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Focando o contexto: uma abordagem sócio-cultural e dialógica das crenças

3.5 O processo de ensino-aprendizagem de LEC: as vozes dos agentes

3.5.2 Focando o contexto: uma abordagem sócio-cultural e dialógica das crenças

Destaca-se, em nosso estudo, a adoção de uma “Abordagem Contextual” (Barcelos, 2004: 82-83), para a investigação das crenças, devido à importância de levarmos em consideração o contexto onde elas se encontram inseridas. Uma vez que privilegiamos, nesta pesquisa, uma visão sócio-histórica do desenvolvimento, aliada a uma concepção enunciativa da linguagem, entendemos ser coerente que nos apoiemos, também, em uma visão sócio-cultural (Alanen, 2003) e discursiva (Dufva, 2003) das crenças.

A noção de “voz” destaca-se, neste trabalho, devido ao propósito de ouvirmos os participantes acerca do ensino de LEC em um contexto social específico. Esse construto, oriundo da natureza polifônica e dialógica da linguagem, remete-nos às concepções bakhtinianas a respeito da mesma. A esse respeito, Dufva (2003: 133) assevera que, “a voz é um conceito central proveniente de Bakhtin”, o qual pode ser usado como instrumento e embasamento para investigações na área de crenças sobre ensino-aprendizagem de línguas.

Conforme já discutido neste trabalho, Bakhtin (2004) concebe a sociedade como sendo dividida em duas partes constitutivas distintas, a “superestrutura”, em que circulam discursos mais cristalizados e se encontra a ideologia, e a “infra-estrutura”, na qual circulam sentidos construídos em um plano mais individual e subjetivo, os quais são denominados de “ideologia do cotidiano”. Os enunciados, dentro das concepções do referido autor, são produzidos em diferentes esferas de produção (contextos sociais específicos), que muitas vezes mantêm uma relação dialógica com discursos que circulam nas duas estruturas sociais descritas. Níveis superiores da ideologia do cotidiano, por exemplo, mantêm um contato mais próximo das ideologias oficiais que pertencem à superestrutura, mostrando um grau de apropriação maior das vozes que constituem este nível.

De acordo com Dufva (2003: 137), as crenças são polifônicas e dialógicas, uma vez que “refletem uma visão pessoal” sobre o objeto em questão, da mesma forma que “ecoam aspectos presentes nos discursos prevalecentes na sociedade”. Este pressuposto retoma o caráter idiossincrático e universal das crenças, conceitos esses centrais em nosso estudo. A opção por uma abordagem discursiva e dialógica das crenças origina-se de nossa intenção de observarmos a que ponto as crenças dos participantes podem ser descritas como coletivas, mostrando-se, portanto, parte do senso comum e semelhantes às crenças partilhadas pela maioria das outras pessoas inseridas no mesmo contexto social, ou como mais individuais e subjetivas.

Outro motivo que nos aproxima dessa abordagem é o fato de procurarmos observar se as vozes dos professores de sala, dos professores de LE e demais agentes da Educação, por terem contato com as diretrizes oficiais que norteiam o Ensino Fundamental, apresentam crenças condizentes com o discurso explícito nos documentos oficiais, demonstrando certa apropriação das vozes que o constituem. É

pertinente salientar que o conceito de polifonia se faz presente, mais uma vez, neste estudo, na medida em que nossa voz, uma síntese dialética de outras vozes, se faz presente no diálogo com as vozes dos participantes, no momento em que passamos a interpretar e a inferir suas crenças (Dufva, 2003).

Orientando-se por princípios da “Abordagem Contextual” (Barcelos, 2001, 2004) ao enfatizar a origem social e interacional das crenças, Alanen (2003: 66) pontua que, dentro da visão sócio-cultural por ela adotada, as mesmas podem ser definidas como “um tipo específico de artefato cultural que medeia a atividade humana, da mesma forma que ferramentas, signos, símbolos e mitos”. Este tratamento é considerado pertinente para nossa pesquisa, pois nos permite enxergar que, assim como a linguagem medeia a relação entre o indivíduo e seu meio, as crenças dos participantes deste estudo podem ser também consideradas instrumentos que mediam seu modo de entender o mundo, no que se refere ao ensino-aprendizagem de LE em foco. Tal princípio mostra-se convergente com a acepção de Dufva (2003: 133), quando a autora ressalta que o que é dito pelos participantes “são palavras ditas por alguém” e refletem, desta forma, “sua personalidade e visão de mundo”.

Mostrando que a Abordagem Sócio-cultural encontra-se alinhada à “Abordagem Contextual”, Alanen (2003: 60) acentua o caráter dinâmico das crenças ao explicitar que, sendo um tipo de conhecimento construído sobre o ensino-aprendizagem de línguas, as mesmas estão em constante processo de reconstrução, até mesmo enquanto o aprendiz estiver falando ou, até mesmo, pensando sobre elas. Alanen (2003) acrescenta que as idéias de Bakhtin (1981,1986) exerceram grande influência acerca de como a fala dialógica é concebida nas perspectivas sócio-culturais. Ao discorrer sobre a questão, a autora reforça a concepção da linguagem como externa e interna, pertencendo à comunidade e ao indivíduo ao mesmo tempo.

Buscando condensar os conceitos e princípios discutidos, podemos concluir que dentro de uma Abordagem Contextual, alinhada a uma visão bakhtiniana e sócio- cultural das crenças, devemos estar atentos para o fato de que as mesmas são dependentes do contexto, dinâmicas, recíprocas e interativas, sendo também individuais e/ou coletivas. Ao serem construídas na interação, podem ou não ser apropriadas pelo indivíduo. Uma vez apropriadas, elas passam a fazer parte da

constituição da pessoa e são usadas como meios para se interpretar o mundo, como também para regular a ação individual ou coletiva.

Após termos explicitado a abordagem que norteia nosso estudo em relação à investigação das crenças dos participantes, apresentamos, na subseção seguinte, algumas crenças relacionadas ao ensino-aprendizagem de LE, as quais podem ser definidas como recorrentes. As mesmas são relevantes para nosso trabalho, propiciando-nos referências para analisarmos o quanto as crenças expressas pelos participantes apresentam-se consonantes ou dissonantes das principais crenças fortes e mitos, no que se refere ao processo em questão.

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