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Jurimetria, matematização do direito e o controle da atividade judicial.

INFORMÁTICA, TELEMÁTICA E CIBERNÉTICA DIREITO: INFORMÁTICO, TELEMÁTICO E CIBERNÉTICO.

9. Jurimetria, matematização do direito e o controle da atividade judicial.

Segundo Loevinger: “A jurimetria é um esforço para a utilização dos métodos da ciência no âmbito do Direito”.189 Este autor entendia por científico apenas aquilo que podia ser experimentado ou, no máximo, quantificado. Atribuía assim à jurimetria uma característica não contingente, porém essencial de uma ciência estatística aplicada ao direito. Esta visão matematizada do direito já havia sido vislumbrada pelos pandectistas, que chegaram a considerá-lo como “um cálculo com os conceitos”. Loevinger tentou traçar um marco divisório entre a disciplina jurídica tradicional e uma outra inovadora, aplicando- lhe métodos próprios das ciências exatas, notadamente da estatística e da matemática. A relação existente entre a sua teoria e a tradicional bagagem cultural do jurista europeu, vertida para a analogia entre Matemática e direito, reside no fato de que a ciência jurídica, assim como toda e qualquer ciência, serve-se do método lógico.190 Mas Bobbio tem razão quando diz que este problema deve ser posto de forma, a saber, se a ciência jurídica é, ou não, semelhante à lógica ou à matemática, noutras palavras: a ciência jurídica seria uma ciência instrumental? Ela “constitui por si mesma uma linguagem que poderia ser utilizada para outras pesquisas, outra coisa é dizer que ela se exprime numa linguagem matemática?”. Os juristas matematizantes, por sua vez, não estão preocupados em respondê-la. Apenas afirmam que o direito utiliza-se da matemática ou da lógica.191

Deste raciocínio é possível distinguir dois argumentos: de um lado o metafísico, que tenta construir uma ciência jurídica aprioristicamente, constituindo-se numa lógica, numa matemática sui generis, com o escopo de estudar o direito concreto; de outro

188 LOEVINGER, ap. LOSANO. Informática jurídica, 1976, p. 3. 189 LOEVINGER, ap. LOSANO. Informática jurídica, p. 4. 190 LOSANO. op. cit., p. 5.

lado está o operacional e finalístico pretendendo aplicar ao direito o método lógico- matemático. Ao primeiro corresponderia a ciência jurídica. Ao segundo, a teoria jurídica que utiliza a matemática, até então situada às margens dos estudos jurídicos. A jurimetria de Loevinger é subsumida por esta última categoria, ou seja, diz que o direito pode ser expresso numa linguagem matemática, subdivida em três setores essenciais: 01o-

previsibilidade das decisões judiciais; 2o- processamento eletrônico de dados jurídicos; 3o- uso da lógica no campo do direito.192

O controle analítico e quantitativo da atuação dos juízes e tribunais, segundo Losano, não prosperou na Europa Continental, pois para o jurista europeu este enfoque é pouco atrativo, dentre outras razões, pela diferença existente entre os sistemas jurídicos do Velho e do Novo Mundo, sendo bastante difícil antever o conteúdo das sentenças proferidas nos sistemas legais que têm por base o direito legislado. Assim, o interesse teórico por este assunto diminui proporcionalmente à medida que na realidade prática as dificuldades de previsão de conteúdo de sentenças aumentam.193

Para Losano a impossibilidade de previsão das sentenças em sistemas legais como o nosso torna-se ainda mais dificultada pela maneira através da qual o controle da constitucionalidade das leis é exercido. É que

podendo a Corte Constitucional retirar a vigência de uma lei na qual inúmeros juízes proferiram suas decisões, os casos concretos até então por

ela regidos serão regulados por uma outra norma, advindo daí decisões sobre uma mesma matéria fática com diferentes fundamentos e efeitos

concretos. A margem de erro que uma pesquisa jurimétrica traria ao tentar prever como seriam decididas determinadas matérias jurídicas num

país que adote o sistema romanístico, seria tamanha que inviabilizaria o uso deste setor da jurimetria. Até mesmo nos Estados Unidos inúmeros argumentos contrapuseram-se em desfavor da jurimetria, dentre os quais registram-se os seguintes: 01o- incompossibilidade com a tradição jurídica,

já que o uso dos computadores eletrônicos jungir-se-ia ao behaviorismo;

192 Ibidem. 193 Ibidem.

2o- os esquemas formais que o processamento eletrônico exige constituir-se- iam num obstáculo à evolução do direito; 3o- a formalização do processamento eletrônico de dados jurídicos requereria uma excessiva sutileza na linguagem jurídica; 4o- a grande capacidade de memorização

do computador reduziria o trabalho do jurista a um papel subalterno, podendo acarretar uma redução na sua formação profissional ao mínimo

possível de conhecimento; 5o- o computador eletrônico seria mais um aliado a sujeitar ainda mais o cidadão ao Estado. 194

