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A EVOLUÇÃO RECENTE DA COBERTURA PREVIDENCIÁRIA 3 E OS COMPONENTES CONTRIBUTIVOS E SEMICONTRIBUTIVOS DA PROTEÇÃO OFERECIDA PELA

POSSIBILIDADES E LIMITES PARA A EXPANSÃO DA PROTEÇÃO SOCIAL PELA VIA CONTRIBUTIVA CLÁSSICA: NOTAS SOBRE A INCLUSÃO

2 A EVOLUÇÃO RECENTE DA COBERTURA PREVIDENCIÁRIA 3 E OS COMPONENTES CONTRIBUTIVOS E SEMICONTRIBUTIVOS DA PROTEÇÃO OFERECIDA PELA

PREVIDÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA

Após um longo período de quedas consecutivas na taxa de cobertura previdenciária dos traba- lhadores ocupados (ocupados que se autodeclaram contribuintes da Previdência Social/PEA ocupada),4 passou-se a observar uma tendência clara de reversão desta tendência negativa,

ainda que o indicador agregado tenha sempre ocultado diferenças de gênero marcantes. Entre 1992 e 2002, a proporção de cotizantes diminuiu para os homens, comprometendo assim o resultado global (já que os homens preponderam entre os ocupados), mas entre as mulheres a tendência foi de clara expansão desta relação entre contribuintes e ocupados. As mulheres mantiveram essa tendência ao longo de toda a série considerada (1992-2011), sendo acom- panhadas pelos homens a partir de 2003 (gráfico 1). Em termos agregados, a proporção de contribuintes avançou de maneira consistente no período 2003-2011: partindo-se de 2002, ano em que se observou o pior resultado da série considerada, a cobertura social aumentou em 14,5 pontos percentuais (p.p), chegando a 59,6% em 2011 – melhor resultado da série.

GRÁFICO 1

Taxas de contribuição e de proteção previdenciária da população ocupada de 16 a 59 anos, segundo sexo (1992-2011) (Em %) 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 Homens – Contribuição 53,3% 52,6% 52,0% 51,9% 51,2% 50,0% 49,4% 50,5% 49,8% 50,9% 52,1% 52,9% 54,6% 56,3% 57,8% 59,2% 63,0% Total – Contribuição 49,9% 49,3% 49,0% 49,9% 49,3% 48,7% 47,9% 49,6% 48,9% 50,0% 50,8% 51,6% 53,1% 54,8% 56,3% 57,8% 62,6% Mulheres – Contribuição 44,7% 44,2% 44,7% 47,0% 46,5% 46,8% 45,8% 48,3% 47,6% 48,6% 48,9% 49,8% 51,1% 52,7% 54,4% 56,1% 62,2% Homens – Proteção 70,0% 68,7% 67,6% 67,1% 66,3% 64,8% 64,1% 63,5% 62,9% 63,8% 64,3% 64,9% 65,7% 66,9% 67,8% 68,9% 71,3% Total – Proteção 67,0% 65,9% 65,1% 65,0% 64,6% 63,4% 62,8% 62,3% 61,7% 62,5% 62,6% 63,4% 64,0% 65,1% 66,0% 67,0% 70,6% Mulheres – Proteção 62,4% 61,6% 61,4% 61,8% 62,1% 61,4% 61,0% 60,7% 60,0% 60,7% 60,2% 61,4% 61,8% 62,7% 63,6% 64,6% 69,6% 35,0% 40,0% 45,0% 50,0% 55,0% 60,0% 65,0% 70,0% 75,0%

Fonte: PNAD/IBGE (vários anos). Elaboração: SPS/MPS.

Obs.: exclusive áreas rurais da região Norte (salvo Tocantins).

3. Esta seção está fortemente baseada no artigo Mercado de trabalho e inclusão previdenciária no Brasil: evidências para o período 1992-2011, publicado no Informe de Previdência Social. Para detalhes, ver Ansiliero (2013).

