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2.1 O conceito e a identificação dos interesses ou direitos coletivos em sentido amplo

2.1.1 Direitos ou interesses difusos

A definição dos direitos ou interesses difusos encontra-se, como acima indicado, no inciso I do parágrafo único do art. 81 da Lei n° 8.078/90, in verbis, “interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato”.

Dessa redação, considerando-se os três critérios (subjetivo ou titularidade, objetivo e origem84) utilizados pelo CDC na definição dos interesses metaindividuais, mostra-se possível extraírem-se as seguintes características dos interesses ou direitos difusos: a) titulares indetermináveis; b) direitos ou interesses indivisíveis; c) titulares ligados por uma circunstância de fato.

São direitos ou interesses essencial ou substancialmente coletivos, pertencentes, ao mesmo tempo, a toda uma coletividade e aos seus integrantes.

Então, com relação à titularidade dos direitos difusos, sobressai-se o fato de que são direitos que não dizem respeito a apenas uma pessoa, pois também pertencem a uma

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WATANABE, Kazuo. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, comentado pelos autores do

Anteprojeto. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p. 739. Preleciona Ada Pelegrini Grinover

que a doutrina moderna tem relevado a distinção entre interesses juridicamente protegidos e direitos subjetivos, de modo que todos os interesses relevantes para o direito constituem posições ocupadas nas relações jurídicas, passíveis de sua realização (GRINOVER, Ada Pellegrini. A Tutela Jurisdicional dos Interesses Difusos. Revista de Processo, São Paulo, ano IV, nº 14-15, p. 25-44, abril-setembro 1979).

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coletividade de número tão significativo de componentes que estes não podem ser identificados, determinados. Ou seja, os titulares dos direitos difusos foram uma comunidade de pessoas indeterminadas e indetermináveis.85

A ameaça ou a lesão a essa espécie de direito atinge a todos simultaneamente, sem embargo de uma ou outra pessoa determinada sofrer eventualmente também ameaça ou dano concreto em sua órbita jurídica.86

A segunda característica dos direitos difusos é a sua indivisibilidade, peculiaridade que resulta da própria natureza desses direitos, i.e., o bem jurídico protegido é indivisível justamente porque pertence a todos simultânea e indistintamente. Não é possível de ser cindido ou compartilhado. Uma única ofensa é capaz de propiciar lesão a todos os integrantes da coletividade, da mesma forma que, em contrapartida, a cessação dessa ofensa os satisfaz em tempo simultâneo.87

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Pedro Lenza ressalta que “a indeterminação de seus sujeitos destaca-se com a marca fundamental dos

interesses difusos, já que os titulares dos interesses coletivos e individuais homogêneos são perfeitamente

identificados ou, ao menos, identificáveis” – grifos no original (LENZA, Pedro. Teoria Geral da Ação Civil

Pública. 2. ed. São Paulo: RT, 2005. p. 72). No mesmo sentido: NUNES, Rizzato. As Ações Coletivas e as

Definições de Direito Difuso, Coletivo e Individual Homogêneo. Processo Civil Coletivo. Coord. Rodrigo Mazzei e Rita Dias Nolasco. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 86; ALVIM, Eduardo Arruda. Apontamentos sobre o Processo das Ações Coletivas. Processo Civil Coletivo. Coord. Rodrigo Mazzei e Rita Dias Nolasco. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 28.

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Se várias forem as pessoas atingidas por esta ofensa, estará configurada uma hipótese de direitos individuais homogêneos, cujo conceito será estudado adiante (item 2.1.3).

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No ponto, com precisão, discorre Pedro Lenza que, “[...] no tocante aos interesses difusos, a indivisibilidade é ampla e absoluta, na medida em que, como não se consegue determinar os seus sujeitos, não se pode falar em partição de algo que pertence a todos indistintamente, ou, em outras palavras, não se pode dividir algo que pertence a pessoas indefinidas” (LENZA, Pedro. Teoria Geral da Ação Civil Pública. 2. ed. São Paulo: RT, 2005. p. 76). Ao discorrer sobre a nota da indivisibilidade, o processualista Barbosa Moreira esclarece que “[...] o interesse em jogo, comum a uma pluralidade indeterminada (e praticamente indeterminável) de pessoas, não comporta decomposição num feixe de interesses individuais que se justapusessem como entidades singulares, embora análogas. Há, por assim dizer, uma comunhão indivisível de que participam todos os possíveis interessados, sem que se possa discernir, sequer idealmente, onde acaba a ‘quota’ de um e começa a de outro. Por isso mesmo, instaura-se entre os destinos dos interessados tão firme união, que a satisfação de um só implica de modo necessário a satisfação de todos; e, reciprocamente, a lesão de um só constitui, ipso facto, lesão da inteira coletividade” (grifos do autor) (MOREIRA, José Carlos Barbosa. Tutela Jurisdicional dos Interesses Coletivos ou Difusos. Revista de Processo, São Paulo, ano X, nº 39, p. 55-77. julho-setembro 1985).

Nem mesmo o fato de a tutela jurídica específica ao bem jurídico protegido (indivisível) ser convertida em perdas e danos retira essa qualidade, pois a indenização será revertida para o fundo de que trata o art. 13 da Lei da Ação Civil Pública.88

Por fim, os titulares dos direitos difusos estão unidos por uma circunstância fática. Não há relação jurídica base quer entre os titulares dos direitos, quer com a parte contrária. A circunstância que une esses titulares reside justamente no fato de que todos são atingidos pela ofensa, do mesmo modo que a cessação dessa beneficia a todos a um só tempo.

Conforme destaca Pedro Lenza,

[...] não se percebe qualquer vínculo jurídico, mas apenas uma situação fática a unir os sujeitos titulares dos interesses difusos. Não se identifica qualquer relação jurídica-base ligando grupo, categoria ou classe de pessoas entre si ou com a parte contrária, relação esta percebida nos interesses ou direitos coletivos, onde esta característica evidencia-se antes da lesão ou ameaça de lesão coletiva.89 (grifos no original)

São exemplos dessa modalidade de direitos: o direito a respirar ar puro e de viver em um meio ambiente ecologicamente equilibrado, à não veiculação de propaganda abusiva ou enganosa nos meios de comunicação, à não colocação no mercado de consumo de produtos com alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde, à não colocação de cláusulas abusivas em contratos de massa, à administração pública proba, à defesa do erário, à não destruição do patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico etc.