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LIÇÃO 9 Frase e motivo musical

3.2 PADRÕES DE INTERAÇÃO NAS VÍDEO CONFERÊNCIAS – MÓDULO

3.2.2 Padrão: Facilidade de expressão – Inclusão

Por ter sido esse o padrão que mais vezes apareceu ao longo das vídeo conferências do módulo 1, ele ocupa a maior parte de nossa análise neste módulo. Podemos sintetizar o padrão “facilidade de expressão – inclusão”, como aquele que envolvia: a) explicação ou demonstração do conteúdo por parte do professor; b) oportunidade para que os alunos tirassem dúvidas sobre trechos específicos do exercício ou música e c) execução conjunta do trecho musical ou peça. Um aspecto muito relevante a ser lembrado é que esse padrão envolve o trabalho em grupo, mas ainda não propriamente o trabalho colaborativo, que só ocorrerá quando entrar em cena o “senso de solidariedade”. Na vídeo conferência 2, observamos o padrão “facilidade de expressão- inclusão” no momento em que o professor se colocou como modelo em um exercício que criara naquele instante, com o objetivo de resolver problemas técnicos – digitação e leitura de notas na segunda e terceira cordas. Depois de demonstrar o exercício, o professor

precisou dar um tempo para que os alunos o praticassem, como podemos notar na observação 2 da vídeo conferência 2:

Facilidade de expressão (modelo em técnica). O professor tocou o exercício proposto, que pareceu ser bem compreendido por todos.

Inclusão. Giann esperou que Clara aprendesse as posições e que outros que apresentavam dificuldade treinassem um pouco os movimentos antes de começar. Essa é uma estratégia que facilita a participação dos que têm maior dificuldade. (Um aspecto negativo: mais uma vez, chamou a atenção da aluna Clara. Também pediu que ela tocasse sozinha, já demonstrando certa impaciência).

Nessa observação, procuramos destacar não somente os aspectos positivos, como também uma dificuldade que ocorreu entre o professor e uma aluna. Na vídeo conferência 3, temos mais duas observações em que o mesmo padrão aparece. Abaixo, a observação 1, que aconteceu em um exercício com cordas soltas:

Facilidade de expressão (modelo em técnica, alternância de estratégias) Em melodia elementar (três notas na mesma corda) combinar o modelo em leitura métrica com a execução da linha melódica parece ser muito eficaz.

Inclusão. Apresentar um exercício em partes permite incluir mesmo um aluno com muita dificuldade. (Apesar da dificuldade da aluna, por não ter estudado, o professor procurou não pressioná-la, nitidamente por causa da experiência da semana anterior, com outra aluna).

O professor Giann demonstrou ter aprendido uma lição valiosa, como podemos notar no seguinte trecho do diálogo de avaliação dos professores, quando ele se refere ao modo como agiu diante da dificuldade da aluna Giovanna (Gigi), na vídeo conferência 3:

Paulo: Gigi tocou o sol com o dedo 1. Vc lembra se viu? Vc não chamou atenção pra isso, mas pediu que ela corrigisse a postura, pois o violão precisa "apontar pra o céu".

Giann: Acho que vi sim. Estava tentando não pegar no pé dela. Paulo: Certo.

Giann: Para ela não desistir da aula.

Paulo: Ela estava muito na defensiva, o tempo todo. Giann: Elas estão muito sensíveis.

Ele explica que o motivo de não corrigi-la muito, ou seja, de “não pegar no pé dela”, é justamente para que ela não desista do curso. Ao usar a expressão: “Elas estão

muito sensíveis”, fica patente que o prof. Giann estava com a experiência da vídeo conferência anterior bem viva em sua memória, pois ele estava se referindo a apenas uma aluna (a única presente na vídeo conferência 3) utilizando o pronome no plural: “Elas”. Essa experiência precedente foi registrada na observação 2 da vídeo conferência 2: “Mais uma vez, chamou a atenção da aluna Clara. Também pediu que ela tocasse sozinha, já demonstrando certa impaciência”.

