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CONStRUÇãO DA PAz NA INFÂNCIA: RESUltADOS DE Um PROGRAmA DE PROmOÇãO DA SAúDE

3. PROMOÇÃO DA SAÚDE MENTAL INFANTIL: CONTRIBUTOS DO PROJECTO

“APRENDER A CRESCER EM PARANHOS”

Nas sessões foram utilizadas competências comunicacionais e técnicas que permitiram estabelecer relações de confian- ça e colaboração com as crianças (Bierman, 1997), sendo de enfatizar o encorajamento das competências e o suporte das crianças para a autoconfiança, fortalecendo a sua confiança e a manifestação da resiliência (Fraser et al., 1999).

A primeira sessão abordou o tema da cidadania, tendo como directriz principal capacitar as crianças para reconhecerem valores positivos face à diferença e à diversidade, promovendo o reconhecimento de que todas as pessoas apresentam seme- lhanças e diferenças e de que ninguém é igual ao outro. Todos

somos seres únicos e diferentes, mas todos temos coisas em comum. A diversidade é considerada um factor de enriqueci- mento e de desenvolvimento uma vez que a inclusão desafia a mudança, estimula a flexibilidade das relações e permite uma eficaz distribuição dos recursos e do seu bom aproveitamento, motivando o trabalho em equipa e o envolvimento de todos os intervenientes da escola, dos pais e encarregados de educação, da comunidade e dos diversos serviços. Esta sessão possibi- litou também aos alunos envolverem-se na aprendizagem do conviver com o outro, respeitando as diferenças e a percepção de que a multiplicidade de olhares contribui para o planea- mento de acções de grupo mais integradas e totalizadoras. A cidadania é um dos aspectos essenciais de uma escola promo- tora de saúde, em que a escola pode e deve trabalhar nessa perspectiva. A educação para a cidadania e a valorização do singular de cada criança assumem um papel fundamental na promoção da saúde e na prevenção da doença mental quando encontram um apoio no contexto colectivo, cultural e social e, mais concretamente, na escola actual que enfrenta um conjun- to de desafios que incluem a massificação do ensino, o aumen- to da escolarização e a adaptação ao grande desenvolvimento tecnológico da sociedade.

A segunda sessão teve como tema central a educação para os afectos. De acordo com os ideais transdisciplinares, a educa- ção passa pelo afecto. O aluno, quando percebe que a escola promove afectos e que as acções afectivas podem reflectir-se na melhoria da escola, valoriza os estudos e ajuda a transfor- mar o ambiente escolar. Promover acções de sensibilização para os afectos desperta o aluno para os sentimentos e emo- ções. O conceito de afectividade é polissémico, referindo-se a sentimentos de apego e de ternura, relação de cuidado e de ajuda, empatia, amizade, amor e carinho. Espinosa (2003) propõe uma análise da afectividade em cinco componentes, ou seja, motivação, confiança em si, atitudes, emoções e atri- buição causal. Estes componentes assumem um papel im- portante na aprendizagem e no ensino. A educação afectiva privilegia a atitude de respeito, empatia, abertura ao outro, e relaciona-se com sentimentos de bem-estar e emoções, como a alegria, satisfação, confiança, sentimento de si, que decorrem de situações e contextos de interacção nas quais essas atitu- des ocorrem. A escola actual tem a função de formar cidadãos pensantes, críticos e actuantes. Por isso, a aprendizagem é um processo interactivo, dinâmico e consequente. Torna-se fun- damental realizar actividades no âmbito da educação afectiva dado que é pela afectividade que o indivíduo tem acesso aos sistemas simbólico-culturais. Na medida em que os aspectos cognitivos e os afectivos se associam mutuamente, pode con- cluir-se que o êxito escolar depende não só dos aspectos inte- lectuais mas também dos afectivos (Neves e Carvalho, 2006). Assim, é essencial abordar a temática da afectividade no con- texto escolar dado que isso significa analisar as condições concretas através das quais se estabelecem os vínculos entre o aluno e o objecto, ou seja, os conteúdos escolares e culturais. A afectividade manifesta-se mediante comportamentos postu- rais e verbais e vai adquirindo complexidade à medida que o indivíduo se vai desenvolvendo. A comunicação afectiva deve fluir respeitando a faixa etária do indivíduo e as necessidades de cada fase, visando um relacionamento que favoreça am- bientes de diálogo, de partilha, de confiança e de valorização das suas contribuições, valorizando assim a auto-estima e au- mentando a segurança e contribuindo para uma relação posi- tiva com o meio social (Spagolla, nd). Por isso, quando a escola decide abrir-se à comunidade, com toda a sua complexidade, assumindo a responsabilidade de ser uma referência na socie- dade, unindo-se às famílias e a outros parceiros sociais, está a

VOL 2. TRABALHO, SAÚDE

E MEDIAÇÃO AMBIENTAL

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prevenir que, no futuro, as crianças venham a apresentar pro- blemas, promovendo a sua saúde global (Spagolla, nd).

