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As teorias da eficácia mediata e imediata retratam a controvérsia em torno da forma de exercício da horizontalidade dos direitos fundamentais, razão porque é imprescindível uma abordagem sobre tal aspecto.

A questão é discutível, sobretudo a partir da extensão dessa aplicação, ou seja: até que ponto os direitos fundamentais vinculam os particulares nas relações por eles firmadas?!

Desta feita, esta vinculação repercutirá inevitavelmente na autonomia privada, como princípio basilar do Direito Privado, apto a nortear as ações dos sujeitos envolvidos.

Para os teóricos da eficácia mediata, a vinculação direta dos particulares aos direitos fundamentais aglutina riscos, sobretudo à autonomia da vontade, como princípio de fundamental importância para o direito privado, exigindo por isso, precaução no trato do seu conteúdo.

A relação estabelecida entre os direitos fundamentais e a autonomia privada, encontrará diversos desdobramentos, resultando, por exemplo, em situações em que a autonomia privada será restringida por normas de Direitos Fundamentais, assim como outras em que serão os direitos fundamentais que sofrerão restrições em face exatamente da autonomia privada.

Por esse raciocínio, advirão situações em que por força da liberdade negocial orquestrada pela autonomia da vontade, própria dos negócios de natureza privada, poderão configurar renúncia ou mesmo restrição a direitos fundamentais.

Evidencia-se, portanto, hipótese de colisão de direitos fundamentais em sentido amplo, figurando de um lado um ou mais direitos fundamentais e de outro a autonomia privada.

a saber:

Nesse passo, no âmbito das relações contratuais, podem surgir situações distintas

- O particular no exercício da sua liberdade de contratação espontaneamente consente na restrição, temporária ou não, ao núcleo essencial de um ou mais direitos fundamentais;

separação de poderes” (STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 174-175).

- O particular no exercício da liberdade de contratação negativa, quando exatamente por optar não contratar, acaba lesando direitos fundamentais de um ou mais particulares202.

A autonomia privada é considerada pedra angular do Direito Civil, atribuindo aos particulares a aptidão de auto regulamentarem seus próprios interesses.

Por força da autonomia privada os particulares se auto vinculam, como se fossem legisladores dos próprios interesses, com o objetivo de criarem direitos e deveres para si próprios.

Em maior ou menor escala, a autonomia privada está presente no universo dessas relações, revestindo-se da condição de autêntico princípio fundamental.

Assim, no universo das relações privadas celebradas contratualmente, a autonomia privada emerge de forma mais evidente, sendo muitas vezes associada à liberdade negocial ou liberdade contratual; nos dois aspectos: positivo e negativo de contratar, no exercício de escolha do contratante, assim como no tipo de contrato que se deseja celebrar, fixando conteúdo e efeitos segundo adequação, funcionalidade ou conveniência entre os contratos típicos e atípicos.

Conforme já noticiado antes, os direitos fundamentais não são absolutos, a liberdade negocial enquanto direito fundamental, também não.

Inclusive o próprio direito privado fixa limitações legais a essa liberdade negocial.

Princípios outros como o pacta sunt servanda e o do contrato como instrumento que faz lei entre as partes, muito embora tenham tido sua essência preservada, também sofrem limitações, que resultam na relativização da própria liberdade contratual no Direito Privado, em decorrência da denominada funcionalização da liberdade contratual.

Desta feita, normas imperativas, emprego de cláusulas gerais como ordem pública, bons costumes, boa fé e aumento do número de contratos de adesão, popularmente conhecidos como contratos de massa, retratando a nova realidade capitalista em que

