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O educativo no museu: noções sobre a experiência museal brasileira

4 NOÇÕES SOBRE A DIMENSÃO EDUCATIVA DO CAMPO MUSEAL BRASILEIRO

4.1 O educativo no museu: noções sobre a experiência museal brasileira

Uma mudança conceitual se operou dentro dos museus, com reflexos na atuação dessas instituições e na forma como elas se relacionam com a sociedade. Essa mudança em andamento até os dias atuais, teve inicio na segunda metade do século XX e transferiu a principal vertente de atuação dos museus, historicamente voltada para guarda e estudo dois seus acervos para o público.

Luciana Conrado Martins

A relação entre coleções especializadas, museus, divulgação do conhecimento e a valorização de uma memória nacional, estabelecidas na Europa, nos séculos XVII e XVIII. No Brasil ganha contornos mais nítidos no século XIX, com o surgimento dos primeiros museus brasileiros. (SUANO, 1986, p.38). No entanto, a primeira ação, de cunho museológico no Brasil, de acordo com Mario Chagas (2009), ocorreu durante a invasão Holandesa em Pernambuco, uma experiência isolada; a instalação de um museu no grande parque do Palácio de Vrijburg 16, no século XVIII. Podendo essa ação, dentro do contexto museal brasileiro, ser entendida como um ato educacional, ―parte de um projeto civilizador de modernidade‖ (CHAGAS, 2008, p. 64.).

A transferência da posse privada, dos colecionadores, restrita ao acesso de algumas pessoas às coleções, para um espaço público, através da gestão do Estado, é paralela aos novos princípios de surgimento do Estado-nação moderno. As exposições serviam para educação das populações, para expor os símbolos do Antigo Regime, transformando o museu em instrumento que servia para o bem do Estado. Os primeiros museus brasileiros foram diretamente influenciados pelo modelo dos grandes centros europeus e atuaram como importantes espaços de pesquisa e valorização das Ciências Naturais. Influenciado por uma visão positivista.

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―O Palácio também era conhecido como Palácio das Torres pelas duas partes quadrangulares elevadas nas laterias do prédio. Estas torres serviam como posto de observação e farol para os navios em demanda ao porto do Recife. Seus salões estavam decorados com pinturas de motivos do País e objetos trazidos de várias partes do mundo, formando uma coleção de curiosidades, como era moda na Europa. O Conde Mauricio de Nassau, alem de tratar dos assuntos oficiais da conquista Holandesa, recebia as pessoas gradas nos jardins do palácio para festas e encontros culturais. Friburgo serviu de residência oficial a vários governadores da província de Pernambuco passando por diversas reformas até ser demolido em 1786. No local foi construído o prédio do Erário Régio, que por sua vez também foi demolido, surgindo em 1840 à nova sede do governo. O edifício passou por reformas em 1852, 1873 e 1922 quando assumiu o aspecto atual. O Palácio do Campo das Princesas, como é denominado hoje‖.

O primeiro museu com objetivo de forjar uma identidade nacional, ―civilizar o Brasil‖ (SANTOS, 2002), através do seu desenvolvimento científico, com princípios educativos, foi o Museu Real17 (1818) que depois passou a se chamar Museu Imperial e Nacional (1824); e posteriormente Museu Nacional (1890). Essas mudanças de denominação do Museu Real acompanham aspectos das transformações, políticas, econômicas, culturais, sociais. O Museu Real foi fundado sob o comando do imperador D. Pedro II, e tinha a função de:

Propagar os conhecimentos e estudos das ciências naturais no Reino do Brasil, que encerra em si milhares de objetos dignos de observação e exame e que podem ser empregados em benefício do comércio, da indústria e das artes. BRASIL, 1818 (Dicionário Histórico-Biográfico das Ciências da Saúde no Brasil 1832-1930).

Segundo Mario Chagas (2009). O Museu Real passa a contribuir na composição do cenário museológico internacional, ao lado de outros grandes museus de tradição européia, preocupados com a classificação e com a formação de um acervo que representa-se a nação que se formava (SANTOS, 2002). Nesse período, muitos museus europeus aumentaram suas coleções, por intermédio de saques e transferência de bens de suas colônias em todas as partes do mundo. (CÂNDIDO, 2013, p.35). Até os dias atuais, muitos grupos sociais tentam reaver, juridicamente, objetos, subtraídos de seus contextos originais.

