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JOÃO CASQUEIRA CARDOSO

PROFESSOR ASSOCIADO

FACULDADE DE CIêNCIAS HUmANAS E SOCIAIS

DA UNIVERSIDADE FERNANDO PESSOA, PORTO · PORTUGAL

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RESUmO

Esta comunicação sublinha os novos desafios do Direito da Saúde (im- plementação do Regulamento Sanitário Internacional — OMS) como instrumento de paz. Apresenta primeiro o contexto global do Direito da Saúde, numa perspectiva comparada. A seguir aborda questões es- pecíficas, como a atenção dada às necessidades das populações mais vulneráveis, em particular os refugiados e as crianças. Trata-se de uma oportunidade de apresentar o projecto SOCHIR, um projecto ligando direitos sociais e direitos das crianças numa perspectiva de Ciências Sociais e de Direito Comparado, no seio da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

ABSTRACT

This communication emphasizes the new challenges of Health Law (following the in progress implementation process of the Internation- al Health Regulations — WHO) as a tool for peace. It first presents the global context of Health Law in a comparative perspective. It then turns to specific issues, such as the attention to the needs of vulnerable populations, in particular refugees and children. It is an opportunity to present the SOCHIR project, a project linking social and child rights in a social science and comparative law perspective within the Com- munity of Portuguese Speaking Countries (CPLP).

1. CONTExTO: OS REGULAMENTOS SANITÁRIOS INTERNACIONAIS

O Regulamento sanitário internacional (RSI) foi publicado primeira vez em 1969. A este momento, a pergunta da paz

internacional e as minorias era um assunto internacional de-

licado, particularmente após a vaga africana descolonização, começando em 1960. Apesar de aprovado pela grande maio- ria dos Estados no mundo, o primeiro RSI desenvolveu pou- co uma perspectiva holística da cooperação internacional de saúde entre os Estados. O novo RSI, adoptado em 2005, tenta mudar radicalmente esta perspectiva limitada. Abre a possi- bilidade de uma perspectiva mais global da coordenação, e de um campo mais completo das acções. Contudo é limitado igualmente.

A) O REGULAMENTO SANITÁRIO INTERNACIONAL DE 1969

O primeiro o RSI tem a sua origem nos regulamentos sani- tários internacionais adaptados nas conferências sanitárias internacionais celebradas na segunda metade do século XIX. O RSI foi adoptado na vigésima-segunda Assembleia mundial da saúde e entra em vigor 1 Janeiro de 1971. Tem sido alterado duas vezes: primeiro, na vigésima sexta Assembleia mundial da saúde em 1973; em segundo lugar, na 34ª Assembleia mun- dial da saúde, em 1981.

A primeira alteração, em 1973, alterou disposições sobre a cólera. A segunda alteração, em 1981, excluiu varíola na lista das doenças notificáveis. Todos os Estados-Membros da OMS, representando um total de 160 estados — menos dois — foram vinculados ao RSI em virtude da sua adesão à Organização mundial da saúde. Alguns Estados partes emitiram reservas, todos que exigindo uma aplicação mais enérgica de medidas

que evitam a propagação da febre amarela. O RSI de 1969 foca quatro doenças notificáveis, ou antes, de acordo com o RSI “as doenças sujeitas ao Regulamento” (as doenças que justificam o quarentena [que] significa a cólera, incluindo a cólera devida ao vibrio El Tor, a peste, a febre amarela, e a variola. Cf. art. 1, RSI de 1969). Em 1980, varíola foi retirado da lista das doen- ças notificáveis.

O RSI de 1969 assenta num equilíbrio pelo qual visa evitar a propagação das doenças epidémicas, e ao mesmo tempo as- segura uma interferência mínima com o comercio mundial. Como diz o seu artigo 23, aqui parafraseado, as medidas sani- tárias permitidas [pelo RSI, 1969] constituem o máximo que um Estado pode exigir em relação ao tráfego internacional para a protecção do seu território contra as doenças sujeitas ao Regulamento. O RSI de 1969 não visa explicitamente popu- lações específicas - como as minorias e mais especificamente os imigrantes. Contudo, define o conceito “da viagem interna- cional” como significando:

a) no caso de um navio ou uma aeronave, uma viagem entre portos ou aeroportos situados nos territórios de mais de um Estado, ou uma viagem entre portos ou aeroportos situados nos territórios de um mesmo Estado, se o referido navio ou aeronave entra em relações com o território de qualquer outro Estado durante a sua viagem, mas apenas no que diz respeito a estas relações;

b) no caso de uma pessoa, uma viagem que comporta a en- trada no território de um Estado, outro que o território do Estado onde esta viagem começa (Cf. art. 1, RSI de 1969). Sobre este aspecto, no que diz respeito às pessoas, limita os documentos de saúde que podem ser exigidos aos viajantes por razões de saúde. O RSI de 1969 relembra que nenhum documento sanitário outro que os referidos no presente regulamento pode ser exigido no tráfego internacional (Cf. art. 81, RSI de 1969).

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CONSTRUIR A PAZ: VISõES INTERDISCIPLINARES E

INTERNACIONAIS SOBRE CONHECImENTOS E PRáTICAS

Os documentos de saúde que podem ser exigidos pelas admi- nistrações nacionais comportam apenas os certificados inter- nacionais de vacinação (de acordo com um modelo fornecido no RSI) contra as três doenças notificaveis. Certificados da vacinação são exigidos eventualmente antes de uma partida (para obter um visto, por exemplo) apenas para as pessoas que provêm de zonas infectados (o art. 30.2 do RSI de 1969 prevê que a autoridade sanitária de uma zona infectada pode exigir dos viajantes à partida um certificado de vacinação válido).

Contudo, e apesar do facto de, no caso dos viajantes inter- nacionais em geral que desejam deixar o seu país, nenhum documento específico de saúde ser exigido pelo RSI, especifi- ca que os migrantes, os nómadas, os trabalhadores sazonais ou as pessoas que participam em agrupamentos periódicos importantes, bem como qualquer navio, em especial os pe- quenos barcos utilizados para o tráfego costeiro internacio- nal, qualquer aeronave, comboio, veiculo camionista ou outro meio de transporte usado, podem ser sujeitos à medidas sani- tárias adicionais conformes com leis e regulamentos de cada um dos Estados interessados e acordos entre os mesmos (Cf. art. 84.1 RSI de 1969). Além disso, uma nota final afirma que “[n]o caso dos viajantes que, embora não imigrantes, no en- tanto tenham a intenção de residir num país durante um pe- ríodo prolongado (como estudantes), o fornecimento de um certificado médico deveria preferivelmente ser uma condição da concessão do visto antes que ser exigido como documento de viagem à chegada”.

B) O NOVO O REGULAMENTO SANITÁRIO INTERNACIONAL DE 2005

O RSI foi revisto e adoptado o 23 de maio de 2005 pela Assem- bleia da OMS, e entrou em vigor a 15 de Junho de 2007. Vin- cula actualmente 194 Estados partes, todos membros da OmS (incluí a Santa Sé, que não é um membro da OMS). Apenas um Estado (o Liechtenstein) permanece fora da OMS e do RSI, e apenas dois Estados partes — a Índia e os Estados Unidos da América — propuseram reservas. O objectivo e o alcance do novo RSI são largos (OMS, 2008). O seu objectivo geral é prevenir a propagação internacional das doenças, proteger-se, dominar e reagir com uma acção de saúde pública proporcio- nada e limitada aos riscos que apresenta para a saúde pública, evitando criar obstáculos inúteis ao tráfego e o comércio inter- nationais (Cf. Introdução, RSI, 2005). Os domínios afectados pela nova execução do RSI incluem onze matérias, cobrindo todos os tipos de doenças (e não somente uma lista restrita das doenças internacionalmente adequadas escolhidas no RSI de 1969). Isto inclui as doenças que são biológicas, químicas ou radionucleares de origem ou de fonte e potencialmente trans- mitidos por pessoas (por exemplo SRAS, gripe, poliomielite, Ebola), mercadorias, alimento, animais (riscos zoonotiques), vectores (por exemplo peste, febre amarela, West Nile Fever), ou ambiente (por exemplo libertações radionucleares, de pro- duto químico ou qualquer outra contaminação) (WHO, 2009). Sempre é pedido comunicar à OmS quatro doenças críticas, em todas as circunstâncias, incluindo: varíola, poliomielite de- vida ao tipo selvagem do vírus da polio, gripe humana provo- cada por novo sub-tipo, e Síndroma respiratória aguda severa (SRAS). O RSI de 2005 exige igualmente a notificação num máximo de 24 horas dos acontecimentos de saúde pública que podem constituir urgências de saúde pública (conhecido sob o nome de PHEIC - Público Health Emergency fora Interna-

cional Concern) (Cf. RSI, Anexo 2). As Partes no RSI de 2005 têm agora papéis e responsabilidades acrescidas, no que diz respeito a aspectos internacionais e nacionais de saúde.

