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Capítulo 3 Colaboração e Liderança em contextos escolares

3.1. Colaboração em contextos escolares

3.2.5 Liderança em contextos escolares

O trabalho de Breen, Agherdien e Lebethe (2003) descreve uma interação de curta duração entre as três autoras, que teve lugar numa universidade no âmbito do “desenvolvimento de equipas”. Após descrever os aspetos específicos da relação, as autoras afastam-se dos pormenores e começam a examinar cuidadosamente os seus diferentes aspetos através de uma variedade de visões teóricas incluindo a da investigação colaborativa e dos textos legislativos. Questões de confiança, hierarquia e relacionamento são examinados e tentam discutir a necessidade crucial de colocar o desenvolvimento da equipa ao nível de um empreendimento colaborativo de “aprender pela experiência” ao invés de ser apenas outra oportunidade de “obter conhecimento” (p. 213).

No estudo torna-se claro que as autoras fazem uma grande separação entre relacionamentos cooperativos e colaborativos, pois identificam os primeiros como existindo no paradigma do “obter conhecimento” (p. 226). A cooperação aqui parece ser usada para definir situações onde grupos se reúnem, por mútuo acordo, para procurar resolver determinada tarefa. Objetivos e tarefas são distribuídos desde o início com o poder a permanecer na liderança, cujo papel é constante. Esta descrição permitiria relações profissionais entre professores universitários e os seus alunos no paradigma “obter conhecimento” como sendo de cooperativismo, visto que a tarefa é nitidamente a de transferir conhecimento do académico para o aluno e o sistema universitário assenta o poder no académico.

Por outro lado, a colaboração parece conter aspetos de cooperação, mas aproxima-se mais de um quadro consultivo universitário. A colaboração desenvolve-se num modelo de planeamento conjunto, implementação e avaliação conjunta onde a responsabilidade e a autoridade para as tomadas de decisão são partilhadas. O programa de desenvolvimento de equipas descrito neste artigo procura ir ao encontro destas características pelo facto de, em cada fase, os participantes serem todos responsáveis pelas decisões tomadas em relação às tarefas a cumprir todas as semanas e decidirem em conjunto quando se deveria terminar com o programa. No entanto, para as autoras, a

importância de descrever este programa como colaborativo ao invés de cooperativo não é clara e necessita de uma investigação mais profunda.

As sessões de discussão que ocorriam após as conferências foram caracterizadas como sendo animadas e onde cada participante pôde explorar as suas próprias experiências. Isto parece ir ao encontro daquilo que as autoras descrevem como um meio-termo seguro. Um contributo importante para a reflexão sobre a questão do poder é que em colaboração as decisões são partilhadas no que diz respeito ao como e quanto cada participante participa na liderança e na tomada de decisões. Outro contributo importante diz respeito à importância da definição clara de objetivos no desenvolvimento de um trabalho colaborativo. Estes devem ser estabelecidos de acordo com a visão do grupo. As tarefas devem ser negociadas, distribuídas e as responsabilidades partilhadas.

Krainer e Koop (2003) refletem sobre um desenvolvimento de um projeto internacional - ARTISM1. O programa ARTISM envolveu três escolas e uma

Universidade e surgiu após as escolas sentirem a necessidade de estudar as atuais tendências e orientações para a educação matemática. Durante a fase de planificação e mesmo durante a implementação do programa, foram apoiados por um consultor educacional representando a autoridade escolar regional.

Os casos relatados referem-se a duas das três escolas envolvidas. Ambos os casos evidenciam as diferenças na cultura de trabalho de cada instituição, e como o contexto específico e o indivíduo ou grupo influenciam a constituição de um trabalho colaborativo. Projetos colaborativos são construídos socialmente dentro de contextos culturais e esses contextos definem limites e criam oportunidades. Em ambos os casos o projeto nasceu no interior do Departamento de Matemática quando Robert (Austrália) e Jill (Áustria) tiveram consciência da necessidade de promover o desenvolvimento profissional no interior da escola. Estes dois professores de Matemática experientes, tiveram sucesso criando uma boa relação com a direção da escola, que apoiou ativamente os seus professores de Matemática, fator que permitiu divulgar para o exterior o bom trabalho do departamento. No entanto, no caso de Robert é relatado que, na relação do diretor com o grupo de professores, houve alguma tensão que se deveu, por um lado, à liderança (imposta pelo diretor) e por outro lado, à necessidade de formar

1 ARTISM é o nome dado ao projeto “Ative and reflective teaching in secondary mathematics”, desenvolvido na Austrália.

redes profissionais entre colegas de modo a alcançar objetivos pessoais e partilhados no que diz respeito a melhorias escolares.

