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2. O SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA SBDC

3.1. O PODER ECONÔMICO NO MERCADO

3.1.4 Estruturas de mercado

3.1.4.3 Oligopólio e oligopsônio

A multiplicidade de produtores observada nos mercados perfeitamente competitivos não é observada nos oligopólios. Consoante Frederico do Valle Magalhães Marques, os mercados de oligopólio distinguem-se pela presença de um número pequeno de fornecedores ou quando se verifica um grupo restrito de produtores que controla a maior parte da produção, ao lado de diversos concorrentes desprovidos de influência significativa nas condições de mercado229.

Essa estrutura de mercado, afirma Fábio Nusdeo230, apresenta grande instabilidade. Um prognóstico razoável de seus comportamentos é difícil de obter-se. Ana Maria Nusdeo revela que a razão dessa complexidade reside no fato de existirem diversos comportamentos racionais para as empresas, diferentemente do verificado nos regimes de concorrência perfeita ou de monopólio.

Uma das preocupações surgidas para a autoridade concorrencial ao se deparar com os mercados oligopolizados, segundo Frederico do Valle Magalhães Marques231, é o surgimento de uma estrutura de incentivos que estimula a formação do cartel – o acordo entre os produtores para limitar ou anular competição no afã de obter lucros acima do padrão competitivo232.

Segundo Eduardo Gaban e Juliana Oliveira, a prática do cartel afeta negativamente o bem-estar do consumidor, pois torna possível a elevação dos preços a níveis supracompetitivos, gerando a transferência de renda do comprador para os produtores, além de desestimular a eficiência econômica233.

Ademais, a configuração de oligopólio torna factível a adoção de práticas restritivas da concorrência em razão do comportamento interdependente, o qual dispensa a existência de acordos expressos entre os produtores. Conforme Ana Maria Nusdeo234, o acompanhamento

229 NUSDEO, Ana Maria de Oliveira. Defesa da concorrência e globalização econômica: o controle de concentração de empresas. São Paulo: Malheiros Editores, 2002. p. 35-38.

230 NUSDEO, Fábio. Curso de economia: introdução ao direito econômico. 6.ed.rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 271.

231 MARQUES, Frederico do Valle Magalhães. Direito internacional da concorrência. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 118.

232 GABAN, Eduardo Molan; DOMINGUES, Juliana Oliveira. Direito antitruste. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 104.

233 GABAN, Eduardo Molan; DOMINGUES, Juliana Oliveira. Direito antitruste. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 159.

234 NUSDEO, Ana Maria de Oliveira. Defesa da concorrência e globalização econômica: o controle de concentração de empresas. São Paulo: Malheiros Editores, 2002. p. 36-37.

recíproco do comportamento dos concorrentes permite que esses agentes econômicos estabeleçam um preço de mercado similar ao qual se fixaria em regime de monopólio.

No tocante ao oligopsônios, é interessante notar, como faz Sérgio Varela Bruna235, que, se o oligopólio é o domínio da oferta por um pequeno grupo de produtores, o oligopsônio corresponde ao controle do mercado do lado da demanda por um conjunto limitado de compradores. Segundo Varela Bruna, a ambição dos compradores é idêntica a dos fornecedores, ou seja, ambos buscam a maximização da utilidade de seus recursos. No oligopsônio, os compradores tenderão a diminuir a demanda para forçar uma redução nos preços dos produtos. Assim, o preço de mercado situar-se-á em nível abaixo do preço de equilíbrio.

3.1.4.4 Monopólios e monopsônio

Se nos mercados oligopolizados a multiplicidade de agentes econômicos, típica dos regimes concorrencialmente perfeitos, sofre fortes abalos, nas estruturas monopolizadas esse elemento sequer se identifica. Para Robert Cooter e Thomas Ullen236, o monopólio é o extremo oposto do mercado perfeitamente competitivo.

Consoante às ideias de Calixto Salomão Filho237, pode-se definir o monopólio como o regime de mercado no qual apenas um agente econômico exerce influência sensível na oferta de produtos e controla, dessa maneira, o preço. Isso quer dizer que o monopolista não necessita deter uma participação de mercado de 100%. As condições para instalação do monopólio são a existência de um produtor com grande market share e a ausência de competidores ou concorrentes atomizados sem poder de influência sobre o preço de mercado238.

