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Probabilidade do exercício do poder econômico no mercado

2. O SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA SBDC

3.1. O PODER ECONÔMICO NO MERCADO

3.1.2 A definição do poder econômico no mercado

3.1.2.3 Probabilidade do exercício do poder econômico no mercado

Uma vez identificada que a empresa originada do ato de concentração possuirá uma participação no mercado relevante capaz de possibilitar o uso de poder de mercado, faz-se necessário verificar se existem fatores que restringem o possível exercício de poder de mercado pela nova firma177.

O Guia para Análise Econômica de Atos de Concentração Horizontal estipula que o primeiro fator a limitar o poder de mercado de uma empresa é a perspectiva de importações inibirem o agente concentrado. Ponderando um cenário anterior à concentração, a autoridade antitruste examinará em que medida uma elevação de preços estimularia a substituição do bem local pelo produto importado. Essa investigação pondera fatores pertinentes ao custo de transporte, à existência de barreiras tarifárias e não tarifárias e aos hábitos dos consumidores.

176 O Guia para Análise Econômica de Atos de Concentração Horizontal determina : “36. Critérios. Os critérios para identificar se a concentração gera o controle de parcela de mercado suficientemente alta são os seguintes: (a) A SEAE e a SDE considerarão que uma concentração gera o controle de parcela de mercado suficientemente alta para viabilizar o exercício unilateral do poder de mercado sempre que resultar em uma participação igual ou superior a 20% do mercado relevante (art. 20, §2º, da Lei nº 8.884/94);

(b) A SEAE e a SDE considerarão que uma concentração gera o controle de parcela de mercado suficientemente alta para viabilizar o exercício coordenado de poder de mercado sempre que: · a concentração tornar a soma da participação de mercado das quatro maiores empresas (C4) igual ou superior a 75% ; e a participação da nova empresa formada for igual ou superior a 10% do mercado relevante”.

177 GABAN, Eduardo Molan; DOMINGUES, Juliana Oliveira. Direito antitruste. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 100.

Conforme Bruno Leal Rodrigues178, é necessário assinalar que as importações somente terão o condão de restringir o exercício do poder econômico se elas não foram consideradas na delimitação do mercado relevante179. Dessa forma, nos casos em que os produtos importados já fazem parte do mercado relevante do produto ou o mercado relevante geográfico é internacional, não é adequado tomá-las como limite ao uso do poder de mercado.

Assim, como consta no Guia para Análise Econômica de Atos de Concentração Horizontal, nos casos em que o bem importado tem condições de substituir o produto local em razão de uma elevação de preços, verifica-se que a empresa concentrada não permanecerá livre para exercer seu poder de mercado, por conseguinte, o ato de concentração não prejudicaria as estruturas de mercado.

O segundo elemento, consoante o Guia, capaz de conter o uso do poder econômico, é a probabilidade da entrada de novos concorrentes no mercado. Gesner Oliveira e João Grandino Rodas informam que esse fator denomina-se contestabilidade e para verificar o seu nível nos mercados faz-se necessário averiguar as barreiras à entrada180.

Rodas e Oliveira informam que as barreiras à entrada correspondem às circunstâncias que possibilitariam às empresas presentes em certo mercado relevante auferirem lucros extraordinários sem estimular a entrada de novos competidores181.

Em outros termos, conceituam-se as barreiras à entrada como os fatores em dado mercado que tragam desvantagens a um potencial concorrente, em comparação com os competidores já firmados. São exemplos de barreiras: economias de escala, economias de escopo, custos fixos elevados, custos irrecuperáveis, nível de lealdade do consumidor, tecnologia de difícil acesso e elevada integração da cadeia de produção182.

A entrada de novos competidores pode atuar como um fator de erosão do exercício do poder de mercado, porque os agentes econômicos não elevarão os preços dos seus,

178 RODRIGUES, Bruno Leal. Direito da concorrência, concentração de empresas e eficiência econômica, a aprovação de atos de concentração horizontal por eficiências compensatórias. 2006. 323f. Dissertação (Pós- Graduação Stricto Sensu em Direito) – Universidade Gama Filho, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. p. 105.