4. A proporção da PEA que contribui para a Previdência Social (contribuintes/PEA), juntamente com a proporção de ocupados contribuintes (ocupados que se auto declaram contribuintes/PEA ocupada), consiste em um dos indicadores mais clássicos de mensuração do grau de cobertura previdenci- ária. Ocorre que a apuração deste indicador é dificultada no Brasil pela insuficiência de dados nas principais bases disponíveis, mesmo aquelas de abrangência nacional. A PNAD, assim como o Censo Demográfico, apenas coleta dados sobre a contribuição das pessoas ocupadas em um período de referência, deixando à margem de seus levantamentos os contribuintes desocupados ou inativos. Resta, então, a alternativa de explorar o indicador de cobertura da PEA ocupada, o qual tende a ser suficiente para ilustrar o padrão predominante de evolução da cobertura previdenciária brasileira.

Não obstante a relevância desta relação entre contribuintes e ocupados, o Brasil adota oficialmente um indicador mais amplo, que se vale de um conjunto de critérios capaz de produzir um retrato mais acurado da proteção entre os trabalhadores ocupados, inclusive in- corporando as particularidades da Previdência Rural brasileira (Schwarzer et al., 2004). Para além dos contribuintes (segurados ativos do RGPS e segurados ativos de regimes específicos para militares e servidores públicos), a população ocupada protegida ainda incorpora outros grupos: i) os chamados “segurados especiais” (trabalhadores rurais que exercem suas atividades individualmente ou em regime de economia familiar, pessoas que contam com a proteção da Previdência Social mesmo não declarando contribuição para a previdência, já que sua contri- buição se dá sobre a eventual comercialização da produção rural); e ii) os não contribuintes que recebem algum benefício continuado (previdenciário ou assistencial). Assim, resumidamente, os protegidos são aqueles que contribuem para algum regime previdenciário público ou são segurados especiais ou, embora não contribuam e não sejam caracterizados como segurados especiais, já são beneficiários da Previdência ou da Assistência Social.

Na série histórica harmonizada, o indicador agregado de proteção previdenciária também atingiu em 2011 (70,6%) o melhor valor registrado pela PNAD desde 1992, resultado que segue consolidando a mesma mudança de tendência observada, desde 2002, no indicador de cobertura previdenciária. No período de 1992 a 2002, o contingente de protegidos cresceu menos que proporcionalmente em relação à população ocupada total com o mesmo recorte etário, fazendo com que a taxa de proteção diminuísse, passando de 67,0% (1992) para 61,7% (2002). Ambos os sexos registraram redução da proteção, mas entre as mulheres este fenô- meno foi bem menos significativo. Entre 2002 e 2011 houve melhora visível nesse indicador (de 61,7%, em 2002, para 70,6%, em 2011), sendo que a recuperação se deu para homens e mulheres.

O peso do grupo formado pelos beneficiários não contribuintes caiu ligeiramente no pe- ríodo (gráfico 2), resultado de um pequeno incremento na primeira metade da série (de 1992 a 2002: +0,5 p.p.) e uma subsequente retração mais que proporcional (de 2002 a 2011: -0,8 p.p.). Entre os segurados especiais houve queda contínua: a participação dessa categoria no total de ocupados caiu de 15,6% (em 1992) para 7,5% (em 2011). Para militares e estatutários, a parte inicial da série revela estabilidade relativa, seguida de ligeira expansão, movimento esse que predomina no saldo final (diferença: +0,6 p.p.). Fica claro, portanto, que o ganho recente no indicador de proteção se deu mais em função da inclusão de contribuintes do RGPS do que pelo aumento na proporção de protegidos em qualquer outra das categorias consideradas: na série harmonizada, o indicador de cobertura decomposto variou positivamente em 12,1 p.p. para este grupo, um movimento claro de aumento do grau de formalidade trabalhista (ou, ao menos, previdenciária).

