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O lh/qh lh/qh lh/qh pensando a partir da alegoria lh/qh

No documento renataangelopernisa (páginas 78-82)

1.4. O resgate da a)lh/qeia a)lh/qeia a)lh/qeia a)lh/qeia na Alegoria da Caverna

1.4.2 O lh/qh lh/qh lh/qh pensando a partir da alegoria lh/qh

Na interpretação da alegoria que percorremos até aqui, resgatamos a possibilidade de compreendermos a verdade no sentido de a)lh/qeia. A partir dessa perspectiva, continuamos a caminhada buscando também a possível interpretação dos constitutivos dessa perspectiva resgatada, o lh/qh ou não-verdade, e mesmo a sua contra-essência, ou errância.

O modo de conhecimento que fundamenta a verdade na luminosidade da ideia do Bem recebe a sua medida na concordância daquilo que é visto através da luz doada pelo sol. Ao levarmos nosso questionamento a essa relação de concordância que faz a ponte entre o conhecimento e o que é conhecido, nos colocamos em proximidade a um modo de conhecer capaz de perceber a dinâmica que envolve toda a relação de construção de conhecimento. A percepção dessa articulação apresenta uma dimensão aberta que é a possibilidade para que o conhecimento da verdade não se dê somente na presentificação do desvelamento.

A luz irradiada pelo sol harmoniza a forma como nos comportamos diante das coisas e do mundo, perante aquilo que essa claridade nos possibilita ver. O clarear constitui o ser do sol e da ideia do Bem. Ele abre espaço para que as coisas se mostrem em uma modalidade de abertura que não acontece limitada pela ideia de retitude. Seu ser em abertura ocorre partindo de um modo de olhar que não se prende à claridade unicamente. Ele tem a capacidade de enxergar além e perceber a escuridão que está na referência do clarear. Esse jeito de interpretar que recolhe a luminosidade no jogo com a escuridão nos aponta para a essência da

a)lh/qeia como desvelamento e velamento.

A saída da caverna revela ao homem o desvelamento de seu próprio modo de ser. No entanto, nesse seu caminho rumo à verdade, ele também reconhece que pertence à sua constituição o contínuo caminhar em busca da verdade. Por isso, ele necessita permanecer caminhante e sua constituição se mantém aberta no questionamento que não se esgota. Sua busca se dá pela volta à origem. É no contexto de sua originalidade que ele pode se perceber constituído pelo aberto da referência entre o que aclara e o que permanece escuro.

O retorno ao início do pensamento significa retomar o fundo escuro da caverna, ou seja, retomar o sentido do desvelamento a partir de sua relação com o velamento. O escuro presente no fundo da caverna constitui o lh/qh da a)lh/qeia. Ele ambienta a construção do conhecimento através de um início em abertura. Nessa escuridão, o desvelamento da verdade é como um facho de luz que ocorre envolto pelo escuro que vela.

A verdade desvelada no exterior da caverna também desvela nosso ser próprio. E isso não como algo pronto, mas em um modo de ser que ocorre sempre sendo. Logo, a liberdade

abordada no quarto estágio tem o sentido do deixar-ser do homem por ele mesmo, livre de qualquer vinculação. Nessa compreensão livre, passamos ao entendimento das coisas por meio da relação de referência em liberdade de fundamentação. Passamos, assim, à apreensão do conhecimento e de sua verdade não só mediada pela perspectiva da claridade, mas também pela obscuridade que envolve o clareamento. Nessa dinâmica, a não-verdade nos é apresentada como atributo do que fica encoberto, ocultado na escuridão da caverna. Desse modo, enquanto a essência da verdade entendida tradicionalmente confirma o ente como sendo o ser verdadeiro, assume a a)lh/qeia apenas sob o julgo de seu desvelamento.

Aqui, a)lh/qeia e lh/qh não são o mesmo, mas eles acontecem no mesmo evento, sendo cada um o seu ser. O modo de se desvelar o lh/qh é através de sua retração no desvelamento da a)lh/qeia. Ele se dá, assim, sem se revelar totalmente. Sua essenciação ocorre ambientada no mistério que anuncia sua presença, sem que isso signifique sua revelação enquanto tal. Para que seu aceno seja então percebido, é necessário

haver uma apreciação do “positivo” na essência “privativa” da a)lh/qeia. Antes disto, deve-se experimentar esse positivo como o traço fundamental do ser ele mesmo. Primeiramente, é preciso que irrompa a necessidade na qual se torna digno de ser questionado não sempre somente o ente em seu ser, mas pela primeira e única vez o próprio ser (isto é, a diferença). E visto que essa necessidade é iminente, a essência inicial da verdade ainda repousa em seu início velado (HEIDEGGER, 2008a, p. 250).

Essa ambiência que se consagra em um modo diferente de interpretação nos dispõe no mistério e na espera daquilo que nos vem ao encontro, sem que esse se mostre totalmente. Ele permanece velado no escuro e somente se manifesta por apontamentos.

Assim como o prisioneiro retorna para esse horizonte de mistério, nós também nos dispomos no mistério quando abrimos nossa compreensão à sua presença velada. Essa modalidade de compreensão da verdade do ser ocorre ambientada pelo pensar da diferença ontológica. Nela, nossa compreensão da verdade não diferencia a)lh/qeia e lh/qh no contexto da apropriação metafísica, igualando-os. Cada um se revela acolhido em seu próprio modo de ser, sendo junto ao outro. Essa perspectiva compreende a)lh/qeia e lh/qh como diferentes e em reunião porque deixa de pensar somente no âmbito do desvelamento.