202“Contudo, desde logo, diga-se que no conflito entre liberdade contratual negativa (direito de não contratação) e direitos fundamentais há peculiaridades dogmaticamente relevantes. A experiência mostra que nos casos em que o exercício da liberdade contratual negativa colide com um direito fundamental, este direito, via de regra, é o direito fundamental à igualdade de tratamento (direito fundamental ao tratamento isonômico). Está em questão a eficácia do princípio da igualdade nas relações entre particulares; ou, dizendo de outro modo,o princípio da igualdade como limite ao princípio da autonomia privada. Na literatura, é consenso que, na questão da vinculação dos particulares a direitos fundamentais, o direito fundamental ao tratamento isonômico, em razão do seu conteúdo, sua estrutura, sua função e suas implicações práticas, exige um tratamento dogmático diferenciado. Aqui, faz-se a mesma opção” (STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 189).

predominam contratações nas quais, o tempo para tratativas e negociações de seus termos é cada vez mais escasso, são, portanto, formas contratuais mais funcionais e eficientes, para um sistema de produção e consumo, promovem avanços progressivos enquanto mecanismos de restrição à liberdade negocial203.

Mesmo sofrendo restrições pela lei (comandos imperativos e cláusulas gerais), e pela metodologia de formalização dos contratos de massa, a liberdade contratual ou negocial, continua a ser considerada um princípio fundamental do direito privado, mesmo porque a autonomia privada é estruturante para o Direito Civil, embora não tenha caráter ilimitado, exatamente em face das restrições que sofre de cunho legal, como também as advindas dos contratos Standard.204

O que ocorre é que a teoria da eficácia mediata invoca o princípio da autonomia privada, como óbice a vinculação imediata dos particulares aos direitos fundamentais. Essa vinculação para tais teóricos deve operar-se de forma mediata, em se tratando das relações que a iniciativa privada estabelece.

Operacionalização mediata da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais, significa dizer que numa relação de natureza contratual, as normas de direitos fundamentais restringem a autonomia privada, através de leis especificamente editadas para aquela determinada situação, leis estas, aptas a concretizarem normas de direitos fundamentais, podendo ainda essa restrição se dar mediante atividade jurisdicional concretizadora de cláusulas gerais de direito privado, preenchidas com valores subjacentes aos direitos fundamentais, aplicáveis ao caso concreto.205

203“Os contratos standard representam uma das mais fortes restrições à liberdade contratual. Neles, o princípio da liberdade contratual reduz-se, praticamente, à liberdade de escolher entre contratar e não contratar. Há exíguo espaço – e, por vezes, nenhum espaço – para o exercício da liberdade de discutir e determinar o conteúdo e os efeitos do contrato e, nos casos de monopólios e de oligopólios econômicos de certos bens e serviços (e.g. água, energia elétrica, telefonia), até mesmo para o exercício da liberdade de escolher com quem contratar”. (STEINMETZ, op. cit., p. 194-195).

204“Por isso, é alarmista e infundada a objeção, desde a teoria da eficácia mediata, segundo a qual os direitos fundamentais como limites diretos ou imediatos à autonomia privada poderiam conduzi-la à eliminação. A rigor, os direitos fundamentais operam como mais um tipo de limites à autonomia privada, ao lado dos já construídos no próprio campo do direito privado. Ademais, como escreveu Perlingieri, a autonomia privada não é um valor em si e, sobretudo, não representa um princípio subtraído ao controle de sua correspondência e funcionalização dos sistemas das normas constitucionais” (STEINMETZ, op. cit., p. 196-197).

205“Nos casos concretos subsumíveis às normas imperativas de direito privado, deve prevalecer aquilo que elas obrigam ou proíbem. Não cabe ao juiz sobrepor-se à decisão legislativa se ela for constitucionalmente possível. Para exemplificar, cite-se o art. 13 do novo Código Civil Brasileiro: ‘salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes’. Conforme a teoria da eficácia mediata, um caso concreto que caísse no suposto fático (fattispecie, tatbestand, hipótese legal) dessa forma deveria resolver-se de acordo com a consequência jurídica que ela prescreve. Se a norma é constitucional, então não cabe ao juiz sobrepor-se a ponderação já feita pelo legislador para um virtual conflito entre integridade física (CF, art. 5º, X) e autonomia privada (liberdade para

Havendo previsão legislativa específica restringindo a autonomia privada, deve prevalecer aquilo por ela prescrito; entretanto; se inexistir previsão legislativa nesse sentido, ou havendo, seja deficiente, cabível será a decisão judicial mediante o emprego de cláusulas gerais preenchidas axiojusfundamentalmente.