A concentração de poder econômico no monopolista pode acarretar em um custo social239 elevado para os consumidores e para sociedade quando essa capacidade é usada de

235 BRUNA, Sérgio Varella. O poder econômico e a conceituação do abuso em seu exercício. 1.ed. 2.tir. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001. p. 54-56.

236 COOTER, Robert; Ulen, Thomas.Law & Economics.5.ed. Boston: Pearson Education, Inc., 2008. p. 301. 237 SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito concorrencial: as estruturas. 3.ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007. P. 61

238O conceito de custo social do monopólio é dado por Herbert Hovenkamp: “For antitrust purposes, the social cost of the monopoly is equal to the loss produced by monopoly pricing and monopoly behavior, minus any social gains that monopoly produces.” (HOVENKAMP, Hebert. The antitrust enterprise: principles and execution. Cambridge, Harvard University, 2005. P.18).

239 SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito concorrencial: as estruturas. 3.ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007. p. 145-147.

modo predatório. Alguns dos efeitos negativos do monopólio e da racionalidade do monopolista foram temas tratados em tópicos anteriores a este capítulo240.

Além da redução do excedente do consumidor, da criação do peso morto e da ineficiência alocativa, outro efeito negativo do monopólio predatório, ressalta Frederico Valle Magalhães Marques241, consiste no desincentivo à pesquisa e ao desenvolvimento de novas tecnologias, processos produtivos e mercadorias.

Em relação ao monopsônio, a exemplo do que foi dito sobre o oligopsônio, esse fenômeno corresponde ao domínio do mercado por um agente por meio do controle da demanda por um único comprador. Idêntica lógica de maximização dos lucros afeta ao monopsionista, que tentará agigantar seus lucros impondo uma diminuição do preço de mercado pela baixa artificial da demanda. É conveniente notar que há uma tendência de que as empresas em monopsônio não repassem a redução de custos aos consumidores finais242.

3.1.4.5 Monopólio bilateral

O modelo de monopólio bilateral corresponde ao mercado no qual tanto a oferta quanto a demanda estão sob o controle, respectivamente, de um único produtor ou de um singular comprador. Para Ana Maria Nusdeo243, esse arranjo permite que os agentes econômicos acordem práticas contra a concorrência, auferindo lucros superiores ao padrão competitivo, por exemplo, partilhando o lucro obtido pelo monopolista dos consumidores finais. A autora informa ainda que esse regime de mercado ocorre com muita raridade, mas seria factível a sua presença em setores de atividade econômica de alta tecnologia, nos quais as matérias-primas não possam ser destinadas a mais de uma empresa em uma região qualquer.

3.2 A CONCENTRAÇÃO ECONÔMICA

Neste capítulo, foram feitas observações no sentido dos benefícios do mercado perfeitamente competitivo e dos potenciais efeitos deletérios advindos da concentração

240 Vide o § 3º. Exercício do poder de mercado desta seção.

241 MARQUES, Frederico do Valle Magalhães. Direito internacional da concorrência. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 121-122.

242 BRUNA, Sérgio Varella. O poder econômico e a conceituação do abuso em seu exercício. 1.ed. 2.tir. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001. p. 55.

243 NUSDEO, Ana Maria de Oliveira. Defesa da concorrência e globalização econômica: o controle de concentração de empresas. São Paulo: Malheiros Editores, 2002. p.41.

econômica, especialmente quando se dá na forma de monopólio. Dessa forma, a princípio, o mercado de concorrência perfeita constituiria o parâmetro de avaliação das configurações mercadológicas existentes, bem como o direito concorrencial deveria colocar-se de forma ancilar a essa estrutura e fazê-la sua meta maior. Porém a análise econômica e jurídica das concentrações econômicas foge da trivialidade.

Supostamente, à época do capitalismo nascente, a atomização do poder econômico era uma realidade, visto que o processo produtivo não demandava um aporte elevado de capital. A simplicidade da tecnologia, os tamanhos reduzidos das unidades produtivas, entre outros fatores, possibilitavam com facilidade o acesso de novos agentes a um determinado mercado quando esse indicasse negócios promissores. Todavia, o século XIX teria sido palco de uma transformação significativa da empresa. Do caráter atomístico migrou-se para a tendência à concentração244.

