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Tecendo a Grande Teia

No documento OUTROS TEMPOS, OUTROS ESPAÇOS (páginas 107-110)

Se a Segunda Guerra funcionou como um catalisador para o surgimento do computador, a Guerra Fria foi uma condição de possibilidade para a invenção da internet. Em 1957, a URSS lança o Sputnik, o primeiro satélite artificial colocado em órbita. Em resposta, os EUA, em 1958, criaram a Advanced Research Projects Agency (ARPA), com o objetivo de desenvolver pesquisas que lhe desse superioridade tecnológica na área militar. Em 1962 foi iniciado um projeto de pesquisa, denominado de Arpanet, que tinha por finalidade permitir o compartilhamento de tempo de computação, que era muito caro na época, entre diversos institutos de pesquisa. Entretanto, isso parece ter sido apenas uma justificativa aparente, apresentada ao congresso para sua aprovação. A intenção dos pesquisadores que propuseram o projeto, segundo algumas declarações posteriores, seria de promover uma comunicação por meio de computadores capaz de interligar todo o planeta. Esses pioneiros visionários sonhavam de alguma maneira transformar o mundo pela comunicação informatizada (CASTELLS, 2003).

A rede interativa que daria suporte à Arpanet foi montada com uma tecnologia de comutação por pacotes51, desenvolvida por Paul Baran para o Departamento de Defesa, com

o objetivo de criar uma rede flexível e descentralizada, capaz de armazenar dados estratégicos, que poderiam ser acessados em qualquer ponto da rede. O objetivo do Departamento de Defesa era preservar a capacidade de defesa dos EUA em caso de ataque da URSS. Apesar dos objetivos de Baran serem tão distintos daqueles da Arpanet, a tecnologia mostrou-se bastante adequada para ser utilizada no projeto de pesquisa. Em 1969 foi montada a primeira rede, constituída por quatro nós localizados em grandes

51 Sistema onde uma determinada massa de dados é segmentada em pequenas porções, chamadas

universidades estadunidenses: UCLA, Santa Bárbara, Stanford e Utah. Em 1971, eram 15 nós, a maioria ainda em universidades. Nessa época, foram criadas duas outras redes, a Prnet e a Satnet. Em 1973, as três redes são interligadas, formando uma rede de redes. A conexão entre diferentes redes, criadas com diferentes arquiteturas, abre a discussão sobre a necessidade de padronização da tecnologia. Em 1978 é estabelecido o protocolo TCP/IP, que se torna o padrão para o funcionamento de todas as redes, tornando-as compatíveis entre si (LEINER et al., 2005). O nome internet foi utilizado pela primeira vez em 1983, quando a Arpanet foi dividida em duas redes: a Milnet, reservada ao uso das forças armadas dos EUA, e a Arpanet-Internet, aberta aos institutos de pesquisa. A unificação da internet como a rede mundial que pode interligar todos computadores estaria definitivamente sedimentada no final dos anos 80 (KRISTULA, 2005).

Enquanto o Departamento de Defesa e as grandes universidades criavam uma rede voltada para o meio acadêmico e para o desenvolvimento de pesquisas, dois jovens estudantes, Ward Christensen e Randy Suess, escreveram, em 1977, um programa que permitia a transferência de arquivos entre seus microcomputadores. Em 1978 o programa foi aperfeiçoado e permitia enviar mensagens. Esse programa foi liberado para o domínio público. Surgiram, então, uma infinidade de redes interligando computadores pessoais, chamadas BBS (Bulletin Board Systems – Sistema de Quadro de Avisos), que permitiam aos usuários trocarem mensagens (CASTELLS, 2003).

Durante a década de 80, além de proliferarem as BBS, surgem diversas redes governamentais e de pesquisa, não apenas nos Estados Unidos, mas também na Europa. Também é nessa época que surge o movimento do software livre. Em 1984, Richard Stallman, numa reação à decisão da At&T de comercializar o Unix, sistema operacional que vinha sendo distribuindo gratuitamente desde 1974, criou a Free Software Foundation e desenvolveu o Gnu, um sistema operacional capaz de substituir o Unix, disponibilizado gratuitamente. O produto mais conhecido do movimento de software livre é o sistema Linux, desenvolvido por Linus Torvalds em 1991 (OPEN OPTIONS, 2005).

Entretanto, para tornar a internet efetivamente popular faltava o desenvolvimento de uma interface que a tornasse acessível ao público em geral. Em 1990, Tim Berners-Lee, que trabalhava no CERN (Laboratório Europeu para a Física das Partículas), desenvolveu um aplicativo de compartilhamento de informações, que denominou de World Wide Web. A principal característica desse aplicativo era interligar informações distribuídas entre diversos servidores, por meio de um sistema de hipertexto. O aplicativo criado por Berners-Lee foi o primeiro navegador da internet. Mas ele ainda não apresentava recursos gráficos. Em 1993, a

Universidade de Illinois apresenta o Mosaic, que incorporava esses recursos, o que iria tornar a navegação muito mais simples. Um dos pesquisadores que desenvolveu o Mosaic, Marc Andressen, convidado a trabalhar numa empresa privada, criou o Netscape Navigator, primeiro navegador comercial, distribuído desde outubro de 1994. O aparecimento dos navegadores gráficos foi decisivo para difundir o uso da internet. O sucesso do Navigator fez com que a Microsoft, que até então não acreditava no potencial da internet, lançasse o Internet Explorer, em 1995 (LEINER et al., 2005).

Em 1992, a internet já havia atingido uma escala global. Até então, ela era controlada pelo governo dos EUA. Frente a sua expansão, tornava-se necessário privatizá-la. Naquele ano foi formada a Internet Society, uma organização sem fins lucrativos que, até hoje, é encarregada de gerir a infraestrutura técnica da rede (ISOC, 2005). Essa organização, no ano de 1994, iniciou um processo junto ao escritório de patentes americano pedindo o cancelamento do registro da marca Internet pela empresa Honor Technologies, por entender que o nome não podia ser utilizado como uma marca, por tratar-se de um tipo de tecnologia e seu uso deveria ser de domínio público. O processo somente foi encerrado em 1999, confirmando o uso público do termo internet52 (ISOC, 2005). A atribuição de endereços na

internet foi controlada pelo governo dos EUA até 1998. Apenas naquele ano essa tarefa foi parcialmente privatizada, com a criação da Internet Corporation for Assigned Names and Numbers (ICANN, 2005). O conselho gestor do ICANN tem representantes de diversas regiões e países, mas ainda existe uma supervisão do Departamento de Comércio dos Estados Unidos. Esse fato restringe sua autonomia e faz com que sofra diversas críticas a respeito de sua ingerência em assuntos que deveriam estar a cargo das gestões nacionais da internet, principalmente em relação aos chamados domínios de países (as extensões que caracterizam sites localizados em servidores que estão dentro do território de um país, como .br no Brasil). Um exemplo disso foi a negação de reconhecimento aos endereços com extensão .eu, que seria aplicada a instituições da União Européia, numa estratégia para reforçar politicamente esta região (CASTELLS, 2003). Em julho de 2005, foi apresentado um relatório encomendado pela ONU a 40 especialistas sobre o futuro da internet (WGIG, 2005). O documento recomenda a internacionalização de seu governo, retirando o domínio dos EUA, de modo que as decisões possam ser favoráveis a um maior número de usuários. Essa posição, que causa um confronto entre os Estados Unidos e a ONU, tem o apoio do Brasil (CGI, 2005a)

52 Esse caso foi utilizado na nota número 1, para justificar o uso da palavra internet em letras

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