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SUJEITOS DA RELAÇÃO DE EMPREGO

3.2 EMPREGADO DOMÉSTICO

3.2.1. Características

As características específicas da relação de emprego doméstico e também as regras de proteção deste tipo de empregado estão previstas na Constituição Federal e na Lei n. 5.859, de 11.12.1972.

Empregado doméstico é “aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou a família, no âmbito residencial destas” (art. 1º, Lei n. 5.859/72).

Assim, são fatores que diferenciam o doméstico dos demais empregados:

trabalho para pessoa ou família;

trabalho no âmbito residencial;

inexistência de fins lucrativos no trabalho que exerce.

doméstico com objetivo de lucro, sob pena de caracterizá-lo como empregado em geral, excluindo- lhe do âmbito da Lei n. 5.859/72.

A inexistência de finalidade lucrativa no trabalho deve ser considerada em relação ao tomador dos serviços, mas não significa que em relação ao empregado não haja um evidente conteúdo econômico, o que é caracterizado pela onerosidade. Os serviços prestados pelo empregado doméstico não podem se constituir em fator de produção para aquele que deles se aproveita (pessoa ou família). Mas o empregado doméstico tem o direito de receber o salário como contraprestação pecuniária pelos serviços prestados ao empregador.[21]

São empregados domésticos a arrumadeira, a cozinheira, o motorista, o jardineiro etc., desde que o trabalho seja realizado no âmbito residencial do empregador e que este não utilize os serviços do empregado com finalidade de obtenção de lucro. Na hipótese de a casa ser utilizada como pensão, a cozinheira não será doméstica, mas, sim, empregada com todos os direitos da CLT.

Considera-se como âmbito residencial não só a residência permanente do empregador, mas também as residências de veraneio, tais como casa de praia, chácara ou sítio, desde que nelas não haja exercício de atividade econômica com finalidade lucrativa. Assim, por exemplo, sendo a chácara ou sítio utilizados exclusivamente para o lazer do empregador e de sua família e sendo eventual produção agrícola unicamente para consumo próprio, o empregado será doméstico. Ao contrário, havendo na propriedade produção agrícola ou pecuária com a finalidade de comercialização, o empregado não será doméstico, mas, sim, rural.[22]

O trabalho doméstico, como ocorre em qualquer tipo de relação de emprego, é prestado com

pessoalidade,de forma contínua, subordinada e com onerosidade, ou seja, o empregado doméstico presta serviços pessoais, não eventuais e remunerados, sob as ordens do empregador.

Existem certos tipos de serviços prestados pelo empregado que geram dúvida em relação à caracterização ou não do trabalho doméstico. Tais situações são as seguintes:

Trabalhos intelectuais ou que exigem uma certa especialização da mão de obra

A doutrina e a jurisprudência têm se posicionado no sentido de não fazer qualquer diferença o tipo de serviço prestado para que se possa caracterizar o trabalho doméstico. A natureza intelectual ou manual da atividade não exclui a qualidade do doméstico, desde que o serviço seja prestado para pessoa ou família, no âmbito residencial destas e sem finalidade lucrativa.

Neste sentido, Maurício Godinho Delgado afirma que podem ser considerados domésticos “professores (ou “preceptores”) particulares, secretárias particulares, enfermeiras particulares e outros trabalhadores, desde que, insista-se, estejam presentes, na situação sociojurídica examinada, todos os elementos fático-jurídicos gerais e especiais da relação de emprego da Lei n. 5.859/72”.[23]

Trabalho exercido pelos porteiros, faxineiros, zeladores e serventes de prédios de apartamentos residenciais

A Lei n. 2.757, de 23.04.1956, excluiu estes trabalhadores, desde que trabalhem a serviço da administração do edifício, das regras específicas do trabalho doméstico, razão pela qual são considerados trabalhadores urbanos, a eles sendo aplicáveis todos os direitos previstos no art. 7º da Constituição Federal.

