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CAPÍTULO 2 – UM ESCRITOR E SUA BIBLIOTECA

2.4 Dedicatórias

2.4.5 Dedicatórias inusitadas

Finalizando este rápido apanhado das dedicatórias autografadas, encontradas nos livros do acervo pertencente à biblioteca particular de José Condé, registramos alguns textos curiosos, em que se sobressaem o bom humor, a brincadeira, o chiste, que eram comuns entre os amigos escritores, naquela época, como recorda Vera Condé (informação verbal)85: “Eles estavam sempre brincando, essa coisa lúdica que você não vê hoje”.

Vejamos alguns desses autógrafos:

a) Inicialmente, registremos a poeticidade e o respeito de um poeta ao enviar a Condé

um livro ainda inédito: “A você, José Condé, neste exemplar de um livro ainda não lançado, a primeira dedicatória que faço investido de um Principado que você conquistou e magnanimamente me atribuiu pelo seu belo espírito e pelo seu grande coração. São Paulo, 30.IX.1959. Guilherme de Almeida” (Messidor); poética é também a linguagem utilizada por Audálio Alves, no autógrafo a Condé: “Ao José Condé, o sempre irmão, com minha admiração pelo Romancista, com minha fé e minha solidão, Audálio Alves. Rio, 09-1-66” (Romanceiro do canto soberano).

b) Há mensagens que são cifradas, e somente os dois, o que envia e o que recebe, as

compreendem completamente – talvez também um ou outro amigo comum, que tenham vivenciado a experiência –: “A Zé (Tigre) Condé, do seu companheiro de avião, Antonio

Callado. 14/III/1957” (Madona de cedro). Sabemos, por vários depoimentos, do pavor de voar que Condé nutria, e, provavelmente, o texto de Callado trata-se de uma ironia (“Tigre”), de uma brincadeira com esse medo de avião. Ou, ainda, o registro de uma situação acontecida em Porto Alegre, na viagem de tantas peripécias, já aqui narradas por Leopoldo Teixeira Leite (informação verbal)86: “Para o José Condé, como lembrança da inesquecível noite em que estivemos juntos na busca infrutífera de macumbas, durante o 1º Congresso Brasileiro de Arte. Oferece o Paulo do Couto e Silva. P. A., 2.4.61” (Da interpretação musical).

c) Cobranças bem humoradas, mas enfáticas, também aparecem com frequência:

1) “Ao José Condé, que ainda não me emprestou sequer sua “Histórias da cidade morta”, of. Geir Campos. Maio 53” (Coroa de sonetos);

2) “Meu caro José Condé, Dom J. Eliezer de Carvalho fala-nos aqui com grande entusiasmo do seu último romance. Ganharei um exemplar? Depois da violenta alegria e outras emoções que me deu a Terra de Caruaru, estou desejosíssimo de ler o novo livro. Abraços, Ribeiro Couto. 20.1.63” (Sentimento lusitano);

3) Do poeta Thiago de Mello: “Ao José, que ainda nem me deu o ramo para Luíza, mas a quem dou, com alegria, este livro também seu, com a amizade do Thiago” (Vento geral);

4) “Ao muito caro Condé, com um grande abraço desta sua contadora de história. Lygia [Fagundes Telles]. S. Paulo, outubro de 58. (Em novembro (fins) estarei aí. Farei perguntas sobre estes contos, entendeu?...) L.” (Histórias do desencontro) – apesar da

discreta cobrança de leitura, encontramos este livro com as folhas ainda coladas. As

cobranças por parte de Lygia, no entanto, não param por aí; no livro Silbermann, de Jacques Lacretelle, encontramos dois autógrafos. Um, de 1949: “Para o Condé, com um grande abraço, Lygia. Rio, 1949.” Outro do ano seguinte, com uma curiosa informação: “Condé, arrumando meus livros, achei este que já te dei há tempos. Aceite-o com um segundo grande abraço. Lygia. Rio, 1950”.

d) Condé deve ter participado de algumas polêmicas, principalmente em sua condição

de jornalista literário, cujas rusgas proporcionaram ácidas, mas gentis, dedicatórias: “Ao José Condé, cuja teima em desfavor do escritor nada altera a simpatia do velho amigo, oferece o Lúcio Cardoso. Rio, 60” (Diário I). Mas também o reconhecimento: “Ao ‘implacável’ José

