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1.2. As distintas teorias de crescimento e a centralidade do investimento

1.2.3. Os economistas de Cambridge

No que tange à contribuição dos autores pós-keynesianos, na literatura do crescimento econômico, Kaldor (1966, 1968, 1975 e 1977) demonstra a importância do setor industrial para o processo de crescimento econômico. O desenvolvimento da indústria manufatureira acarretaria um progresso tecnológico e elevação da produtividade, fatores esses que transbordariam para as demais atividades da economia e, por conseguinte, promoveriam uma elevação do crescimento em virtude dos estímulos de demanda, gerados por esse setor. Tal fato é retratado em seu trabalho seminal de 1966, demonstrando os fatores para a desaceleração do crescimento do Reino Unido e para as diferentes taxas de crescimento entre os países, sendo esses fatores expostos, por meio das denominadas leis de Kaldor.

A primeira Lei de Kaldor evidencia uma forte relação entre o crescimento do produto manufatureiro e o crescimento do produto. O setor industrial é o vetor de dinamismo das economias capitalistas, seja pelos encadeamentos produtivos intrassetoriais e intersetoriais ou por sua capacidade de difundir inovações e elevar a produtividade total da economia. Essas considerações desdobram-se na segunda lei de Kaldor, conhecida como a lei Kaldor-Verdoorn,

que é a existência de uma intensa relação de causalidade entre a taxa de crescimento da produção manufatureira e o aumento da produtividade desse setor. Em outros termos, os encadeamentos

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Nesse caso o sistema de preços não é apto o suficiente para proporcionar uma previsão adequada desses setores inexplorados. Essas novas inversões não possuíram bases sobre os estímulos, pressões e mudanças relativas dos preços devido serem inexplorados nesses países.

produtivos, isto é, as elevações na produção provenientes de estímulos de demanda por bens industriais, acarretaram, assim, ganhos de escala e aperfeiçoamentos tecnológicos. Pode-se ressaltar que tanto a elevação da renda como os ganhos de escala e progresso técnico são desdobramentos da efetuação de investimentos, uma vez que os novos ativos de capital fixo incorporam uma fração significativa das inovações tecnológicas. O investimento se apresenta, portanto, como o principal mecanismo de transmissão das elevações da produtividade para toda a economia.

Por sua vez, a terceira lei de Kaldor ratifica que, quanto mais rápido o crescimento do produto industrial, mais rápida é a taxa de transferência de mão-de-obra dos setores não manufatureiros para o manufatureiro. Nesse sentido, o crescimento total da produtividade está relacionado positivamente com crescimento do produto e do emprego do setor manufatureiro, e negativamente relacionado ao crescimento do produto e do emprego dos setores não manufatureiros. Destarte, o crescimento do produto industrial é um elemento primordial para a elevação da produtividade total das economias capitalistas. Isto posto, Kaldor (1975) salienta a importância das exportações líquidas de manufaturados, em um primeiro instante com bens de consumo e, posteriormente, por meio de bens de capitais. Essa dinâmica retrata de forma explícita a necessidade da transformação da estrutura produtiva dos países no processo de crescimento, percorrendo uma trajetória crescente do grau de complexidade e de diversidade.

Seguindo essa lógica kaldoriana, Thrilwall (1979 e 1983) fortalece esse pensamento por destacar que as discrepâncias entre as taxas de crescimento dos países no globo devem-se às suas distintas taxas de crescimento de demanda. De acordo com o autor, restrições de demanda seriam a adversidade principal ao crescimento, sendo que, em economias abertas, as restrições no balanço de pagamentos seria a explanação dominante. Advém desse ponto a quarta lei de Kaldor, conhecida também como a lei de Thrilwall, enfatizando a relação entre os constrangimentos no balanço de pagamentos e o crescimento econômico de longo prazo; a taxa de crescimento dos países se aproxima da razão entre a taxa de crescimento das exportações e a elasticidade-renda da demanda por importações. Os constrangimentos no balanço de pagamentos simbolizam, dessa forma, vazamentos de demanda e uma estrutura produtiva insuficientemente diversificada e desenvolvida.

