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4 PÁGINAS DE OUTRORA

4.10 Traçando novas linhas

Nas primeiras décadas do século XXI, o livro-reportagem continua representando um segmento importante para as editoras brasileiras, segundo atestam os próprios editores. Mas os livros de não ficção escritos por jornalistas enfrentam os mesmos turbilhões de crise que costumam atingir constantemente o mundo editorial. Em se tratando de varejo, segundo Borges (2009, p. 139) “os problemas de distribuição e a baixa quantidade de pontos de venda” geram um fenômeno de concentração em lojas que “solicitam descontos de 50% a 55%”, entre as quais a autora elenca como as principais a Saraiva, a Siciliano, a Nobel e a Livraria Cultura.

Ainda assim, uma simples consulta aos catálogos das principais editoras que trabalham com o gênero no Brasil atesta que grande número de jornalistas continua fechando acordos para produzir livros-reportagem sobre múltiplos assuntos, sejam biografias ou livros-reportagem. Algumas obras conseguem sobreviver editorialmente por anos, perpetuadas em várias edições, como A ilha, Rota 66, 1968: o ano que não

terminou, entre outras. Os editores entrevistados garantem que os livros-reportagem

vendem mais do que os títulos de ficção, o que só confirma a formação de um público fiel ao longo de muitos anos.

Pesquisa conjunta do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL) e da Nielson BookScan Brasil apontou que, de janeiro de 2016 a setembro de 2017, houve uma recuperação do mercado livreiro, da ordem de 6,25% em volume e 6,65% em valor, o que corresponde a algo em torno de 29,3 milhões de livros vendidos em 2016 e 33,1 milhões até setembro de 2017. Mas o faturamento total com o conteúdo digital

128 representa apenas 1,09% do mercado editorial brasileiro, segundo o Censo do Livro Digital de 2017, realizado pela SNEL. As biografias e autobiografias perseveram com sua força no mercado, representando um crescimento de 27% em volume e 41% em faturamento no comparativo de 2016 e 2017.

Nas livrarias, os livros-reportagem não aparecem sob essa alcunha, nem costumam ser reunidos em uma mesma prateleira. Com a popularização midiática da “batalha das biografias”, alguns estabelecimentos deram mais visibilidade a essa categoria. No entanto, muitas vezes estão agrupados na mesma estante não só livros- reportagem biográficos, mas também obras escritas por amigos ou inimigos dos biografados, não necessariamente jornalistas. Livros-reportagem que tratam de cinema, fatos históricos e música, por exemplo, em geral são distribuídos em prateleiras específicas para cada um desses assuntos, havendo casos de um Rota 66 repousar em uma prateleira de sociologia. Pode ser que essa distribuição difusa ajude o produto a tornar-se visível em todas as partes de uma livraria, mas um pouco mais de padronização na sua visibilidade talvez ajudasse.

No caso das biografias, outra questão interessante é que não houve, como se esperava, uma explosão imediata de publicação de livros-reportagem biográficos não autorizados após a decisão do STF. Pelo contrário, ironicamente, muitos artistas e personalidades culturais passaram a contratar jornalistas, antes e depois da decisão, para lançar biografias autorizadas, assinadas em conjunto. Foi o caso de Lobão, com 50 anos

a mil (2010); Gilberto Gil, em Gilberto bem de perto (2013); Rita Lee, em Rita Lee: uma autobiografia (2016), entre outros títulos. Mas Paulo César Araújo, o biógrafo não

autorizado de Roberto Carlos, promete testar os limites da nova lei publicando uma nova versão do seu livro proibido, agora pela Record.

Em sua tese de doutorado, Catalão (2010) estudou os livros-reportagem mais vendidos na linha histórica de 1966 a 2004. O pesquisador levou em conta lançamentos nacionais e internacionais de não ficção, criando uma hierarquia entre as obras em termos de sucesso comercial. Vale mencionar as experiências brasileiras, para entender os temas que encontraram mais aceitação junto ao público nesse arco de 38 anos. Destaque inicial para as biografias, com Olga (1985), de Fernando Morais, ocupando a primeira posição e detendo a marca de 29 meses na lista de mais vendidos. O biógrafo também conquistou o sétimo lugar com Chatô, o rei do Brasil (1994), tendo permanecido 14 meses na mesma lista. Em quinto lugar, As vidas de Chico Xavier

129 (1994, 15 semanas), de Marcel Souto Maior, além de confirmar o sucesso das biografias, trouxe à tona outra vertente do mercado: a abordagem de personagens ligados à religião e espiritualidade. Já Mauá: empresário do Império (1995, 18º lugar, 10 meses), de Jorge Caldeira, aparece em último na lista do pesquisador. Todos esses olhares jornalístico-biográficos dão conta de um vasto pano de fundo histórico e descortinam a vida atribulada e pulsante de personagens curiosos e marcantes.

