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III–FUNDAMENTO

No documento 1 2 1 2 (páginas 150-155)

149 I – CONSIDERAÇÕES INICIAIS

III–FUNDAMENTO

A convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados no artigo 53 sobre o Tratado em Conflito com uma Norma Imperativa de Direito dispõe:

―É nulo um tratado que, no momento de sua conclusão, conflite com uma norma imperativa de Direito Internacional geral. Para os fins da presente Convenção, uma norma imperativa de Direito Internacional

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geral é uma norma aceita e reconhecida pela comunidade internacional dos Estados como um todo, como norma da qual nenhuma derrogação é permitida e que só pode ser modificada por norma ulterior de Direito Internacional geral da mesma natureza.‖

O jus cogens existe independente de qualquer tratado ou convenção, ou seja, mesmo que não houvesse o artigo 53, não poderíamos negá-las; a Convenção de Viena acaba por trazê-la na verdade, para o campo do direito positivo. Ajudando em seguida a estabelecer os requisitos para sua identificação.

A priori, o método de maior eficácia para identifica-lá é fornecer os critérios que possibilitam verificar a natureza imperativa das normas.

♣ Ser norma aceita e reconhecida pela Comunidade internacional como norma cogente; ♣ Comunidade internacional essa formada pelos Estados no seu conjunto;

♣ Não deve ser possível sua derrogação ou ser revogável apenas por outra norma cogente ulterior. Pierre Marie Dupuy fala que o jus cogens dá critério material a fatos e situações jurídicas criadas pelos Estados, tem valor normativo superior a qualquer outra norma no plano internacional. Logo, torna-se recorrente sua discussão por parte dos Estados e dos doutrinadores. Até porque as regras de direito Internacional não têm uma característica imperativa.

Assim, o jus cogens vem ganhando cada vez mais importância, logo a discussão a seu respeito se intensifica. Do ponto de vista jurídico, afirma-se a dupla insuficiência, seja a falta de definição e a falta de eficácia.Em contrapartida, quando se trata de Direito Internacional, as abstrações muitas vezes tornam-se constante, tendo o preenchimento dessas lacunas apenas com o processo evolutivo.

Uma conseqüência da evolução e da aplicação efetiva das normas imperativas internacionais é referente à importância nos próprios tratados, sendo uma das causas para gerar nulidade absoluta em caso de violação de jus cogens.

Hoje também, podemos dizer que as Cortes Internacionais ou Tribunais de alguns países já reconhecem o Direito cogente, tanto que fazem alusão e pautam suas decisões nos chamados ―princípios intransgressíveis de Direito internacional", como Corte internacional de Justiça se refere a ele, ou mesmo o Tribunal Constitucional alemão que o definiu como: ―o conjunto de regras que são essencias à existência do Direito Internacional e que já obtiveram da parte dos Estados à consciência de sua obrigatoriedade‖ .

Mas o posicionamento da Alemanha, de Portugal, da Espanha é divergente do Chinês e do Iraniano. O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de Lisboa nº 04B4662, no qual aparecia com clareza no artigo 63 da CPEREF (Regime de Falência e Recuperação de Empresas), que este não continha norma imperativa ou injuntiva (jus cogens), mas sim meramente dispositiva (jus dispositivum), logo não era irrenunciável, assim, o Supremo Tribunal Português decidiu por não aceitar o recurso.

Já no caso de Houshang Bouzari, que foi capturado, preso e torturado por agentes da República Islâmica do Irã, depois de sua fuga, imigrou para o Canadá e em seguida ajuizou uma ação na Corte de Ontário pedindo que o Irã fosse processado pelos danos que sofreu. Aparentemente teríamos um princípio fundamental, a proibição da tortura amplamente conhecida como vital nos direitos humanos. Sem falar, da proibição de Estado Soberano não pode atuar na jurisdição de outro Estado, já que isso pauta a relação entre as nações.

O artigo 14 da Convenção de Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, da qual o Canadá é signatário tendo inclusive ratificado a mesma, expressa de acordo com o sistema legal da vítima de tortura possui o direito justo a compensação pelos males que sofreu.

