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filosofia natural em Portugal , de 1786; Memória sobre as matas da Comarca de Ilhéus , de 1803; e Memória acerca da abertura de uma estrada , de 1808 Lisboa doutorou-se em

No documento 2007HemersonJosiasdaSilvaFerreira (páginas 125-129)

Direito Civil e Canônico pela Universidade de Coimbra, tendo sido sócio correspondente da Academia Real das Ciências de Lisboa e juiz em sua comarca, na Bahia. Suas obras eram endereçadas às autoridades lusitanas locais a serviço da metrópole, quando não diretamente dedicadas ao próprio El Rei de Portugal. Por sua defesa da permanência do Brasil como colônia lusitana, chegou a ser considerado como contrário à Independência em 1822. Mas logo se adaptou às novas modificações políticas e chegou a ser indicado por dom Pedro I como professor de curso jurídico em São Paulo. Dentre seus objetivos, Lisboa visou apresentar sugestões para tornar “mais eficiente” o emprego dos trabalhadores escravizados, defendendo que um conjunto de tratamento mais brando os faria produzir melhor e lhes reduziria a resistência. [LIMA: 2006]

Conhecido também pelo título de Barão do Monte Santo, Luís José de Oliveira Mendes [1779-1851] foi desembargador, ministro do Supremo Tribunal de Justiça e senador do Império do Brasil. Assim como Balthazar Lisboa, Mendes escrevia a serviço do Estado desde o período colonial. Sua apologia da escravidão foi registrada principalmente em

Memória a respeito do tráfico da escravatura entre as costas d'África e o Brasil

, original de 1793, mas publicada em 1812. Com base em outros escravizadores e traficantes de cativos antilhanos, demonstrou além de uma preocupação com a situação econômica ultramarina, a qual pretendeu dinamizar com argumentos defensores e legitimadores do tráfico negreiro permeados de mitos. [MENDES: 1977]

Por último, contemplamos o

Manual do agricultor brasileiro

, de Carlos Augusto Taunay, publicado no Rio de Janeiro em 1839. Francês naturalizado brasileiro, Taunay provinha de família envolvida nos eventos da França revolucionária e napoleônica. Após ingressar com dezoito anos no exército de seu país de origem, foi enviado para combater na Espanha, em 1810, e pelos cinco anos seguintes participou de praticamente todas as grandes campanhas militares envolvendo a França até a queda de Napoleão. Em 1813, durante a batalha de Leipzig (invasão da Rússia), teve o nariz decepado por uma lança inimiga, o que lhe rendeu uma medalha da Legião de Honra e um rosto assustador. Lutou ainda na campanha de “Defesa da França”, em 1814, e nos combates do “Governo dos Cem Dias”, em 1815. [TAUNAY: 2001, 7-9]

Com a derrota do império napoleônico, a vida da família Taunay tornou-se política e socialmente insustentáveis na França. Expulsos das filas do exército e excluídos da vida política e social, os Taunay aceitaram convite da corte portuguesa para participar da montagem da Escola Real de Belas-Artes no Rio de Janeiro. Em 1816, se juntaram ao seleto grupo de pintores, escultores, arquitetos e músicos franceses e vieram ao Brasil na chamada

Missão Artística

. Logo depois, compraram um sítio de vinte hectares na Tijuca, onde adquiriram numerosa mão-de-obra escravizada e iniciaram plantio de café, o então principal produto de exportação nacional do Império do Brasil.

Carlos Augusto Taunay ingressou nas tropas imperiais brasileiras no posto de major e participou dos combates pela Independência na Bahia. Ao fim do conturbado período, passou a administrar diretamente as propriedades da família, pedindo

baixa

das milícias reais e se dedicando exclusivamente à administração de suas plantagens. Seu

Manual

foi

produzido em contexto bem diferente dos textos anteriores, com a plenitude do desenvolvimento da cafeicultura, da escravidão e, ao mesmo tempo, com a Inglaterra já pressionando pelo fim do tráfico negreiro. Este autor visou alcançar seus pares sociais, os demais escravizadores do Brasil, defendendo o sistema com base desde os clássicos da Antiguidade, como Catão e Culumella, aos escritores europeus mais em voga de sua época. Escreveu em detalhes e praticamente sobre tudo que envolvesse a produção agrícola de seu tempo e, em especial, sobre o trato aos trabalhadores escravizados. Divulgado, reproduzido e distribuído pelo Império desde a primeira publicação, seu livro se constituiu em registro/documento fundamental para a compreensão da mentalidade laica e dominante até 1850, repleto de narrativas justificadoras do escravismo colonial.

