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7 2 ENQUADRAMENTO CONCETUAL

No documento Mestre em Gestão e Políticas Ambientais (páginas 37-40)

“Mesmo as leis mais bem ordenadas são impotentes diante dos costumes (…)”

Nicolau Maquiavel

Para abordar a participação pública na elaboração de políticas de acesso aos recursos genéticos e partilha dos benefícios derivados da sua utilização, evitando assim a biopirataria, é fundamental estudar algumas conceções importantes para o desenvolvimento desta tese. A primeira refere-se à escolha do pensamento político a ter como base do estudo, o qual servirá para analisar os modelos de políticas de ABS já existentes.

A segunda refere-se à conceção teórica de participação pública, considerando-a como um fim em si mesma, prática para a cidadania e a consolidação da democracia, e diferenciando-a de seu uso como categoria instrumental de projetos, ações e programas governamentais que a empregam como um discurso vazio de significado. Este pode ser trabalhado em conjunto com a governância pública, na qual há três atores distintos na condução político-económica das sociedades atuais: o governo, o setor privado e as organizações distintas das governamentais ou empresariais privadas (Heidemman, 2009).

A terceira está diretamente relacionada com a segunda e refere-se aos potenciais conflitos que podem surgir quando existem interesses e valores diferenciados quando se pensa na construção de políticas públicas participadas.

É ainda essencial que se apresente e debata conceitos e termos que irão ser utilizados ao longo desta tese, nomeadamente o conceito de política, políticas públicas, política internacional e participação pública e os termos biodiversidade e biopirataria, elementos que auxiliaram na construção do atual cenário português para a elaboração de uma política pública nacional de ABS.

Assim, a referência central da revisão bibliográfica deste trabalho é a Convenção das Nações Unidas sobre a Diversidade Biológica, cuja conceção de políticas públicas, participação pública e negociação, está associada à democracia deliberativa. Para o autor, a elaboração de uma política pública ambiental está intrinsecamente ligada à vontade da sociedade civil e do

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setor privado fazerem-se ouvir pelo Governo, de modo a que todos sintam que os seus direitos estão a ser defendidos e, consequentemente, cumpridas as suas obrigações com o Governo.

2.1 Política

As pessoas, no seu dia a dia, desenvolvem políticas para alcançar objetivos nas relações de trabalho, de relação interpessoal ou de lazer. São decisões comuns que necessitam de ser tomadas de forma individual ou por um grupo de pessoas, e que implicam uma relação de poder.

Seguindo o pensamento de Aristóteles, a política engloba tudo o que diz respeito à vida coletiva das pessoas em sociedade e nas suas organizações (Heidemann, 2009), e portanto o homem é um ser político por natureza.

A política por si só possui vários significados que são amplamente retratados por grandes estudiosos, como por exemplo Noberto Bobbio (1986) e Thomas R. Dye (2005), e ainda é responsável por grandes discordâncias entre as pessoas no diálogo e no debate, tanto a nível local, como regional e mundial (Heidemann, 2009).

Já a teoria política moderna, que começa no século XV, fundada por Nicolau

Maquiavel, nitidamente refletida no seu livro “o Príncipe”, defende o Estado e o governo como

realmente são e não como deveriam ser. Para Maquiavel a finalidade da política é a manutenção do Estado.

Ao analisar o conceito de política pela linha de estudo de Maquiavel, verifica-se que a política trata de um conjunto de processos, métodos e expedientes utilizados por indivíduos ou grupos de interesse para influenciar, conquistar e manter o poder, ou seja, a conjuntura prevalece sobre a estrutura (Heidemann, 2009). É a partir de Maquiavel que a finalidade das ações dos governantes passa a ser a manutenção da pátria e o bem geral da comunidade, e não somente o bem próprio.

David Easton (1965), reconhecido cientista político, no seu livro “A Framework for

Political analysis” define a Política como sendo a distribuição autoritária de valores.

