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4. PUBLICIDADE E VIOLAÇÃO À IMAGEM-ATRIBUTO DE GÊNERO

4.4 ANÁLISE DA PUBLICIDADE ATENTATÓRIA À IMAGEM DE GÊNERO

4.4.2 Parâmetros e análise da publicidade de gênero

4.4.2.7 Padrões de beleza

Um tema que costuma estar presente nas análises sobre as questões de gênero na publicidade é o relativo à adoção de rígidos padrões de beleza para as mulheres935. De um modo mais amplo, há a crítica a qualquer construção cultural que trabalhe com estes modelos, a exemplo dos concursos de beleza feminina, havendo grupos feministas que os acusam de serem aberrações que são reflexos dos valores patriarcais936.

Acerca destas críticas, deve-se constatar que o culto ao corpo em diversos âmbitos da vida social tem sido praticado por homens e mulheres há várias décadas, calcado em uma existência dedicada à aparência937. Esta construção cultural acarreta consequências também no âmbito publicitário938, sendo a idealização do corpo fomentada não apenas em relação aos adultos, mas também nas crianças e adolescentes939.

Neste sentido, parece adotar a perspectiva monocular a crítica de que a publicidade apenas exige padrões de beleza femininos. Ao contrário, constata-se que, especialmente a partir dos anos 1990, houve um aumento gradativo na representação publicitária de homens

Disponível em: <http://www.brasilpost.com.br/2015/05/20/transsexuais-campanha-magnum_n_7343054.html>. Acesso em 26 out. 2015; REVISTA FÓRUM. Transexual Brasileira Vira Garota Propaganda de Marca de Cosméticos, 31 ago. 2015. Disponível em: <http://www.revistaforum.com.br/blog/2015/08/transexual-brasileira- vira-garota-propaganda-de-marca-de-cosmeticos/>. Acesso em 26 out. 2015. Interessante notar ainda, em relação à nota de rodapé anterior, que a sugestão de boicote teve efeito contrário: ao passo que o comércio em geral teve queda de 5% nas vendas em relação ao ano que passara, considerando a crise econômica instalada, O Boticário teve alta de 3% (PRAGMATISMO POLÍTICO. Venda de O Boticário Aumentam após Boicote Evangélico, 25 jun. 2015. Disponível em: <http://www.pragmatismopolitico.com.br/2015/06/vendas-de-o-boticario-aumentam- apos-boicote-evangelico.html>. Acesso em 26 out. 2015. Conferir, ainda, a figura 6, no apêndice B.

933 LYSARDO-DIAS, Dylia. A Construção e a Desconstrução de Estereótipos pela Publicidade Brasileira. In:

Stockholm Review of Latin American Studies, n. 2, 2007, p. 26.

934 GIACOMINI FILHO, Gino. Consumidor Versus Propaganda. São Paulo: Summus, 1991, p. 87.

935 ZAMBONI, Júlia Simões. Para Que Serve a Mulher do Anúncio?: um estudo sobre representações de gênero

nas imagens publicitárias. Dissertação (mestrado em Comunicação Social). Universidade de Brasília, Brasília, 2013, p. 68.

936 Conforme constata: RODRÍGUEZ, Francisco Javier Cortazar. Reinas de Belleza y Mr. Músculos: sociología

de la exhibición corporal en concursos de pasarela. Trabalho apresentado no XXVII Congreso de la Asociación Latinoamericana de Sociología. Asociación Latinoamericana de Sociología: Buenos Aires, 2009, p. 10. Disponível em: <http://www.aacademica.com/000-062/2157.pdf>. Acesso em 22 ago. 2015.

937 Ibidem, p. 1-2.

938 Ibidem, p. 3-4. Relacionando o corpo com as mensagens midiáticas (inclusive publicitárias) no esporte:

GABRIELLI, Lourdes; HOFF, Tânia. O corpo nas imagens midiáticas que tematizam o esporte. Revista Galáxia, São Paulo, n. 14, 2007, p. 111-121.