Este trabalho apresenta aspetos importantes designadamente, a necessidade de se realizarem programas que promovam o desenvolvimento profissional de professores e a importância da sua liderança como a chave fundamental para a promoção da colaboração nas escolas. Robert e Jill iniciaram os projetos nas suas escolas, geriram o trabalho e o apoio dado aos seus professores e agiram como executivos ao garantirem autonomia aos seus colegas. Ambos demonstram a importância do equilíbrio entre as quatro dimensões: ação, reflexão, autonomia e trabalho em rede tendo em conta o papel dos diretores para um desenvolvimento profissional com sucesso. Além disso, mostram que os líderes que respeitam a autonomia dos professores têm êxito em transformar trabalho em rede imposto em colaboração onde cada vez mais participantes se tornam elementos de mudança.

É possível perceber que a realização do projeto australiano foi possível devido à definição atempada de um trabalho para o desenvolvimento profissional em rede com os seus pares das duas outras escolas. No seu esforço de colaboração para otimizar o suporte aos professores participantes durante a implementação do ARTISM, tanto Robert como Jill agiram autonomamente no sentido de alcançar os seus objetivos comuns. A entrega e partilha de poder é um fator essencial na liderança e um pré- requisito numa relação colaborativa, pois permite uma reflexão suficiente sobre o seu papel numa determinada rede de relações de poder e na atribuição de uma quantidade adequada de autonomia a grupos particulares ou indivíduos.

Por último, os autores referem que a mudança educacional enfrenta sempre a dicotomia entre liderança e colaboração. Em relação ao desenvolvimento profissional de professores, os diretores têm um papel crucial. Sendo estes gestores intermédios têm como tarefa estar em contacto com os professores e manter os supervisores satisfeitos. Por outro lado, iniciativas por parte dos professores ou do próprio diretor foram fatores impulsionadores de mudança educacional local. Também, ao apresentar os dois casos salientam a importância do líder e do seu papel no desenvolvimento e gestão de um projeto de escola. Aspetos como estilos de liderança, relação entre o líder e os seus subordinados são abordados, salientando o papel de todas as partes envolvidas terem responsabilidades similares, haver partilha de objetivos e de uma visão. Ainda com maior relevância para o sucesso do projeto são referidos a importância do respeito do

líder pela autonomia dos professores e o equilíbrio entre a ação e reflexão, autonomia e trabalho em rede.

Estas duas experiências evidenciam alguns aspetos da liderança que emergem do desenvolvimento de projetos de colaboração. Igualmente, sobressai que há uma forte ligação entre a colaboração e a liderança, nomeadamente, não há trabalho colaborativo sem liderança e, por sua vez, não há liderança sem colaboração.

3.2.6 Síntese

Uma liderança eficaz e partilhada tem um papel determinante no desenvolvimento da cultura de escola, dos seus projetos e da sua comunidade profissional. As escolas que refletem os valores das comunidades que servem, as crenças dos professores que aí trabalham e as necessidades dos alunos que servem, são únicas e têm uma cultura própria. Esta unicidade torna-se fundamental, porque criar uma cultura de escola e fazer parte dela ajuda os que nela trabalham a sentirem-se especiais e a melhorar o seu nível de empenho. Por outro lado, os compromissos partilhados aproximam as pessoas e fortificam ligações entre estas, e entre estas e a própria escola. Estes são, por isso, fatores que contribuem para promover a aprendizagem dos alunos e a construção da sua identidade.

Em parte a escola como organização considera o seu projeto educativo como uma carta de referência que vai inspirar a sua ação. O projeto mobiliza as energias à volta de uma aposta, tornando-se um símbolo para os seus atores. A este nível, a gestão do projeto é uma maneira de lutar contra o funcionamento burocrático das organizações tornando-se uma forma de motivação e de mobilização do seu capital e criatividade do potencial humano. Há, por isso, pelo menos dois aspetos que podem ajudar ao sucesso, o trabalho colaborativo dos professores e o envolvimento e participação ativa dos pais e encarregados de educação na vida escolar.

Neste sentido, a mudança numa escola passa, necessariamente, pela mudança de cultura profissional, pelo despoletar de iniciativas de liderança, inovação efetiva e o aluimento do status quo. Importa, por isso, perceber que tipo de relações, valores e tradições que se devem manter. O papel do líder é o de identificar o trabalho que tem sido desenvolvido e que experiências de liderança resultaram e foram ao encontro dos objetivos da escola e do desenvolvimento da sua cultura.

Por isso, a liderança passa por ouvir as experiências dos colegas e por preservar as relações profissionais. Estas podem ocorrer num formato mais formal (as reuniões do grupo disciplinar) ou informalmente sempre que um colega pede a opinião a outro ou partilha uma tarefa um episódio pede um conselho. Neste sentido, as ações têm mais impacto e são mais audíveis que um discurso ou um documento escrito.

Por último, da discussão aprofundada sobre este tema percebemos que uma liderança eficaz requer, forçosamente, a partilha e a colaboração de todos, assim como a sucesso de um projeto colaborativo requer, inevitavelmente, uma liderança eficaz e partilhada. A visão, a capacidade de liderar e a perícia do líder, associada à riqueza das experiências e criatividade dos seus pares, são elementos fundamentais para o sucesso de projetos do desenvolvimento profissional do professor, e com eles, uma nova cultura de profissional e de escola.