O fato é que o Prof. Giann reconheceu que, na aula anterior, não deveria ter sido tão rígido com a aluna Clara, ainda que tivesse motivos para isso. Tomando por base essa experiência prévia, ele procurou ser mais compreensivo com a aluna Giovanna, apesar de ela nitidamente não ter estudado a lição, assim como acontecera com Clara, na vídeo conferência 2.

Amparado nessas observações, chegamos à terceira lição:

Lição de Interação 3: Para que uma atitude inclusiva seja o mais efetiva possível, o professor deve se predispor a esperar o aluno com dificuldades a assimilar o mínimo necessário para que o exercício seja executado em conjunto com os outros. Não sendo isso possível, é recomendável evitar reprimendas a esse aluno na frente dos outros, e apenas fazer o exercício com quem tiver condições.

Na observação 2 da vídeo conferência 3, encontramos o seguinte relato a respeito do momento em que o professor trabalhou a melodia de Asa Branca:

Facilidade de expressão. Professor como modelo de técnica. A variação de dinâmicas gera interesse: primeiro só observar a partitura enquanto o professor toca, depois olhar o professor enquanto toca. Ajudar o aluno a identificar e corrigir os trechos problemáticos é uma habilidade básica que o professor deve ter.

Inclusão. Tentativa de integrar todos no exercício, inclusive os que estavam com muita dificuldade. Quando não é possível integrar todos, é bom que pelo menos se mantenha algum diálogo direto com os que estão com dificuldade, mas sem interromper muito a atividade do grupo.

Na observação 2 da vídeo conferência 4, aparece mais uma vez o padrão “facilidade de expressão-inclusão”, no trecho em que o professor interagiu com a turma para realizar exercícios melódicos nas últimas cordas do violão (bordões):

Facilidade de expressão. Professor como modelo de técnica. Exercícios de leitura que o professor perceba que são fáceis para a turma parecem não precisar de mais que uma breve explicação para serem executados, no máximo uma leitura rítmica ou métrica.

Inclusão. Quando os alunos estudam os exercícios em casa, ou conseguem fazê-los razoavelmente bem (mesmo sem que tenham estudado), a participação de todos é efetiva (abordagem própria do ensino coletivo se torna possível) e, mesmo quando é preciso fazer comentários sobre dificuldades de alguém (erros de digitação, por exemplo) isso não precisa tomar muito tempo. Ainda na vídeo conferência 4, na observação 6, no momento em que o professor trabalhou a peça Andantino, de Matteo Carcassi, foi registrado o mesmo padrão:

Facilidade de expressão. Aqui aconteceu um padrão interessante, em que o professor imprimiu uma boa dinâmica (apesar de ter que se dirigir individualmente aos alunos, a intervenção promoveu o aprendizado e execução em grupo em pouco tempo): Giann mostrou a parte do violão 2 de Andantino e pediu que Teófilo fizesse sozinho inicialmente. Depois solicitou que Tayrone fizesse a melodia do mesmo trecho, mostrando rapidamente como tocar e pedindo que eles tocassem as duas partes juntos. Eles tocaram. Na seqüência, Giann inverteu as partes: Tayrone foi orientado a tocar o violão 2, enquanto Teófilo faria a melodia. Só explicou a digitação (mão esquerda) que Tayrone tocaria, mas mostrou a Teófilo a melodia tocada. Por fim, definiu que, para tocar a peça inteira, Teófilo ficaria com a melodia e Tayrone com a parte do acompanhamento.

Inclusão. Através de intervenções relativamente rápidas, mesmo com as dificuldades técnicas, o professor os ajudou a definir os papéis individuais para que tocassem a peça juntos (aproximadamente em sete minutos e meio de orientações e demonstrações do professor e treino dos alunos). Se tivesse se fixado muito em detalhes, provavelmente a aula ficaria monótona.

Vale destacar que, nesses dois momentos da vídeo conferência 6, só estavam participando da aula dois alunos, o que certamente facilitou um pouco o gerenciamento das dificuldades que apareceram. Mas o fato é que as ações do professor Giann nos ajudaram a perceber um modo de operar muito particular da abordagem de ensino coletivo, que consiste na objetividade e precisão das intervenções individuais, sem interromper o fluxo das atividades práticas.