Tendo em vista a exclusão expressa da relação de emprego doméstico do sistema de proteção da CLT, o regramento específico deste tipo de trabalho foi dado apenas pela Lei n. 5.859/72, que previa os seguintes direitos aplicáveis aos domésticos: férias anuais remuneradas de 20 dias úteis, após cada período de 12 meses de trabalho prestado à mesma pessoa ou família; anotação na CTPS; e inscrição como segurado obrigatório da Previdência Social. O decreto regulamentador da referida Le i (Decreto n. 71.885/73, art. 2º) determinou que fosse aplicado ao empregado doméstico o capítulo da CLT relativo às férias, com exceção das regras sobre prazo, em relação às quais já havia previsão específica.

A legislação instituidora e regulamentadora do vale-transporte (Leis ns. 7.418/85 e 7.619/87 e Decreto n. 95.247/87) estendeu tal benefício à categoria dos trabalhadores domésticos.

A Constituição Federal de 1988 foi um marco na proteção trabalhista dos domésticos, à medida que lhes assegurou um leque de direitos muito mais extenso do que o que lhe era conferido pela legislação existente até então. No entanto, muito embora seja inegável a melhoria das condições de proteção trabalhista do doméstico a partir da Constituição de 1988, era inescusável a constatação de que o constituinte adotou um critério desigual entre os trabalhadores domésticos e os trabalhadores urbanos e rurais, à medida que o art. 7º prevê uma proteção ampla e integral a estes últimos em detrimento da proteção assegurada aos primeiros, que se restringia aos direitos previstos em alguns poucos incisos do referido dispositivo.

De toda sorte, a partir da Constituição Federal de 1988 os domésticos passaram a ter os direitos previstos no art. 7º, parágrafo único:

salário mínimo;

irredutibilidade de salário;

décimo terceiro salário;

repouso semanal remunerado preferencialmente aos domingos;

férias anuais remuneradas com pelo menos um terço a mais do que o salário normal;

licença-gestante de 120 dias sem prejuízo do emprego e do salário;

licença-paternidade;

aviso prévio de no mínimo 30 dias;

aposentadoria;

integração à Previdência Social.

A Lei n. 11.324, de 19.07.2006, trouxe nova ampliação de direitos do trabalhador doméstico:

descanso remunerado em feriados (foi revogada expressamente a exclusão prevista no art. 5º, da Lei n. 605/49);

30 dias corridos de férias, para períodos aquisitivos iniciados após a data de publicação da Lei (art. 3º, da Lei n. 5.859/72, com nova redação, e art. 5º, da Lei n. 11.324/2006);

proibição de descontos no salário do doméstico por fornecimento de alimentação, vestuário, higiene ou moradia (art. 2º-A, da Lei n. 5.859/72);

5.859/72).

Em resposta às discussões sobre a desigualdade de tratamento constitucional entre os trabalhadores urbanos e rurais e os trabalhadores domésticos, e atendendo aos anseios dessa última categoria, que somente no Brasil soma mais de sete milhões de trabalhadores, a Emenda Constitucional n. 72/2013 trouxe uma nova ampliação aos direitos do empregado doméstico.

Assim, mantendo os direitos já originalmente previstos pela Constituição Federal de 1988

(salário mínimo, irredutibilidade de salário, décimo terceiro salário, repouso semanal remunerado preferencialmente aos domingos, férias anuais remuneradas com pelo menos um terço a mais do que o salário normal, licença-gestante de 120 dias sem prejuízo do emprego e do salário, licença- paternidade, aviso prévio de no mínimo 30 dias, aposentadoria e integração à Previdência Social), o parágrafo único do art. 7º da Constituição Federal passou, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 72/2013, a garantir à categoria dos trabalhadores domésticos os seguintes direitos:

garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável;

proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa;

duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;

remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinquenta por cento à do normal;

redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;

reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho;

proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;

proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;

proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos.