Digno de registro é que muito embora a eficácia imediata dos direitos fundamentais nas relações entre os particulares não fulmine a autonomia privada, considerada um bem constitucionalmente protegido, como também pelo fato de já existirem mecanismos de solução de colisões entre direitos fundamentais e autonomia privada, a exemplo do princípio da proporcionalidade, não deixa de ser importante e relevante a preocupação que a teoria da eficácia mediata demonstra ter, com a preservação da autonomia privada diante da condição desta, essencial e fundamental para o direito privado, nesse contexto considerada manifestação do princípio da autonomia da pessoa humana, (moral e juridicamente).

Muito embora a autonomia privada nem sempre encontre previsão constitucional, isso não significa dizer que deixe de ser protegida constitucionalmente.

A propriedade privada inclusive tem sua previsão em diversas Constituições do mundo, como fundamento do princípio da autonomia privada.

No Brasil a carta constitucional tutela a autonomia privada em diversas disposições, como por exemplo, o art. 5º (direito de liberdade), art. 1º, IV c/c art. 170 (livre iniciativa), art. 5º, XIII (exercício de qualquer ofício, trabalho ou profissão), art. 5º, XXII (direito de propriedade), dentre outros, numa evidência de que a autonomia privada é respaldada pela Constituição Federal Brasileira (1988), e, portanto por ela é protegida.

A proteção constitucional à autonomia privada é reflexo de dois bens jurídicos resguardados pela Constituição: o direito de propriedade (Art. 5º, XXII) e o princípio da livre iniciativa (art. 1º, IV c/c art. 170, CF/88).

O direito de propriedade assegura ao indivíduo proprietário, exercer atos de disposição sobre o que lhe pertence, por meio do manejo de instrumentos contratuais.

O contrato por sua vez, atrela-se a liberdade contratual, como representante da própria autonomia privada, enquanto princípio fundamental do direito privado.

Consequentemente, se a propriedade goza de proteção constitucional, gozará também de tal privilégio a autonomia privada.

dispor contratualmente do próprio corpo). O caso se resolve como um caso de direito civil e não como um caso de direito constitucional” (STEINMETZ, op. cit., p. 197).

A livre iniciativa tem previsão constitucional não só no art. 1º, IV, da CF/88, como no art. 170, diante de sua condição de princípio constitucional, cujo texto a equipara ao principal fundamento constitucional da autonomia privada.

Portanto, havendo colisão entre os direitos fundamentais e a autonomia privada, esta deverá ser solucionada em sentido amplo; ou seja, direito fundamental versus bem constitucionalmente protegido, numa concepção mais atual da teoria da eficácia imediata.

A concepção de que a vinculação direta dos particulares aos direitos fundamentais resultaria no comprometimento da autonomia privada cai literalmente por terra, tendo em vista que não se pode afastar da discussão um bem ou princípio constitucionalmente protegido.

A autonomia privada não pode dessa forma ser afastada automaticamente nas situações em que colide com os direitos fundamentais, mesmo porque, da mesma forma que os direitos fundamentais limitam a autonomia privada, esta igualmente os limita.

A proporcionalidade enquanto princípio, por sua vez, tem sido utilizada como solução para as colisões entre os direitos fundamentais e a autonomia privada.

Necessário aludir para desenvolvimento do assunto, à teoria dos princípios, que estruturalmente impõe uma diferenciação entre estes e as regras.

Alexy 206 considera princípios e regras como normas, entretanto os princípios teriam a condição de mandamentos de otimização, suscetíveis de ponderação para aplicação do direito, de modo que o caso concreto determine qual princípio precede o outro. As regras têm sua aplicação manejada na base do tudo ou nada, sendo insuscetíveis de ponderação, de modo que sua aplicação se dá por meio da subsunção207.

