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A EDUCAÇÃO DE INFÂNCIA

4. Modelos Curriculares na Educação de Infância

4.2 Modelos Curriculares na Creche: breve abordagem

Nas últimas décadas têm surgido novas orientações para o trabalho em creche. São apresentados, de modo sucinto, alguns dos modelos com maior divulgação internacional e aqueles que se encontram mais relacionados com este estudo. Os modelos e currículos existentes para o contexto de creche estão, muitas vezes, associados, directa ou indirectamente, à avaliação da qualidade. Aborda-se aqui com maior detalhe, dada a pertinência para o presente estudo, o modelo High/Scope e o modelo de Goldschmied e Jackson.

Para a orientação das práticas desenvolvidas em creche, a National Association for the

Education of Young Children (NAEYC) publicou um documento que define as

práticas adequadas e a sua adequação desenvolvimental, as designadas Developmental Appropriated Practices (DAP), em programas de educação de infância para crianças desde o nascimento até aos 3 anos.

Nesta abordagem, o currículo e a avaliação interceptam-se mutuamente uma vez que as suas premissas se assumem, por um lado como linhas mestras para a prática dos educadores e, por outro lado como critérios para a avaliação dessa mesma actuação (NAYEC, 2009).

Esta proposta considera cinco áreas centrais nas quais se deve promover a aprendizagem e o desenvolvimento: (i) a social; (ii) a emocional; (iii) a física; (iv) a da linguagem; e (v) a cognitiva. E identificam-se dez temas que devem ser avaliados para determinar a qualidade de um programa, tendo subjacente as práticas adequadas do ponto de vista do desenvolvimento. Os temas são: (i) as relações; (ii) o currículo; (iii) o método de ensino; (iv) a avaliação do progresso das crianças; (v) a saúde; (vi) os educadores; (vii) as famílias; (viii) as relações com a comunidade; (ix) o ambiente físico; e (x) a gestão e liderança (NAEYC, 2008).

Na tomada de posição da NAEYC (2009) é apresentado um conjunto de princípios de desenvolvimento e de aprendizagem na infância que enformam a prática. Esta, como qualquer outra lista de princípios, não é completa, dada a complexidade do desenvolvimento da criança e da sua aprendizagem. Cada princípio descreve um factor individual, mas tal como todos os domínios do desenvolvimento e da aprendizagem se

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encontram inter-relacionados, também os princípios se interceptam mutuamente. Os princípios são:

“1. All the domains of development and learning – physical, social and emotional, and cognitive – are important, and they are closely interrelated. Children’s development and learning in one domain influence and are influenced by what takes place in other domains;

2. Many aspects of children’s learning and development follow well documented sequences, with later abilities, skills, and knowledge building on those already acquired;

3. Development and learning proceed at varying rates from child to child, as well as at uneven rates across different areas of a child’s individual functioning;

4. Development and learning result from a dynamic and continuous interaction of biological maturation and experience;

5. Early experiences have profound effects, both cumulative and delayed, on a child’s development and learning; and optimal periods exist for certain types of development and learning to occur;

6. Development proceeds toward greater complexity, self-regulation, and symbolic or representational capacities;

7. Children develop best when they have secure, consistent relationships with responsive adults and opportunities for positive relationships with peers;

8. Development and learning occur in and are influenced by multiple social and cultural contexts;

9. Always mentally active in seeking to understand the world around them, children learn in a variety of ways; a wide range of teaching strategies and interactions are effective in supporting all these kinds of learning;

10. Play is an important vehicle for developing self-regulation as well as for promoting language, cognition, and social competence;

11. Development and learning advance when children are challenged to achieve at a level just beyond their current mastery, and also when they have many opportunities to practice newly acquired skills;

12. Children’s experiences shape their motivation and approaches to learning, such as persistence, initiative, and flexibility; in turn, these dispositions and behaviors affect their learning and development” (NAEYC, 2009: 11-15).

Em síntese, as três considerações principais das DAP são: (i) saber sobre o desenvolvimento infantil e a aprendizagem (por forma a ajudar a decidir quais as melhores experiências a proporcionar às crianças); (ii) saber o que é individualmente adequado (cada criança é um ser único; a observação do jogo e da sua interacção com os outros e com o ambiente físico fornece informação sobre os seus interesses, capacidades e desenvolvimento – social, emocional, físico e cognitivo); (iii) saber o que é culturalmente importante (conhecer as características dos seus contextos familiares, de modo a proporcionar experiências de aprendizagem significativa nos diversos domínios do desenvolvimento, que respeitem a criança a sua família), com o intuito de promover a inserção social da criança.

O Modelo High/Scope foi já abordado nos modelos do pré-escolar. Especifica-se aqui a sua proposta relativamente aos bebés e crianças pequenas, de idade de creche. As ideias

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centrais deste currículo para a educação e cuidados das crianças dos 0 aos 3 anos, são: (i) a aprendizagem activa; (ii) as interacções adulto-criança; (iii) as observações diárias; (iv) o ambiente físico orientado para as crianças; e (v) os horários e rotinas adequadas às suas necessidades. Todos estes aspectos encontram-se representados na “Roda da Aprendizagem” High/Scope.

