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Quando 8: Características da amostra

4.4. Mentores autênticos

4.4.1 Identificação dos mentores autênticos

Foram percorridas duas etapas para se chegar à resposta a essa questão. Primeiramente, verificou-se a seleção feita pelos usuários entrevistados, que apontaram as pessoas que foram importantes para sua adesão à atividade física e, entre essas, as que, na percepção dos entrevistados, tiveram um interesse especial em seu sucesso. O quadro a seguir apresenta as fontes de suporte indicadas segundo essas condições. O traço (–) significa que não foi identificada pelo entrevistado uma fonte com essas características.

Fontes de suporte mais significativas Entrevistados

Pré-adesão Adesão

1 Mãe Filho

2 Colega de trabalho (Chesf) Professor de educação física (Chesf) 3 Colegas de trabalho 1 e 2 (Chesf) Colega de trabalho 1 (Chesf) Colega de trabalho 3 (Chesf)

4 Familiares Professor de educação física (outra academia) Médica (Chesf) Professor de educação física (Chesf)

5 Colegas de trabalho não especificados (Chesf) Colegas de trabalho não especificados (Chesf) Professora de educação física (Chesf) 6 Colega de trabalho (Chesf) Colega de trabalho (Chesf) Filha

7 Pais Professor de educação física (outra academia) Professor de educação física (Chesf) 8 – Professor de educação física (Chesf)

9 Colega de trabalho (Chesf) Professor de educação física (Chesf) Professora de educação física (Chesf)

10 – Professora de educação física (outra academia) Professor de educação física (Chesf) 11 – Professor de educação física (Chesf)

12 – Professor de educação física do colégio 13 Colega de trabalho (Chesf) Professor de educação física (Chesf) Esposa 14 Colega de fora do trabalho Professor de educação física (Chesf) 15 Colegas de infância e juventude não especificados

16 Desconhecido entrevistado na TV Professor de educação física (Chesf)

17 Colegas de trabalho não especificadas (Chesf) Professora de educação física (outra academia)

Quadro 15: Fontes de suporte mais significativas para a adesão dos entrevistados à atividade física. Fonte: Elaborado pelo autor, com base nos resultados da pesquisa.

Predominam os colegas de trabalho antes da adesão e os professores de educação física na adesão. Há uma presença maciça de fontes de suporte vinculadas à Chesf, em ambas as fases. Na adesão, a entrevistada 9 recebeu influência simultânea de duas fontes. Em todos os outros casos em que há mais de uma fonte, elas estão listadas em ordem cronológica crescente, ou seja, a fonte listada antes exerceu influência antes da fonte seguinte na lista. Por exemplo, a entrevistada 10 recebeu suporte de sua professora de educação física de outra academia antes de ser influenciada pelo professor da Academia Chesf. Até mesmo no caso do entrevistado 13, influenciado pela esposa, a intervenção desta só ocorreu depois que ele já estava na academia sendo influenciado pelo professor de educação física.

Os entrevistados 8, 10, 11 e 12 não apontaram fontes significativas na fase anterior à adesão. Na adesão, apenas o usuário 15 revelou não receber qualquer tipo de influência. No caso específico do entrevistado 12, a influência referida na adesão ocorreu ainda na juventude e desde então ele se mantém em atividade.

O segundo critério foi baseado nas conclusões da seção anterior (4.3) sobre as relações de mentoria autêntica. Foi analisado quais das pessoas influentes acima referidas poderiam ser consideradas mentores autênticos, isto é, provedores de suporte nos relacionamentos de mentoria autêntica identificadas no estudo. O resultado está registrado no quadro a seguir.

Mentores autênticos Entrevistados

Pré-adesão Adesão

1 Mãe –

2 – Professor de educação física (Chesf) 3 – Colega de trabalho 3 (Chesf)

4 – Professor de educação física (outra academia) Médica (Chesf) Professor de educação física (Chesf)

5 – –

6 – –

7 Pais Professor de educação física (outra academia) Professor de educação física (Chesf) 8 – Professor de educação física (Chesf)

9 – –

10 – Professora de educação física (outra academia) Professor de educação física (Chesf) 11 – Professor de educação física (Chesf)

12 – Professor de educação física do colégio 13 – Professor de educação física (Chesf) Esposa 14 – Professor de educação física (Chesf)

15 – –

16 – –

17 – –

Quadro 16: Mentores autênticos identificados no estudo.