A terceira sessão, em que foi abordada a prevenção da violên- cia, partiu da necessidade cada vez mais premente de passar às crianças noções básicas do que é a violência e das várias hipóteses que têm à disposição para resolver um conflito. Se é verdade que a violência nas escolas é um espelho da violên- cia na sociedade civil envolvente, as acções de sensibilização, prevenção e promoção nas escolas constituem um passo na diminuição dos níveis de violência entre jovens (Matos et al, 2009). Muito mais haverá a fazer, em especial junto das fa- mílias, professores, assistentes operacionais e comunidade em geral, de uma forma mais frequente e consistente, para que os resultados possam ser mais expressivos e evidentes.

Actualmente, o conceito de bullying/provocação tem sido alvo de uma enorme divulgação por parte dos media. O fenó- meno não é recente mas é o facto de estar na ordem do dia que tem permitido que a investigação sobre o tema avance, fazen- do com que a sua compreensão seja maior e os meios para a sua resolução mais eficazes. As agressões físicas e o bullying são os tipos de violência mais praticados nas escolas europeias (Matos et al, 2009). Sendo um comportamento intencional, específico e agressivo, representa um tipo de violência prati- cado entre pares, num contexto próprio: a escola. Estes com- portamentos, que englobam acções de ordem física, verbal e psicológica, podem ser praticados por um único indivíduo ou por um grupo, direccionado igualmente a um indivíduo ou a um grupo. Quem é simultaneamente vítima e agressor é de- nominado de vítima-provocatória (Matos et al., 2009). Mais recentemente, a atenção foi-se focalizando também nos deno- minados bystanders (espectadores) que são aqueles que nor- malmente assistem sem interferir ou que interferem tomando a defesa da vítima ou incentivando o agressor (Matos et al 2009). Comportamentos como bater, pontapear, empurrar, roubar, ameaçar, brincar de uma forma rude e intimidatória e usar armas constituem o bullying físico ou directo; o bullying psicológico refere-se a chamar nomes, arreliar ou pegar com alguém, ser sarcástico, insultuoso ou injurioso, fazer caretas e ameaçar; o bullying indirecto, que constitui o tipo de bullying mais dissimulado porque não é tão visível, inclui excluir ou rejeitar alguém de um grupo (Bullock, 2002).

CONCLUSÃO

Na medida em que os problemas da sociedade reflectem-se na escola, a escola deve ter recursos para lidar com estas ques- tões que possam emergir, o que nem sempre se evidencia. A intervenção articulada de instituições e serviços da escola e da comunidade torna-se fundamental para se poder intervir eficazmente. Os primeiros anos de vida da criança são mo- mentos muito importantes para a formação da criança, num período em que ela está a construir a sua identidade e a sua estrutura física, social, afectiva e intelectual. Por isso, através de actividades lúdicas, pensa-se ter contribuído para intervir positivamente no desenvolvimento das crianças, suprindo as suas necessidades biopsicossociais e concedendo condições adequadas para elas adquirirem e desenvolverem as suas com- petências. Espera-se ter contribuído para o desenvolvimento integral das crianças, ampliando as suas experiências e co- nhecimentos para estimular o interesse pela dinâmica da vida social e permitindo uma integração e convivência adaptada à sociedade através de valores de solidariedade, liberdade, coo- peração e respeito. As actividades lúdicas, segundo Schaefer

et al. (1986), promovem e contribuem para o bem-estar psi-

cológico da criança. As escolas acolhedoras, e estimuladoras, acessíveis às crianças e suas famílias, através da realização de acções socioeducativas, podem contribuir para a promoção da saúde e prevenção de doenças, nomeadamente de âmbito mental. A interacção com os pares é uma parte imprescindí- vel da socialização na infância, proporcionando um espaço de aprendizagem de papéis, desenvolvimento cognitivo e moral, domínio de impulsos agressivos e aquisição de competências sociais globais (Kendall et al., 1983).

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