GRÁFICO 2

Decomposição do indicador de proteção previdenciária – Brasil (1992-2011)1 (Em %) 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 RGPS 43,1% 42,4% 41,6% 42,5% 42,2% 41,6% 40,6% 42,6% 42,0% 42,9% 43,7% 44,8% 46,0% 47,5% 49,0% 50,3% 55,2% Militares e estatutários 6,8% 6,9% 7,4% 7,4% 7,1% 7,1% 7,2% 6,9% 6,8% 7,0% 7,1% 6,8% 7,0% 7,2% 7,3% 7,5% 7,5% Segurados especiais 15,7% 15,1% 14,4% 13,4% 13,5% 12,9% 13,1% 10,9% 10,9% 10,8% 10,2% 10,1% 9,4% 8,8% 8,2% 7,9% 6,8% Beneficiários não contribuintes 1,4% 1,5% 1,7% 1,7% 1,8% 1,8% 1,8% 1,8% 1,9% 1,8% 1,6% 1,7% 1,6% 1,5% 1,4% 1,3% 1,1% Desprotegidos 33,0% 34,1% 34,9% 35,0% 35,4% 36,6% 37,2% 37,7% 38,3% 37,5% 37,4% 36,6% 36,0% 34,9% 34,0% 33,0% 29,4%

Fonte: PNAD/IBGE (vários anos). Elaboração: SPS/MPS.

Nota: 1 Exclusive áreas rurais da região Norte (salvo Tocantins).

Obs.: incluídos os militares e os servidores públicos estatutários.

Tomando-se como conceito de informalidade trabalhista a ocupação em posições sem vínculos formalizados, a medida desse problema, no Brasil, pode ser auferida como a proporção de ocupados na condição de autônomos (trabalhadores por conta própria), empregados sem carteira (domésticos ou não) e não remunerados (não remunerados, trabalhadores ocupados na construção para o próprio uso e trabalhadores ocupados na produção para o próprio consumo). Pelo gráfico 3 nota-se que este segmento da população ocupada ainda é bastante importante no país, respondendo por cerca de 45,0% do total de postos de trabalho informados na PNAD 2011 (sempre com o filtro etário previamente definido, de idade entre 16 e 59 anos), mas que seu peso já foi substancialmente maior.

Essa diminuição da informalidade se fez sentir em áreas urbanas e rurais, agrícolas e não agrícolas. Embora o patamar de informalidade ainda seja elevado, notadamente entre os ocu- pados em atividades agrícolas, o aumento das taxas de proteção e de contribuição na última década resulta principalmente de um aumento na participação dos empregados com carteira entre os ocupados. Os menores avanços foram sentidos entre os trabalhadores rurais ocupados em atividades agrícolas, onde a precariedade dos postos de trabalho ainda prepondera, mas a queda foi perceptível em todos os grupos considerados. Isso indica que a Previdência Rural tem ganhado relevância para explicar a expansão da cobertura também em razão de um aumento observado na proporção de trabalhadores agrícolas que – embora não possam ser incluídos no regime diferenciado, como segurados especiais – contribuem para o RGPS.

GRÁFICO 3

Composição da PEA ocupada com idade entre 16 e 59 anos, segundo posições na ocupação (1992-2011)

(Em %) 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 Empregados sem carteira

Empregados com carteira

Domésticos sem carteira Domésticos com carteira

Conta-Própria Militares e estatutários Não remunerados Empregadores 44,9 47,8 48,5 50,6 51,5 52,9 53,5 54,2 54,9 54,8 56,4 55,7 55,5 55,5 55,6 55,7 54,9 Fonte: PNAD/IBGE 1992-2011. Elaboração: SPS/MPS.

Obs.: exclusive áreas rurais da região Norte (salvo Tocantins).