Fonte: Elaborado pelo autor, com base nos resultados da pesquisa.

Dos 17 entrevistados, 2 tiveram mentores autênticos (1 para cada entrevistado) na pré- adesão, enquanto 10 tiveram na adesão. Desses 10, 6 tiveram apenas 1 mentor, 3 tiveram 2 mentores e 1 teve 3 mentores, totalizando 15 mentores autênticos. Foram mentores: na pré- adesão, mãe e pais (estes, referidos em conjunto); na adesão, 12 professores de educação física (dos quais 8 da Academia Chesf, 3 de outras academias, 1 do colégio), 1 colega de trabalho, 1 médica e 1 esposa.

É grande a diferença na quantidade de fontes entre os dois quadros (fontes e mentores). Apenas duas foram consideradas mentores autênticos antes da adesão. Na adesão, pouco mais da metade delas. Os entrevistados 5, 6, 9, 15, 16 e 17 não tiveram mentores autênticos. A entrevistada 1 só teve mentor antes da adesão. A entrevistada 7 foi a única que teve mentores nas duas fases. Os demais entrevistados só os tiveram na adesão. O entrevistado 4 relacionou-se com três mentores na adesão. Predominam, mais uma vez, os professores de educação física e, entre eles, os vinculados à Chesf.

O quadro cima, portanto, configura a resposta à questão norteadora 4, apresentando as fontes de suporte que, entre todas as referidas como influenciadoras da adesão à atividade física, puderam ser consideradas como mentores, pelos critérios de mentoria autêntica constituídos neste trabalho. Os achados serão discutidos logo a seguir.

4.4.2 Discussão

A análise dos dados apresentados acima permite encontrar correspondências com a literatura. Uma primeira constatação, corroborando Higgins e Thomas (2001), é que desenvolvedores podem ou não ser verdadeiros mentores (expressão dos autores) e também não estão limitados a relacionamentos do tipo formal. Com efeito, variadas fontes de suporte existiram e pouco mais da metade delas pôde alcançar a qualificação de mentor autêntico. Além disso, a totalidade dos relacionamentos avaliados, inclusive os de mentoria, não obedeciam a uma estrutura formal no sentido de um relacionamento formal de mentoria preconcebido como tal. Poderia alegar-se formalidade na relação entre os alunos e professores da Academia Chesf. Porém essas relações não foram constituídas na perspectiva de um relacionamento de mentoria planejado. Alguma formalidade pode existir em decorrência dos papéis que as partes tradicionalmente assumem no início da relação (professor-aluno). Mas surgimento de mentoria autêntica nas relações foi sempre espontâneo.

Professores, familiares, colegas de trabalho, entre outra fontes de suporte podem ser ou não mentores. Essa constatação não se alinha com o modelo de constelação de relacionamentos sugerido por Kram (1988). Nele, mentores ocupam uma das posições de desenvolvedores, sendo as demais posições na constelação ocupadas por colegas de trabalho, familiares, chefes, entre outros. Mentor é um papel que provavelmente qualquer das fontes pode assumir. Sendo assim, seria mais adequado desenhar a constelação com a designação das fontes (familiares, colegas, chefes etc.) e acrescentar que qualquer uma delas pode ser ou não um mentor.

O conceito de rede de desenvolvimento (HIGGINS; KRAM, 2001) tem presença evidente nos dados coletados. Para essas autoras, o conceito possui um traço temporal próprio: relações que ocorrem simultaneamente num dado ponto do tempo. Por exemplo, embora a colega de trabalho 3 tenha constituído uma relação mais forte com ele após a intervenção das colegas de trabalho 1 e 2, estas continuaram a dar-lhe suporte de encorajamento durante longo tempo (embora a colega 1 não esteja entre as fontes mais influentes da adesão). Portanto as três atuaram simultaneamente como suas desenvolvedoras

na adesão. O conceito de rede de desenvolvimento mais presente, contudo, é o da constelação que se forma ao longo do tempo (HIGGINS; THOMAS, 2001). A própria perspectiva cronológica que foi utilizada nas entrevistas do presente estudo, colhendo desenvolvedores que atuaram antes da adesão e outros que surgiram durante a adesão, permitiu visualizar constelações de desenvolvedores (segundo o conceito desses autores). Cada fonte forneceu suporte em seu tempo. Veja-se, por exemplo, o entrevistado 4. Iniciou na atividade física com a ajuda de familiares (não mentores), referiu um importante professor de educação física em outra academia, antes de receber influência de uma médica e de um professor da Academia Chesf.

