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6.1 Caracterização da bacia hidrográfica do Curu

6.1.2 A formação da infra-estrutura do Curu

Com a grande seca de 1877, o Governo Central começa a se organizar para intervir na questão da vulnerabilidade das populações nordestinas às secas, sendo proposto a construção de obras de acumulação de água. Mas só em 1909 é criado o DNOCS, e tem início o Programa de Açudagem Pública.

O Programa de Açudagem Pública Federal, do DNOCS, construiu na Bacia do Curu, 10 (dez) açudes, com capacidade de armazenar 1.008.153.000 m³, como pode ser visto na Tabela 10.

No Programa de Açudagem em Cooperação, também desenvolvido pelo DNOCS, foram construídos, na bacia do Curu, 48 açudes, correspondendo a capacidade de 98.996.310 m³, distribuídos em nove municípios, com maior concentração de 17 reservatórios em Canindé, como mostra a Tabela 11.

55 vacum – diz-se do gado constituído de vacas, bois, novilhos, garrotes e bezerros

56 Os anos registrados pela historigrafia como seca foram: 1877/79, 1888, 1900/08, 1915 e 1919. Thomaz Pompeo de Sousa Brasil

(1863:101) registra o fenômenos no século XVIII (1724/27, 1777/78, 1791/93) e na primeira metade do século XIX (1809, 1817, 1824/25 e 1845). Martins (2000, p. 50)

Tabela 10 – Barragens construídas pelo DNOCS na bacia do Curu.

Açude Município Capacidade (m³) Conclusão da obra

São Miguel Itapajé 1.400.000 1910

Salão Canindé 6.049.000 1918

São Francisco Itapajé 230.000 1920

General Sampaio General Sampaio 322.222.000 1935

Serrota Pentecoste 4.570.000 1943

Pentecoste Pentecoste 395.638.000 1957

São Mateus Canindé 10.338.000 1957

Caxitoré Pentecoste 202.000.000 1962

Frios Umirim 33.025.000 1989

Tejuçuoca Tejuçuoca 28.110.000 1990

Capacidade total de acumulação de água 1.008.153.000 m³ Fonte: COGERH/DNOCS.

Tabela 11 - Barragens construída em cooperação pelo DNOCS na bacia do Curu.

Município Total de

Barragens Capacidade (m³)

Período de Conclusão dos Açudes Canindé 17 27.370.110 1916 – 1964 Caridade 07 12.405.600 1933 – 1958 Itatira 03 4.827.000 1933 – 1965 Paramoti 03 3.473.100 1934 – 1952 Pentecoste 11 21.548.000 1933 – 1961 Irauçuba 03 13.971.000 1944 – 1953 Itapajé 02 3.898.000 1948 – 1959 Apuiarés 01 2.500.000 1988 Paraipaba 01 3.500,000 1988 Total geral 48 89.996.310 1916 - 1988 Fonte: DNOCS.

Em relação a infra-estrutura para utilização da água acumulada, destaca-se, em 1964, a fundação da AGROVALE, uma usina de açúcar e de álcool, que transformou a realidade do Vale do Curu, implantando uma nova cultura – a cana-de-acúcar, substituindo as culturas alimentares tradicionalmente cultivadas nos aluviões do rio. A partir de um discurso de modernização e contando com subsídios públicos, a AGROVALE consegue estabelecer novas relações de produção e de dominação, transformando a paisagem, com a monocultura da cana; a propriedade das terras, com a compra e concentração de grandes áreas; o meio ambiente, com o desmatamento para ampliação da cana e com os efluentes oriundos da usina; a demografia, com o estabelecimento da mão-de-obra sazonal; os recursos hídricos, com o controle político da liberação de água. Até sua falência em 1996. Sobre a AGROVALE, Martins (2000, p. 11), sublinha que,

“a monocultura canavieira trouxe graves conseqüências para a sociedade no Vale do Curu: tornou o meio-ambiente mais vulnerável e reduzido os recursos usuais de sobrevivência do sertanejo. A usina controlou o curso do rio, apossou-se dos melhores solos, alterou a estrutura demográfica. Expropriou, proletarizou, integrou e urbanizou os trabalhadores rurais que passaram a ter novos interesses, necessidade, costumes e valores”.

Esse processo de proletarização do trabalhador e trabalhadora rural, criou uma realidade pouco conhecida no vale do Curu, propiciando o surgimento de uma categoria de trabalhadores(as) submetidos(as) as contradições das relações capitalistas de produção e de dominação. Sobre esse aspecto da proletarização da população agrícola, Marx apud Martins (2000, p. 143), afirma que,

“portanto, a população agrícola foi, primeiramente, expropriada da terra pela força, retirada de seus lares, transformadas em vagabundos e, então, batida, marcada, torturada por leis grotescamentes terríveis na disciplina necessária ao sistema de assalariamento.”