Para além dos efeitos diretos sobre o segmento do mercado de trabalho vinculado aos setores mais estruturados da economia brasileira, a melhoria do cenário econômico e a resposta positiva do mercado de trabalho formal também favoreceram a redução da “informalidade previdenciária” por meio da elevação do rendimento real médio no país. O aumento do nível de emprego observado nos últimos anos, embora muito atrelado à ocupação registrada em carteira de trabalho, pressionou o rendimento do trabalho para cima, mesmo entre os informalmente ocupados (gráfico 4). Ademais, há que se considerar os efeitos multiplicadores do crescimento econômico sobre a economia como um todo, dadas as conhecidas interações entre os setores formal e informal da economia, fenômeno que também pode ter contribuído para a melhoria da capacidade contributiva de empregados informais e trabalhadores por conta própria. Daí resulta que, para além do incremento na formalidade trabalhista, houve um movimento de redução da informalidade previdenciária entre aqueles não absorvidos pelo mercado de traba- lho formal, ainda que este movimento se mostre bem mais sutil e pouco homogêneo entre as distintas posições na ocupação consideradas.

GRÁFICO 4

Evolução do rendimento real médio, segundo posições na ocupação (1992-2011)

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

Empregados com carteira 1.083,4 1.112,8 1.328,0 1.323,9 1.334,8 1.347,4 1.251,5 1.200,8 1.182,7 1.089,2 1.086,2 1.121,5 1.172,5 1.194,3 Empregados sem carteira 433,0 465,1 644,3 678,8 688,4 697,6 650,0 677,5 659,5 592,3 606,6 645,3 670,1 702,3 Domésticos com carteira 393,3 375,2 485,3 503,4 508,6 521,7 521,1 521,5 517,0 498,2 502,5 538,0 579,9 601,1 Domésticos sem carteira 220,3 221,3 342,8 357,3 353,4 341,8 331,1 322,9 318,4 293,8 298,7 310,0 331,8 350,2 Trabalhadores por conta-própria 749,3 846,7 1.095,3 1.212,0 1.129,4 1.058,7 995,8 970,7 906,8 848,4 845,8 857,5 906,1 1.012,8 Empregadores 2.652,8 3.184,1 4.166,8 4.480,0 4.196,3 4.020,7 3.610,3 3.542,7 3.484,6 3.168,0 3.188,7 3.280,0 3.600,3 3.507,3 1.206,5 722,8 614,0 359,7 977,2 3.438,4 1.235,9 761,7 658,3 374,4 980,7 3.447,5 1.294,9 837,5 692,6 430,4 1.191,6 3.923,2 0 500 1.000 1.500 2.000 2.500 3.000 3.500 4.000 4.500 5.000

Fonte: Série Histórica IBGE-INPC; PNAD 1992-2011. Elaboração: SPS/MPS.

Obs.: exclusive áreas rurais da região Norte (salvo Tocantins).

Grosso modo, portanto, pode-se dizer que na primeira metade da série histórica de 1992

a 2011 houve uma ligeira retração na taxa de contribuição previdenciária total, determinada por uma diminuição na proporção de contribuintes entre empregados, trabalhadores por conta própria e empregadores, bem como por uma redução no contingente de segurados especiais. Na segunda metade desta série, o arrefecimento no ritmo de queda do volume de segurados especiais, atrelado à expansão da formalização previdenciária entre empregados e trabalhado- res por conta própria, explica a recuperação do indicador global de proteção previdenciária a partir de 2003.