Uma evidência que merece destaque é a idade dos mentores e dos mentorados. O conceito tradicional de mentoria tem como um dos pressupostos básicos que o mentor é mais velho que o mentorado (e.g., LEVINSON et al., 1978; KRAM, 1988). No entanto, as relações de mentoria verificadas neste trabalho apontaram diversas díades em que o mentor é mais novo que o mentorado. Em um dos casos, a diferença chegou a 28 anos. Os achados se alinham com a posição de diversos autores mais recentes (e.g., DARLING et. al., 2002; ENSHER; MURPHY, 2005; SCANLON, 2008). Especificamente no caso da amostra utilizada neste estudo, cuja idade média foi de 51,2 anos, não causa surpresa que haja mentores mais novos que mentorados, principalmente quando a maioria dos mentores identificados são professores de educação física27.

Alguns dos entrevistados (8, 10, 11 e 12) não apontaram grande importância para qualquer fonte de suporte na pré-adesão. O entrevistado 15 assim fez em relação à adesão. Paralelamente, esses entrevistados fizeram considerações que sinalizam para a influência principal nessas fases. Para o entrevistado 12, a maior influência antes da adesão foi o ambiente físico em que vivia. Os demais, porém, lançam o foco sobre si mesmos. O entrevistado 8, ao ser indagado sobre quem tinha sido mais importante para que iniciasse a atividade regular na academia, respondeu enfaticamente:

Eu! Minha força de vontade! Pode colocar aí.”. Que, se eu não tivesse, ninguém me puxaria pela mão numa idade dessa.

27 A idade média dos professores da Academia Chesf é de 31,7 anos. A idade média dos professores mentores identificados no estudo é de 37,7 anos. Não foi possível identificar na literatura informações abrangentes sobre a idade média de professores de academias. Porém casos específicos de estudos consultados (DE DEUS; DUARTE, 1997; BENEDETTI; PALMA; ASSIS, 2005; OURIQUES, 2007) apontam idades de 20 a 47 anos. Além disso, evidências da prática diária sugerem, em média, os professores têm idade menor do que os alunos que compuseram a amostra deste estudo.

A entrevistada 10 chegou a jurar que não tinha precisado de qualquer pessoa para iniciar a atividade:

Não, eu juro a você. (...) Eu sempre fui uma pessoa assim, disciplinada nesse aspecto. Eu me proponho a fazer uma coisa, eu vou fazer, tá entendendo? Então eu comecei. (...) Foi por minha conta. Eu não lembro de ninguém que tenha me incentivado a alguma coisa.

Na mesma linha de iniciativa seguem os entrevistados 11 e 15:

... eu também não sou muito de me preparar para fazer as coisas. Sou muito [do tipo] “Olhe, eu vou fazer isso!” Eu acho que é mais assim. Eu comecei a fazer exercício e fui progredindo. (...) quando eu penso em fazer, eu vou procurar quem é, quais os caminhos que eu tenho que tomar pra começar a acontecer. (E11)

... existia uma preocupação constante comigo. (...) Eu sempre gostei de fazer exercício. Eu sempre tive essa preocupação. (...) Sempre a atividade física esteve presente em minha vida. (...) É uma coisa que vem de mim mesmo. É uma vontade própria... (E15)