Apesar dessa concepção em abertura constituir o início de nossa formação, ou melhor, poder ser encontrado ainda no fundo da caverna de Platão, a totalidade do desvelamento das ideias foi o que efetivou nosso modo de pensar tradicional, consumado a partir de um esquecimento. O esquecimento do lh/qh na referência da essência não essente da verdade confirma a errância como outro constitutivo do sentido de verdade mais originário. Assim, enquanto o caminho ascendente funda a essência da verdade na luz do desvelamento total da

a)lh/qeia e a não-verdade permanece no mistério que envolve o interior da caverna, a errância

se configura no não desenvolvimento da essência não essente da verdade.

Esse não desenvolvimento é o próprio esquecimento do diferir entre o desvelamento e o velamento. Ele coloca em evidência a a)lh/qeia somente como desvelamento. Com isso, mantém o velamento encoberto e o jogo em desenvolvimento. O não pensar da contra essência enquanto constitutiva da formação do conhecimento da verdade põe em firmamento a fundamentação da ideia suprema como a causa primeira de toda a formação de nosso modo de conhecer.

A saída do prisioneiro, narrada na alegoria, marca essa formação condicionada à visibilidade da luminosidade do agaton. Esse atributo do agaton lhe concede a apropriação de fundamento para sua formação. Essa ideia de fundamentação e causa primeira “suscitou por parte dos comentadores, numerosas exegeses. Assim é que ‘à época cristã, nos diz Heidegger, se interpretou o a)laqou de Platão no sentido do summum bonum, isto é, enquanto Deus

creator’” (BOUTOT, 1987, p. 157). A partir daí, o pensamento platônico serve de base para

o pensamento metafísico, dispondo a possibilidade de uma compreensão tanto ontológica, quanto teológica. Nesse contexto, tanto uma como a outra perspectiva são movidas pela mesma busca ao fundamento único.

Enquanto no âmbito ontológico esse fundamento se dá na totalidade do desvelamento do ente, no teológico, a busca é pelo fundamento como a causa primeira e razão de todas as coisas. Aqui,

o objeto originário do pensamento mostra-se como a causa originária, como a causa prima, que corresponde a volta fundamentante à última ratio, ao último prestar contas. O ser do ente somente é representado radicalmente, no sentido do fundamento, como causa sui. Com isto designamos o conceito metafísico de Deus (HEIDEGGER, 2006b, p. 66).

A filosofia, enquanto metafísica, questionadora do ser, privilegia o sentido ontológico em busca do desvelamento do ser. Já a tradição religiosa parte do sentido teológico, se apropriando da ideia do Bem como sendo o fundamento, a causa primeira para sua religiosidade.

Do mesmo modo como a ontologia, interpretada a partir da metafísica, funda a verdade no desvelamento integral do ente e isso, nos deixa aberta a possibilidade de resgatarmos a a)lh/qeia no interior da caverna, podemos também estender nosso olhar a uma interpretação no âmbito de uma dimensão de religiosidade. Nesse modo de apropriação, vamos além da entidade do Bem e nos voltamos para o mistério consagrado em recolha na caverna. Essa disposição perdida junto à origem e no horizonte da a)lh/qeia envolve nossa

busca, assentando-a por um modo de pensar capaz de resgatar um sentido de sagrado perdido nos primórdios do pensamento.

O caminho de nossa interpretação, que tem por escopo relacionar pensamento, poesia e sagrado, buscou, através da constituição do questionamento do ser e de sua verdade, a indicação de como devemos situar nossa interpretação. Uma modalidade de ocorrência perdida nos pilares do pensamento tradicional e que buscamos revigorar através da releitura da Alegoria da Caverna de Platão. A passagem pelo pensamento platônico nos ressaltou a relação entre a formação (paidei/a) do conhecimento do homem e de sua verdade (a)lh/teia), pois para Heidegger,

se não nos contentarmos em traduzir as palavras paidei/a e a)lh/teia apenas de modo “literal” e procurarmos, ao contrário, pensar a partir do saber dos gregos a essência objetiva mencionada nas palavras traduzidas, então “formação” e “verdade” apontam imediatamente para uma unidade essencial (HEIDEGGER, 2008a, p. 230- 31).

É essa unidade que constitui nosso modo de essenciar em abertura. Antes, na interpretação habitual da alegoria, a relação entre a formação da verdade ocorria somente na derivação do desvelamento. Agora, essa relação pode acontecer a partir do sentido da a)lh/qeia. Desconstruímos a formação estabelecida pela tradição ao resgatarmos no interior da caverna a possibilidade de interpretarmos o lh/qh a partir dele mesmo. Uma desconstrução que não é destruição enquanto tal. Mais que isso, a desconstrução representa a desmontagem de uma formação já estabelecida, em prol de uma outra possibilidade de construção. Em vista desse modo de interpretação,

a reflexão de Heidegger sobre Platão é também, e sobretudo, uma reflexão sobre o ponto de partida do pensamento próprio. Por isso é que Heidegger pode acrescentar ao trabalho sobre a teoria platônica da verdade a Carta sobre o humanismo: a tentativa de libertar o próprio pensamento dos mal-entendidos “antropológicos”, metafísicos e humanistas, e de permitir que ele seja visto como o caminho para a verdade do próprio ser (PÖGGELER, 2001, p.105).

Dizer como esse outro modo de caminhar no trajeto do caminho que nos essencia esbarra na questão da linguagem que nos constitui, aponta-nos a continuidade do caminho na indagação por outro modo de abordarmos a verdade, agora, pensada mais originariamente.

No documento renataangelopernisa (páginas 78-82)

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