Esse processo de concentração relacionar-se-ia com o fenômeno da economia de escala – o qual configura a diminuição do custo unitário da produção de um bem na proporção em que se amplia a escala de produção. Consoante Ana Maria de Oliveira Nusdeo, o processo concentrador constituiria uma característica intrínseca ao desenvolvimento científico inaugurado pela Revolução Industrial. Todavia, essa suposta era de ouro da concorrência perfeita, de acordo com Joseph A. Schumpeter, nunca foi uma realidade. 245

Outra conjectura que sofre abalos é a de que os monopólios são essencialmente negativos para a sociedade. De acordo com Schumpeter, a análise dos dados econômicos dos Estados Unidos sugere que a média de crescimento produtivo não diminuiu a partir de 1890, quando as grandes empresas passaram a prevalecer nos mercados e por um período atuaram quase sem amarras. Segundo este autor, nesse período também se observou uma elevação dos padrões de consumo e bem-estar das massas no referido país com a contribuição dos grandes empreendimentos246.

Diante dessas ponderações, deve-se ter em mente, quando exercer o controle dos atos de concentração, que a principal força motriz sistema de mercados não é equilíbrio estático.

244 FONSECA, João Bosco Leopoldino da. Direito econômico. 5. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2004. p.15.

245 Schumpeter retrata que a suposição de uma era na qual a concorrência perfeita era preponderante não se confirma pela análise empírica. Em seus termos: “First, this involves the creation of an entirely imaginary golden age of perfect competition that at some time somehow metamorphosed itself into the monopolistic age, whereas it is quite clear that perfect competition has at no time been more of a reality than it is at present”. (SCHUMPETER, Joseph A. Capitalism, Socialism, and Democracy. [Kindle Edition] 2.ed. . Floyd: Wilder Publications, Inc., 2013. Posição 1789-1791).

246 SCHUMPETER, Joseph A. Capitalism, Socialism, and Democracy. [Kindle Edition] 2.ed. . Floyd: Wilder Publications, Inc., 2013.

Na verdade, o capitalismo é um processo evolutivo247. O capitalismo, segundo Schumpeter, constitui um método econômico de mudança que nunca pode ser parado.

Schumpeter afirma que a força motriz principal do capitalismo advém da conquista de novos consumidores, da introdução de novos métodos produtivos e de transporte, da abertura de novos mercados e do desenvolvimento de novos modelos de organização industrial concebidos pela empresa capitalista, que modificam ininterruptamente a configuração da economia por ação endógena. Dessa forma, o capitalismo, sem descanso, oblitera o passado à medida que faz surgir o novo. Esse processo denomina-se “destruição criadora”248.

Dessa forma, sem descurar dos eventuais efeitos negativos da concentração econômica, faz-se necessário sempre ponderar os potenciais ganhos sociais, especialmente de inovação e desenvolvimento, que esse tipo de operação tem potencial para originar.

3.2.1 Conceito

O art. 90 da Lei 12.529/2011249 enumera, para fins concorrenciais, quais são os tipos de práticas que são considerados atos de concentração econômica. De acordo com análise desse dispositivo e ponderando observações realizadas por Calixto Salomão Filho250, pode-se afirmar que, sob o ponto de vista do direito antitruste e em razão da consequência econômica da operação, existem duas modalidades de classificação desses atos: a concentração e a cooperação econômicas.

Segundo Bruno Leal Rodrigues251, é importante destacar que, independentemente da espécie de concentração, o elemento fundamental para determinar a relevância de uma ação

247“The essential point to grasp is that in dealing with capitalism we are dealing with an evolutionary process.” (SCHUMPETER, Joseph A. Capitalism, Socialism, and Democracy. [Kindle Edition] 2.ed. . Floyd: Wilder Publications, Inc., 2013. Posição 1813-1814).

248 “This process of Creative Destruction is the essential fact about capitalism.” (SCHUMPETER, Joseph A. Capitalism, Socialism, and Democracy. [Kindle Edition] 2.ed. . Floyd: Wilder Publications, Inc., 2013. Posição 1830-1831).