Os Estados partes no RSI de 2005 devem reforçar capacida- des de vigilância e resposta para detectar, avaliar, informar e de reportar acontecimentos de saúde pública junto da OmS e igualmente responder — sobre o terreno, a diferentes níveis (primário, regional ou nacional) — aos riscos e às urgências de saúde pública. A OmS fornece o apoio e ajuda para a avaliação e execução na vigilância e a resposta, mas os Estados devem desempenhar um papel activo, criando e informando a OMS quanto aos organismos competentes e aos procedimentos (por exemplo pontos focais nacionais para a implementação do RSI). A legislação nacional no domínio da saúde é respeitada, mas deve alinhar-se sobre os objectivos do RSI de 2005 (art. 3, do RSI de 2005), respeitando três categorias dos princípios: em primeiro lugar, abordagem de pleno respeito para a dignida- de, direitos do Homem e liberdade fundamental da pessoa, de acordo com os princípios do direito internacional público; em segundo lugar, conformidade com a Carta das Nações Unidas e Constituição da Organização mundial da saúde; em terceiro lugar, aplicação universal do RSI a todas as pessoas do mundo. A execução do novo RSI foi prevista como sendo realizada de forma progressiva. De acordo com o prazo previsto pela OmS, os Estados, com o apoio das estruturas regionais da OmS, de- vem responder às exigências do RSI tão cedo quanto possível, mas não mais tarde do que cinco anos após a sua entrada em vigor (em Junho 2007). O RSI (artigos 5 e 13 do RSI de 2005; art. 2 do Anexo 1 do RSI de 2005) define uma cronologia má- xima que é de dois anos para a avaliação, e de três anos para a execução, do seguinte modo: abordagem, entre o 15 de Junho de 2007 e o 15 de Junho de 2009: este período de dois anos é consagrado à avaliação das estruturas e dos recursos nacio- nais existentes, que devem desenvolver planos de acção; em segundo lugar, entre o 15 de Junho de 2009 e o 15 de Junho de 2012: este período de três anos consistirá na execução destes planos de acção para assegurar que as capacidades dos ponto focais presentes e funcionando em todo o país e/ou os territó- rios adequados.

Este prazo pode ser prolongado ligeiramente, até dois ou mesmo quatro anos, se assim justificado. Embora o novo RSI favorece uma maior cooperação internacional, conserva a an- tiga filosofia do RSI, dando aos Estados margem importante na interpretação e aplicação do mesmo. Baseia-se nos Estados para a disseminação do seu conhecimento, enquanto os es- tudos precedentes indicaram que o RSI continua não muito bem conhecido pelos profissionais da saúde em sectores geo- gráficos onde o número de pessoas vulneráveis é precisamente mais importante (Casqueira Cardoso, 2012).

2. qUESTÕES EM SUSPENSO E O PROJECTO SOCHIR

Numa perspectiva clássica, a questão da saúde como factor de paz diz respeito sobretudo a um tipo de populações, de cariz transnacional: os migrantes, e mais especialmente os refugiados.

O projecto SOCHIR (Social Rights and Child Rights) visa pre- cisamente estudar, no âmbito da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), o modo como este tipo de popula- ção — migrantes em geral, refugiados em particular — e mais especificamente as crianças, podem ver os seus direitos sociais e sanitários garantidos de forma mais eficaz.

Nesta fase de contextualização do projecto, averiguou-se dois aspectos, pelo menos.