179 No Ato de Concentração n.º 08700.009882/2012-35 relativo à operação entre Munksjö AB (“Munksjo”) e Ahlstrom Corporation (“Ahlstrom”), SD ponderou que o mercado geográfico do dos produtos papel decorativo do tipo PRIP, bases para abrasivos de papel e papéis eletrotécnicos teria um mercado de abrangência global, logo, as importações não obstariam o eventual exercício de poder de mercado.

180 OLIVEIRA, Gesner; RODAS, João Grandino. Direito e economia da concorrência. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 122.

181 OLIVEIRA, Gesner; RODAS, João Grandino. Direito e economia da concorrência. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 122.

182 GABAN, Eduardo Molan; DOMINGUES, Juliana Oliveira. Direito antitruste. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 100.

antecipando a entrada de novos competidores183. Conforme o Guia para Análise Econômica de Atos de Concentração Horizontal, a concorrência potencial somente configura um efetivo limite ao abuso de pode econômico se a entrada for provável, tempestiva e suficiente.

De acordo com Guia, a entrada provável é aquela economicamente lucrativa a preços pré-concentração e quando o potencial entrante possam assegurar esses preços.

No tocante à tempestividade da entrada, faz-se imperativo que os potenciais competidores possam entrar no mercado no período de dois anos – conforme o Guia –, abrangendo desde os planos iniciais até o impacto efetivo no mercado.

A entrada suficiente deve ser aquela capaz de restabelecer os preços ao patamar pré- concentração. No entendimento do Guia, é suficiente quando possibilitar que todas as oportunidades de comercialização sejam apropriadamente exploradas pelos virtuais entrantes.

Nas hipóteses em que a operação de concentração redunda em aumento de poder de mercado aos agentes envolvidos, se não existirem barreiras à entrada, não há necessidade de qualquer intervenção da autoridade antitruste por meio do direito da concorrência, porquanto nesses casos os mecanismos de mercado promoverão a correção da situação, mesmo que logo após o ato de concentração o efeito seja a criação ou o aumento do poder de mercado dos agentes envolvidos184.

Nas ocasiões em que se vislumbrem a existência de barreiras à entrada capazes de obstar a entrada provável, tempestiva e suficiente, o Guia, no ponto 60, indica o exame da rivalidade entre as firmas para avaliar o possível exercício de poder econômico de forma individual ou concertada. Isto é, sem o fator inibidor de potenciais novos entrantes, para averiguar. O Guia considera que uma competição efetiva entre a empresa concentrada e os outros players já atuantes no mercado pode desestimular eficazmente a prática abusiva de poder econômico por parte do novo agente.

Isto posto, consoante Bruno Leal Rodrigues, deve-se analisar a real possibilidade dos players atuarem impedindo o exercício abusivo do poder econômico ou se, após a

183 RODRIGUES, Bruno Leal. Direito da concorrência, concentração de empresas e eficiência econômica, a aprovação de atos de concentração horizontal por eficiências compensatórias. 2006. 323f. Dissertação (Pós- Graduação Stricto Sensu em Direito) – Universidade Gama Filho, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. p. 106.

184 O Guia para Análise Econômica de Atos de Concentração Horizontal põe essa proposição nos seguintes termos: “ 39. O fato de uma concentração envolver uma parcela de mercado suficientemente alta não implica necessariamente que a nova empresa formada exercerá de forma unilateral seu poder de mercado, ou que as empresas coordenarão suas decisões. Nesta seção são apresentados os fatores que determinam se o exercício de poder de mercado é provável”.

concentração, haverá a formação de uma estrutura de mercado favorável ao uso do poder econômico de forma concertada ou unilateral185.

Rodrigues adverte que, no tocante à viabilidade do exercício unilateral de poder econômico, faz-se necessário observar se a empresa concentrada terá o condão de restringir oferta e aumentar os preços dos produtos ou serviços no mercado com base no conjunto de condições, na sua capacidade de produção, nos canais distributivos, nos hábitos do consumidor, entre outros fatores.

O Guia orienta que, em mercados de produtos homogêneos, a avaliação do ato de concentração deve investigar se as empresas remanescentes operam com capacidade produtiva total e a inviabilidade econômica de aumentar a produção em prazo de até dois anos ou se os custos para exercer a capacidade ociosa são maiores do que os praticados na operação do no grau de ocupação atual. Em tais condições, essas empresas não poderão ampliar a oferta de modo suficiente em um lapso temporal satisfatório e haverá a probabilidade de exercício unilateral do poder econômico.

