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A questão da gestão dos recursos hídricos já vem sendo discutida e desenvolvida a bastante tempo no cenário internacional. Devido a percepção da escassez relativa da água no mundo, da distribuição irregular no espaço, da diminuição de disponibilidade hídrica provocada pela poluição e do diminuto percentual de água doce disponível.

Na evolução do modo de tratar as questões relativas ao uso, alocação e conservação da água é possível distinguir três fases, que adotam modelos18 gerenciais cada vez mais complexos: o modelo burocrático, o modelo econômico-financeiro e o modelo sistêmico de integração participativa (Lanna, 1995).

Apesar da identificação destes três modelos gerais, podem existir variações, resultantes de aspectos ligados as características locais, cultura, história, arranjos

18 O termo modelo tem, na linguagem cotidiana, ao menos três usos distintos: como substantivo, remete a representação; como

adjetivo, implica ideal; e, como verbo, modelar significa demonstrar. Da reunião destes significados resulta uma representação idealizada da realidade a fim de demonstrar algumas se suas propriedades. (...) A construção de modelos torna-se, portanto, uma operação valiosa, na medida em que as generalizações obtidas a partir deles permitem vislumbrar áreas que demandam ajustes ou aperfeiçoamentos. Estes modelos podem reunir teorias, leis, equações ou suspeitas que materializam nossas crenças a respeito do universo que pensamos ver. Bressan (1996).

institucionais19, o modo de produção dominante20 e a formação social historicamente determinada21.

Não obstante essas variações possíveis, apresentaremos os três modelos básicos destacados anteriormente, de modo a facilitar o entendimento dos aspectos básicos de cada modelo, permitindo assim comparações quando necessário.

3.8.1 Modelo burocrático

Esse modelo começou a ser implantado no final do século XIX, e baseava-se na idéia que a problemática da água poderia ser resolvida apenas com o cumprimento da legislação pertinente.

Dada a complexidade da problemática ambiental e especificamente dos recursos hídricos, foram editadas uma grande quantidade de decretos, portarias, etc., cabendo aos(as) gestores(as) fazer com que esses dispositivos legais fossem cumpridos.

Esse modelo apresenta algumas limitações que podem ser verificada na tendência de uma contínua centralização de muitas atribuições em entidades públicas, o que pode levar a ineficiência, casuísmo e clientelismo. A falta de participação da sociedade na elaboração desses dispositivos legais, bem como no planejamento e na alocação dos recursos.

Lanna (1995), afirma que as principais falhas desse modelo, consistem em considerar como previsíveis as reações e comportamentos humanos e em dar excessiva atenção aos aspectos formais, o que impede a percepção dos elementos dinâmicos: o meio onde estão inseridos, a subjetividade do atores e as relações de poder.

19 “arranjos institucionais”, é definido por Kemper (1997, p. 23), como estruturas que determinam as tomadas de decisões. Os

arranjos institucionais podem ser formais (leis, regulamentos, etc.) ou informais (por exemplo costumes, códrigos de comportamentos, etc.). Pode ser também definido como qualquer forma de limitação que os seres humanos possam criar para modelar a interação humana. (North, 1990, citado por Kemper, 1997, p. 33)

20 Modo de produção, corresponde a uma determinada fase de produção da vida material da sociedade. Em conjunto, as forças

produtivas e as relações de produção constituem o modo de produção. As forças produtivas seria o resultado da soma dos conhecimentos e habilidades humanas, orientadas para fins produtivos, mais os meios de produção. As relações de produção deve ser entendida como as relações sociais que os homens contraem entre sí na produção dos bens materiais de que se utilizam para a satisfação de suas necessidades. As épocas históricas distinguem-se entre sí, não pelo que se produz, mas pelo modo como se produzem os objetos de que o homem se utiliza para satisfazer suas necessidades. (Soares, 1989). Mais sobre o assunto pode ser visto em: Huberman (1986); Marx (1999); Harnecker (1978).

3.8.2 Modelo econômico-financeiro

Esse modelo pode ser considerado como um desdobramento do pensamento econômico Keynesiano, que destacava a relevância do papel do Estado enquanto empreendedor, bastante defendido na década de 30, principalmente devido a grande crise capitalista que assolou a economia internacional naquela época.

Segundo Lanna (1995), esse modelo é caracterizado pela predominância do emprego das negociações político-representativas e econômicas, através de instrumentos econômicos e financeiros, aplicados pelo poder público, para a promoção do desenvolvimento econômico nacional ou regional e indução à obediência das disposições legais vigentes.

3.8.3 Modelo sistêmico de integração participativa

Este modelo tem como objetivo estratégico a reformulação institucional e legal, e busca integrar sistematicamente os quatro tipos de negociação social: econômica, política direta, política representativa e jurídica. Se caracteriza pela criação de uma estrutura sistêmica, na forma de uma matriz institucional de gerenciamento, responsável pela execução de funções gerenciais específicas, e pela adoção de três instrumentos: planejamento estratégico por bacia hidrográfica; tomada de decisão através de deliberações multilaterais e descentralizadas (comitê de bacia); e o estabelecimento de instrumentos legais e financeiros (Lanna, 1995).

Apesar do reconhecimento da existência histórica desses três modelos, e da possibilidade de inúmeras combinações, atualmente esta em discussão os dois modelos que se colocam em posições opostas, de um lado o modelo econômico-financeiro ou de mercado de água (baseados nos mercados de água do Estados Unido) e de outro o

21 Formação social, seria uma realidade social historicamente determinada, constituída pelo modo de produção (estrutura econômica

ou infra-estrutura), e a correspondente superestrutura ideológica (Jurídica, política, filosófica, artística, religiosa, etc.). (Soares, 1989). Mais sobre o assunto pode ser visto em: Huberman (1986); Marx (1999); Harnecker (1978).

modelo sistêmico de integração participativa ou modelo de negociação (baseado na experiência dos comitês de bacia da França).

Essa opção é reforçada pelos resultados das conferências internacionais de Dublin22 e do Rio23, onde houve o reconhecimento de que o modelo burocrático tem sido inadequado e que devem-se buscar novas políticas (Kemper, 1997).

No modelo de mercado os(as) usuários(as) de água possuem direitos privados de uso, que podem ser transacionados e decidem individualmente sobre sua a alocação.

No modelo de negociação os(as) usuários(as) de água negociam o uso e a alocação da água, tendo como pré-requisito alguma estrutura colegiada (comitê de bacia), podem dispor de cobrança pelo uso da água, o direito de uso de água não é privado, nem pode ser transacionado, sendo fornecido pelo órgão gestor enquanto uma autorização (outorga) de uso.

Apesar das diferenças e variações entre os modelos, alguns princípios são comuns a todos, universalmente aceitos e incorporados pelos países que já organizaram ou estão organizando seus respectivos sistemas de gestão de recursos hídricos.

Entre esses princípios universais que norteiam a gestão dos recursos hídricos podemos citar a adoção da bacia hidrográfica como unidade de planejamento; o uso múltiplos das águas; o reconhecimento da água como um bem finito e vulnerável; o reconhecimento do valor econômico da água; e que a gestão deve ser descentralizada e participativa (Brasil, 1997).