A proposta de Loevinger, a bem da verdade, consistiu no primeiro passo no sentido de se aplicar o novo método tecnológico da computação eletrônica ao campo jurídico e teve uma rápida difusão na cultura jurídica anglo-saxônia radicando-se no uso jurídico lexical. Os enfoques jurimétricos, no entanto, são realmente bastante limitados, restringindo-se à previsibilidade das decisões judiciais através do processamento eletrônico de dados jurídicos e ao uso da lógica no campo do direito, inexistindo qualquer preocupação de ordem teórica exceto quanto ao emprego da lógica simbólica. O fenômeno tecnológico-jurídico que a jurimetria designa exprime uma idéia de mensuração do direito, ou, ao menos, de uma quantificação de alguns aspectos da experiência jurídica. Entretanto, a afirmação no sentido de que a disciplina de Loevinger não teria logrado êxito naquilo que de mais importante havia se proposto: a previsibilidade das decisões judiciais, mormente nos países que, como o Brasil, adotam o sistema do direito legislado, é merecedora de questionamentos.

Tais argumentos baseiam-se na assertiva de que é bastante difícil prever o conteúdo de decisões judiciais num ordenamento jurídico que adote um sistema no qual uma única lei pode lograr interpretações diversas. Diferentemente, nos Estados que adotam um sistema derivado do Comom Law, onde a produção legislativa é bem menos acentuada, os precedentes judiciais possuem força vinculante. A isto, some-se ainda o argumento de que os efeitos provocados por uma declaração de inconstitucionalidade de lei, no sistema de controle do tipo concentrado, seria mais um fator a pesar contra a previsibilidade de como se decidirão as hipóteses concretas reguladas por uma norma cuja vigência é suprimida pela

Corte Constitucional. Com efeito, podem os juízes no nosso sistema ao aplicar uma mesma lei atribuir interpretações distintas umas das outras.195

Isto, porém, não é argumento suficiente para condenar aquela proposta jurimétrica. Perez Luño, por exemplo, considera esta crença totalmente equivocada em razão da influência vinculante que os precedentes acarretam na prática forense.196 Na Espanha, exemplificativamente, a força dos precedentes é bastante significativa sendo admissível o recurso de cassação por infração à lei ou à doutrina legal,197 colimando reformar decisões contrárias à lei ou às tomadas pelo Tribunal Supremo. Na Itália, a Corte de Cassação dispõe de um sistema computacional cuja finalidade é ordenar e informar os seus membros componentes sobre os precedentes jurisprudenciais. Na Alemanha no ano de 1967, foi criado um sistema com a finalidade de compilar em forma de repertório as decisões judiciais sobre matéria fiscal, possibilitando a uniformização dos julgados.198 A uniformidade nos julgados constitui-se num objetivo processual hoje perseguido pela absoluta maioria dos países adotantes de ordens jurídicas derivadas do direito romano. No caso do Brasil, talvez signifique uma verdadeira questão de sobrevivência sistemática, posto que a inflação processual verificada maiormente no absurdo número de recursos está a pôr em xeque a efetividade das decisões judiciais. Enfrentemos agora a questão da vinculação dos precedentes.

195 A propósito a revista “Veja” publicou uma matéria sobre o Poder Judiciário com a epígrafe: “Sem Lei Nem

Ordem”, onde se constatou que: “Existe mais de um milhão de leis no Brasil, e por isso é comum encontrar sentenças diferentes para um mesmo caso. Um exemplo são duas ações de interrupção de gravidez que tramitaram neste ano no mesmo Fórum Lafayette em Belo Horizonte. Em março, o juiz Luciano Pinto, 43 anos, autorizou a faxineira Zélia Rosa de Jesus a fazer um aborto (...) Dois meses depois outro juiz, Antônio de Pádua Oliveira, 53 anos, negou autorização para um caso idêntico...”.

VEJA, Revista, ano 29 nº 50 de 11 de dezembro de 1996, p. 62.

196 “Cabría pensar que en los sistemas romanistas el interés por este tipo de investigaciones es menor, dado

que en ellos el precedente no es vinculante, tiéndose a lo sumo en cuenta a título orientativo. Esta crencia es totalmente falsa, ya que si bien el jurista teórico puede subestimar el valor vinculante de la jurisprudencia, la prática jurídica se orienta hacia una fuerza más o menos obligatoria del precedente”. LUÑO. Cibernética informática e derecho: un análisis metodológico, p. 66-67. Grifou-

se.

197 Por doutrina legal entenda-se a manutenção pelo Tribunal Supremo de suas decisões. 198 LUÑO. Cibernética informática e derecho: un análisis metodológico, p. 68.

10. O poder vinculante reflexo ou indireto (provocado ou necessário) e a

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