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Neste tópico é importante destacar as diferenças entre processo judicial e administrativo, para demonstrar que não existe qualquer confusão terminológica, já que as peculiaridades de cada poder serão caracterizadoras do tipo de processo103. Com efeito, o processo judicial se desenvolve no âmbito do poder judiciário, que tem como função precípua a jurisdição, com competência para dizer o direito em última palavra, através da imutabilidade do ato jurisdicional, ou seja, caracterizado pela coisa julgada formal e material.

Diferentemente do processo administrativo que é exercido perante qualquer poder público no âmbito da atividade administrativa, na qual a decisão final, considerada tradicionalmente como ato administrativo, pode ser alterada pelo judiciário, pois não existe no Brasil a coisa julgada administrativa, sendo garantia constitucional decorrente do Princípio da Inafastabilidade do Poder Judiciário, expresso no dispositivo do art. 5º, inciso XXXV da Constituição Federal104. Logo, os efeitos da decisão administrativa não possui imutabilidade decorrente da coisa julgada, porque podem ser revistos pelo poder judiciário.

Além disso, a função jurisdicional possui um caráter substitutivo, ou seja, a decisão do juiz substitui a vontade das partes, para dizer qual delas possui o direito. Enquanto, a função administrativa, a administração se confronta com o cidadão, com o servidor ou com o contratado, ou ainda com outro órgão público, havendo dois sujeitos, através da qual atende ao interesse da coletividade, mas não possui esse caráter substitutivo105 (MEDAUAR, 2008, p.58).

103 Sobre o assunto Medauar (2008, p. 50) destaca que “a concepção da processualidade extensiva a todos os

poderes estatais, ressaltada a existência de um núcleo comum dessa processualidade, as peculiaridades afloram das características funcionais de cada poder. Portanto, a idéia de um núcleo comum de processualidade não é incompatível com a existência de particularidades em cada tipo de processo, decorrentes, sobretudo, da modalidade de função a que se vincula”.

104Artigo 5º, inciso XXXV da CF: “não se excluirá da apreciação do poder judiciário qualquer lesão ou ameaça

ao direito”.

105 Medauar (2008, p. 57-58) salienta algumas notas diferenciadores do processo judicial e administrativo:

“Assim, em primeiro lugar, a função administrativa não visa precipuamente à atuação da lei, embora, como já se observou, deva nortear-se pelo princípio da legalidade. Em segundo lugar, inexiste na função administrativa o caráter de substitutividade em relação a dois sujeitos em disputa: havendo situação de controvérsia em seu âmbito, a própria administração toma a decisão que vai solucioná-la. E quanto aos efeitos de seus atos, falta-lhe

Com a ampliação da atividade estatal, surge a necessidade de maior observância dos aspectos processuais para garantir o controle dos atos administrativos. Por esse motivo que atualmente, a processualidade representa uma mudança de enfoque no direito administrativo: a passagem do primado da autoridade para o primado do consenso (MEDAUAR, 2008, p. 76-77).

Para Dinamarco (1996, p. 65), o processo administrativo disciplinar é que mais se aproximam do jurisdicional, em suas formas e garantias, apesar de destacar as diferenças existentes em relação à função jurisdicional, caracterizada especialmente pelo Princípio da Inafastabilidade do Poder Judiciário e do instituto da coisa julgada.

Na verdade, pode-se afirmar que existe um núcleo comum de processualidade106, traduzido através das normas e princípios processuais que são aplicados de uma forma geral nos processos, porém, considerando as peculiaridades de cada função do Estado. Nas palavras de Bacellar Filho (2012, p. 55), o núcleo diferenciado persiste como decorrência das características de cada função.

Medauar (2008, p. 51-54) ainda destaca alguns critérios de diferenciações trazidas pela doutrina, porém, as mais relevantes dizem respeito ao modo como se inicia o processo administrativo, os efeitos dos atos e a substitutividade da vontade, esses dois últimos já retratados neste tópico. As demais distinções destacadas como critério do fim, a existência de litígio, bilateralidade e igualdade entre as partes, independência e inexistência de hierarquia, obrigatoriedade de decidir, na verdade, são características também verificadas no processo administrativo. Isso porque esses parâmetros de distinção estão atrelados ao sentido tradicional de ato administrativo como resultado de um ato unilateral da administração pública dotada de superioridade em relação aos seus súditos, e que vem perdendo espaço para a doutrina moderna do processo administrativo107. Quanto ao modo como inicia o processo administrativo, pode ser “de ofício” ou por “provocação”, enquanto o processo judicial apenas

imutabilidade decorrente da coisa julgada; de regra, podem ser revistos por outros atos administrativos ou por atos jurisdicionais”.

106 Dispondo sobre a processualidade administrativa e sua ligação com o direito processual judicial Merkl (1927,

p.283) ensina que o nascimento do direito administrativo processual representa no segundo grau uma semelhança da administração com a justiça, constituindo o em primeiro grau, o que se entende pela concretização do direito administrativo material, o que se pretende com a elaboração de um direito processual administrativo é proporcionar aos indivíduos que detêm os seus direitos, as mesmas garantias juridicidade ou a mesma aplicação justa do direito administrativo material, através das autoridades administrativas, como forma de garantir semelhante segurança como ocorre com as relações jurídicas que oferece o processo judicial. Além disso, o autor traz como a mais eficaz de todas as garantias, a colaboração das pessoas as quais poderão acarretar direitos e obrigações decorrente do procedimento.

107 O primeiro capítulo desta dissertação trata a respeito da mudança do papel da Administração Pública em

se inicia mediante a “provocação” da parte autora. Essa distinção é decorrente da peculiaridade de cada função estatal.

O processo administrativo representa um meio para que sejam preservados os direitos fundamentais dos cidadãos na atuação administrativa, isso porque com a ampla processualidade, o administrador se obriga a observar parâmetros determinados na lei, bem como nos princípios processuais constitucionais como do contraditório e da ampla defesa.