Como se pode conferir na observação 2, a situação era mais favorável para o trabalho em grupo, tanto pelos exercícios serem relativamente fáceis para a turma quanto pelo fato de os alunos terem estudado em casa. Já na peça Andantino, de Carcassi, temos

um exemplo primoroso de como a dinâmica da aula coletiva de instrumento deve acontecer. As intervenções do professor foram direcionadas àquilo que era mais urgente e relevante na peça, de modo a manter todos envolvidos na tarefa de tocá-la. Para proporcionar uma idéia melhor do que ocorreu nesse momento tão significativo da aula, apresentamos um trecho da transcrição dos diálogos. Apesar de ser difícil precisar exatamente onde começa um aspecto e começa outro, marcamos os momentos aproximados em que acontecem “facilidade de expressão” e “inclusão”.

Giann: [Facilidade de expressão] Vocês querem tentar passar o Andantino? (...) Vocês estudaram, no vídeo, ela? (Somente Tayrone faz sinal de positivo). Olha, essa segunda parte (violão 2) é só com esses dois dedos aqui, polegar e indicador, olha (toca com os dois dedos nas cordas soltas para demonstrar). Façam só esse dedilhado aí [Inclusão] (continua tocando. Os alunos começam a tocar). Quarta e terceira (cordas). (Deixa os alunos repetirem por uns dez segundos). [Facilidade de expressão] Aí, os dedos aqui, olha (mostra como tocar a parte da mão esquerda). Faça aí, Teófilo, só essa primeira linha.

Teófilo: A de cima ou a de baixo? (violão 1 ou 2)?

Giann: A de baixo (a parte que estava mostrando). O dedo 2 no mi (o aluno olha para a partitura, mas não coloca o dedo no lugar devido). [Inclusão] Dedo 2, Teófilo, no mi. Dedo 2, Teófilo (o aluno coloca o dedo na posição). [Facilidade de expressão] Porque depois, Teófilo, você só vai descer... pra o fá. Depois (...) você vai precisar do fá. Vá lá. [Inclusão] (Teófilo toca o trecho solicitado do jeito que o professor havia feito, mas timidamente). [Facilidade de expressão] Olha, Teófilo, é só isso (mostra de novo o trecho a tocar). Só isso, vá lá. [Inclusão] (Teófilo toca o trecho com um pouco mais de volume). [Facilidade de expressão] Pronto, faça a primeira linha, Tayrone. Só isso aqui, olha (toca a primeira linha da melodia para demonstrar). (...) Contem aí, vocês aí (para começar). 1, 2 [Inclusão] (Giann acaba contando ele mesmo. Os alunos tocam o trecho juntos). Pronto, viu? Se vocês estudassem juntos, era só isso. Agora invertam. Na segunda parte, Tayrone faz ... [Facilidade de expressão] Olha, Tayrone, dedo 3 no dó, você vai fazer a segunda parte (violão 2). (Tayrone não coloca o dedo no lugar devido e Giann repete). Dedo 3, Tayrone, dedo 3.

Tayrone: Sim, segunda parte! (entende somente agora que Giann estava chamando o violão 2 de segunda parte).

Giann: Segunda parte, você vai fazer. E o Teófilo vai fazer a primeira linha (violão 1). (Teófilo olha para Giann como quem está em dúvida e esboça perguntar algo. Giann se antecipa à pergunta). Olha, Teófilo, você só vai fazer isso, Teófilo (Giann toca o trecho da melodia duas vezes para demonstrar). [Inclusão] Faça aí, Teófilo, uma vez (Teófilo toca). Agora vocês dois. Tayrone, já deu pra pegar aí?

Giann: Vamos lá? [Inclusão – momento mais significativo porque os alunos tocam juntos] (Tayrone conta para entrarem juntos e os dois tocam o trecho da melodia. Tayrone erra o baixo do penúltimo acorde, ao invés de sol, toca lá).