A AGROVALE chegou a ter uma situação bastante destacada, tornando-se pólo de desenvolvimento do Vale do Curu. A empresa tinha o domínio das terras, da água, da mão-de-obra e da matéria-prima, tornando-se a maior empregadora e compradora da região. Com 2.960 hectares irrigados, 30% da área total irrigada do Vale, a usina produzia 450 mil sacas de açúcar e 8 milhões de toneladas de álcool. Em cada safra, moía 600 mil toneladas de cana própria. Adquiria a produção de 500 fornecedores. Empregava 600 trabalhadores diretos e 3.000 indiretos (Martins, 2000).

Após a construção dos principais açudes da bacia do Curu o DNOCS, começa a se preocupar com o aproveitamento dessa água para a irrigação.

Inicialmente, a intervenção do DNOCS no vale do Curu se deu nos anos 60, quando implantou um posto agrícola, uma unidade experimental, com o propósito de transmitir experiência e incentivo para a agricultura irrigada na região. Posteriormente, o DNOCS construiu o Projeto de Irrigação Curu-Pentecoste para irrigantes particulares. No início da década de 70, o DNOCS resolveu tornar público o projeto privado de irrigação Curu-Pentecoste. A irrigação privada não tinha dado certo porque os(as) produtores(as) não organizaram a operação nem a manutenção dos canais. Após sua recuperação, contando agora com 866,4 ha irrigados e 369 irrigantes, o perímetro foi “batizado” de Curu-Recuperação, sob o controle do DNOCS (Kemper, 1997).

Em 1980, foi construído o Projeto de Irrigação Curu-Paraipaba, com a previsão de implantação em três etapas. Atualmente estão implantadas apenas duas etapas, com um total de 3.859 ha.

A construção do perímetro Curu-Paraipaba foi importante para os planos de expansão da indústria da cana no vale do Curu. A partir do acordo entre o DNOCS e a AGROVALE, apoiado pelo Governo Central e pelos poderes locais, o Perímetro passa a plantar cana para atender a necessidade de matéria prima da fábrica de álcool e açúcar.

Mais recentemente, em 1995, se instalou na bacia do Curu uma fábrica da YPIÓCA, agroindústria produtora de cachaça, aproveitando o espaço deixado pela decadência da AGROVALE, arrendando terras para plantio de cana e comprando cana de fornecedores(as) da antiga usina. Segundo dados levantados em entrevista ao gerente de produção da YPIÓCA57, atualmente a referida unidade da YPIÓCA, conta com 750 ha irrigados, com uma produtividade média de 70 toneladas/ha, chegando a moer numa safra aproximadamente 200.000 toneladas de cana, grande parte de fornecedores(as), contando com 15.000 toneladas de cana oriundas do Perímetro Curu-Paraipaba.

Após a falência da AGROVALE, o grupo empresarial Avelino Fortes assume a fábrica da AGROVALE, em 1997, retomando a fabricação de açúcar, de forma inconstante e precária. A partir daí tem início um conflito de interesses entre a YPIOCA e a AGROVALE pela disputa da matéria prima dos(as) fornecedores(as) de cana, pelo uso da água e pelo domínio judicial das antigas áreas irrigadas da AGROVALE.

Em relação a infra estrutura hídrica, percebe-se um predomínio de intervenções federais na bacia do Curu. O Governo do Estado do Ceará só começa a intervir nesta bacia mais recentemente, com a construção do açude Jerimum, localizado em Itapajé, concluído em 1996, com uma capacidade de 20,5 milhões de m³; e do açude Souza, localizado em Canindé, concluído em 1998, com uma capacidade de 30,8 milhões de m³. Além dos açudes o Governo do Estado construiu, no âmbito do PROURB, várias adutoras para as sedes municipais, como pode ser visto na Tabela 12.

57 Entrevista com o Gerente da Ypióca, em 28/04/2003.

Tabela 12 – Adutoras construídas pelo PROURB na bacia do Curu.

Adutora Município Fonte hídrica Extensão (km) Ano de execução

01 Irauçuba Irauçuba Açude Jerimum 16,97 1998

02 Itapajé Itapajé Açude Jerimum 17,08 1999

03 Canindé Canindé Açude Souza 7,20 1999

Fonte: SRH/PROURB, Relatório de Execução, 2001.