Os motivos para tais atitudes parecem estar associadas a um atributo de grande importância para a mudança de comportamento em saúde: a autoeficácia. Corresponde à convicção do indivíduo de poder realizar com êxito um comportamento necessário para atingir os resultados (BANDURA, 1977) ou, em outras palavras, à sua crença na própria capacidade de exercer controle sobre seu funcionamento e sobre os eventos que afetam a sua vida (BANDURA, 2004). Pode ter ocorrido, portanto, que a autoeficácia dos entrevistados 8,10 e 11 tenha sido tal, antes da adesão, que se bastaram a si próprios para iniciar a prática de exercícios. Já o entrevistado 15 referiu grande importância de colegas de infância e juventude na pré-adesão, mas ninguém mereceu tal qualificação na adesão. Poderá ter sido primordial a sua autoeficácia. O’Donnell (2008) defende que um melhor desempenho no cumprimento das metas de mudança no comportamento em saúde é conseguido pelo aumento da autoeficácia. Diversos autores (e.g., DISHMAN; SALLIS; ORENSTEIN, 1985; JAGO et al., 2009) apontam associações positivas entre autoeficácia e adesão à prática de atividade física. Entre os fatores psicológicos associados ao comportamento de adesão à atividade física, a autoeficácia parece ser um dos mais fortes preditores desse comportamento (SHERWOOD; JEFFERY, 2000; WOOD, 2008). A autoeficácia, segundo O’Donnell (2008) pode ser estimulada pela observação de pessoas que sirvam de exemplo, pelo recebimento de mensagens persuasivas de especialistas ou colegas que expressem confiança na habilidade que o outro possui de atingir um melhor desempenho e pelo feedback recebido. Identificam-se na proposição do autor prováveis indícios de funções que foram levantadas neste estudo

associadas à adesão à atividade física, como modelagem de papel, aceitação-e-confirmação, encorajamento ou coaching.

Não obstante o vazio de influências importantes na pré-adesão, os entrevistados 8, 10 e 11, reconheceram mais tarde, na fase de adesão, a presença de provedores de suporte muito importantes que se alinham com o perfil do mentor autêntico. É provável que a força da presença dos mentores tenha sido para esses usuários mais significativa que a independência que a autoeficácia lhes proporcionava. E, assim como outros colegas, usufruíram (e ainda usufruem) do privilégio de contar com a colaboração dos que, movidos por interesse autêntico, lhes proporcionaram apoio para que continuassem na prática regular de atividade física.

Por fim, é importante observar o quadro a seguir. Ele apresenta, em ordem decrescente, as frequências médias dos 17 entrevistados às aulas da academia, nos seis meses anteriores ao processo de seleção para a entrevista, e participação ou não em uma relação de mentoria autêntica naquele período.

Entrevistado Frequência média às aulas (%) Relação de mentoria

10 108,58 Sim 5 101,16 Não 11 99,75 Sim 7 99,60 Sim 3 97,53 Sim 2 97,43 Não 8 96,15 Sim 14 89,65 Sim 16 88,93 Não 6 83,77 Não 1 81,92 Não 13 78,95 Sim 9 77,92 Não 4 76,78 Sim 12 72,65 Não 17 72,58 Não 15 70,33 Não

Quadro 17: Frequência média dos entrevistados às aulas da academia nos seis meses anteriores ao processo de seleção para a entrevista e participação em relação de mentoria autêntica.

Fonte: Academia Chesf (agosto/2009) e pesquisa do autor.

Entre os entrevistados com as 8 maiores frequências (campos sombreados), 6 estavam vivenciando um relacionamento de mentoria autêntica no momento em que foram selecionados. Apenas os entrevistados 5 e 2 fugiam a essa situação. Ainda assim, o entrevistado 2 tivera como mentor um professor da academia, mas este já se havia afastado de

lá. Por outro lado, entre os entrevistados com as 9 menores freqüências, apenas 2 (os de número 13 e 4) mantinham relação de mentoria. Embora a frequência às aulas possa ser afetada, entre outros fatores, por viagens de trabalho, férias ou licenças médicas dos usuários, esses dados sugerem que uma associação entre mentoria e frequência às aulas merece ser investigada com maior profundidade. Vale aqui ressaltar que entre os entrevistados existe, na prática, o reconhecimento dessa associação:

... no fundo você descobre em qualquer lugar, em qualquer época da tua vida, (...), que você precisa se sentir cuidada. Você precisa saber que há alguém que está ali com você. Está tendo cuidado com você. E eu vou te dizer uma coisa, Paulo: isso é um dos maiores motivos de evasão ou de permanência numa academia.

Neste ponto, encerram-se a análise e a discussão dos dados da pesquisa, e a dissertação se encaminha para seu último capítulo, com a apresentação das conclusões e sugestões.

5 CONCLUSÕES E SUGESTÕES

Utilizando-se como guia a sequência das questões norteadoras deste estudo, serão apresentadas as conclusões do trabalho. Logo em seguida, oferecem-se sugestões para a realização de pesquisas e outras iniciativas.