939 BERTOLLI FILHO, Cláudio; TALAMONI, Carolina Biscalquini. Corpo de (Revista) Adolescente. In:

em contextos sexuais e de moda e beleza940. A publicidade teve, inclusive, um papel relevante na mitigação da diferença tradicional do homem “viril” e da mulher com “feminilidade”, desenvolvendo, nas últimas décadas, o modelo de homem metrossexual, que adota algumas das práticas anteriormente reservadas às mulheres941.

Uma pesquisa que analisou quase duzentos anúncios feitos entre os anos de 2002 e 2012 em uma revista voltada ao público masculino (Men’s Health) constatou que os principais valores da publicidade dirigida aos homens são a beleza e a sedução, sendo a maioria dos anúncios relativos à moda e estética942.

Portanto, o culto à beleza de rosto e corpo na publicidade não está relacionado apenas à mulher, mas também ao homem – e cada vez mais presente943 –, sendo algo constatável não apenas neste âmbito social944. A veiculação de homens e mulheres considerados “atraentes” pelo corpo social é feita para transferir uma mensagem positiva, tendo em vista que eles ativam nas pessoas sentimentos de coisas “boas”, aumentando a estima pelo produto ou serviço945. Deste modo, entende-se que apenas haveria violação à igualdade caso a exigência do padrão de beleza fosse estabelecida em relação a um dos gêneros, o que não ocorre.

A publicidade observa a sociedade e reflete seus valores, vindo a reforçar (retroalimentar) as construções sociais vigentes946. Neste sentido, as campanhas publicitárias não podem responder completamente por valores emergentes. O âmbito publicitário convive com o dilema de que, se “forçar” o desfazimento de estereótipos em suas campanhas, pode perder parte do seu público-alvo947. O ponto negativo é que, caso não seja realizado este processo de desconstrução, acarreta-se a retroalimentação de determinado padrão de beleza, atingindo os indivíduos com características não abarcadas pelo paradigma.

Sobre o tema, interessante notar que, em Kant, ideia de beleza das pessoas pauta-se nos padrões médios de uma sociedade948. Contudo, sua afirmação foi feita em uma época em

940 HOFF, Tânia Marcia Cezar. Corpo Masculino: publicidade e imaginário. Revista Eletrônica E-Compós, v. 1,

2004, p. 5-6. Disponível em: <http://compos.org.br/seer/index.php/e-compos/article/view/24/25>. Acesso em 12 set. 2015.

941 SILVA, Ricardo André de Barros. A Publicidade e um Novo Gênero Masculino. Dissertação (mestrado em

Publicidade e Marketing). Instituto Politécnico de Lisboa, Lisboa, 2013, p. 17-18.

942

Ibidem, p. 108.

943 SHEEHAN, Kim. Controversies in Contemporary Advertising. 2. ed. Los Angeles: Sage, 2014, p. 97. 944 Ibidem, p. 95.

945 Ibidem, p. 102. 946

SILVA, op. cit., p. 16-17.

947 Em sentido próximo, Ricardo André de Barros Silva afirma: “No entanto a publicidade raramente se distancia

dos estereótipos e o intermédio não existe. Daí as novas categorias de gênero que vão surgindo voltam a ser estereotipadas, pois se um homem usa algo que está conotado como pertencente à mulher ou vice-versa, já é estereotipado como homossexual” (ibidem, p. 103).

948 KANT, Imannuel. Crítica da Faculdade do Juízo. Valerio Rohden; Antonio Marques (trad.). 2. ed. Rio de

que a mídia não tinha o poder que tem atualmente, ou mesmo as sociedades não possuíam o grau de heterogeneidade visualizado nos dias presentes, onde o comum é que parâmetro de beleza seja estabelecido fora da média da população.

O que se pretende demonstrar da exposição feita é que a questão do padrão de beleza, embora possa ser um tema afeito à abusividade na publicidade – acarretando desrespeito à imagem-atributo de coletividade não abarcada no paradigma estético por ausência de representação adequada949 –, não tem relação direta com a igualdade de gênero, tendo em vista que todos os corpos costumam ser idealizados na publicidade e não apenas os femininos. Assim, a constatação de que a publicidade voltada para o público feminino está, em geral, calcada no padrão de beleza da mulher jovem, alta, magra e com seios fartos950 não implica violação à igualdade de gênero, tendo em vista que padrões estéticos rigorosos também são demandados relativamente aos homens.