VOL 2. TRABALHO, SAÚDE

E MEDIAÇÃO AMBIENTAL

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- Primeiro, a situação dos migrantes implica com efeito sem- pre pelo menos dois tipos específicos de riscos sanitá- rios (ACNUR, 1995):

a) Os riscos de mortalidade como consequência di-

recta de deslocação de população. A deslocação de po-

pulação, e em especial a deslocação em massa de população, apresenta um elevado risco da mortalidade22. Por exemplo, segundo informação do Instituto Nacional de Apoio aos Re- fugiados de Moçambique (Inar), reportado pela ONU, entre Janeiro e maio 2011, morreram 39 migrantes no Centro de Acolhimento de Maratane, na província de Nampula. As ta- xas de mortalidade entre refugiados durante a fase aguda (os primeiros dias e semanas do novo afluxo) da deslocação é extremamente elevado, até 60 vezes as taxas previstas. Isto afecta todos os grupos de idade, mas com um excesso ge- ralmente observado da mortalidade nos grupos de idade de crianças com menos de 14 anos.

b) Há doenças que são causas específicas da morta-

lidade entre migrantes e refugiados. As doenças espe-

cíficas afectam populações de refugiado durante e após a mi- gração. O sarampo, as doenças diarreicas, infecções respira- tórias agudas, como a malária, são os problemas de saúde principais tradicionalmente mencionados. As doenças que não são normalmente mortais podem tornar-se problemas de saúde sérios devidos à desnutrição de proteína-energia e a certas insuficiências de micronutrientes. A falta de água limpa adequada e de higiene, a imunização do sarampo agrava igualmente a situação das populações de migrantes e de refugiados.

Há uma relação causal directa entre a desnutrição e a mor- talidade nas zonas de refugiados. Além disso, a maior parte dos falecimentos referidos refere-se a crianças abaixo de cinco anos de idade. Em 1991, 63 porcento dos falecimentos docu- mentados entre os refugiados Curdos à fronteira do Iraque eram crianças abaixo de 5 anos (ACNUR, 1995). Em alguns casos, os próprios surtos de doenças impendem aos refugiados o repatriamento — como é o caso dos angolanos refugiados em zâmbia.23

Por fim, note-se que doenças específicas podem afectar po- pulações de refugiado como a tuberculose, as doenças trans- mitidas por vectores, as doenças sexualmente transmissíveis (DST) que compreendem o HIV/SIDA, as complicações de gravidez e do parto, e doenças da infância previsível por vaci- na (excepto o sarampo) (ACNUR, 1995). Todas as doenças são doenças potencialmente sérias e mortais entre as populações deslocadas. Nenhuma destas doenças é incluída sistematica- mente no RSI (nova versão), apesar do seu impacto imediato na mortalidade à grande escala e longo no termo.

- Segundo: Novos problemas identificáveis para estas populações.

Os novos problemas de saúde são identificáveis, devido à sensibilidade mais a elevada da comunidade médica e a so- ciedade civil em geral. Após ter considerado os novos proble-

[22] . «Nós constatamos que os últimos grupos (de refugiados) que dão entrada através do distrito de Palma, província de Cabo Delgado, maiori- tariamente constituídos por indivíduos de países de Corno de áfrica, como seja Somália e Etiópia, apresentavam elevado índice de desnutrição, que resultou em algumas mortes». Porquê? «Distâncias. Segundo o responsá- vel governamental, grande parte dos candidatos a asilo chegam ao centro de acolhimento após percorrer milhares de quilómetros desde o Corno de África, o que contribui para a sua má condição física.» (http://www.un- multimedia.org/radio/portuguese/detail/195734.html).

[23] . Cf. http://angonoticias.com/full_headlines_.php?id=10178

mas de saúde, é importante contudo duvidar que o RSI possa supervisionar eficazmente estes problemas de saúde que afec- tam especificamente populações minoritárias. Quais esses problemas?

a) Os riscos mentais específicos: Estes últimos anos, houve uma sensibilidade crescente, entre ONG e agências públicas no terreno com as populações de refugiados, aos aspectos psicológicos das doenças. Com efeito, o esforço emotivo da deslocação pode ter um grande impacto no exa- me médico assim como na saúde mental das populações migrantes e refugiadas, ambos antes e após um repatria- mento por exemplo. A violência física e psicológica juntam- se em muitos casos ao trauma da viagem. O esgotamento das forças físicas e emotivas da pessoa pode baixar a sua resistência normal à doença. As necessidades de saúde mental deveriam ser identificadas, e se necessário ser pro- videnciado o apoio de pessoal qualificado, como elemento dos serviços primários de cuidados de saúde. É especifica- mente importante numa perspectiva a longo prazo de cui- dados de saúde, tomando em consideração o facto que os refugiados podem sofrer dificuldades psicológicas provoca- das pela guerra cujas consequências podem não ser visíveis imediatamente. Outro aspecto é a importância da sexuali- dade e as necessidades de saúde genésica (ou reprodutiva) dos refugiados, e mais em especial das mulheres e das ado- lescentes. A maternidade, a prevenção dos riscos de HIV/ AIDS/DST, os serviços de planeamento dos nascimentos, e a gestão da violência sexual nos serviços primários globais de cuidados de saúde são pedidos ainda não concretizados (ACNUR, 1995).

