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1. ANÁLISE SETORIAL

1.1. A EVOLUÇÃO DA INDÚSTRIA GLOBAL DE TELECOMUNICAÇÕES

1.1.3. A NOVA INDÚSTRIA DE TELECOMUNICAÇÕES

O início da década de 1990 foi marcado pelo surgimento na Camada 2 de um novo grupo de novos entrantes, que, nitidamente, apresentavam uma postura competitiva mais agressiva do que os novos entrantes da fase de transição. As mudanças introduzidas eram radicais e acabaram por ofuscar os novos entrantes do período anterior, o da transição. Os “novos” novos entrantes que surgiram na Nova Indústria de Telecomunicações passaram, por isso, a representar uma forte ameaça às incumbents.

Nos EUA, um destes “novos” novos entrantes, a WorldCom, como relata Fransman (2003), após poucos anos de existência, adquiriu o controle acionário da MCI e da Sprint, dois dos maiores concorrentes da AT&T. A WorldCom conseguiu estabelecer a melhor rede de comunicações de longa distância, chegando mesmo a ameaçar seriamente os demais operadores nos mercados europeu, japonês e de países menos desenvolvidos. Na Europa, embora com algum atraso, surgiram novos entrantes com atitudes competitivas similares. Na Inglaterra, surgiu a City of London Telecommunications - COLT e a Energis l, subsidiária de uma fornecedora de energia elétrica inglesa. Na Alemanha, surgiu a Mannesmann, empresa de engenharia industrial que se transformou em uma operadora de linhas fixas e móveis.

Durante a década de 1990, a Antiga Indústria de Telecomunicações e grande parte fase de Transição caracterizaram-se por um processo de especialização vertical, envolvendo as Camadas 1 e 2, em que os fornecedores especialistas de equipamentos exerciam o papel de fabricantes e eram totalmente dependentes dos inovadores operadores de redes, que possuíam os laboratórios de pesquisa. A partir de 1995, já na fase da Nova Indústria, os operadores estabelecidos decidiram transferir gradualmente as atividades de P&D para os fornecedores de

equipamentos, ao mesmo tempo em que decidiram diversificar seus fornecedores de equipamentos.

A Nova Indústria de Telecomunicações caracterizava-se, então, pela existência de operadores de rede estabelecidos (incumbents) que pouco priorizavam os investimentos em P&D (como a AT&T, a NTT e a BT), pela existência de novos entrantes que não priorizavam investimentos em P&D (como a WorldCom, a Qwest, Level 3, Energis) e pela existência de fornecedores especialistas em tecnologia, que priorizavam os investimentos em P&D (como a Cisco, a Ericsson, a Nortel, a Lucent, a Nokia, entre outros). Ficou bastante nítido que o “motor da inovação” havia se transferido dos laboratórios de pesquisa dos operadores de redes para os fornecedores especialistas em tecnologia. Como os fornecedores de tecnologia atuavam em mercados bastante competitivos, eram competentes e transmitiam confiança aos novos entrantes operadores de redes, que não encontravam barreiras de entrada tecnológicas. O mercado de operadores de redes (Camada 2) tornou-se, por isto, um mercado bastante competitivo. Os fornecedores de tecnologia tornaram-se também fornecedores de mão de obra para os operadores novos entrantes. Os fornecedores especialistas tiveram ainda um papel importante ao financiar os novos entrantes, o que os ajudou a crescer.

Uma outra conseqüência da transferência do motor da inovação para os fornecedores de tecnologia é a dependência que os operadores de redes passaram a ter dos fabricantes de equipamentos e dos sistemas operacionais por eles desenvolvidos, como, por exemplo, os softwares específicos para administração da Tecnologia de Informação e os sistemas de faturamento. Essa dependência passou a ser mais crítica para os novos entrantes, que não tinham como objetivo as atividades de P&D próprias. Por isto, o processo de aprendizado aplicado pelos operadores baseava-se no conceito de aprender enquanto estiver usando (learning to use), em vez do conceito de aprender enquanto estiver produzindo (learning to produce), que era largamente utilizado na fase anterior da Antiga Indústria de Telecomunicações, como relata Fransman (2003).