Ressalte-se que, apesar desta redução na quantidade absoluta de segurados especiais, a relevância da Previdência Social brasileira para a proteção dos trabalhadores rurais (principal- mente daqueles atuando na agricultura familiar e de seus equiparados) segue incontestável. Uma evidência disso é o fato de que a proteção previdenciária rural – definida neste contexto pela região censitária do local de moradia e não pela natureza da atividade laboral desempe- nhada pelo trabalhador –, segue elevada e bastante superior à urbana, em que pese uma ligeira tendência de queda observada desde 1992.5 Por um lado, a queda no contingente de segurados

especiais tem forçado o indicador de proteção para baixo; por outro, especialmente no período de 2003 a 2011, a redução da informalidade entre os trabalhadores agrícolas tem servido para neutralizar, ao menos parcialmente, esta tendência. De todo modo, impressionantes 7,5% da população ocupada masculina se declara não contribuinte, mas encontra-se protegida na con- dição de segurados especiais, mesma situação vivida por 5,9% das mulheres ocupadas no país. 5. Sempre com base nos dados harmonizados da PNAD, tem-se que a proteção previdenciária no meio rural caiu de 85,7% (em 1992) para 82,0% (em 1999) e, posteriormente, evoluiu para os 84,3% registrados no último ano da série (em 2011). No meio urbano, os indicadores correspondentes assumem valores mais modestos: 61,4% (em 1992); 57,6% (em 1999); e 68,6% (em 2011).

Este movimento de redução na quantidade absoluta de potenciais segurados especiais não se deve a qualquer medida legal ou administrativa por parte do RGPS (restringindo o público beneficiário potencial), mas sim à migração rural-urbana e à expansão da agroin- dústria e das atividades não agrícolas no meio rural (estas últimas, associadas a um forte movimento de urbanização do meio rural). O incremento na ocupação rural não agrícola, por sua vez, está possivelmente relacionado a uma “intensificação da interiorização da eco- nomia”, marcada pelo surgimento de novos polos econômicos no interior das Unidades da Federação – dinâmica que fugiu ao modelo predominante até então, focado basicamente nas regiões metropolitanas.6

A figura do segurado especial segue sendo, portanto, componente fundamental da política previdenciária nacional, ainda que a própria dinâmica econômica, ocupacional e demográfica esteja contribuindo para, paulatinamente, promover a migração destes trabalhadores para ou- tras categorias, como a de empregados formais (agrícolas ou não). O impacto desta migração sobre a cobertura previdenciária e, principalmente, sobre a proteção previdenciária, depen- derá de como estas variáveis se comportarão no futuro, pois estes trabalhadores se distanciam do componente semicontributivo do RGPS – no qual não há uma vinculação rígida entre contribuição e recebimento de benefícios de natureza previdenciária – e se colocam em seu componente eminentemente contributivo, onde o acesso a qualquer serviço ou benefício não pode prescindir de contribuição prévia e onde a proteção efetiva de seus filiados está sujeita aos efeitos de intempéries como a informalidade, o desemprego e os baixos rendimentos.

Com efeito, em que pese a natureza contributiva do RGPS, os segurados especiais são contemplados com um regime previdenciário bastante diferenciado, no qual, na prática, há garantia de cobertura independentemente de cotização, desde que a atividade em regime de economia familiar seja devidamente comprovada. Por este motivo, os benefícios concedidos sob estas regras são muito comumente classificados como não contributivos ou até mesmo assistenciais. O termo semicontributivo é mais adequado porque, apesar de serem muito fre- quentes as concessões de benefícios (de risco e planejados) sem o cumprimento de carência em seu conceito mais clássico (qual seja, o recolhimento prévio de valores ao sistema), há previsão legal para que tais contribuições sejam vertidas e elas, em algum grau, ocorrem. Mais preci- samente, o segurado especial não está isento de contribuição, já que é obrigado a contribuir com 2,1% da receita bruta proveniente da comercialização da produção.7 Ocorre, contudo,

que, em geral, a contribuição deste segurado é sub-rogada ao adquirente da produção. Trata-se de regime bastante peculiar e, no âmbito do Regime Geral de Previdência Social, sem equivalente previdenciário para os trabalhadores urbanos, os quais até bem pouco tempo 6. Segundo estudo do IBGE, a interiorização do Brasil na última década foi influenciada de forma significativa pela expansão das cadeias produtivas de carne, grãos e algodão em direção ao Centro-Oeste e ao Norte, fenômeno que – entre outros reflexos – estaria elevando o grau de urbanização nacional e modificando a densidade e a mobilidade populacionais. Isso tudo ao mesmo tempo em que houve uma aparente litoralização do país, tanto em razão da exploração de petróleo quanto de atividades relacionadas ao turismo. O resultado foi o adensamento da população e dos centros urbanos situados nestas proximidades, nas quais a composição setorial da ocupação foi alterada.