Condé (nunca amigo da onça), com a homenagem e o cordial abraço do José Carlos [Lisboa]. 25-X-1960” (A casa do bode). E ainda: “Para José Condé, homem direito e escritor em permanente ascensão – que aceita o combate de ideias sem ressentimento – a admiração agradecida de José Carlos Oliveira. Rio, 4 de fevereiro de 1963” (Os olhos dourados do ódio).

e) Brincadeiras também são feitas com o sobrenome do escritor, que lembram aquelas,

entre o coronel Quincas Barros e seu compadre João, do Mondé, que deram origem ao nome de família, conforme já abordamos anteriormente: “A José Condé (Conde é? Conde deveras? Mas onde é que já se escreveu conde com acento agudo no E?). Ribeiro Couto. Rio 6.5.1953” (Entre mar e rio).

f) Há espaço também para agradecimento: “A José Condé, romancista que me ensinou muitas coisas, este ramo seco mas vivo de camaradagem e amizade, Ascendino Leite. 6-9-60” (Dois romances: A viúva branca – O salto mortal). Ou este, de um conterrâneo nordestino, da Paraíba: “Para José Condé, a quem devo tanta coisa, inclusive a publicação deste livro, com o abraço amigo e a admiração constante de Virginius da Gama e Melo. Paraíba, agosto de 1970.” (Tempo de vingança).

No caso do livro de Gama e Melo, percebemos a atuação de José Condé, através do

Jornal de Letras, como editor de autores que tinham dificuldade em conseguir espaço ou

sequer atenção das grandes editoras. Recordemos que, como aludimos acima, o escritor potiguar Renard Perez foi outro que aceitou a oferta de Condé de publicar seu livro de contos Os sinos, sob a chancela do jornal literário dirigido por Elysio Condé. A desenvoltura de José Condé como divulgador literário decerto terá contribuído para o estabelecimento de vários escritores iniciantes e/ou desconhecidos, no concorrido cenário literário carioca, entre as décadas de 40 e 60, a exemplo do que se deu com Perez, e mesmo colegas jornalistas, como Mauritônio Meira, Celso Rodrigues, Vandragézilo Neves etc.

g) Notemos a descontração do crítico literário e jornalista Augusto Meyer: “Ao José Condé, estas bilusadas do bom tempo, com um abraço do seu Augusto Meyer, 1955” (Poemas de Bilu). Temos ainda uma referência à vasta cabeleira branca do escritor, que cedo

grisalhou: “Ao meu caro José Condé, com o abraço mais antigo que os seus cabelos brancos.

h) A gentileza de uma dama da literatura brasileira: “Ao José Condé, este caso de amor e misticismo, que, na certa, você contaria melhor que eu. Rachel de Queiroz. 21-4-58” (A beata Maria do Egito). O carinho de outra dama: “Ao muito querido Condé – amizade de 2000 anos quase – e à cara Maria Luiza, a Lygia [Fagundes Telles]. São Paulo, janeiro de 1961” (Histórias escolhidas).

i) O deslize da autora, que parece ter ouvido o galo cantar sem saber onde: “A José Condé, para seus arquivos implacáveis, Myrtha Rosato. Santos – 1962/1963” (Bié) – na verdade, os “Arquivos Implacáveis”, como sabemos, eram de João Condé, não de José. Outro equívoco, a tempo consertado, embora deixando de fora o rabo do gato: “A Maria Luiza, em primeiro lugar. E [rasura] caro José Condé com o abraço de sempre do admirador Herbert Sales. Rio, 19-III-71” (O lobisomem e outros contos folclóricos) – O autógrafo, inicialmente, fora somente para José Condé; posteriormente, foi aposto o nome de Maria Luiza, ressaltando ser “em primeiro lugar”.

j) José Condé andava à cata da obra Seu Candinho da Pharmacia, do pernambucano

Mário Sette, quando lhe chega às mãos um exemplar, com a seguinte dedicatória: “Dr. Condé, oferto-lhe esta joia literária pernambucana, que o soube interessado através do Dr. Valdemar Lopes, cientificando-lhe que, para experimentar esta satisfação, tive que readquiri-la do Dr. José Eduardo Wanderley Rocha, que sabendo da finalidade, imediatamente pôs a minha disposição tão precioso acervo literário, e que faço chegar as suas mãos pelas mãos do Dr. Valdemar Lopes. Recife, Natal de 1961. [assinatura ilegível], “Sebista”.