Além disso, atendidas as condições estabelecidas em lei e observada a simplificação do cumprimento das obrigações tributárias, principais e acessórias, decorrentes da relação de trabalho e suas peculiaridades, também se assegurou aos trabalhadores domésticos:

relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, entre outros direitos;

seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário;

fundo de garantia do tempo de serviço;

remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;

salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei;

assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas;

seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa.

trabalhador doméstico, até que venha a ser promulgada lei regulamentando a concessão do referido direito continua em vigor a previsão do art. 3º-A da Lei n. 5.859/72, incluído pela Lei n. 10.208, de 23.03.2001, que prevê a possibilidade de o empregado doméstico ser inserido no sistema do FGTS

mediante requerimento do empregador, o qual, nesse caso, ficará obrigado a efetuar mensalmente o recolhimento de tal benefício, na forma da lei específica, em favor de seu empregado doméstico. Assim, até que venha a ser regulamentado, o FGTS do empregado doméstico continua a ser uma

faculdade do empregador que, uma vez exercida, gerará um direito em favor do empregado.

Da mesma forma, enquanto não for promulgada a lei regulamentadora, o seguro-desemprego do doméstico continua a ser assegurado apenas a empregado inserido pelo empregador no FGTS e que tiver trabalhado como doméstico por um período mínimo de quinze meses nos últimos vinte e quatro meses contados da dispensa sem justa causa, fazendo jus ao benefício, no valor de um salário mínimo, por um período máximo de três meses, de forma contínua ou alternada (art. 6º-A, Lei n. 5.859/72).

Os documentos necessários para que o doméstico possa se habilitar ao benefício do seguro- desemprego são os previstos no art. 6º-B, também incluído pela Lei n. 10.208, de 23.03.2001.

No que tange à proibição dos descontos nos salários, o art. 2º-A da Lei n. 5.859/72 ressalva que poderão ser descontadas as despesas com moradia, quando essa se referir a local diverso da residência em que ocorrer a prestação de serviço, e desde que essa possibilidade tenha sido expressamente acordada entre as partes (§ 1º). As despesas com alimentação, vestuário, higiene ou moradia não têm natureza salarial nem se incorporam à remuneração do doméstico para qualquer efeito (§ 2º).

A Lei n. 11.324/2006, em nítida intenção de incentivar a formalização da relação de emprego e o registro de empregados domésticos, criou ainda alguns incentivos para o empregador doméstico. O primeiro incentivo, de natureza fiscal, permitiu ao empregador doméstico deduzir do imposto de renda, desde o ano de 2006 (exercício de 2007) e até o ano fiscal de 2011 (exercício de 2012), as contribuições previdenciárias mensais (inclusive sobre o 13º salário e o terço de férias), respeitando o teto de um salário mínimo como salário de contribuição e o lançamento de um único empregado (arts. 1º e 8º). Visando a desburocratização da relação de emprego doméstico, referida Lei autoriza o recolhimento em guia única, até 20 de dezembro, das contribuições previdenciárias

relativas ao mês de novembro e ao 13º salário (art. 1º).

Entre todos os direitos previstos em favor dos domésticos, questão bastante polêmica, em relação à qual são travados debates na doutrina e na jurisprudência, é a que diz respeito às férias.

Conforme mencionado, nos termos do art. 3º da Lei n. 5.859/72, o empregado doméstico tem direito a férias anuais remuneradas de 30 (trinta) dias com, pelo menos, 1/3 (um terço) a mais que o salário normal, após cada período de 12 (doze) meses de trabalho, prestado à mesma pessoa ou família.

No entanto, há quem considere não serem aplicáveis ao empregado doméstico os preceitos relativos às férias proporcionais e à dobra de férias sobre a parcela não quitada. Tal posicionamento se fundamenta na inexistência de previsão específica a esse respeito na Lei n. 5.859/72.

No entanto, conforme visto anteriormente, o Decreto n. 71.885/73, que regulamenta a Lei n. 5.859/72, determinou, em seus arts. 2º e 6º, a aplicação aos domésticos do capítulo da CLT sobre férias. Isso porque, tendo em vista que a lei específica conferiu à categoria dos domésticos o direito a férias anuais remuneradas, sem, no entanto, nada dispor acerca do instituto, exceto em relação à sua

duração, não haveria como deixar de se aplicar a estrutura e a dinâmica do instituto dadas pela CLT, que passou, desse modo, no que for compatível, a ser necessariamente aplicada à categoria doméstica.