No caso dos princípios não existe, portanto, uma ordem de precedência dura ou absoluta.

Por essa razão é que o peso de um princípio variará, a depender das exigências do caso concreto.

É, portanto, um procedimento racional a identificação e valoração das condições sob as quais um princípio será ou não aplicado, mas a ponderação, é que permite fundamentar os motivos pelos quais um determinado princípio precede o outro.

206 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2015.

207“As colisões de princípios exigem um método de solução diferente. Não há introdução de cláusula de exceção em um nem declaração de invalidade de um dos princípios. Com base nas circunstâncias relevantes do caso – são elas que determinam o peso relativo de cada um dos princípios no caso -, um dos princípios precede o outro, ou, o que é dizer o mesmo, um princípio cede ante o outro” (STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais.São Paulo: Malheiros, 2004.p. 206).

Alexy208menciona em sua teoria dos princípios o que denomina de relação de precedência condicionada à lei de colisão.

Os princípios têm peso.

Peso significando razões suficientes de prevalência de um princípio sobre outro, na observância do caso concreto.

Essas razões emergem a partir da ponderação dos princípios ou interesses em discussão.

O processo intelectual de ponderação exige a conjugação de três elementos constitutivos: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito209.

As restrições ou limitações dos direitos fundamentais, através da ponderação, exigem que se examine a relação entre o meio e o fim.

Portanto, a decisão limitadora e o meio para alcance do fim, como objetivo almejado.

necessária.

Essa relação entre meio e fim, é que precisa ser adequada de forma proporcional e

Adequação no sentido de que a decisão limitadora de um direito fundamental precisa ser considerada apropriada, enquanto meio para alcance do objetivo almejado.

Necessidade na medida em que dentre os meios de restrições possíveis e igualmente eficazes para o alcance de determinado fim, deve ser eleito o menos restritivo aos direitos fundamentais, ou seja, menos gravoso ou menos prejudicial.

Proporcionalidade significando em sentido estrito razoabilidade, entre os meios escolhidos e o resultado almejado210.

208 ALEXY, op. cit.

209“Segundo Alexy, entre a teoria dos princípios – para a qual os princípios são mandamentos de otimização e a colisão de princípios se resolve mediante ponderação – e a máximada proporcionalidade e suas três máximas parciais, existe uma conexão. Os princípios, como mandamentos de otimização, são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas. As possibilidades fáticas são determinadas pelas máximas da adequação e da necessidade e as possibilidades jurídicas, pela máxima da proporcionalidade em sentido estrito – esta última é o mandamento de ponderação propriamente dito. Há uma co-implicação entre princípios e a máxima da proporcionalidade: os princípios exigem a máxima da proporcionalidade – de modo especial a máxima da proporcionalidade em sentido estrito (a ponderação) – para que se solucionem as colisões de princípios in concreto e a máxima da proporcionalidade determina as possibilidades fáticas e jurídicas dos princípios, isto é, determina o grau de otimização (realizabilidade ou satisfação) dos princípios in concreto. Adequação (Geeignetheit), necessidade (Erforderlichkeit) e proporcionalidade em sentido estrito (VerhältnismässigkeitimengerenSinne) são os elementos constitutivos daquilo que na dogmática e na jurisprudência constitucionais contemporâneas – de matriz germânica – chama-se princípio da proporcionalidade (Verhaltnismassigkeitsgrundsatz)” (STEINMETZ, op. cit., p. 210).

210 A análise do conteúdo dessa lei mostra que a ponderação consiste em três passos. Primeiro: determinação (‘mensuração’) do grau de não satisfação ou de não realização de um princípio (o princípio restringido). Trata-se de ‘quantificar’ o grau de intensidade da intervenção ou da restrição. Segundo: avaliação da importância (‘peso’)

A precedência prima facie ou prioridades, baseia-se em condições gerais de precedência para criação de certa ordem, que, no entanto, não significa hierarquia entre princípios.

