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CAPÍTULO III ANALISANDO OS DADOS

3.3 Em busca de respostas: retomando as entrevistas e analisando documentos

3.3.4 Reformas no Sistema de Justiça para tratamento de graves violações de

Sobre reformas no Sistema de Justiça, analisei os pactos republicanos firmados entre os três poderes, para aprimoramento do Poder Judiciário, e o relatório do Programa Justiça Plena, do Conselho Nacional de Justiça. O objetivo da análise dos documentos é, de acordo com a unidade de análise formulada, verificar as propostas de reforma do Sistema de Justiça que incorporem as ações, os programas e as políticas realizados pelo Poder Executivo quando da violação de um direito e que resultam numa relação com o Sistema de Justiça, com vistas a reparar e/ou restaurar o direito violado.

As entrevistas também forneceram informações e posicionamentos importantes, uma vez que todos os entrevistados foram questionados sobre perspectivas de reforma do Sistema de Justiça quanto a violações de Direitos Humanos.

Os pactos republicanos foram firmados no contexto de reforma do Judiciário, iniciada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004.93 O primeiro pacto republicano, de 15 de dezembro de 2004, contou com a adesão dos três poderes e foi denominado de “Pacto de Estado em favor de um Judiciário mais Rápido e Republicano”.

92O projeto foi arquivado com fundamento no artigo 332 do regimento interno do Senado, que estabelece

o arquivamento de todas as tramitações ao final da legislatura. O regimento estabelece que pode ser requerida a continuidade da tramitação da matéria arquivada assinada por um terço da composição da Casa e aprovada pelo Plenário, até sessenta dias após o início da primeira sessão legislativa da Legislatura seguinte. Entretanto, em relação ao projeto, não houve esse requerimento.

93 Uma análise sobre o tema será desenvolvida no quarto capítulo, com menção ao incidente de deslocamento de competência criado pela emenda constitucional e mencionado em diversas recomendações das conferências nacionais de Direitos Humanos (a chamada “federalização” de crimes de Direitos Humanos).

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As propostas apresentadas pelo pacto são as seguintes: i) implementação de reforma constitucional do Judiciário, a partir da promulgação da Emenda Constitucional n. 45, de 2004, com a instalação do Conselho Nacional de Justiça e aprovação pelo Legislativo de medidas que tornem mais amplo o acesso à Justiça e mais célere a prestação jurisdicional; ii) reforma do sistema recursal e dos procedimentos; iii) ampliação das defensorias públicas da União e dos estados; iv) ampliação dos juizados itinerantes e aperfeiçoamento da concessão de benefícios previdenciários julgados pelos Juizados especiais; v) incentivo à aplicação de penas alternativas; vi) coerência entre a atuação administrativa e as orientações jurisprudências já pacificadas; vii) revisão da lei de execução fiscal; viii) realização de debates e audiências de conciliação visando à construção de modelos institucionais e à adoção de providências para resolução dos problemas relacionados ao pagamento dos precatórios; ix) informatização do Judiciário; x) produção de dados e indicadores estatísticos e xi) criação de banco de dados com sistema de acompanhamento dos inquéritos e das ações judiciais relacionados a casos de denúncias nos sistemas internacionais de proteção aos Direitos Humanos, em especial no âmbito da Organização dos Estados Americanos (BRASIL, Exposição de Motivos n. 204/2004).

Já o segundo pacto republicano, firmado em abril de 2009, foi denominado Pacto Republicano de Estado por um Sistema de Justiça mais acessível, ágil e efetivo e apresentou três objetivos: i) acesso universal à Justiça, especialmente dos mais necessitados; ii) aprimoramento da prestação jurisdicional, mormente pela efetividade do princípio constitucional da razoável duração do processo e pela prevenção de conflitos; iii) aperfeiçoamento e fortalecimento das instituições de Estado para uma maior efetividade do sistema penal no combate à violência e criminalidade, por meio de políticas de segurança pública combinadas com ações sociais e proteção à dignidade da pessoa humana (BRASIL, 2009).

Os poderes assumiram compromissos para a consecução dos objetivos, dentre eles o aperfeiçoamento da assistência e o Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas; estruturar e apoiar as ações dos órgãos de controle interno e ouvidorias, no âmbito das instituições do Sistema de Justiça, com o objetivo de promover maior transparência e estimular a participação social. Foram elencadas as seguintes matérias prioritárias: proteção dos Direitos Humanos e fundamentais, agilidade e efetividade da prestação jurisdicional e acesso universal à Justiça.

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Na perspectiva de propostas que incorporem ações, programas e políticas realizados pelo Poder Executivo, possibilitando uma relação com o Sistema de Justiça, com vistas a reparar e/ou restaurar o direito violados, localizei apenas duas: a criação de banco de dados com sistema de acompanhamento dos inquéritos e ações judiciais relacionados com denúncias nos sistemas internacionais de proteção aos Direitos Humanos, em especial no âmbito da Organização dos Estados Americanos, e o aperfeiçoamento do Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas.94

O banco de dados e o sistema de acompanhamento dos inquéritos e das ações judiciais foram desenvolvidos pelo Programa Justiça Plena, do Conselho Nacional de Justiça. O programa foi lançado em novembro de 2010 e consiste no monitoramento da tramitação de processos de grande repercussão social, no intuito de garantir a efetividade e a celeridade da prestação jurisdicional. A partir da indicação dos órgãos que participam do programa ou do juiz responsável pela ação, processos com grande repercussão social, em que há dúvidas sobre a efetividade ou o cumprimento do princípio da razoável duração do processo, passam por uma avaliação da Corregedoria Nacional de Justiça e podem ser incluídos no programa. As ações são acompanhadas pela Corregedoria do CNJ, que garante apoio administrativo à gestão desses processos, zelando pelo cumprimento em tempo razoável e providenciando ao magistrado estrutura administrativa e condições compatíveis com a complexidade da causa (BRASIL, 2012, p. 3). Especificamente sobre as ações do programa em relação aos casos estudados, abordarei na seção seguinte.

