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O CONFLITO E A MEDIAÇÃO DE CONFLITOS NA EDUCAÇÃO DE INFÂNCIA

2. O Conflito na Infância

3.2 Modelos de Mediação

A importância da mediação não se reduz ao seu resultado em termos de resolução de conflitos, é deveras importante o modo de resolvê-los (Torrego, 2003: 48). São, por isso, apresentadas, de uma forma muito breve, diferentes perspectivas de mediação, a saber: o Modelo Tradicional Linear ou Modelo de Harvard; o Modelo Transformativo, desenvolvido por Bush e Folger; e o Modelo Circular Narrativo, desenvolvido por Sara Cobb.

3.2.1 Modelo Tradicional-Linear

A sua fundamentação baseia-se numa comunicação que é entendida no sentido linear e centrada no aspecto verbal – cada parte expressa a sua opinião. A função do mediador é ser um facilitador da comunicação para poder estabelecer um diálogo, que é entendido como uma comunicação bilateral efectiva. Este modelo perspectiva o conflito como tendo uma causalidade linear, ou seja, apenas é tida em consideração uma causa, aquela que levou ao desacordo e exclui a possibilidade de múltiplas causas, que possam ter contribuído para o seu aparecimento. Muito menos entende que o efeito também pode ser causa, num círculo de causalidades recíprocas. Nem o contexto, nem a história do conflito, nem mesmo o factor relacional são encarados como determinantes, quer para o aparecimento quer para a resolução do conflito. Trata-se, pois, de eliminar as percepções erradas do passado, as quais impedem a compreensão do presente e de chegar a um acordo para o futuro.

O seu método consiste na discussão do conflito pelas partes, pois considera-se muito importante que aquelas se possam expressar no começo do processo, deixando sair todas as emoções, como se fosse um mecanismo de catarse. A função do mediador é estabelecer a ordem numa situação de caos, recorrendo à neutralidade (ausência de preconceitos, valores, crenças, etc.) e à equidistância (não estabelecer aliança com nenhuma das partes). O mediador centra-se na dinâmica da negociação, na formulação de propostas e contrapropostas, relegando para segundo plano a relação interpessoal, a visão que cada parte tem de si mesmo, do outro e da situação (Shailor, 2000; Littlejohn e Domenici, 2000); não havendo, por isso, qualquer intento de aprofundar e transformar o relacionamento entre os litigantes (Suares, 2004: 58).

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A sua finalidade é celebrar o acordo, diminuindo ou anulando as diferenças inter- individuais e aumentando as semelhanças em termos de valores e de interesses para aliviar ou cessar o conflito.

3.2.2 Modelo Transformativo

A sua fundamentação baseia-se numa comunicação que se centra no aspecto relacional, considerando a causalidade circular dos acontecimentos.

No seu método é privilegiado a capacitação de ambas as partes, potenciando os seus recursos de forma a tornarem-se protagonistas das suas próprias vidas e responsabilizando-se pelas suas acções. E, dado que há um reconhecimento do outro como parte do conflito, significa que o outro é reconhecido como sendo co-protagonista e co-responsável no processo de mediação (Littlejohn & Domenici, 1999). Este modelo concentra a atenção do mediador nas necessidades dos disputantes e na sua relação. Na mediação transformativa, os mediadores facilitam um processo pelo qual os próprios disputantes determinam o rumo e o resultado da mediação, não importando se isso acabará por levar a um acordo ou não. Os objectivos de comunicação da mediação transformativa encontram-se, pois, diferenciados em objectivos transformadores (centrados nas relações entre as partes) e objectivos de acordo (concentrados no acordo e na tomada de decisão), embora não seja necessário terminar-se em acordo (Ibid).

A finalidade do modelo prende-se, assim, com a modificação da relação entre as partes – transformação relacional – independentemente de alcançarem ou não um acordo para resolverem o conflito. Tem também um potencial de transformar as pessoas (Shailor, 1999) para melhor, dado promover o seu crescimento moral (Bush & Folger, 1996), a sua capacitação para lidar com as próprias vidas e a sua consciência acerca de si, do outro, de relações e dos contextos.

3.2.3 Modelo Circular-Narrativo

A sua fundamentação baseia-se numa comunicação circular, isto é, a comunicação é entendida como um todo, incluindo elementos verbais relativos ao conteúdo (comunicação digital) e elementos não-verbais relativos às relações (comunicação

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analógica). A causalidade é circular, ou seja, não existe uma única causa que produz um determinado resultado e há uma recursividade de causas e consequências.

As partes chegam à mediação com uma posição rígida que as impede de encontrar alternativas. O trabalho do mediador consiste em ajudar ambas as partes a descentrarem-se do seu ponto de vista, mais ou menos cristalizado, e tendo em consideração o ponto de vista do outro, percepcionarem o problema de outro prisma. Trata-se, então, de fomentar a reflexão sobre as histórias de cada uma das partes, procurando construir, em colaboração, uma história alternativa.

Este modelo inspira-se na teoria sistémica e tem uma causalidade circular, a qual depreende que a resposta do receptor alimenta a acção do emissor e vice-versa, numa lógica de estímulo-resposta-reforço (Relvas, 2003); e na abordagem narrativa (Suares, 2004). Nesta, interessa ouvir as partes a contar o que é que aconteceu, do seu ponto de vista, e o mediador terá que levar as partes a aliarem-se na criação de um novo discurso. As histórias são aqui, a espinha dorsal da experiência (Winslade & Monk, 2001).

A finalidade deste modelo é, pois, modificar o significado da história de cada uma das partes, a qual é tida, por cada uma delas, como sendo a verdadeira, e co-construir uma história alternativa.

Apresenta-se de seguida um quadro-síntese, dando conta dos principais traços que caracterizam cada uma delas.

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Quadro 2: Modelos de Mediação e Principais Características

Modelos Modelo Tradicional / Modelo de Harvard

Modelo Transformativo / Modelo de Bush & Folger

Modelo Circular Narrativo / Modelo de Coob

Objectivo Alcançar um acordo

Promover o desenvolvimento pessoal (crescimento moral) e interpessoal (relações) Transformar as relações Função do

Mediador Promover o diálogo

Promover o reconhecimento e a revalorização Promover a desconstrução e reconstrução de narrativas Resultado Expectável Acordo Empowerment face ao sentido de responsabilidade das partes Co-construção de uma história alternativa, em que

cada parte muda a sua narrativa tendo em consideração a perspectiva do

outro

Apesar de cada abordagem apresentar o seu próprio processo metodológico, é comum a todas, a promoção de uma comunicação interpessoal efectiva. Esta, por sua vez, requer uma série de procedimentos que se passam a explanar de seguida, alguns dos quais em maior detalhe, dada a sua relevância para esta investigação.