A decisão da Corte de Ontário concluiu que apesar das injúrias, dos malefícios psíquicos e físicos que Bouzari tinha sofrido, o Irã era imune do processo. Uma das decisões mais controversas do tribunal especialmente, quando elencamos ao julgamento os Direitos Humanos e o peso teórico do jus cogens. Em contrapartida, a ONU vem caminhando para impor sanções ao Irã, mas não por causa de casos como o de Bouzari, e sim decorrente do enriquecimento de urânio e da possível fabricação de armas nucleares. Caminhando um pouco mais, a China que participa do Conselho de Segurança da ONU não comete uma violação a direitos humanos de forma rotineira? O gigante asiático impôs sua política de restrição à natalidade em 1979. O infanticídio de milhões de crianças - em especial de meninas - faz parte do cotidiano chinês, as pessoas passam e nem sequer olham para os recém-nascidos jogados em valas

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públicas.

Contudo, não se falam em sanções. Para que derrogar, algo que aparentemente não é eficaz?

Temos uma contradição quanto à aplicação e validade do jus cogens. De um lado, a aceitação por parte dos países que a defendem e caminham com ela, de acordo com a mentalidade ocidental e seus problemas internos.E do outro, Estados anteriores e milenares a qualquer formação de um conceito nem mesmo próximo, a de normas imperativas internacionais, que também precisam lidar com graves problemas todos os dias.

Cada país tem constituições, leis que com certeza não diferem apenas na língua na qual foram codificadas. Quando analisamos o Direito Romano, seja o ius civile ou o ius gentium temos pontos basilares, aos quais os legisladores de hoje continuam se prendendo. O direito consuetudinário construído e aplicado de acordo com os costumes e a história do povo romano é um dos exemplos mais clássicos. A essência de cada lugar é muito difícil der ser transmitida por uma única lei, haja vista, como exemplo, a heterogeneidade da África que resultou em genocídio entre as tribos. E o que torna o homem único segundo muitos antropólogos é a diversidade, o multiculturalismo.

Sendo o fruto da historicidade do povo, já discutida por um dos fundadores da Escola Alemã, F. Savigny, herdada de Montesquieu e o famoso espírito geral da nação.

Então, questiono se a seguinte frase de Anarcase a Solón não nos alude a real aplicação das normas imperativas do direito internacional. Segundo Assier Adrieu, ―tais leis são exatamente como teias de aranhas, por que prenderão os pequenos e os fracos que nelas caírem, mas os ricos e poderosos passarão através delas e as romperão‖.

No julgamento da ADPF 153, a qual examinava a existência da controvérsia constitucional no âmbito de aplicação da Lei de Anistia, visando que o Supremo Tribunal Federal anulasse o perdão concedido aos militares, policiais, agentes do governo responsáveis pela prática de tortura, dentre outras barbaridades no período da Ditadura Militar teve julgada como improcedente a ação, inclusive o ministro Eros Grau termina seu voto com as seguintes palavras: ―É necessário não esquecermos, para que nunca mais as coisas voltem a ser como foram no passado.‖ Mas, e a impunidade também deveria ser esquecida? No plano interno, o caso da Guerrilha do Araguaia não teve a responsabilização penal devida, bem como o devido processo legal. Já, no plano supranacional, a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Brasil, lembrando que crimes contra a humanidade são insuscetíveis de anistia e imprescritíveis.A proibição de tais crimes alcançou caráter de jus cogens. No julgado, a Corte referida, enfatiza que violações praticadas contra humanidade são uma norma jus cogens, que não nasce com a Convenção, logo mesmo que o Brasil não a tenha ratificado é obrigatório à investigação e a responsabilização penal. Configura-se violação a norma imperativa, aplicar anistia ou prescrição. Logo, o Estado Brasileiro deve cumprir.

Ian Brownlie, conhecido advogado internacionalista falava: ―The vehicle does not often leave the garage‖ . Ou seja, ―o veículo nem sempre sai da garagem‖, assim mesmo que o instituto não tenha a aplicabilidade sempre merecida, negá-lo seria mais incoerente que as próprias contradições que o cercam.