A habilidade de explorar segmentos de mercado era uma característica diferencial apresentada pelos novos entrantes da Nova Indústria de Telecomunicações em relação incumbents. Embora todos devessem obedecer a regulamentações governamentais, que os obrigavam a caminhar no sentido da universalização dos serviços, eles podiam escolher os segmentos de mercado que mais lhes parecem atraentes e focar seus processos inovadores e de aprendizado voltados para estes segmentos. Os novos entrantes escolhiam segmentos como os formados por empresas multinacionais, por grandes empresas nacionais, por pequenas e médias empresas ou por clientes residenciais. Esta condição permitia que os novos entrantes

operassem de forma eficiente, mesmo sendo menores que as incumbents. Por serem menores, suas estruturas administrativas poderiam ser menos hierarquizadas e menos burocratizadas; poderiam também tomar decisões mais rapidamente e mudar seu curso de ação com maior flexibilidade.

Os operadores, apesar de se beneficiarem dos desenvolvimentos tecnológicos obtidos pelos fornecedores de tecnologia e de equipamentos, por dependerem dos fornecedores, que ofereciam a mais recente tecnologia a quem se dispusesse a pagar seu preço, abriram mão da possibilidade de diferenciação, pois eles não eram mais capazes de desenvolver novos produtos, novos serviços ou novos processos a partir de mudanças internas e de recursos próprios. Todos os operadores de redes tinham acesso às mesmas tecnologias, e não podiam se beneficiar de tecnologia melhores do que as que seus concorrentes dispunham. Esta situação se configurava em um dilema que era particularmente mais grave para os novos entrantes, que não desenvolviam nenhuma atividade de P&D. A ausência de diferenciação, combinada com as possibilidades de entradas constantes de novos concorrentes, devido à inexistência de barreiras de entradas, demonstra Fransman (2003), levaram as operadoras de redes a encontrar dificuldades crescentes com rentabilidade: as margens tornaram-se extremamente apertadas. Esta situação obrigou as empresas a desenvolverem características competitivas específicas, que lhes garantissem a sobrevivência.

As operadoras desenvolveram vantagens competitivas, usando os recursos disponíveis. A Qwest, cujo proprietário era o mesmo proprietário de empresas ferroviárias, conseguiu instalar com exclusividade cabos de fibras óticas ao longo de suas ferrovias; isso conferiu à Qwest uma possibilidade redução de custos e ainda gerar receita significativa ao vender parte da capacidade de transporte de seus cabos aos concorrentes. Os novos entrantes operadores de redes puderam conquistar vantagens competitivas em relação às firmas estabelecidos, ao se beneficiarem da aplicação da mais recente tecnologia disponível, o que nem sempre era possível às incumbents, devido aos investimentos comprometidos com tecnologias não tão recentes. Evidentemente, esta vantagem competitiva não era sustentável, pois novas oportunidades de uso de tecnologias mais modernas surgiam com muita rapidez nesta Indústria.

Uma outra forma de desenvolver vantagem competitiva, de acordo com Fransman (2003), era a tentativa de oferecer qualidade de serviço superior à de seus concorrentes, tais como serviços rápidos de eliminação de defeitos e atenção especial aos clientes, demonstrando compreensão pelas necessidades do cliente e grande habilidade para apresentar soluções, a partir da mesma base tecnológica a que todos os concorrentes têm acesso.

O mercado financeiro na Nova Indústria de Telecomunicações teve papel importante para o desenvolvimento dos operadores de redes, facilitando sua entrada e permitindo seu desenvolvimento inicial, através emissão de diversos tipos de títulos de capitalização. Os novos entrantes foram capazes de convencer os analistas financeiros e investidores que eles representavam alternativas bastante atraentes, com ótimas perspectivas de lucratividade no futuro próximo. Como relatou Fransman (2003), as aquisições e fusões também foram facilitadas pelo mercado financeiro, como, por exemplo, o apoio que a WorldCom recebeu do mercado financeiro para a aquisição da MCI e da Sprint, para a aquisição da Airtouch e da Mannesmann pela Vodafone, entre outras. As ações dos novos entrantes tiveram forte valorização no mercado de capitais, o que serviu de garantias para os financiamentos de novas aquisições. Esta valorização patrimonial das empresas foi também fortemente influenciada pela explosão verificada na demanda por comunicação de dados, que por sua vez era resultado da rápida aceitação da Internet pelos consumidores ao redor do mundo.