4.3. Os mitos

Alguns mitos centrais podem ser encontrados nos discursos e textos desses escritores arrolados, apresentados muitas vezes de forma articulada uns aos outros. No fundo, havia uma reprodução muito aproximada de uma mesma visão ideológica comum aos escravistas. Mesmo as narrativas dos literatos laicos mais próximos ao ano de 1850 e com toda a influência das novas ideologias internacionais mantinham ainda certa ligação e continuidade aos utilizados pelos religiosos bem anteriores. Destacamos, portanto,

quatro

mitos escravistas fundamentais e sustentadores do discurso escravista no Brasil:

1)

O mito da escravidão benevolente

, uma suavização ou abrandamento retórico das relações escravistas, tentando tirar-lhe o caráter conflitivo. Como se cativos e escravizadores, apesar de se encontrarem em condições nitidamente distintas, tivessem os mesmos interesses. Com base neste mito, a escravidão no Brasil seria vista e descrita como uma não-escravidão, um sistema assentado em relações paternalistas, com demonstrações mútuas de respeito, enfim, um

pacto

entre escravizadores e escravizados que no fim das contas garantiria a própria liberdade aos últimos, desde que cumprissem a contento a

sua

parte do acordo

. O Brasil, descrito mitologicamente, era apresentado como uma terra de

bons escravizadores

, os quais dispensavam o mais

justo

tratamento aos cativos, que inclusive viveriam no Brasil em condições muitas vezes melhores até que a dos proletariados europeus ou demais cativos em outras colônias escravistas ou na África.

2)

O mito da escravidão redentora

, que apesar de se parecer a princípio com o

mito

da escravidão benevolente

, se tratou de suporte justificador ao discurso da escravidão como

salvação

do trabalhador escravizado trazido da África e que, até então, viveria

condenado

aos infernos

de um regime

bem pior

do que conheceriam no Brasil. Por sua vez, a função dessa narrativa apologética era justificar o tráfico negreiro. Ao ser trazido para trabalhar nas plantagens luso-brasileiras, o africano escravizado seria literalmente

resgatado

de seu antigo

habitat

, para o seu próprio

bem

.

3)

O mito da inferioridade do cativo

, o qual pregava uma pretensa

impossibilidade

intrínseca dos trabalhadores escravizados em reger suas próprias vidas sem a tutela do escravizador.

Inferioridade

que se dava principalmente por causa de sua

raça

e de seus

costumes bárbaros

. Tal mito buscava fortalecer a manutenção da escravidão diante de quaisquer críticas pró-abolicionistas ou mesmo de autocríticas morais e religiosas entre os próprios escravistas diante dos mais recentes questionamentos mundiais ou nacionais.

4)

O mito da defesa dos interesses nacionais

, por fim, que surgiu após o processo de Independência do Brasil. Mesmo sendo a escravidão considerada agora pelas ideologias mundiais mais recentes como contrária ao

direito natural

e mesmo à

religião

, defendia que as relações sociais do Brasil deveriam ser mantidas e jamais extintas, pois fundamentariam o próprio

funcionamento e progresso da nação

. Acabar com a escravidão, nessa visão mitológica, seria acabar com o próprio país. Mesmo que já tida como

imperfeita

, a escravidão era justificava por sua necessidade econômica e social.

Desses quatro principais mitos, os dois primeiros foram desenvolvidos sobretudo pelos escritores religiosos e os dois últimos pelos laicos, embora ambos os grupos utilizassem muitas vezes todos os quatro mitos de forma articulada. Os escritores laicos só começaram a publicar suas considerações sobre a escravidão na virada do século 17 para o 18 e não romperam com a essência do discurso escravista religioso. Apenas o modificaram e adaptaram ao seu contexto, dando contornos mais atualizados ao véu paternalista religioso. Escravistas laicos precisaram elaborar discurso mais conectado às novas idéias internacionalmente vigentes. Eis o motivo da maior utilização de determinados mitos nesta ou naquela corrente de escritores.

No documento 2007HemersonJosiasdaSilvaFerreira (páginas 125-129)