7. O segurado especial contribui com 2,0% incidentes sobre a receita bruta da comercialização da produção rural, além de mais 0,1% para o custeio dos benefícios concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho.

atrás se deparavam com mecanismos de proteção estritamente previdenciários (e, evidente- mente, contributivos) ou assistenciais, sem alternativas intermediárias. Este cenário prevaleceu desde a extinção das prestações assistenciais denominadas rendas mensais vitalícias (RMV), em 1993, até meados dos anos 2000, quando se intensificou o esforço (por parte do Legislativo e, principalmente, do Executivo Federal) para a expansão da cobertura previdenciária no país. Estes benefícios de natureza assistencial, instituídos pela Lei no 6.179/1974 e totalmente extin-

tos pela LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social (Lei no 8.742/1993), foram concedidos a

residentes urbanos e rurais até 31/12/1995 e, embora não contributivos, até 2002 integraram as despesas com o pagamento de benefícios pelo RGPS.8

Com a regulamentação da LOAS, a RMV – prestação mensal de um salário mínimo (SM) então devida ao maior de 70 anos ou ao inválido que tivesse sido filiado à Previdência Social,9 que não fosse aposentado pelo RGPS e tampouco exercesse atividade remunerada e que

comprovasse não possuir meios de prover sua própria subsistência ou de tê-la provida por sua família – foi substituída pelo Benefício de Prestação Continuada (BPC), benefício mensal de igual valor, mas que, ao contrário da RMV, não dá origem a pensões por morte e tampouco dá direito a gratificação natalina. O BPC, mais precisamente, consiste em um amparo assistencial financiado pelo Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) e apenas operacionalizado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), concedido (sem qualquer requisito contributivo ou de filiação previdenciária, contrariamente à RMV) aos portadores de deficiência e aos ido- sos com 65 anos ou mais de idade que comprovem possuir renda mensal familiar per capita inferior a um quarto do salário mínimo. As despesas com seu custeio, portanto, não possuem natureza previdenciária e tampouco integram o fluxo de caixa do RGPS.

Dos segurados obrigatórios do RGPS, a exemplo do segurado empregado (urbano ou rural); do trabalhador avulso (cuja filiação é intermediada por órgão gestor de mão de obra ou sindicato); do empregado doméstico; do trabalhador por conta própria (no RGPS, denominado contribuinte individual, categoria de segurado que inclui os empresários e os trabalhadores autônomos e/ou que exercem atividade remunerada eventual); e dos segurados especiais (tra- balhadores rurais em regime de economia familiar, bem como seus dependentes), portanto, apenas os últimos podem receber benefícios sem alguma contrapartida contributiva efetiva. Esse tratamento diferenciado derivaria da reduzida capacidade contributiva que possuem e das dificuldades que enfrentariam para se enquadrar adequadamente nas mesmas regras impostas aos demais trabalhadores, situação minimamente compensada pela customização de um pa- cote de benefícios menos generoso que o oferecido aos segurados empregados – sujeitos aos maiores custos totais de cotização.

8. Desde janeiro de 2003 estes valores foram oficialmente declarados assistenciais e passaram a não mais integrar as despesas e, consequentemente, a necessidade de financiamento do RGPS.

9. Por filiação à Previdência Social, entende-se: i) filiação ao regime do INPS, em qualquer época, no mínimo por 12 meses, consecutivos ou não, vindo a perder a qualidade de segurado; ou ii) exercício de atividade remunerada incluída no regime do INPS ou do FUNRURAL, mesmo sem filiação à Previdência Social, no mínimo por cinco anos, consecutivos ou não; ou, ainda, iii) ingresso no regime do INPS, após complementar 60 (sessenta) anos de idade sem direito aos benefícios regulamentares.