IV – CONCLUSÃO

Além do problema jurídico, revelam-se questionamentos de outras ciências sociais no decorrer do artigo, em especial o caráter sociológico, que enriquecem a problematização e tensionam o teste de verificação da hipótese suscitada no artigo aqui apresentado. Falar na derrogabilidade do jus cogens é ainda mais confuso e pouco concreto. Sem dúvida, ela aponta um direcionamento as Cortes internacionais, contudo os juízes cada vez mais, não fazem uso só da Lei, analisam o caso levando em conta princípios e técnicas de decisão que podem ser utilizados, como a ponderação, o princípio da proporcionalidade, da adequação, dentre outros. Por esta razão, verifica-se a complexidade do tema ao se falar de validade e derrogação de

jus cogens, até porque sua aceitação efetiva, independente de ser jurídica, gera tensões, que muitas acabariam até por afetar a soberania de Estado Nacional dependendo do entendimento de suas normas jurídicas e como estas são afetadas por fatos extrajurídicos.

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A vontade dos Estados, porém, é reflexo de um fato jurídico que o direito declara como tal e ainda que funde a vontade do Estado, o mesmo possibilita que as vontades do homem representem um Estado; este vínculo jurídico proporciona segurança aparente e as devidas conseqüências jurídicas, seja a violação de um tratado ou, de um direito injuntivo.

Toda a discussão a esse respeito ganha um caráter mais sociológico do que propriamente jurídico. Falar na derrogabilidade do jus cogens é ainda mais confuso e pouco concreto. Sem dúvida, ela aponta um direcionamento as Cortes internacionais, contudo os juízes cada vez mais, não fazem uso só da Lei, analisam o caso levando em conta princípios que podem ser utilizados como a ponderação, o princípio da proporcionalidade, da adequação e etc. Por esta razão é tão complexo falar de validade de derrogação de

jus cogens, até porque sua aceitação efetiva, independente de ser legal, gera tensões, que muitas vezes acabariam até por afetar a soberania de Estado Nacional dependendo do entendimento de suas leis e como estas são afetadas por fatos extrajurídicos.

Não podemos falar em direito imperativo sem situar o contexto histórico no qual se desenvolveu. Existe um subjetivismo do significado de justiça. É caótico falar de um valor absoluto imposto da mesma forma a todos os Estados. Até porque para chegarmos ao equilíbrio na balança jurídica muitas vezes se faz necessário tratar os desiguais como desiguais para haver proteção as minorias. Afirma-se que o povo ocidental nega a diferença, e que o oriental a ressalta. Não que isso seja razão, para qualquer prática que se posicione de forma contrária a dignidade da pessoa humana. Entretanto, deixar de lado os problemas e a formação que existe por de trás de cada homem, que com certeza não difere apenas na seqüência de genes, não minimiza ou solve aquilo que o concerne.

Todavia, quando um ou mais Estados ignoram esses direitos do indivíduo, torna-se necessário aplicar de forma paritária as normas peremptórias do Direito Internacional. A sujeição deve ser as normas jurídicas e não à ―razão de Estado‖ como já iluminava Hugo Grócio. Logo, temos o instituto como um instrumento de poder, mas que concomitantemente é um mecanismo limitador político e legal, mantendo a interação dos sistemas nacionais ao internacional, no qual a convergência mínima de interesses e valores dos Estados Soberanos torna-se o jus cogens.

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V – REFERÊNCIAS

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Sítios Genéricos

Consulta restrita a plano de pesquisa do Programa de Mestrado e Doutorado em Direito, disponível em: <http://vlex.com/vid?b_prevnext=true&ix_fragmento=1&ix_resultado=6&query%5Bct_resultados%5D= 740&query%5Bfrase%5D=jus+cogens&query%5Btextolibre%5D=jus+cogens&sort=score&word=jus+c ogens#ixzz0mREgDRvH>. Acesso em: 28.04.2010

Disponível em:

<http://www.cidh.oas.org/demandas/11.552%20Guerrilha%20do%20Araguaia%20Brasil%2026mar09%2 0PORT.pdf pag.65 >. Acesso em 18.05.11

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http://www.cidh.oas.org/demandas/11.552%20Guerrilha%20do%20Araguaia%20Brasil%2026mar09%20 PORT.pdf pag. 66>. Acesso em 18.05.11

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A INSTITUCIONALIZAÇÃO E JUDICIALIZAÇÃO DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS: UM

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