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6 O TRABALHO DA COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA NA CRECHE

6.1 Recepção das crianças e suas famílias na entrada e organização da saída

O trabalho da coordenadora pedagógica na creche iniciava-se com a recepção das crianças e seus pais ou responsáveis. No horário em que chegava à instituição, por volta de seis horas 50 minutos, Paula estava na recepção recebendo as crianças e suas famílias. De forma simpática e acolhedora, cumprimentava todas as famílias, desejando bom dia. Igualmente cumprimentava todas as crianças, chamando-as por seu nome.

Nesse horário, geralmente as professoras ou as estagiárias já estavam na sala de atividades. Nos dias de segunda, terça e quinta-feira, a secretária escolar e a diretora ficavam com a coordenadora pedagógica na recepção, pois nesses dias as famílias não entravam com as crianças até a sala de atividades. Os familiares as deixavam na recepção e umas das três profissionais do núcleo gestor as acompanhavam até suas salas.

Segundo a coordenadora pedagógica, os pais só entravam para deixar as crianças nas salas nos dias de quarta e sexta-feira, porque, se as famílias entrassem todos os dias as crianças chorariam mais, e, se o núcleo gestor permitisse, os pais queriam entrar todos os dias. Também esses dias de entrada com as crianças eram definidos pelo núcleo gestor como

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aqueles em que os pais podiam falar com as professoras sobre algo que avaliassem ser necessário.

A forma como a instituição, representada pelo núcleo gestor, considerava e organizava a participação das famílias das crianças no momento em que traziam seus filhos à creche, limitando os dias em que elas podiam falar com as professoras, evidenciava que, apesar dos equipamentos de Educação Infantil terem o dever de promover ações que permitam e estimulem a participação das famílias (BRASIL, 1996), algumas vezes essa participação é restringida, sendo definida, somente, a partir do ponto de vista dos profissionais da instituição. É necessário enfatizar que tal prática é contrária aos preceitos legais que garantem a presença ativa dos pais na educação de seus filhos e ao desenvolvimento de ações complementares entre instituições de Educação Infantil e famílias na educação das crianças. (BRASIL, 1990, 1996).

Sobre a relevância dos momentos de entrada para o fortalecimento das relações entre os três sujeitos da educação, professoras, crianças e famílias, Barbosa (2009) indica que o horário da chegada à escola é um momento importante, pois possibilita a construção de uma aliança entre famílias, criança e professora, contribuindo para edificação da confiança entre esses três parceiros de jornada.

A recepção das crianças e famílias na creche “Cuidando e Pensando no Futuro,” além de constituir-se em um momento de acolhimento e controle de entrada dos pais por parte da coordenadora pedagógica e do núcleo gestor, possibilitava que fossem estabelecidas algumas comunicações e trocas entre famílias e coordenadora pedagógica, bem como da coordenadora pedagógica com as crianças. A transcrição a seguir elucida um momento em que isso aconteceu:

Uma mãe chega com sua filha descalça. A criança estava com o pé machucado. Paula percebe e pergunta o que aconteceu com o pé da criança e a mãe afirma que foi uma queimadura na moto, que a levou no posto de saúde, mas não tinha material. Paula diz: “Não tem nada protegendo o pé dela, ela não poder ficar assim com o pé no chão. Eu vou passar uma pomada e fazer um curativo.” A coordenadora leva a criança para sua sala e, carinhosamente, explica que vai passar um “remedinho” em seu pé para ele ficar bom. A criança não fala nada. Paula faz o curativo e depois leva a criança para sua sala. (DIÁRIO DE CAMPO, 03.10.14).

O cuidado em relação ao bem-estar e à saúde das crianças também pode ser observado na seguinte situação:

Paula conversa com uma mãe que a relata que sua filha está “doente da barriga.” A mãe pergunta se na creche é feito vitamina de fruta para as crianças. A coordenadora informa que, quando a prefeitura manda fruta, é feito, mas que também é servida a própria fruta. A mãe pergunta que frutas a prefeitura manda e a coordenadora diz que enviam mamão, melão e banana. A mãe comenta que sua filha gosta mais de

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vitamina, por isso ela tinha trazido algumas goiabas e que havia pedido à professora para fazer, mas ela disse que não podia. Paula explicou que quando ela quisesse que fosse feito vitamina ela podia falar com alguém do núcleo gestor, pois as professoras não têm tempo de fazer, por isso a professora disse que não faria. Em seguida, perguntou a mãe se ela queria que a vitamina fosse servida no lanche da manhã ou da tarde. A mãe respondeu que à tarde era melhor. A coordenadora recebeu as goiabas e disse que ia fazer a vitamina. (DIÁRIO DE CAMPO, 16.10.14).