Ocorre que outras categorias de trabalhadores também estão sujeitas às mesmas vulnera- bilidades, quadro que tem sido levado seriamente em consideração nas políticas mais recentes de inclusão previdenciária. Muito embora os dados analisados sugiram que o bom momento experimentado pela economia brasileira na última década tenha sido a força motriz por trás desta melhoria dos indicadores de cobertura do RGPS, nesse período foram implantadas diversas medidas facilitadoras (ou fomentadoras) do processo de inclusão previdenciária, as quais tendem a beneficiar principalmente os trabalhadores urbanos, tanto pela composição censitária da população ocupada como em razão da natureza das atividades desenvolvidas pelos trabalhadores focalizados prioritariamente nestas iniciativas.

Pelo lado do emprego formal, as principais iniciativas são relatadas a seguir.

1) A instituição do Simples, que, a partir de 1996, desonerou a folha de salários das microempresas e empresas de pequeno porte.

2) A isenção da cota previdenciária patronal incidente sobre as receitas oriundas da exportação rural, em 2001.

3) A obrigatoriedade de retenção de 11,0% do valor dos contratos de cessão de mão de obra, em 2003;

4) A permissão de dedução da cota patronal relativa ao empregado doméstico na De- claração Anual de Ajuste do Imposto de Renda das Pessoas Físicas, a partir de 2006. 5) E, bem recentemente, a desoneração compensada da folha de salários de empresas vinculadas a determinados setores da economia, política demasiadamente recente para que se tenha alguma avaliação mais consistente do seu impacto.

Exceções feitas à retenção de 11,0% (que consiste tão somente em eficaz instrumento administrativo para garantir o recolhimento de contribuições) e ao tratamento tributário concedido ao empregador doméstico (cujo custo é assumido diretamente pelo Tesouro Na- cional), as demais medidas implicam em renúncias previdenciárias significativas. Em comum, todas têm o fato de que proporcionam incentivos para empregadores, não para os próprios potenciais segurados, já que são os primeiros os tomadores de decisão nas relações tradicionais patrão-empregado (quadro 1).

QUADRO 1

Principais políticas e medidas de inclusão previdenciária pela via da formalização trabalhista (emprego com registro em carteira de trabalho)

Políticas de Inclusão/

Medidas Legais Ano Categoria de ContribuinteTipo de Estabelecimento/ Categorias de Segurados Descrição Amparo Legal

SIMPLES 1996 Microempresas e empresas de pequeno porte Empregados

Os estabelecimentos optantes têm a contribuição previdenciária patronal substituída por uma alíquota incidente sobre a receita bruta mensal. O SIMPLES substitui uma série de tributos (entre eles, a cota patronal devida ao RGPS) por um único tributo, cobrado sobre o faturamento.

Lei no 9.317/1996 e

suas alterações.

Políticas de Inclusão/

Medidas Legais Ano Categoria de ContribuinteTipo de Estabelecimento/ Categorias de Segurados Descrição Amparo Legal Isenção da Cota

Patronal incidente sobre as Exportações Rurais

2001 Agroindústria e Produtor Rural Pessoa Jurídica

Empregados (Empregados Rurais com Carteira de Trabalho)

As receitas de exportações (da agroin- dústria e do produtor rural pessoa jurídica) estão isentas da contribuição patronal, que normalmente seria de 2,6% da receita bruta decorrente da comercialização da produção rural.

§ 2o do art. 149 da Emenda Constitucio- nal no 33/2001. Retenção de 11% dos Contratos de Cessão de Mão-de- -Obra 2003

Empresas que contratam Pessoas Jurídicas presta- doras de serviços mediante cessão de mão de obra

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