No tocante aos mercados de produtos diferenciados, nos termos do Guia, a perspectiva de uso unilateral do poder de mercado cresce na proporção direta do número de consumidores sem capacidade de adquirir, de agentes econômicos alternativos, produtos substitutos. Nesse particular, importante observar em qual medida a preferência dos consumidores pelos produtos dos agentes em processo de concentração obstará que as empresas remanescentes ganhem parcela do mercado. O poder de mercado aumenta se parte considerável dos consumidores identificar os bens oferecidos pelas empresas concentradas como primeira e segunda escolhas ou se as alternativas forem substitutos distantes . O grau de substituição é menor quando as características técnicas dos produtos são bastante rígidas, caso a marca do produto tenha muito peso na decisão do consumidor, ou se houver dificuldade na compreensão de diferentes arranjos de preço e qualidade ofertados no mercado.

O Guia, também, preocupa-se em identificar quais fatores favorecem o exercício do poder econômico de forma coordenada. A probabilidade de ação combinada entre as empresas aumenta quando se verifica as seguintes condições: (i) há número reduzido de empresas no mercado; (ii) homogeneidade de produtos e/ou das empresas; (iii) acessibilidade a informações relevantes sobre os concorrentes; (iv) existência de práticas empresariais que, ainda quando não necessariamente ilícitas, arrefecem a rivalidade das empresas. Essas

185 RODRIGUES, Bruno Leal. Direito da concorrência, concentração de empresas e eficiência econômica, a aprovação de atos de concentração horizontal por eficiências compensatórias. 2006. 323f. Dissertação (Pós- Graduação Stricto Sensu em Direito) – Universidade Gama Filho, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. p. 107.

circunstâncias aperfeiçoam os mecanismos de arranjo de condutas e de controle de regras, facilitando a aplicação de penalidades para as empresas que fujam dos termos acordados entre os agentes concertados.

O Guia apresenta outros pormenores nos tópicos 65 a 69, que, igualmente, favorecem o acordo entre agentes de mercados. Um dos elementos referidos é a presença de agentes que, em outras oportunidades, já realizaram combinações entre players ou foram submetidos a políticas públicas as quais estimulassem tal classe de conduta, como verbi gratia, o controle de preços. A eliminação de um concorrente agressivo por meio de sua compra por um rival da mesma forma propicia a articulação de comportamentos.

Outro facilitador dos acordos, conforme o Guia, ocorre quando há a estabilidade das condições da oferta e da demanda e a inexistência de incentivos para que os agentes coordenados furem o pacto. Um mercado estável aumenta a probabilidade dos acordos porque favorece a perspectiva de supervisão das práticas concertadas por uma aliança empresarial, que, dessa maneira, poderá punir aqueles desviantes mais eficazmente.

O Guia ainda identifica, nas estruturas verticalizadas, elementos de facilitação no controle da execução dos compromissos entre os acordantes, mormente se essas controlarem canais distributivos ou descomplicarem o monitoramento dos preços de transações comerciais.

Ademais, consoante o Guia, os agrupamentos societários também simplificam as condições de controle, uma vez que tornam mais fácil a circulação de informações.

Os fatores enunciados neste tópico do trabalho (§ 2º. A definição do poder econômico no mercado) fornecem os parâmetros de investigação e identificação se o ato de concentração analisado resultará na formação ou na intensificação do poder econômico da empresa concentrada. Por meio da análise calcada nesses pontos, obtém-se uma indicação das probabilidades do poder econômico unilateralmente ou de modo coordenado.

É importante aduzir, conforme Bruno Leal Rodrigues, que a possibilidade de intervenção do Estado para impedir ou condicionar os atos de concentração somente tem fundamento quando estes resultarem em probabilidade de uso do poder econômico, seja qual for a participação de mercado da empresa concentrada. Assim sendo, a análise econômica sobre as perceptivas do exercício de poder econômico precisa providenciar indicativos que verdadeiramente sustentem a conclusão de que o ato de concentração implicará no surgimento ou elevação do poder de econômico. Dessa forma, a análise deve ser calcada na razoabilidade

das premissas e das previsões aproveitadas no exame e com base em informações empíricas que, de fato, confirmem as resultantes deduções186.