Já os/as entrevistados/as apresentaram várias observações e propostas para a reforma do Sistema de Justiça numa perspectiva de integração com a atuação do Poder Executivo para reparar ou restaurar um direito violado. Pontuo que, em todas as entrevistas, formulei uma pergunta específica sobre o tema, para levantar o posicionamento dos diversos sujeitos que trabalham nos casos e programas em estudo e suas opiniões sobre o papel do Sistema de Justiça diante de uma violação de Direitos

94 O Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas (Provita) não é objeto de análise da pesquisa. Mas é importante pontuar que o fortalecimento e aprimoramento do Provita são questões que surgem como recomendações das conferências de Direitos Humanos e dos programas nacionais de Direitos Humanos, de forma bastante semelhante ao PPDDH. Um estudo importante sobre o Provita pode ser visto em GALDINO, Danielle de Souza. Proteção pela metade: um estudo sobre as necessidades humanas no Programa Federal de Assistência a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Política Social, do Instituto de Ciências Humanas, Universidade de Brasília. Brasília, julho 2013.

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Humanos. O quadro levantado foi o seguinte, a partir da organização das unidades de análise obtidas na codificação aberta das entrevistas:

Quadro 24: Proposições sobre o Sistema de Justiça pelos entrevistados. Entrevistado/a Proposição sobre o Sistema de Justiça

Carla Olhar específico do Sistema de Justiça sobre os casos dos defensores Contextualização dos crimes contra defensores

Fabiana Prioridade no julgamento das ações relacionadas a defensores Olhar específico do Sistema de Justiça sobre os casos dos defensores Atuação do CNJ e CNMP com mais ênfase em Direitos Humanos Maria Prioridade no julgamento de ações judiciais relacionadas a defensores

Eliane Maior transparência do Sistema de Justiça

Alteração do perfil dos integrantes do Sistema de Justiça Ampliação e fortalecimento das Defensorias Públicas

Álvaro Maior atuação do CNJ para garantir celeridade aos processos judiciais relacionados a conflitos fundiários

Necessidade de regulamentação pelo CNJ sobre a celeridade dos processos relativos a conflitos fundiários

Reinstalação do Fórum de Conflitos Fundiários do CNJ

Alessandra Maior celeridade dos processos judiciais sobre violações de Direitos Humanos para garantir o acesso à Justiça

Ana Capacitação de juízes e promotores em Direitos Humanos

Criação de legislação específica sobre cumprimento de decisões do SIDH (lei-ponte)

Maior mobilização institucional para cumprimento das decisões do SIDH, em especial pelo CNJ e CNMP

Fortalecimento das corregedorias do Sistema de Justiça

Atuação das corregedorias do Sistema de Justiça sobre as do SIDH Criação de legislação específica sobre não-aplicação de prescrição em relação a casos do SIDH

Carlos Fortalecimento das ouvidorias e corregedorias do Sistema de Justiça Realização de planejamentos estratégicos participativos do Sistema de Justiça

Alteração das formas de ingresso e progressão nas carreiras do Sistema de Justiça

Reformulação da estrutura organizativa do Poder Judiciário para além das entrâncias, com criação de núcleos temáticos

Francisco Articulação com CNJ e órgãos do Sistema de Justiça com apoio do Ministério da Justiça para celeridade das ações judiciais relacionadas a defensores

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Capacitação para juízes e promotores sobre o PPDDH e a atuação dos defensores

Fábio Ampliação do controle de convencionalidade pelo Sistema de Justiça no âmbito interno

Ampliação do papel do CNJ no cumprimento das decisões do SIDH e questões de fundo envolvidas

José Criação de legislação específica sobre cumprimento de decisões do SIDH (lei-ponte)

Criação de legislação específica sobre não-aplicação de prescrição em relação a casos do SIDH

Lara Capacitação dos integrantes do Sistema de Justiça sobre o PPDDH e a atuação dos defensores

Lúcia Capacitação dos integrantes do Sistema de Justiça sobre o SIDH

Márcio e

Cristiana

Maior estruturação do CNJ para tratar de conflitos no campo Reinstalação do Fórum de Conflitos Fundiários do CNJ

Ampliação das normatizações do CNJ sobre tratamento de conflitos no campo

Ema Celeridade das ações judiciais relativas a defensores

Nara Olhar específico do Sistema de Justiça sobre os casos dos defensores Celeridade das ações judiciais relativas a defensores

Fonte: Elaborado pela autora.

As propostas vêm de sujeitos que atuam em dois campos — a proteção a defensores de Direitos Humanos e o Sistema Interamericano de Direitos Humanos — com formações profissionais distintas, vivências e experiências diversas, no âmbito do Estado e da sociedade civil organizada. Mas chama atenção o fato de terem conteúdo bastante semelhante entre si e variarem em torno de três eixos: i) celeridade dos processos judiciais relacionados a violações de Direitos Humanos, com adoção de procedimentos específicos que considerem as particularidades da vítima e o contexto da violação; ii) estruturação e fortalecimento dos órgãos de controle externo do Sistema de Justiça quanto ao enfrentamento a violações de Direitos Humanos, com garantias de transparência e participação da sociedade em sua gestão; iii) reestruturação da seleção e do progresso na carreira dos integrantes do Sistema de Justiça, com reformulação da formação para incluir temáticas de Direitos Humanos.

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3.4 Uma síntese preliminar a partir dos casos Maria Joel da Costa e Sétimo