Posteriormente, surgem outros museus, marcados com o tema do discurso nacionalista como: o museu do exército (1846), o da Marinha (1868), o Museu do Instituto Histórico Brasileiro (1894), Museu Histórico Nacional (1922), entre outros. São instituições que buscam no passado os elementos responsáveis para se construir a imagem de nação. Os museus etnográficos também surgem nessa época, como: o Museu Paraense Emílio Goeldi (1866), o Museu Paulista (1894); junto com outras tipologias de museus, em sua maioria museus ―enciclopédicos‖, com enfoque: na visão de preservação do patrimônio nacional, valorização e resgate da memória. Alguns desses museus, fundados até o ano de 1900, podem ser visualizados no quadro abaixo:

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Incorporou o acervo da extinta Casa de História Natural (1784), uma das primeiras experiências de museu, popularmente conhecida como Casa dos Pássaros devido à grande quantidade de aves empalhadas. Criada em 1784 pelo Vice-Rei D. Luiz de Vasconcellos e Sousa, a Casa de História Natural colecionou, armazenou e preparou, por mais de vinte anos, produtos naturais e adornos indígenas para enviar a Lisboa. Em 22 de junho de 1813, o Príncipe-Regente D. João mandou extinguir todos os cargos daquela instituição, e seus móveis e produtos de mineralogia e de história natural foram para a Academia Real Militar, no Largo de São Francisco de Paula. Somente cinco anos mais tarde o Príncipe-Regente criaria o Museu Real do Rio de Janeiro, que incorporou aquele acervo da Casa dos Pássaros. (Dicionário Histórico-Biográfico das Ciências da Saúde no Brasil, 1832-1930). Atualmente, o museu está aberto, após ter sido fechado por não pagamento de funcionários, esse fato, ilustra a realidade em que se encontram muitos museus brasileiros.

Podemos dizer que, enquanto instituições públicas, os museus chegaram até a metade do século XIX com uma postura elitista, e uma mistura de conceitos mal compreendidos. Na análise de Manuellina Duarte Cândido:

O modelo é, portanto, enciclopedista, classificatório e evolucionista. Além dessas balizas, os museus do século XIX em geral se caracterizam por: localização nas grandes metrópoles coloniais, profusão de referências a conquista territoriais, poder político, exploração científica, gosto estético afinado com a representação das elites e de seus valores. (CÂNDIDO, 2013, p. 35)

Nas primeiras concepções de museu público os discursos eram voltados para a valorização de uma cultura material, centrada em objetos que representavam um gosto burguês. E apesar da abertura, o acesso a esses espaços continuava limitado; freqüentado por pequenos grupos de intelectuais, burgueses, pesquisadores e artistas:

―É certo que nessa época, no Brasil, apesar de abertos, os museus tinham como público apenas especialistas, seja pela ideia que se tinha de sua função social, seja pela sua expografia ou pelos objetos que colecionava como exemplos de uma ideia de nação a ser inventada e consolidada. (SANTOS, 2006, apud CASTRO, 2013, p. 21).

Nome do Museu Cidade UF Ano de

Criação Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de

Janeiro

Rio de Janeiro RJ 1808 Museu Nacional Rio de Janeiro RJ 1818 Museu do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro Rio de Janeiro RJ 1838 Museu do Instituto Arqueológico, Histórico e

Geográfico de Pernambucano

Recife PE 1862 Museu Paraense Emílio Goeldi Belém PA 1866 Museu Naval Rio de Janeiro RJ 1868 Museu do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas Maceió AL 1869 Museu Paranaense Curitiba PR 1874 Museu de Ciência e Técnica da Escola de Minas da

Universidade Federal de Ouro Preto

Ouro Preto MG 1876 Museu Inaldo de Lyra Neves - Manta Rio de Janeiro RJ 1889 Museu de Numismática Bernardo Ramos Manaus AM 1900

Quadro 01 - Museus cadastrados, fundados até o ano de 1900

Quadro 1 - Museus cadastrados que foram fundados até o ano de 1900. Fonte: Cadastro Nacional de Museus, Brasil, 2010

Existiam vários fatores que excluíam a maior parte da população brasileira, que não era letrada, e não tinha acesso aos círculos fechados de discussão científico-cultural. Portanto, a divulgação da ciência era feita por uma pequena parcela da sociedade, para outra pequena parcela da sociedade. A ideia de museu como uma instituição administrada pelo Estado e voltada para a instrução ganhou terreno na última metade do séc. XIX. Muitos museus foram abertos com objetivos políticos, e com o intuito de manter essa nova ordem, instruir a população18.

