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A CULTURA DO CATIVEIRO: CAUSAS E IMPLICAÇÕES DA PRÁTICA DO APRI SIONAMENTO DE ANIMAIS

No documento Volume 1 (páginas 120-123)

FERREIRA V. L.; MUNOZ H S.; CHAVES P P O Efeito da Fragmentação e Isolamento

A CULTURA DO CATIVEIRO: CAUSAS E IMPLICAÇÕES DA PRÁTICA DO APRI SIONAMENTO DE ANIMAIS

Alguns dos aspectos mais importantes sobre os animais silvestres discutem-se nesta categoria, salientando a compreensão dos educadores frente à questão da fauna, as quais se mostram importantes devido à essencialidade do docente na socialização das informações e como mediador da reflexão.

Os sujeitos associam os animais silvestres com “natureza”, “matas”, “campos”, “flores- tas” e “selvas”, como animais que “vivem no seu habitat natural”, “livres”, “sem contato com o ser humano”. Como exemplos de animais silvestres foram citados os pássaros, o leão, o tigre e a onça. A repetição dessa ideia leva a crer que existe um distanciamento entre o ambiente urbano e o considerado natural pelos sujeitos, o que dificulta estabelecer uma relação com o animal sil- vestre, hoje adaptados também nos centros urbanos, além de pouco conhecimento sobre a fauna da região, pois não foram mencionados os animais que vivem nos ecossistemas predominantes na região, como os banhados, por exemplo.

Acredita-se que os sujeitos façam essa relação porque não possuem um contato positi- vo com ambientes naturais da região, ou seja, os espaços naturais próximos acabam servindo como depósitos de lixo ou de esgoto, os quais permitem a proliferação de animais considerados nocivos pelas pessoas, como ratos, cobras e aranhas, dentre outros.

Esse distanciamento determina uma predominância de uma noção de meio ambiente ex- clusivamente naturalizada, que não comporta uma dimensão social, econômica e urbana. Nessa naturalização, o meio ambiente é a mata, o bosque, a selva, na qual parece não existir um “meio ambiente urbano”. Esta é uma questão frequentemente enfrentada pelos educadores ambientais, pois, em geral, há uma tendência dos indivíduos em não se sentir inseridos no meio ambiente, dificultando o processo educativo, como se o ser humano apenas se dirigisse ao “meio ambien- te” para destruir e extrair recursos, de acordo com o que afirma Guimarães (2006)

“Essa intervenção antrópica que degrada o meio não é uma condição inata dos seres humanos, mas o resultado das relações sociais constituídas e consti- tuintes de um meio de produção, promotor de um modelo de desenvolvimento, que imprime uma forma de relação entre sociedade e natureza. Diante dessa visão de mundo tão desintegradora, constrói-se e banaliza-se a separação entre seres humanos e natureza estabelecendo uma relação de dominação de um sobre o outro” (Guimarães, 2006, p. 16).

Já com relação aos cativeiro ilegal, os sujeitos demonstraram algumas informações a respeito:

“Para mim é alguém capturar animais silvestres para criar em casa como animal de estimação ou para vender (para ter lucro). As conseqüências são maus tratos, morte dos animais e muitas vezes acaba acontecendo até mesmo a extinção deles” (Professor 12).

“Tirar macacos, aves da mata e vender! A conseqüência é a morte do animal- zinho. (...) condições subumanas (...)” (Professor 1).

As consequências atribuídas pelos sujeitos a essa atividade ilegal são sempre negativas, sendo citados a extinção de espécies e os maus tratos, mutilações, doenças e até morte causa- da pelo transporte e cativeiro ilegal. Outras consequências apontadas foram multas e a prisão para quem pratica a atividade ilegal, demonstrando que os sujeitos conhecem as consequências legais para quem não cumpre a lei, conforme afirma um professor: “As consequências são mui- tas: destruição da fauna, mutilação dos animais e até a morte deles, e também prisão e multa” (Professor 20).

Foram muitas as falas a respeito da ilegalidade de possuir animais silvestres sem auto- rização, porém esta preocupação aparenta estar mais ligada a uma cultura de medo e de repres- são, do que a uma real preocupação com o meio ambiente, pois, apesar da existência de leis e conhecimento dos problemas gerados, vários conhecem pessoas que possuem animais silves- tres e o comércio ilegal de fauna silvestre só aumenta, criando cada vez mais novas técnicas de contrabando, já que o lucro obtido é considerável (RENCTAS, 2001).

A partir das declarações, supõe-se que o tráfico de animais silvestres é uma atividade relativamente conhecida entre os professores. Foi possível evidenciar também que alguns in- divíduos estão cientes dos prejuízos da atividade ilegal: “Vi documentários sobre o tráfico, e as precárias condições do seu transporte, muitos acabam morrendo na viagem. É um crime absurdo” (Professor 18).