Giann: Certo, mais ou menos.

Todos esses diálogos e interações que estão transcritos acima duraram aproximadamente três minutos e meio, o que atesta o quanto as contribuições do professor foram objetivas e precisas, principalmente para ajudar a Teófilo, que, no início desse momento da aula, confessou não ter estudado a música e, por esse motivo, teve mais dificuldade para tocar o trecho. A essa altura, no final do módulo 1, já percebíamos que algo estava acontecendo de maneira muito semelhante às nossas experiências de ensino coletivo de violão presencial: Apesar de terem material didático muito bem organizado, nem todos os alunos estudavam, o que tornava difícil promover o trabalho em grupo logo de início. Em situações assim, a necessidade de inclusão é maior ainda, pois se ignorarmos o aluno que não estudou em casa ele simplesmente ficará assistindo os colegas trabalhando. Por outro lado, tínhamos consciência de que incluir nas atividades, sempre e a todo custo, o aluno que não estudava em casa, provavelmente o deixaria mais relapso. Afinal, se eles percebessem que mesmo sem estudar o professor sempre os ajudaria no momento da vídeo conferência, não seria tão necessário se prepararem durante a semana.

O que podemos notar na transcrição das interações são vários ciclos em que se combinam explicações e demonstrações do professor (facilidade de expressão) seguidos de oportunidades para que os alunos toquem ou tentem tocar os trechos da música demonstrados, primeiro individualmente, e depois em conjunto (inclusão). Um aspecto relevante foi o modo como o professor conseguiu atender aos dois alunos de modo mais ou menos equilibrado, sem concentrar a atenção somente em um ou outro. Apesar de Teófilo, em princípio, ser aquele que deveria receber mais atenção, por não ter estudado em casa, o

professor também teve o cuidado de dedicar o tempo devido para que Tayrone se preparasse para tocar sua parte.

As interações para corrigir a segunda parte da peça Andantino seguem uma dinâmica bem parecida com o trecho anterior (da transcrição), tendo inclusive uma duração semelhante (aproximadamente três minutos e dez segundos). Imediatamente depois de passar a segunda parte da peça com os alunos, o professor pediu para que eles a tocassem na íntegra, sem o ritornello, tarefa que conseguiram realizar sem maiores problemas, em aproximadamente 40 segundos. Podemos resumir a estratégia do professor nessa peça da seguinte maneira: Orientações sobre a parte A; execução, em grupo, da parte A; orientações sobre a parte B; execução, em grupo, da parte B; execução, em grupo, da peça inteira.

Apesar de aparentemente simples, essa dinâmica exigiu decisões e intervenções rápidas do professor e, nesse ponto, devemos confessar que surpreendia-nos a maneira fluida como as interações aconteciam através de uma vídeo conferência. Os problemas de áudio, que vez por outra nos atrapalhavam, não impediam que alunos e professor se entendessem no essencial, fosse através de palavras, de gestos, ou mesmo nas demonstrações práticas. É verdade que, especialmente quando o professor tocava o violão, a qualidade do som que chegava para os alunos não era boa, e escutar detalhes expressivos, as idéias de frases musicais, onde começavam e terminavam, era muito difícil. No entanto, até porque nosso objetivo maior, no módulo 1, era tocar notas e ritmo corretamente, podemos considerar que os resultados alcançados nessa aula, especialmente na peça Andantino, não deixaram a desejar em relação ao que poderia ser feito numa aula presencial.

Tudo que aconteceu nesses dois momentos da aula – exercícios nas últimas cordas e principalmente na música Andantino – fez-nos chegar à outra lição relevante:

Lição de Interação 4: Alternância entre orientações individuais e o trabalho em grupo pode acontecer sem que a aula se torne monótona, desde que, ao fazer essas orientações individuais, o professor seja objetivo e preciso, atenda aos alunos de forma eqüitativa e, assim que seja possível, dê oportunidade para que todos toquem juntos, à medida que aprendem cada trecho da peça musical.