Segundo Heywood (1997) a política é melhor compreendida como sendo a ligação entre as intenções, ações e resultados, sendo que ao nível das intenções, a política é refletida na posição do governo; ao nível das ações, é refletida no comportamento do governo; e ao nível dos resultados, é refletida nas consequências da ação do governo.

Heinz Eulau e Kenneth Prewitt definem a política “como uma decisão existente, caracterizada por consistência e repetibilidade comportamental tanto de quem a formula quanto também de quem a cumpre” (Eulau & Prewitt, 1973, p. 465 in Heidemann, 2009; p. 30; Dye; 2005, p. 4), logo a política envolve uma relação de poder e portanto, o poder é a capacidade em influenciar alguém a fazer algo que de forma diferente que o mesmo doutro modo não faria (Dhal, 1957; Foucault, 1995;Deleuze, 2005).

O cientista político Harold Lasswell, considerado o pai da moderna ciência política, que escreveu diversas obras importantes nesta área, e o filósofo Abraham Kaplan definem a política como sendo um programa estruturado composto de metas, valores e práticas; já o

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cientista político Carl Friedrick diz que é essencial para o conceito de política que exista um objetivo, meta, ou finalidade (Dye, 2005).

Ao analisar a política pela vertente da ética, depreende-se que a política é a arte de governar e realizar o bem público (Heidemann, 2009), e sendo assim a política irá tratar o organismo social como uma totalidade.

Para Dye (1992) a política é um processo pelo qual a sociedade ajuda a descobrir a melhor forma de se organizar e de se autorregular. De acordo com o seu pensamento, as decisões são elaboradas pelo público para lidar com questões que afetam a vida em comunidade.

Weber (s.d., p.56), define a política como um “conjunto de esforços feitos com vistas a participar do poder ou influenciar a divisão do poder, seja entre Estados, seja no interior de um único Estado”. Portanto toda a política implica um pouco de competitividade, principalmente em regimes poliárquicos (Couto, 2005).

No sentido mais operacional a “política é vista como ações, práticas, diretrizes políticas, fundadas em leis e empreendidas como funções de Estado por um governo, para resolver questões gerais e específicas da sociedade” (Heidemann, 2009, p. 29).

Assim, atenta a definição de “política” acima mencionada, no seu conceito mais lato, fica claro que ao pensar em políticas públicas deve-se pensar nas instituições ou entidades de uma sociedade ou, ainda, pressupor, a existência de um interesse comum que consolide e justifique a existência dessas instituições. Portanto, para a consecução de uma política pública que vise o bem da sociedade, na sua maioria, é necessário a elaboração de planos de gestão que tenham como objetivo principal a eliminação de conflitos e a obtenção de ganhos, o que terá, em princípio, como resultado final o alcance do interesse comum. O Estado deverá sempre trabalhar com uma intenção maior de alcançar os fins da sociedade.

A existência de conflitos de interesses e, consequentemente, da pressão por parte da sociedade civil para solução desses conflitos formará agendas, no âmbito dos Estados. A perceção desses conflitos altera-se de acordo com os decisores políticos que estão no poder, e isto fixará a agenda de diferentes formas. Fixadas as agendas, estas farão surtir programas de governo que, por fim, tornar-se-ão políticas públicas a partir do momento em que forem institucionalizadas.

O desenvolvimento deste processo poderá ocorrer através de dois sistemas: autoritário ou democrático. No sistema democrático a posição da população é maioritariamente tida em conta, sistema que será defendido nesta tese, uma vez que a CDB reconhece a necessidade de promover a cooperação internacional, regional e mundial entre os Estados e as organizações intergovernamentais e o setor não-governamental para a conservação da diversidade biológica e a utilização sustentável de seus componentes, demonstrando assim que possui a preocupação de que todos os setores sejam ouvidos. Já no sistema autoritário assistimos a uma maior tecnocracia que não tem em conta a vontade popular.

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No documento Mestre em Gestão e Políticas Ambientais (páginas 37-40)