Quando através da precedência constrói-se uma carga de argumentos favorável a determinado princípio, acarreta-se a construção de carga de argumentação contrária ao princípio que deixou de ser aplicado.

Preponderará o argumento mais forte, de modo que não necessariamente será mantida uma precedência geral considerada inicialmente para construção da decisão definitiva final211,212.

Surgirão situações em que o indivíduo sentindo-se lesado em determinado direito fundamental, invocará a tutela jurisdicional, no afã de corrigir ou solucionar a colisão, elegendo a medida com que deve prevalecer o direito fundamental ou a autonomia privada.

Doutra banda, haverão situações em que o indivíduo não invocará a tutela jurisdicional do Estado. No entanto, o Estado mesmo não sendo chamado, poderá intervir a fim de que os direitos fundamentais lesados prevaleçam em detrimento da autonomia privada.

Existe um dever estatal de proteção aos direitos fundamentais e a dignidade da pessoa humana213.

da realização do outro princípio (o princípio oposto). Terceiro: demonstração de se a importância da realização do princípio oposto justifica a não-realização do princípio restringido.

211 STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais.São Paulo: Malheiros, 2004.p. 224.

212“(1): em uma relação contratual de particulares em situação (ou sob condições) de igualdade fática, há uma precedência ‘prima facie’ do direito fundamental individual de conteúdo pessoal ante o princípio da autonomia privada.

(2): em uma relação contratual de particulares em situação (ou sob condições) de desigualdade fática, há uma precedência ‘prima facie’ do direito fundamental individual de conteúdo pessoal ante o princípio da autonomia privada.

(3): em uma relação contratual de particulares em situação (ou sob condições) de igualdade fática, há uma precedência prima facie do princípio da autonomia privada ante o direito fundamental individual de conteúdo patrimonial.

(4): em uma relação contratual de particulares em situação (ou sob condições) de desigualdade fática, há uma precedência prima facie do direito fundamental individual de conteúdo patrimonial ante o princípio da autonomia privada.

213

A título de exemplificação, é apropriado o caso do ‘arremesso de anão’ (lancer de nain), decidido pelo Conselho de Estado francês em outubro de 1995. Em outubro de 1991, uma empresa de entretenimento para jovens promoveu, em discotecas da região metropolitana de Paris e de cidades do interior da França, o certame batizado de ‘arremesso de anão’ (lancer de nain). O jogo consistia em arremessar um anão de um ponto a outro. O prefeito da cidade de Morsang-sur-Orge, com fundamento no art. 131 do Código dos Municípios (diploma legal de vigência em âmbito nacional) – segundo o qual cabe ao prefeito o exercício do poder de polícia no município, podendo, se necessário à preservação da ordem pública, intervir em atividades ou restringir o exercício de direitos – e no art. 3º da Convenção Européia de Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (Roma, 1950), interditou o espetáculo. A empresa de entretenimento, em litisconsórcio ativo com Wackenheim (um anão), ajuizou ação no Tribunal Administrativo de Versailles com o objeito de anular o ato administrativo do prfeito. O Tribunal acolheu a pretensão dos autores alegando ‘excès de pouvoir’ no ato do prefeito, eis que o espetáculo, por si só, não perturbava a ordem pública. Contudo, em grau de recurso, o Conselho de Estado, em outubro de 1995, reformou a decisão do Tribunal Administrativo de Versailles,

Dar-se-á, portanto a intervenção do Poder Judiciário provocada pelo Ministério Público, de forma autorizada, de modo que a solução buscada emerja do emprego da proporcionalidade.

Essa intervenção estatal, sem provocação pelo interessado, encontra respaldo desde que exista prova inequívoca de grave lesão à dignidade da pessoa humana, enquanto princípio constitucional objetivo e autônomo.

A dignidade da pessoa humana além da dimensão individual, tem também uma dimensão social, de maneira que o tratamento degradante e atentatório a dignidade do indivíduo transcende o universo da vítima, projetando-se contra toda a comunidade a que pertença, e num contexto mais amplo, projetando-se contra a humanidade.