Também, nesse momento de recepção, os pais entregavam à coordenadora pedagógica alguma medicação que as crianças precisavam tomar em algum período do dia.

No final do dia, Paula também assumia o trabalho de organizar a saída das crianças93. Do mesmo modo que ocorria pela manhã, no final da tarde, as famílias só entravam para pegar as crianças nas salas nos dias de quarta e sexta-feira. Nos demais dias da semana (segunda, terça e quinta-feira), geralmente, a secretária escolar e a diretora ficavam com a coordenadora pedagógica ajudando-a a buscar as crianças nas salas. Quando os pais chegavam, uma dessas profissionais se dirigia até a sala da criança ou então gritava seu nome na direção de sua sala e a estagiária, que ficava na porta da sala, acompanhava a criança até o portão da recepção.

Raras vezes Paula não pôde estar presente na recepção durante a saída das crianças no dia que os pais não entravam para buscá-las. Quando isso acontecia, contudo, ela fazia os encaminhamentos para a secretária de como esse momento devia ser organizado. A transcrição a seguir exemplifica isso:

Paula está tentando concluir a escrita da pauta do planejamento mensal e informa à secretaria que não podia ficar no portão entregando as crianças aos pais porque precisava terminar de “passar a limpo” a pauta de planejamento. Paula orientou a secretaria a tirar uma estagiária de cada sala para ajudá-la nesse momento. (DIÁRIO DE CAMPO, 26.09.14).

Nos dias em que os pais entravam para pegar as crianças nas salas de atividades, a coordenadora também ficava na recepção e, igualmente, foram raras as ocasiões em que ela não esteve presente. O relato a seguir contextualiza uma situação em que isso aconteceu:

Desde o início da manhã, entre as diversas tarefas que realizava, Paula pesquisava em revistas um texto para trabalhar com as famílias na reunião de pais prevista para acontecer em seguida. No final da tarde, ela ainda estava envolvida com esse trabalho e comentou comigo que mesmo os pais entrando para pegar as crianças nas salas ela precisava ir para o portão observar quem vinha buscá-las, porque era perigoso vir uma pessoa que não tinha autorização, pois no dia que os pais entravam, às vezes eles mandavam outras pessoas em seu lugar. Falou isso, mas não foi para o portão e algum tempo depois comentou: “Ainda bem que o [nome do porteiro] conhece todo mundo.” (DIÁRIO DE CAMPO, 02.10.13).

93Outras pesquisas (PLACCO; ALMEIDA; SOUZA, 2011; ROMAN, 2001) observaram que a organização da entrada e saída dos “alunos” era realizada pela coordenação pedagógica.

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Embora Paula demonstrasse preocupar-se com a segurança das crianças na hora da saída, essa preocupação parecia não ser suficiente para que ela deixasse o que estava fazendo, embora sua presença fosse importante para acompanhar e garantir a segurança desse momento.

Em relação ao o horário da saída, Barbosa (2009) destaca que ele também conta com a privilegiada presença dos três autores do processo educacional (criança, professoras e família), o que evidencia a necessidade de planejá-lo cuidadosamente. A autora avalia que o momento de saída envolve a despedida das crianças, constituindo ocasião para demonstrar como aquele encontro foi interessante. Pondera, ainda, que, assim como a despedida representa a possibilidade de ir embora, também, precisa, conter o desejo de voltar.

Na creche “Cuidando e Pensando no Futuro,” entretanto, a presença das crianças, professoras e famílias no horário de saída era limitada a alguns dias da semana e não parecia ser um momento planejado com a intenção de possibilitar uma experiência interessante para as crianças. Elas ficavam sem fazer nada, apenas esperando a chegada dos pais.