As transformações econômicas, sociais e culturais ocorridas nas últimas décadas do século XIX e início do século XX, aliadas aos desdobramentos do período pós Guerra mundial, suscitaram novas questões sobre o papel da educação. O gráfico abaixo demonstra o Crescimento do número de museus, de 1910 até 2009. Observa-se um maior crescimento de museus, a partir da década de 60/70, e um aumento ainda maior dos anos 90 aos anos 2000:

Gráfico 02- Crescimento do número de museus, de 1910 até 2009.

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O Louvre (1793) foi um desses museus, assim como o Belvedere de Viena (1783), o Museu Real dos Países Baixos, em Amsterdam (1808), o Museu do Prado, em Madri (1819), o Altes Museum, em Berlim (1810), e o Museu do Hermitage, em Lenigrado (1852). O termo museu passou a ser aplicado em relação a coleções de objetos de valor histórico e artístico. (SUANO, 1986).

O aumento significativo no número de museus, principalmente no século XX, e o destaque do seu aspecto social/educativo, está associado ao processo de preservação da memória. Nas experiências iniciais de museus, ainda não havia a discussão do museu como um espaço aberto, educativo. No entanto, os museus eram vistos como um ambiente favorável de discussão do uso da educação para o desenvolvimento da sociedade. Isso reforçou seu potencial educativo, e deu início ao processo de institucionalização da sua função educativa.

Os primeiros movimentos que vão identificar e reconhecer o museu como um espaço educativo datam da segunda metade do século XX. Influenciados por uma visão construtivista de educação e inspirado pelas idéias do escolanovismo. Para Cury (2013) o museu há muito tempo tem seu caráter educativo definido, mas teve sua ação por muito tempo mais ligada a pesquisa. A incorporação da comunicação, como elemento constitutivo do museu, junto á pesquisa, conservação, preservação, pode ser visto como um marco de transição, uma nova filiação conceitual e empírica para a instituição.

Não existe um consenso em relação à história das ações educativas nos museus, devido à diversidade de instituições, à natureza dos acervos, assim como as diversas formas de interação que estabelecem com o público, não sendo possível traçarmos uma cronologia única das ações educativas. No Brasil, podemos dizer que elas englobam desde ações pontuais de caráter experimental local até estratégias institucionais e políticas de abrangência nacional. Trata-se de um campo bastante amplo e muito diversificado. Para Alice Bemvenuti (2008): ―a história das ações educativas nos museus brasileiros percorre desde a realização de ações experimentais isoladas até as intenções políticas, inicialmente desenvolvidas em museus de história‖. (BEMVENUTI, 2008, p.23).

O primeiro setor educativo, no Brasil, foi criado em 1927, por Edgard Roquette Pinto19, uma Seção de Assistência ao Ensino de História Natural, no Museu Nacional, antigo Museu Real, já com o intuito de auxiliar a formação escolar oferecendo, porém, uma forma alternativa de ensino, centrado no objeto, uma educação extra-escolar. Um pouco antes desse período, a Semana de Arte Moderna de 1922, movimento cultural que reuniu os principais artistas modernistas brasileiros; questionava: a noção de nação que estava sendo imposta, a exclusão, a desigualdade social brasileira, e o elitismo da arte e sua função social. Nesse contexto, os museus eram vistos como espaços legitimadores do discurso oficial, da ascensão progressiva da burguesia.

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Roquette-Pinto fez parte de um grupo de intelectuais e cientistas, no início do século 20, que tinham como propósito a valorização da pesquisa. Ele desenvolveu atividades de divulgação científica no museu – instituição que, para ele, deveria ter também caráter educativo. (MOREIRA; MASSARANI, ARANHA, 2008).