b) o problema da eficácia do Regulamento Sanitário

internacional (rsi). Várias razões podem pôr em cau- sa a eficácia dos RSI face aos problemas de saúde de mi- grantes e refugiados: uma das razões principais é a própria multiplicidade de problemas. Os Estados e as agências da ONU (OMS, ACNUR, UNICEF, UNFPA), mas também as agências privadas (WPF, por exemplo) devem tratar simul- taneamente de velhos e novos problemas de saúde. Um dos paradigmas principais dos velhos problemas de saúde que tem consequências para os novos é o problema da desnu- trição (de diversas formas de Proteína-Energia), que afecta populações deslocadas inteiramente dependentes da ajuda alimentar externa. Uma segunda ordem das razões que põe potencialmente em causa a eficácia dos RSI é a seguinte: a perspectiva meramente técnica às vezes adoptada perante os problemas de saúde de refugiado. Os efeitos das condi- ções de vida pobres não podem ser rectificados por serviços médicos, ainda que estes sejam equipados inteiramente, fornecidos em pessoal e operacionais. Os outros sectores essenciais da ajuda como a qualidade dos alimentos, o aces- so à água, as condições de higiene e o tipo de abrigo, são importantes quanto os cuidados de saúde curativos. Mas uma derradeira razão pode pôr em causa a eficácia do RSI no caso do direito à saúde dos migrantes: é a falta de radiografia das populações especificamente vulneráveis nos grupos mais vulneráveis. Seria um erro ver uma população de migrantes ou refugiados como grupo uniforme. Os refu- giados são caracterizados, antes, por níveis importantes de diversidade cultural, étnica e demográfica. Por esta razão, as intervenções de saúde devem ser adaptadas a estes factores, em especial género e idade. O melhor exemplo disto é a neces- sidade de satisfazer mais as necessidades das crianças abaixo de cinco anos, que constituem habitualmente 15 a 20 porcento

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CONSTRUIR A PAZ: VISõES INTERDISCIPLINARES E

INTERNACIONAIS SOBRE CONHECImENTOS E PRáTICAS

de uma população de refugiados, e são claramente o grupo de maior risco.

No que diz respeito à população de mulheres, outras obser- vações podem ser feitas. Os dados internacionais sobre mi- grantes ou refugiados distinguem raramente a população por género. Ora, as mulheres suportam geralmente uma parte desproporcionada da dor e as dificuldades vividas por uma população em exílio. Certos problemas de saúde específicos às mulheres são susceptíveis de ser agravados pelas condições de vida em instalações de refugiado. As causas desta vulnerabili- dade específica incluem: a carga emocional devido ao facto de tratar da família inteira nas condições novas e muito difíceis, carga de trabalho aumentado pelo facto da desorganização da família e das relações sociais, o regime alimentar altera- do ou insuficiente, e uma posição desfavorecida do ponto de vista do acesso à assistência. Em algumas situações, incluindo tanto a vida em campo como fora de campo, a violência de género aumenta radicalmente os riscos de saúde — devido a complicações após abortos perigosos e doenças sexualmente transmissíveis, incluindo o HIV. A saúde pública dos refugia- dos pode apenas ser abordada eficazmente se as necessidades específicas das mulheres refugiadas são satisfeitas. Estes de- vem ser considerados como uma parte integral dos aspectos de planificação, incluindo a disposição física do campo e a sua segurança, o desenho dos serviços da saúde em consulta com as mulheres refugiadas, o seu emprego como fornecedores de saúde pública e o treino como pessoal de saúde, identificando e tratando os problemas abuso sexual e de violência de género (ACNUR, 1995).

Os constrangimentos culturais ou outros que podem limitar a abordagem feminina à assistência ou aos serviços devem tam- bém ser identificados e tidos em conta nas intervenções.

CONCLUSÃO

É claro que a situação de saúde das minorias, e mais especifica-

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