Consequentemente, tal fato acarreta atenuações dos multiplicadores de renda e de emprego, ocasionando a inibição do crescimento. Ademais, retrata a falta de geração de divisas em virtude de uma situação de termos de troca desfavoráveis, impossibilitando as

importações de bens e insumos essenciais para a atividade econômica. O processo de crescimento jaz calcado em uma necessidade de diversificação e sofisticação da estrutura produtiva, perpassando de uma economia exportadora de commodities para uma exportadora de bens de consumo duráveis e de bens de capital. Isso possibilita a superação dos entraves estruturais dos termos de troca desfavoráveis e, portanto, dos constrangimentos na balança de pagamentos15. O elemento chave para o atingimento de tal objetivo é a transformação da estrutura produtiva, ou seja, a variável central é o investimento, posto que é a única com essa capacidade. Embora o investimento não seja o fator de dinamismo no processo de crescimento, este é fundamental para a obtenção de uma estrutura produtiva desenvolvida e integrada, capaz de proporcionar fortes encadeamentos produtivos, impedindo os vazamentos de demanda e as restrições no balanço de pagamentos.

Pasinetti (1981) é outro autor pós-keynesiano que expõe a centralidade da demanda (e do investimento) para o dinamismo entre transformações estruturais e crescimento econômico, por retratar a importância da demanda efetiva para o processo de crescimento16. Em sua obra seminal, Pasinetti (1981) procurou demonstrar, por meio de uma dinâmica multissetorial, a relação das mudanças estruturais e o crescimento econômico das economias avançadas, considerando que, tanto o progresso técnico como o crescimento da produtividade, ocorrem em ritmos distintos pelos setores17. Em sua concepção, a mudança estrutural é uma questão fundamental na dinâmica econômica, sendo que deve ser tratada conjuntamente com processo de crescimento, envolvendo tanto o lado da demanda como o da oferta. De fato, uma das principais contribuições que podem ser extraídas de Pasinetti (1981) é a sua crítica à teoria tradicional do consumo, e a relevância dos padrões de consumo para a dinâmica das transformações estruturais e para o processo de crescimento18.

O autor argumenta que o pleno emprego só será conservado em virtude de alterações na composição da demanda, isto é, pela criação de novos segmentos de consumo. Caso tal fato não ocorra, toda a geração de renda e do processo de acumulação cessará, ocasionando uma estagnação da atividade econômica. Advém desse ponto a importância da evolução dos

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Essa dinâmica seria o esquema de desenvolvimento exposto por Kaldor, fazendo com que as economias subdesenvolvidas superassem o obstáculo do subdesenvolvimento.

16 Sendo este esquema mais direcionado aos países desenvolvidos.

17 Assim, a demanda não cresce de modo proporcional, sendo tal fato fortalecido pela generalização da Lei de Engels para toda a demanda, não se restringindo ao consumo.

18 O enfoque nos aspectos de demanda acarreta duas considerações sobre as modificações no consumo: (i) formação de gostos e aprendizado; (ii) e a formação de novos mercados.

padrões de consumo19 para o crescimento econômico. Essa relação demonstra a necessidade de transformações estruturais para acompanhar a evolução do padrão de consumo, sendo que esse é um movimento concomitante. Contudo, as alterações nos padrões de consumo não ocorrem por si só, recaindo as firmas com suas estratégias de mercado, a implementação de novos produtos por meio das suas decisões de investimentos, seja em maquinário ou em P&D.

Dessa forma, verifica-se o dinamismo e as relações entre a formação (e destruição) de mercados, os padrões de consumo e as transformações na estrutura produtiva; expondo que as alterações estruturais e o crescimento econômico devem ser conciliadas com uma teoria dinâmica do consumo (GUALERZI, 2005, 2012). Em outras palavras, ao se realizar uma base sólida entre a relação crescimento econômico e o consumo, torna-se exequível o estabelecimento de um elo entre a transformação da estrutura produtiva e a demanda efetiva (especialmente no longo prazo) não apenas no nível macro, mas também em nível setorial, verificando os desdobramentos de avanços não balanceados entre os setores, ou seja, os impactos de diferentes estímulos e pressões de demanda e de progresso técnico. Portanto, constata-se a relevância do nível e da composição do investimento para essa dinâmica, uma vez que é ele a variável central, tanto para demanda efetiva como para as transformações na estrutura produtiva.

1.3. A relevância do setor de infraestrutura e de seus investimentos para o crescimento