A educação nos museus, nesse período é usada como sinônimo de educação patrimonial existe uma clara associação da dimensão educativa museal para a valorização do patrimônio cultural brasileiro. Em 1946, é criado o conselho Internacional de Museus (ICOM) e sua vinculação a Organização das Nações Unidas para a Educação a Ciência e a Cultura (UNESCO) é realizada em 1947. A criação dessas instituições e suas possíveis vinculações influenciaram a composição de um cenário museal nacional. Segundo o Relatório de gestão da Política Nacional de Museus (2010):

Se existem gestos divisores de águas no campo museal brasileiro, eles podem ser identificados na criação do Curso de Museus (1932) e na criação da Inspetoria de Monumentos Nacionais (1934), dois acontecimentos já produzidos no âmbito do Museu Histórico Nacional. O primeiro foi responsável pela institucionalização da Museologia e dos estudos de museus no Brasil, enquanto o segundo acabou se tornando um dos embriões do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), criado em 1936. (RELATÓRIO DE GESTÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE MUSEUS, 2010, p. 22)

O aspecto educativo, no Brasil, ganha contornos mais nítidos relacionado com a concepção de que Preservar o Patrimônio Histórico é um ato educativo, em 1936, e foi proposto por Mário de Andrade, no período da criação do anteprojeto de criação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN). Posteriormente, transformado no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional- IPHAN: ―nesse e em outros documentos, Mário de Andrade fez questão de valorizar os pequenos museus, os museus populares, os museus como espaços privilegiados da república e também a dimensão educacional dos museus‖. (IBIDEM, p. 22).

O documento ―A memória do pensamento museológico contemporâneo‖, publicado pelo Comitê Brasileiro do ICOM, organizado por Marcelo Mattos Araújo e Maria Cristina Oliveira Bruno (1995), conta a história do pensamento Museológico Brasileiro entre as décadas de 1950 e 1990. Os eventos considerados mais relevantes para as mudanças sociais/educativas no campo museal são: Seminário Regional da Unesco sobre a função educativa dos museus, ocorrido no Rio de Janeiro em 1958; a Mesa Redonda de Santiago do Chile de 1972; a Declaração de Quebec de 1984 e a Declaração de Caracas de 1992.

A Declaração do Rio de Janeiro foi promovida pelo Seminário Regional da UNESCO. Neste documento, a definição de museu já contém como uma das suas funções, a missão educativa, e a exposição como a principal forma de comunicação. E o responsável pelo trabalho educativo em museus é o ―pedagogo do museu ou um serviço pedagógico, cujo chefe

é ajudado por pedagogos especializados ou não, nas diversas atividades didáticas: visitas guiadas e outras atividades internas ou externas20‖. Sobre a relação entre museu e educação, o documento diz:

O Museu pode trazer muitos benefícios à educação. Esta importância não deixa de crescer. Trata-se de dar à função educativa toda a importância que merece, sem diminuir o nível da instituição, nem colocar em perigo o cumprimento de outras finalidades não menos essenciais: conservação física, investigação científica, deleite, etc (ARAÚJO; BRUNO, 1995, p. 11 apud BERTELLI, 2010, 23).

A publicação do folheto intitulado ―O museu Ideal‖, também em 1958, de Regina Real21, reforça a visão da Declaração do Rio, de uma concepção de museu centrada no objeto, com a função de ilustrar os conteúdos abstratos do ensino escolar. O folheto apresenta o trabalho educativo como um ―serviço complementar‖ dos museus, e indica que o trabalho no educativo deveria ser feito por conservadores ou naturalistas especializados em pedagogia, com o objetivo de: ―a) organizar cursos e conferências; b) orientar visitas guiadas; c) dar atenção especial aos escolares; d) preparar gráficos, selecionar material técnico ou reproduções para escolas e instituições congêneres‖ (REAL, 1958, p. 19-20). Regina aposta em uma colaboração entre Museologia e Pedagogia. As primeiras experiências educativas, no campo museal brasileiro, de maneira institucionalizada, estão relacionadas a concepções pedagógicas.

A reunião de 1958 no Rio, com a finalidade de discutir a função educativa dos museus, é considerada um marco importante no processo de transformação das instituições museológicas na América Latina. Mas é o encontro da Mesa-Redonda de Santiago do Chile, ICOM, 1972. Que demarca um lugar de maior representabilidade do museu. Quando é questionado seu lugar social, e lançada às bases para o movimento em prol da Nova Museologia, e os Princípios de Base do Museu Integral: ―o museu integral proposto na ocasião levava em consideração a totalidade dos problemas da sociedade, pois os museus passam a ser compreendidos como ação e como instrumentos dinâmicos de mudança social‖. (BERTELLI, 2010, p.73).

