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SECÇÃO II UMA NOVA GESTÃO PÚBLICA

1. Princípios e caraterísticas da Nova Gestão Pública

Com o propósito de ultrapassar as dificuldades e ineficiências tradicionalmente atribuídas às organizações burocráticas, Lane (1995) fala de necessidade de substituir um Estado Administrativo por um Estado Managerial.

Kettl (2005), para que o Estado funcione melhor, propõe a substituição do modelo tradicional de administração pública por um enfoque gerencialista.

Neste mesmo propósito, na década de 80 e 90, as reformas introduzidas pelos países anglo-saxónicos no âmbito da administração pública, foram enquadradas na expressão “Nova Gestão Pública” (NGP)16.

A NGP, segundo Jorge Ávila de Lima (2007, p. 158), «encontrou as suas raízes em dois movimentos complementares: o gerencialismo (managerialism) e a nova economia institucional (Rhodes, 1996).

O gerencialismo parte do princípio de que as organizações, quer sejam do setor público quer sejam do setor privado, podem ser geridas de acordo com os mesmos princípios (Peters e Waterman, 1982). Por isso, como modo de ultrapassar a gestão administrativa e burocrática enraizada desde Max Weber, defende-se a adoção no setor público de metodologias de gestão já testadas no setor privado. Desde logo, afirma-se a necessidade de assegurar uma gestão feita por gestores profissionais, concedendo-lhes, designadamente por parte dos líderes políticos, uma grande autonomia de atuação (Peters, 2006, p. 307). O privilegiar as dinâmicas de gestão face às de administração passa pela definição de padrões explícitos de desempenho dos trabalhadores e das organizações, onde se aponta para a obtenção de resultados, com racionalização de custos e proximidade ao consumidor, procurando conhecer o seu grau de satisfação (Lima, 2007).

A nova economia institucional «caracteriza-se pela introdução de estruturas de incentivos (…) na provisão de serviços públicos – pela - promoção de uma maior competição,

28 através da contratação externa e dos quasemercados – colocando o – ênfase no exercício do direito de escolha por parte dos consumidores” (Lima, 2007, p. 158).

O reconhecimento generalizado de que é necessário alterar o modo de regulação dos sistemas educativos desencadeia, também no âmbito da educação, a disseminação, a nível transnacional, de um conjunto de conceitos como “descentralização”, “contratualização”, “responsabilização”, “managerialismo”, “profissionalização”, “accountability”, etc. que apontam para uma mudança nas políticas educativas (Van Zanten, 2004).

Apesar de algumas especificidades e de enfoques mais direcionados, no sentido de acentuar uma ou outra destas conceções, a expressão “Nova Gestão Pública” reúne estas mudanças no setor público as quais remontam ao final da década de 70 (Peters, 2006) e que constituem «uma resposta particularmente apropriada para aumentar a eficiência, a eficácia, a flexibilidade e a inovação do Estado, preservando o serviço público” (Finger & Ruchat, 1997, p. 34). Este último aspeto, de manutenção dos objetivos do serviço público, revela-se fundamental, porque atenua algumas críticas, circunscrevendo a NGP a uma estratégia, ou instrumento de modernização do setor público, sem que condicione os objetivos das políticas. Entre as críticas mais vulgares atribuídas à adoção da NGP está «o pressuposto fundamental (…) de que tudo o que é público é ineficiente, já que a forma eficiente de alocar serviços é o mercado” (Rocha, 2010, p. 44). A título exemplificativo desta disputa podemos recuperar aqui o debate havido em torno da adoção de metodologias da NGP nas escolas e a necessidade de manter os princípios inerentes à oferta de escola pública.

Philipe Bezes sintetiza as diferentes abordagens da NGP em cinco princípios aglutinadores:

1 - «a separação entre as funções de estratégia, de pilotagem e de controlo e as funções operacionais de implementação e execução; – 2 – a fragmentação das burocracias verticais pela criação de pequenas unidades administrativas autónomas (eventualmente sob a forma de agências), pela descentralização ou pelo empowerment dos grupos de utentes; – 3 – o recurso sistemático aos mecanismos de mercado (concorrência entre actores públicos e com o sector privado, individualização de incentivos, externalização da oferta pela privatização); – 4 – a transformação da estrutura hierárquica da administração reforçando as responsabilidades e a autonomia dos escalões encarregados da implementação da acção do Estado; – 5 – a implementação de uma gestão pelos resultados fundados

29 sobre a realização de objectivos e a medida e a avaliação dos desempenhos no quadro de programas de contratualização» (Bezes, 2009, pp. 36-37).

Por seu lado, Hood (1991) resume em sete aspetos as principais caraterísticas atribuídas à NGP:

1. A gestão profissional no setor público efetuada por pessoas consideradas no top da gestão, o que possibilita uma clara responsabilização e consequente prestação de contas; 2. A explicitação de normas e medidas de desempenho, com definição de objetivos, metas e indicadores de sucesso, expressos de modo quantitativo, para os serviços;

3. A necessidade de enfatizar o controlo de saída, atribuindo recursos e recompensas para o desempenho alcançado, acentuando, assim, a importância dos resultados em detrimento dos procedimentos.

4. A importância de desagregar unidades do setor público de modo a desencadear maiores ganhos de eficiência.

5. A dinamização de uma maior concorrência no setor público, incentivando a celebração de concursos públicos e contratos a termo, como modo de diminuir os custos;

6. O interesse na implementação no setor púbico de práticas e ferramentas oriundas do sector privado;

7. A implementação de uma maior disciplina e parcimónia no uso de recursos com cortes em custos diretos, de modo a fazer mais com menos. (1991, pp. 4-5).

Um melhor funcionamento traz implícita a exigência de fazer mais e melhor com menos custos, o que impele para a necessidade de uma intervenção na gestão dos recursos humanos, com linhas hierárquicas mais próximas, mais flexíveis e com uma maior enfoque no mérito do desempenho, o qual passa a condicionar a seleção, a promoção e a retribuição.

Em síntese, podemos dizer que a Nova Gestão Pública não é um fim em si mesmo, mas um conjunto de técnicas, instrumentos ou uma caixa de ferramentas que valorizando «o planeamento estratégico, a gestão financeira, a gestão de recursos humanos, o controlo de qualidade, o marketing, a avaliação e as novas tecnologias permitem solucionar alguns problemas específicos do funcionamento da administração pública, que não se restringem ao aumento da sua eficiência» (Lamarzelle, 2008, p. 7).

30 A abordagem que iremos fazer sobre a presença da NGP nas políticas educativas em Portugal toma em conta os seus princípios, sublinhando, com especial enfoque, o primado das ferramentas de gestão, designadamente dos recursos humanos e a adoção de instrumentos de aproximação aos cidadãos e de responsabilização que privilegiam a contratualização, a autonomia dos atores enquanto mecanismos de controlo pós- burocrático assentes nos resultados e na satisfação do utente.