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CONStRUÇãO DA PAz NA INFÂNCIA: RESUltADOS DE Um PROGRAmA DE PROmOÇãO DA SAúDE

1. PROMOÇÃO DA SAÚDE MENTAL INFANTIL

A promoção da saúde mental infantil é fundamental, pois os problemas psiquiátricos infantis são comuns a todas as socie- dades (Dell’Aglio et al., 2004). Um grande número desses pro- blemas têm mau prognóstico e muitas perturbações, na idade adulta, originam-se em factores de risco na infância (Dell’Aglio

et al., 2004). De igual modo, a promoção da saúde mental na infância tem um impacto positivo não só a um nível micros- sistémico, para as crianças e suas famílias, mas também a um nível macrossistémico, para as instituições, designadamente a escola e as comunidades (Brofenbrenner, 1979).

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CONSTRUIR A PAZ: VISõES INTERDISCIPLINARES E

INTERNACIONAIS SOBRE CONHECImENTOS E PRáTICAS

Vários estudos demonstram a efectividade do treino de com- petências sociais em problemas de escolares, orientação vo- cacional, perturbações de ansiedade, dependência química, perturbações de personalidade, depressão e esquizofrenia, entre outros (Bedell et al., 1997). Na depressão, para citar um exemplo, os factores de risco identificados são as competên- cias sociais pobres, fracasso escolar, dificuldades de tempera- mento, doença física, estilo de interacção negativa (factores individuais); baixa auto-estima, imagem corporal negativa, expectativas pessimistas e baixa auto-eficácia (factores cogni- tivos); conflitos conjugais, depressão na família, negligência e maus tratos pelos pais (factores familiares) e exposição à pobreza, violência na comunidade e outras situações de vida stressantes (situações de vida) (Dell’Aglio et al., 2004). Por outro lado, as competências sociais, sucesso na vida escolar, envolvimento em actividades extra-curriculares, auto-concei- to positivo, competência intelectual, práticas educativas pa- rentais saudáveis e suporte social são exemplos de factores de protecção comuns a algumas perturbações (Dell’Aglio et

al., 2004).

Ao longo do seu desenvolvimento, as crianças devem desen- volver competências que visem aumentar o bem-estar, prin- cipalmente quando se encontram em risco de desenvolver doenças mentais. Por isso, pode-se falar também de preven- ção da doença (Sroufe et al., 1984). A maior parte das inter- venções dirigidas a crianças têm objectivos gerais (McGuire

et al., 1991) e os aspectos responsáveis pela melhoria da qua- lidade de vida das crianças podem estar associados a concei- tos de saúde mental, tais como o aumento da auto-estima e a diminuição do comportamento anti-social. Observar o desen- volvimento normal da criança pode orientar para estratégias de intervenção dirigidas aos problemas de saúde mental. A Psicopatologia Desenvolvimental refere que algumas formas do comportamento normativo e desenvolvimental, como por exemplo as relações com os pares ou a auto-estima, podem as- sociar-se à vulnerabilidade e a problemas posteriores, como a depressão e o comportamento anti-social (Sroufe et al., 1984). Assim, os problemas com as relações com os pares são um dos maiores factores de risco de ocorrência de perturbações na in- fância e início da adolescência, um dos maiores preditores da perturbação de conduta na adolescência (Dodge et al., 1986) e um dos factores psicológicos individuais que estão mais forte- mente associados à depressão na infância (Attie et al., 1992).

As intervenções de saúde mental na infância têm como objec- to o meio no qual a criança está inserida (McGuire et al., 1991). Como tal, os pais da criança, os professores e as instituições, nomeadamente a escola, têm sido o alvo de intervenção, pois sobretudo a escola é o local onde a criança passa a maior parte do seu tempo. A promoção da saúde mental infantil consiste no processo de capacitação da criança, inserida numa comuni- dade, para actuar no sentido da melhoria da sua qualidade de vida e saúde, enfatizando uma maior participação da criança no controlo deste processo (McGuire et al., 1991). De modo a alcançar um estado de completo bem-estar físico, mental e social dos indivíduos e grupos, devem identificar-se as as- pirações, satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio ambiente (WHO, 1986). No entanto, a promoção da saúde não é responsabilidade exclusiva da área da saúde e visa, além de um estilo de vida saudável, um bem-estar glo- bal (WHO, 1986). Actualmente, a saúde deve ser encarada num sentido positivo, como recurso para a vida, valorizando os recursos sociais e pessoais e as capacidades físicas, e não como mera ausência de doença (WHO, 1986). As acções de promoção da saúde procuram reduzir as diferenças no estado de saúde da população e assegurar oportunidades e recursos

igualitários para capacitar todos os indivíduos a realizar inte- gralmente o seu potencial de saúde (WHO, 1986).

