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Portugal, vanguarda do mercantilismo

No documento 2007HemersonJosiasdaSilvaFerreira (páginas 71-74)

Durante o século 10, a região Oeste da Europa passou por uma fase relativamente tranqüila no campo político-militar, sem as guerras e invasões então comuns desde o século 5. Nesse ambiente de menor instabilidade, a população expandiu-se e, em conseqüência, a produção agrícola necessitou também ser ampliada, para atender a nova demanda, algo que tencionaria e tornaria com os séculos seguintes o sistema feudal cada vez mais obsoleto. Novas técnicas agrícolas e cuidados dos animais elevaram a produtividade rural, incrementando não só o comércio regional, mas também o de longa distância. Com o

surgimento e crescimento das cidades e demais centros urbanos, multiplicaram-se os progressos econômicos do setor artesanal e os ofícios de modo geral.

O comércio, que nunca deixara de existir e até ampliara-se no Mediterrâneo, animava a atividade mercantil. Muitos produtos e artigos tinham que ser buscados em outras regiões da Europa ou do mundo conhecido à época. Surgiam assim mercadores cada vez mais especializados e dedicados a tais atividades. Com a crescente importância desses comerciantes, desenvolveram-se os

burgos

. Um novo modo de produção se formava. No século 13, relativamente desvinculados das regiões rurais dominadas pelas relações feudais em decadência, se iniciou a transição para a Idade Moderna. Originalmente ligada ao senhor feudal, a essência autônoma de uma burguesia mercantil não tardou a se manifestar. [HUNT & SHERMAN: 2000, 23-30]

Entre o século 12 e 15, intensificada a atividade comercial, provinham do então chamado

Oriente

a maioria dos produtos importados à Europa. Eram especiarias como o cravo, canela, pimenta, noz-moscada, gengibre, etc., além dos

produtos de luxo

, como porcelanas, tecidos finos, perfumes, marfim, ouro, vindos todos da África e Ásia. Pela rota das Índias, do mar Índico saíam esses produtos, passando pela costa africana, portos do Cairo, Veneza e Gênova, até chegarem a Europa. As cidades italianas se destacavam na realização do comércio de especiarias e artigos de luxo. Seus mercadores percorriam por terra, com suas caravanas cortando o Saara, ou principalmente com seus navios pelo mar Mediterrâneo em busca de tais produtos nos portos de Constantinopla, Trípoli, Alexandria, Celta, Tânger, Oran e Túnis. Atravessadores e demais intermediários italianos ou árabes cobravam sua participação na aquisição desses produtos, onerando-os. Ainda assim, obtinha-se elevada taxa de lucro ao revendê-los no mercado europeu. [MAESTRI: 1979, 20]

No princípio, Portugal era tão somente o

Condado Portucalense

, pequeno conjunto de

feudos

politicamente ligados ao reino de Leão, doados ao cavaleiro francês dom Henrique, da dinastia dos Borgonha, por seus serviços no movimento de

Reconquista

feito por cristãos ao conjunto de populações árabes, etíopes, persas, turcomanas e afegãs, generalizadas como

mouros

, que ocupavam a Península Ibérica desde o século 13. Portugal proclamou sua independência de Leão em 1139, e iniciou sua expansão ao sul da península. Por muito tempo o novo reino permaneceu envolvido na luta pela completa expulsão dos

mouros

, conquistando o território do Algarve, em 1249. No reinado de dom Dinis [1279- 1325], se interrompeu o processo de

reconquista

. Além de se dedicarem agora a consolidação das regiões conquistadas, as classes dominantes portuguesas iniciaram período de organização interna de seu reino. Se voltaram para o mar, organizando sua marinha mercantil e de guerra, construindo novos modelos de embarcações, contratando e especializando marinheiros, primeiramente italianos e posteriormente trabalhadores locais. [MORAES: 1994, 57-8]

Portugal se identificava com a Europa feudal principalmente no que tocava o catolicismo e a servidão da gleba, aos quais submetiam parcela de sua população. Com base no termo empregado pelo historiador C. R. Boxer, Jacob Gorender destacou a específica “forma portuguesa” de feudalismo. O servo da gleba se convertia aos poucos no

malado

e no camponês, juridicamente livre para mudar de senhorio, porém submetido ao “complexo feudal” dos encargos ou tributos privados senhoriais. A produção agrícola predominante precedia de pequenas explorações pertencentes aos

foreiros enfiteutas

ou

emprazadores

. As explorações da nobreza - as

quintãs

-, não eram extensas, embora houvesse as grandes propriedades pertencentes às ordens monásticas. Em sua formação social imperava, na classe dominante, a Coroa, a nobreza, o clero e os cobradores de tributos. Grupo social que impunha aos setores subalternizados através do

terrádigo

,

direitura

,

jugadeira

,

fossadeira

,

anúduva

(espécie de corvéias) e uma série de outras relações agrárias. O camponês era obrigado a entregar o sobreproduto do seu trabalho ao dono eminente da terra. No bojo deste “feudalismo português” se desenvolveu a burguesia mercantil, concentrada nas cidades portuárias, ainda vinculada por múltiplos canais à Coroa, nobreza e ao clero. [GORENDER: 1980, 113-8]

A segunda metade do século 15 foi marcada por período de grande expansão do reino de Castela. Empenhados na ampliação dos seus domínios sobre os

mouros

, a monarquia e nobreza castelhanas ambicionavam também anexar Portugal e outros reinos cristãos. A influência dos castelhanos em Portugal aumentou quando a filha do então rei português, dom Fernando, casou-se com o rei de Castela, e se iniciou entre os portugueses uma intensa discussão sob os rumos do reino com essa união. Em meio à crise do feudalismo, grande parte da nobreza portuguesa se interessava por tal política, pois julgavam que um monarca estrangeiro aumentaria seu poder particular e os levaria a

conquistar, com suas guerras e saques, as cobiçadas propriedades ao sul da Espanha e norte da África. Entre 1383-85, porém, após intenso processo de lutas políticas, dom João I da Ordem da Cavalaria de Avis ascendeu ao trono, com apoio da cada vez mais influente burguesia lusitana. Sua vitória, na batalha de Aljubarrota, manteve Portugal independente do reino de Castela, no plano externo, e vergou internamente os interesses da nobreza agrária. Mais que uma luta entre reinos, a chamada

Revolução de Avis

representou embate entre classes sociais antagônicas: a velha nobreza contra a nascente burguesia. [SÉRGIO: 1981, 33-5]

A curta vitória da burguesia lusitana aliada a dom João I influenciou na reorientação da sociedade portuguesa às conquistas marítimas, mas a aristocracia logo retomaria o controle da situação. Importa é que Portugal se tornou o primeiro país europeu a constituir um Estado Moderno, com governo centralizado e práticas mercantilistas. Voltados para o Atlântico, suas limitadas terras favoráveis à agricultura encontravam-se empobrecidas por agricultura então anacrônica. Ao leste, o reino português continuava ameaçado pelo expansionismo espanhol. Interessados nos lucros e no poder gerados no crescimento do comércio marítimo, buscaram encontrar uma forma de superar o obstáculo do monopólio intermediário dos genoveses, venezianos e árabes no Mediterrâneo aos produtos das Índias. No dialético resultado das necessidades do mercantilismo europeu, no qual Portugal despontou como vanguarda, a solução foi buscar entrar em contato direto com os fornecedores

orientais

, ou seja,

navegar era preciso

. [MAESTRI: 1979, 26; SÉRGIO: 1981]

No documento 2007HemersonJosiasdaSilvaFerreira (páginas 71-74)