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Declaração do Rio de Janeiro de 1958 In: Legislação de Museus, IBRAM, 2012, p. 90. 21

Museóloga, formada pelo Curso de Museus do Museu Histórico Nacional, membro do International Council of Museums (ICOM).

A mesa de Santiago teve a influência do pensamento de Paulo Freire, o educador foi convidado para comparecer ao evento, mas não pôde estar presente. No entanto, alguns dos temas abordados na Declaração podem ser filiados as concepções que Freire defendia como importante no cenário educacional: uma educação politizada; a busca de uma liberdade, que da voz aos ―oprimidos‖. Sobre a relevância da mesa de Santiago:

Este encontro propôs mudanças substanciais como a revisão dos estatutos e da definição dos museus; propôs maior ênfase na cooperação internacional entre os museus; afirmou a importância do meio ambiente na vocação dos museus. No entanto, a identificação da dimensão política no conceito dos museus e o questionamento sobre qual seja o papel do museu na sociedade, nortearam e deram o tom para a mesa de Santiago do Chile no ano seguinte. Com a diferença de ter sido realizada em país da América do Sul, no idioma oficial espanhol e juntando museólogos e especialistas das Américas, a mesa redonda, trouxe para o universo dos museus a preocupação com o rumo dos museus no mundo e tentou sintetizar na noção de museu integral todo o potencial político e social dos museus frente a demandas sociais. (BERTELLI, 2010, p.73).

Ainda sobre as reformulações a respeito do papel social dos museus, A Declaração de Québec, 1984, inaugura uma preocupação específica e sistemática a respeito da Nova Museologia, e estabelece as diretrizes deste movimento, retomando questões da Mesa de Santiago. Para Mario Canova Moutinho (1995), a Declaração de Quebec confrontou a comunidade museal com práticas que revelavam uma museologia ativa e aberta ao diálogo. O documento da Declaração de Quebec afirma a função social dos museus e o caráter global de suas intervenções. De acordo com a Declaração:

A museologia deve procurar, num mundo contemporâneo que tenta integrar todos os meios de desenvolvimento, estender suas atribuições e funções tradicionais de identificação, de conservação e de educação, a práticas mais vastas que estes objetivos, para melhor inserir sua ação naquelas ligadas ao meio humano e físico. (ARAÚJO; BRUNO, 1995, p. 30 apud BERTELLI, 2010, 24).

E a Declaração de Caracas, 1992, reforça o museu como um espaço comunicacional. O documento de Caracas traz como função museológica fundamental o processo de comunicação que orienta as atividades específicas do museu, como a coleção, conservação e exibição do patrimônio cultural e natural. Mais do que fontes de informação ou instrumentos de educação, os museus são ―espaços e meios de comunicação que servem ao estabelecimento da interação da comunidade com o processo e com os produtos culturais‖ (HORTA, 1995, p.39 apud BERTELLI, 2010, p.73). Para Maria de Lourdes Horta, em 1992 os museus

―procuram ‗se situar‘, descobrir o seu espaço no território social em que estão inseridos, e enfrentam as dificuldades deste processo‖ (HORTA, 1995, p. 34).

A noção de museu como instrumento de desenvolvimento social; e o surgimento de museus locais, de iniciativa comunitária, desconhecidos antes de 1972. È a noção da função social do museu, que traz a responsabilidade política para o esses espaços. De acordo Hugues de Varine, (1995) que esteve presente na Mesa-Redonda de Santiago, à revisão de estatutos e a afirmação da importância do meio ambiente na vocação dos museus, proporcionou o surgimento da dimensão ―política‖ no conceito de museu. Essas modificações iniciadas na maneira de compreender o papel social dos museus é uma condição essencial para a tentativa de integração dos mesmos à sociedade:

O monólogo transforma-se em diálogo, a função pedagógica (afirmada em 1958 no Rio de Janeiro) transforma-se em ‗missão comprometida‘, não mais com a sociedade, em termos vagos, mas com a comunidade em que estão inseridos, ou em que buscam inserir-se para ter alguma razão de existir (HORTA, 1995, p.34 apud BERTELLI, 2010, 25).

As Declarações consideram que os museus podem e devem desempenhar um papel importante na educação da comunidade. E tornaram-se norteadores das práticas do universo museal brasileiro. No final da década de 70, Aloísio de Magalhães, consolidou o lema ―a