249 Art. 90. Para os efeitos do art. 88 desta Lei, realiza-se um ato de concentração quando: “I - 2 (duas) ou mais empresas anteriormente independentes se fundem;

II - 1 (uma) ou mais empresas adquirem, direta ou indiretamente, por compra ou permuta de ações, quotas, títulos ou valores mobiliários conversíveis em ações, ou ativos, tangíveis ou intangíveis, por via contratual ou por qualquer outro meio ou forma, o controle ou partes de uma ou outras empresas;

III - 1 (uma) ou mais empresas incorporam outra ou outras empresas; ou

IV - 2 (duas) ou mais empresas celebram contrato associativo, consórcio ou joint venture”.

250 SALOMÃO FILHO, Calixto. Regulação e concorrência: estudos e pareceres. São Paulo Malheiros Editores, 2002. p. 89-91.

251 RODRIGUES, Bruno Leal. Direito da concorrência, concentração de empresas e eficiência econômica, a aprovação de atos de concentração horizontal por eficiências compensatórias. 2006. 323f. Dissertação (Pós- Graduação Stricto Sensu em Direito) – Universidade Gama Filho, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. p. 68.

para o direito antitruste consiste na capacidade dessa de unificar, de forma não transitória, agentes econômicos, anteriormente autônomos, a um único centro decisão por força de controle ou influência.

Para o direito concorrencial, a roupagem jurídica de uma operação de controle não determina a pertinência ou não para o controle de estruturas, porque a alteração das condições de mercado pode ocorrer em razão de mudanças na composição das sociedades empresariais, como também por contratos com impactos societários inexistentes. Para análise antitruste, as consequências econômicas dos atos são os fatores determinantes da relevância concorrencial.

Neste ponto, ressalta-se que a noção de controle é diferente para os direitos antitruste e societário, conforme Calixto Salomão Filho. Para este “a noção de controle é relacionada com a possibilidade de dispor dos ativos e dos dividendos da sociedade. Tal decisão pode não ter impacto algum sobre como a sociedade atua no mercado”252.

Por sua vez, ainda consoante Salomão Filho, o direito concorrencial brasileiro considera o controle sob o ponto de vista bem mais aberto do que o do direito societário. Para a autoridade antitruste, a ideia de controle vincula-se à aptidão para decidir sobre o comportamento da empresa no mercado.

Por essa razão, o controle estrutural no mercado exercido pelo direito antitruste nacional atua de duas formas. A primeira delas constitui o controle de concentrações econômicas e a segunda refere-se ao controle de cooperação econômica253.

Salomão Filho ainda informa que a concentração econômica resulta da ação de uma influência dominante a qual unifica as decisões relativas à atuação nos mercados das empresas integradas. Por sua vez, para esse autor, a cooperação econômica acontece quando há o surgimento de uma influência relevante capaz de coordenar as condutas mercadológicas das empresas congregadas.

3.2.2 Causas

As razões pelas quais as empresas concentram-se são múltiplas e de diversas naturezas. Não é possível especificar todos os motivos pelos quais esse fenômeno acontece. Também é necessário dizer que as causas subjetivas conducentes à aglutinação empresarial não definem a licitude ou ilicitude do ato. Para o direito antitruste brasileiro, a legalidade da

252 SALOMÃO FILHO, Calixto. Regulação e concorrência: estudos e pareceres. São Paulo Malheiros Editores, 2002. p. 89

253 SALOMÃO FILHO, Calixto. Regulação e concorrência: estudos e pareceres. São Paulo Malheiros Editores, 2002. p. 93.

operação está condicionada aos efeitos dela nas estruturas mercadológicas. Salienta-se que, pela perspectiva da sociedade, as concentrações podem gerar ganhos ou perdas sociais, isto é, tem o condão de serem positivas ou negativas para todos.

A despeito da advertência a respeito da impossibilidade de identificar-se todas razões pelas quais os player reúnem-se, enumera-se, com base em Bruno Leal Rodrigues254, causas de quatro ordens: ganhos de eficiências produtivas; introdução em um novo mercado ou expansão de mercado; proveitos financeiros ou cumprimento de planejamento fiscal; e obtenção de poder econômico.