Assim, torna-se fundamental promover ambientes favorá- veis, o acesso à informação e a experiências educativas signifi- cativas e a aquisição de competências pessoais e sociais, assim como oportunidades que permitam fazer escolhas por uma vida mais saudável (WHO, 1986). A promoção da saúde men- tal deve assentar em estratégias holísticas e ecológicas. Pro- mover a saúde mental infantil no século XXI deve contemplar a responsabilidade social para com a saúde, bem como conso- lidar e expandir parcerias para o desenvolvimento social e da saúde entre os diferentes sectores sociais e em todos os níveis da sociedade de modo a aumentar a capacidade comunitária e dar direito de voz ao indivíduo, nomeadamente através da facilitação da aprendizagem compartilhada e da solidariedade em acção (Witier, 1997). Por isso, não existem doenças estri- tamente locais, não há “saúde local”, a saúde é total, é o todo (Witier, 1997).

O bem-estar social é um dos aspectos essenciais a considerar nos projectos de promoção da saúde dirigidos às crianças. A Carta de Ottawa (WHO, 1986) foi um dos documentos funda- dores da promoção da saúde actual, enfatizando a concepção de responsabilização múltipla dos diversos intervenientes pe- rante os problemas e as propostas de soluções para os resol- ver. Cada cidadão é actor e autor do seu percurso de vida, e condiciona, com as suas decisões, os indivíduos e os contex- tos com os quais interage (Rodrigues, et al., 2005). Por isso, a educação é essencial para a construção da cidadania e para o desenvolvimento de competências transformadoras e criado- ras de condições de vida saudáveis (Rodrigues et al., 2005).

As intervenções ao nível da promoção da saúde e a prevenção das doenças dirigidas a crianças assumem um papel basilar para preparar a criança para viver uma vida individual na so- ciedade em que se insere e ser educada no espírito dos ideais proclamados na Carta das Nações Unidas e, sobretudo, num espírito de paz, dignidade, tolerância, liberdade, igualdade e solidariedade. A Carta de Jacarta, elaborada em 1997, propõe um conceito de promoção da saúde baseado em princípios e valores éticos, como a vida, a solidariedade, a equidade e a ci- dadania e estratégias que procuram concretizar a cooperação e as parcerias para viabilizar uma sociedade mais humana e fraterna. A partir da década de 1970, deu-se início a uma mu- dança do objecto de intervenção dos programas de prevenção, do âmbito individual para o comunitário, com incidência na participação da comunidade e na colaboração multidiscipli- nar, reconhecendo-se que cabe à comunidade melhor avaliar e solucionar os problemas locais. A par deste processo surgiu a evolução do conceito de promoção da saúde, como estratégia promissora para enfrentar os múltiplos problemas de saúde que afectam as populações humanas e o seu meio social. Até ao início da década de 80, as diversas áreas das ciências médicas e sociais incidiram as suas investigações e aplicações práticas nas múltiplas doenças para descobrir as causas de problemas físicos e mentais. Os modelos teóricos dessas investigações vi- savam explicar a elevada probabilidade de resultados negati- vos em função dos factores de risco que não eram suficientes para explicar os fenómenos da sobrevivência humana face à adversidade. A partir de 1990, a promoção da saúde, como meio para alcançar melhor qualidade de vida, com a partici- pação de indivíduos e da comunidade, veio fortalecer a saúde pública e a cidadania. Na V Conferência Internacional de Pro- moção da Saúde, realizada na Cidade do México, em 2000, as- sumiu-se um compromisso de implementar planos nacionais de acção em promoção da saúde, demonstrando o seu papel fundamental. A VI Conferência Internacional de Promoção da

VOL 2. TRABALHO, SAÚDE

E MEDIAÇÃO AMBIENTAL

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Saúde que ocorreu em Bangkok, na Tailândia, em 2005, teve como tema a efectividade da promoção da saúde, cuja reco- mendação fundamental foi a formação de recursos humanos pelas universidades para actuar no paradigma da nova cultura da saúde. Nesta conferência concluiu-se ainda que a capaci- tação para a promoção da saúde deve ir além do desenvolvi- mento comunitário e do desenvolvimento de competências individuais, para passar a considerar as políticas mundiais e locais, as parcerias, os sistemas económicos e de informações, entre outros. Assim, deve preparar-se cada indivíduo, cada criança, para assumir o controlo e a responsabilidade sobre a sua própria saúde e sobre a saúde da comunidade, bem como preparar para o empowerment, para a participação e tomada de decisões, para o controlo social, para exigir direitos, para actuar sobre os factores determinantes e condicionantes da saúde e qualidade de vida (Pelicioni et al, 2007).

2. PROJECTO “APRENDER A

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