Embora os professores conheçam essa prática ilegal e a considerem negativa, a maioria, aparentemente, não tem como hábito conversar com os alunos sobre a questão como foi eviden- ciado nos questionários: “Sim, acho fundamental participar de atividades deste tipo (EA), mas não trabalhei em aula com meus alunos” (Professor 11).

A democratização da informação é um dos objetivos da EA (BRASIL, 1999), pois os indivíduos com menos acesso a informação não conhecem essa questão tão importante, man- tendo o cativeiro ilegal e o tráfico ainda como uma prática ilegal difundida entre a população que, muitas vezes sem conhecimento, não reflete sobre os aspectos envolvidos.

Assim, é fundamental superar, por meio da EA, a limitação a respeito da complexidade das questões socioambientais, ou seu esvaziamento de sentido. Para Loureiro (2005), existe um desafio na superação da perspectiva reducionista da crise ambiental, sobre o qual ele coloca que é a

(...) superação da compreensão naturalista e conservacionista da crise ambiental, onde a educação é entendida em sua dimensão individual, baseada em vivências práticas; da despolitização do fazer educativo ambiental, apoiando-se em pedagogias comportamentalistas ou al-

ternativas de cunho místico; da baixa problematização da realidade e pouca ênfase em processos históricos; da diluição da dimensão social na natural, faltando entendimento dialético da relação sociedade-na- tureza e da responsabilização pela degradação posta em um homem genérico, fora da história, descontextualizado social e politicamente (LOUREIRO, 2005, p.134).

Sobre a importância de não capturar animais silvestres da natureza, os sujeitos se mos- traram cientes do fato, apresentando dois motivos principais: a preocupação com a preservação da fauna para manter o equilíbrio do meio ambiente, e a preocupação com o direito a liberdade dos animais, que ao serem capturados são aprisionados, especialmente aqueles nascidos livres.

Algumas de suas declarações foram:

(...) por que tirar os animais do seu ambiente, do seu viver natural, onde ele sabe como se alimentar, construir seus ninhos ou abrigos, se defender, para deixá-los presos apenas para serem vistos, expostos (Professor 9).

(...) prejudica os hábitos do animal, a cadeia alimentar e o equilíbrio ecológi- co como um todo (Professor 20).

(...) pelo trabalho da conscientização já podemos ver espécies que não víamos há alguns anos. Exemplo: tucanos, veados, etc.. (Professor 11).

A respeito da necessidade de autorização para possuir animais “incomuns”, os sujeitos evidenciaram desconhecer a imprescindibilidade da licença do IBAMA, pois vários indivíduos demonstrou não possuir qualquer informação a respeito. Apenas um dos sujeitos demonstrou a ambição de possuir um animal diferente do comum, um lagarto, não especificando se um animal nativo ou exótico. A maior parte dos professores disse não ter intenção de possuir um animal silvestre em casa. Apenas dois manifestaram esse desejo, citando o lagarto e o papagaio.

Em geral os indivíduos, mesmo não tendo vontade de possuir um animal silvestre, ao vê-lo nas mãos do traficante, geralmente em péssimas condições, acabam comprando-o, na tentativa de salvá-lo, sem perceber que esta atitude incentiva ainda mais o tráfico de animais (WSPA, 2012).

Em geral, os sujeitos possuem ou conhecem pessoas que possuem pássaros em gaiolas. Alguns sabem informar se são legalizados, outros não, porém todos acreditam que sejam ani- mais de origem legal. Enfim, legalizados ou não, é comum conhecer alguém que possua um pássaro em cativeiro, reafirmando o grande quantitativo de indivíduos que praticam essa ativi- dade na região, evidenciando a característica cultural discutida. Sabe-se que a intensa captura de passeriformes no Brasil é direcionada ao mercado interno. No Brasil, a população mantém uma predileção especial por aves de gaiola, sendo estes principalmente os pássaros canoros, espécies mais encontradas em cativeiro no Brasil (RENCTAS, 2001).

Há grande confusão no conceito de animais silvestres, e muitos dos professores os con- fundem com o conceito dos animais exóticos “(...) Exótico é o animal raro (...), por exemplo: Mico Leão Dourado” (Professor 13)”. Raros foram os professores que se aproximaram da definição próxima do conceito definido pela Lei 9.605 (BRASIL, 1998):“Exóticos são animais

que não pertencem ao nosso ambiente, ou seja, não pertence à fauna de uma região e é levado para este ambiente” (Professor 21).

As denominações equivocadas geralmente são decorrentes da falta de informação dos sujeitos ou devido a vinculações com o significado da palavra propriamente dita que, no seu sentido figurado também significa esquisito, diferente. O pensamento dos sujeitos sobre os animais exóticos faz acreditar que está presente uma cultura de fascínio pelo desconhecido, pois possuir um animal diferente é sinal de diferenciação. Isso só incentiva ainda mais o tráfico de animais, principalmente animais raros, em risco de extinção e que possuem maior valor no mercado (RENCTAS, 2001).

No documento Volume 1 (páginas 120-123)