Figura 1: Roda da Aprendizagem High/Scope para bebés e crianças

Fonte: Post e Hohmann (2011: 11)

Os bebés e as crianças de tenra idade aprendem fazendo, pois os seus cérebros estão predispostos para a acção. O princípio central desta abordagem – a aprendizagem activa – concretiza-se, de acordo com quatro pressupostos fundamentais, considerando que os bebés e crianças até aos 3 anos: “aprendem com todo o seu corpo e todos os seus sentidos (…) aprendem porque querem (…) comunicam aquilo que sabem (…) aprendem num contexto de relações de confiança” (Post & Hohmann, 2011: 22-23). Estes pressupostos são operacionalizados em linhas orientadoras que enquadram o conteúdo das aprendizagens atrás apontadas e do desenvolvimento dos bebés e das crianças pequenas, as designadas experiências-chave.

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Figura 2: Experiências-chave High/Scope para bebés e crianças pequenas

Sentido de Si Próprio

Expressar iniciativa Distinguir “eu” dos outros

Resolver problemas com que se depara ao explorar e brincar

Fazer coisas por si próprio

Comunicação e Linguagem

Ouvir e responder Comunicar não-verbalmente Participar na comunicação dar-e-receber Explorar livros de imagens e revistas Apreciar histórias, lenga-lengas e canções

Relações Sociais

Estabelecer vinculação com a educadora responsável Estabelecer relações com outros adultos

Criar relações com os pares Expressar emoções

Mostrar empatia pelos sentimentos e necessidades dos outros

Desenvolver jogo social

Explorar Objectos

Explorar objectos com as mãos, pés, boca, olhos, ouvidos e nariz

Descobrir permanência do objecto Explorar e reparar em como as coisas podem ser iguais ou diferentes

Representação Criativa

Imitar e brincar ao “faz de conta”

Explorar materiais de construção e de expressão artística

Responder a e identificar figuras e fotografias

Noção Precoce da Quantidade e de Número

Experimentar “mais”

Experimentar a correspondência de “um para um”

Explorar o número de coisas

Movimento

Movimentar partes do corpo (virar a cabeça, agarrar, dar pontapés)

Movimentar o corpo todo (rebolar-se, deslocar-se, andar, correr, fazer equilíbrio)

Movimentar objectos

Sentir e expressar movimentos regulares

Espaço

Explorar e reparar na localização dos objectos Observar pessoas e coisas sob várias perspectivas Encher e esvaziar, pôr dentro e tirar para fora Desmontar coisas e juntá-las de novo

Música

Ouvir música Responder à música Explorar e imitar sons Explorar sons e tons vocais

Tempo

Antecipar acontecimentos familiares Reparar no inicio e final de um intervalo de tempo

Experimentar “depressa” e “devagar” Repetir uma acção para fazer com que algo volte a acontecer, experimentando a sua causa e efeito

Fonte: Post e Hohmann (2011: 39).

As experiências-chave têm por base aquilo que os bebés e as crianças pequenas descobrem nas suas aventuras diárias de aprendizagem activa. Ajudam, assim, os educadores a orientar as suas interacções com as crianças, para planificar actividades que apoiem a sua aprendizagem e desenvolvimento, bem como a selecção de materiais adequados às crianças e, ainda, para avaliar e partilhar e interpretar as acções das crianças com os pais.

O Modelo Goldschmied e Jackson tem como pressupostos três ideias-chave: (i) o sistema de cuidador primário; (ii) o cesto de tesouros; (iii) o jogo heurístico com objectos. Relativamente à primeira, baseia-se no estabelecimento de um vínculo entre a criança e o adulto que será o seu cuidador primário. Quanto à segunda, consiste num cesto que contém um conjunto de objectos naturais, que proporcionam estímulos sensoriais, suscitando actividades de exploração e descoberta para os bebés que já se sentam. A terceira é direccionada para crianças a partir de um ano de idade e

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corresponde a um tempo dedicado à exploração pela criança de um conjunto de objectos variados, suscitando a brincadeira livre.

Ainda neste modelo, em relação ao cesto de tesouros, acresce-se que o mesmo é uma forma prática de disponibilizar uma diversidade de objectos às crianças que ficam sentados, para poderem explorá-los ao nível de todos os sentidos: tacto (textura, forma, peso, temperatura), olfacto (vários cheiros), paladar (de alcance mais limitado, mas possível), audição (sons diferentes) e visão (cor, forma, comprimento, brilho) (Goldschmied & Jackson, 2006). Goldschmied e Jackson (2006) fazem duas recomendações fundamentais: (i) os objectos devem ser feitos de materiais naturais (madeira, metal, couro, têxteis, borracha, pele, papel e papelão), e não de plástico; (ii) o papel do adulto consiste em garantir a segurança por meio da sua presença atenta, mas não activa.

O Modelo de Willis e Riccuitti define como fundamental a necessidade de aproximação do ambiente educativo em creche ao ambiente familiar convencional (Coelho, 2004).

O Modelo de Bergen, Reid e Torelli define como central o papel do jogo na aprendizagem e construção do conhecimento, bem como a organização física e social do ambiente educativo (Coelho, 2004).

O Modelo Gonzalez-Mena e Eyer realça a dimensão interpessoal da organização e a prestação de cuidados (Coelho, 2004).

Em síntese, alguns dos aspectos recorrentes na maioria das propostas aqui apresentadas dizem respeito: à dimensão interpessoal, ao respeito pelas crianças, à visão da criança como sujeito que aprende activamente, à importância dos momentos de cuidado como momentos de aprendizagem e desenvolvimento, à construção do currículo a partir das experiências espontâneas do quotidiano mais do que em função de acções planeadas, e à importância dos contextos sociais e culturais mais abrangentes.

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