Mas é o jornalista gaúcho Eduardo Bueno quem mais aparece na lista de mais vendidos organizada por Catalão (2010). Ele consolidou a tendência do olhar jornalístico sobre a história com livros de reconstituição, como A viagem do

descobrimento: a verdadeira história da expedição de Cabral (1998, 2º lugar, 24

meses). Manteve a fórmula em Náufragos, traficantes e degredados: as primeiras

expedições do Brasil – 1500-1531 (1998, 6° lugar, 15 meses) e em Capitães do Brasil

(1999, 12º lugar, 12 meses), no qual trata das desventuras dos primeiros representantes da coroa portuguesa, responsáveis por colonizar o território, e em Brasil: uma história –

a incrível saga de um país (2003, 17º lugar, 10 meses). História do Brasil apresentada

de forma clara e simples, com fartas ilustrações em edições cuidadosas em termos estéticos e muitas vezes pelo viés dos seus aspectos mais pitorescos, o que desperta críticas dos pesquisadores acadêmicos ortodoxos, semelhantes às que seriam enfrentadas por Laurentino Gomes a partir do lançamento de 1808, no ano de 2007.

O interesse dos leitores brasileiros pelos temas históricos filtrados pela ótica jornalística é confirmado, ainda, com 1968: o ano que não terminou (1989, 4º lugar, 16 meses), de Zuenir Ventura. E ainda com experiências de fôlego, como o conjunto As

Ilusões armadas de Elio Gaspari, cujos volumes A ditadura envergonhada (2002, 8º

lugar, 13 meses) e A ditadura escancarada (2002, 9º lugar, 12 meses), são elencados entre os mais vendidos na pesquisa. Por outro lado, seguindo a vertente do relato da violência urbana, de grande sucesso nos anos 1970 em livros-reportagem e romances- reportagem, Caco Barcellos encaixou seus dois principais livros entre os mais vendidos:

Rota 66: a história da polícia que mata (1992, 14º lugar, 10 meses) e Abusado: o dono do morro Santa Marta (2003, 15º lugar, 10 meses).

Percebe-se como, em um movimento constante de apostas editoriais, certas tendências, como a biografia de figuras notáveis, de reconstituição histórica e de denúncia das mazelas sociais encontraram respaldo junto aos mapas culturais de uma comunidade interpretativa de leitores brasileiros. A lista de Catalão (2010) confirma,

130 ainda, a consolidação do mercado de livros-reportagem no Brasil a partir de 1985, sendo a maioria produzida exclusivamente pelos jornalistas, não tendo origem em reportagens prévias publicadas na imprensa. Basta perceber que, entre 1966 e 1984, nenhum livro- reportagem de não ficção brasileiro escrito por jornalistas conseguiu chegar perto do desempenho de vendagens no gênero experimentado a partir de 1985. Ao que parece, o período de redemocratização também incentivou a retirada do limbo de várias abordagens antes silenciadas – vontade de revisitar o Brasil com o auxílio do trabalho de escavação jornalística amparado firmemente no solo da pesquisa histórica.

A partir de dados organizados pelo site Publishnews é possível ter indícios sobre como foi o desempenho dos livros escritos por jornalistas entre 2010 e 2017, levando-se em conta o amplo universo da não ficção. A lista é elaborada em cima da soma das vendas das 12 maiores livrarias do Brasil e é mais detalhada do que a da revista Veja, já que apresenta o número de exemplares comercializados. A intenção não é proceder aqui uma rígida análise quantitativa, e sim demonstrar como é o desempenho e quais são os temas dos livros escritos por jornalistas no mercado editorial nessa década.

A primeira análise geral que pode ser feita é que o jornalista Laurentino Gomes (1956) foi o que obteve melhor desempenho ao longo dos anos. Lançado em setembro de 2010, seu livro 1822 já era líder da lista dos mais vendidos daquele ano, com 115.546 exemplares comercializados e, em 2011, ficou em terceiro, com 72.872. Mas ninguém bate o sucesso da primeira parte da trilogia, 1808. Embora lançada em 2007, a obra vendeu 40.041 exemplares em 2010 (4º lugar). Manteve a posição em 2011, com 65.895 compradores. Em 2012 ficou com o 14º, com 29.583 de vendagem, 11º em 2013, com 27.236, e fechou a lista de 2014 com 19.021 (20º lugar). A terceira parte da trilogia, 1899, ficou em terceiro lugar no ano de seu lançamento, 2013, com 123.813 livros vendidos, e em sétimo em 2014, com 51.603. Na lista da Veja, com mais livrarias, Laurentino emplacou a trilogia inteira no ano de 2013.

O interesse pela interpretação jornalística da história tem se mantido como tendência nessa década ao se levar em conta o desempenho de outros títulos. O jornalista Leandro Narloch (1978) criou uma trilogia em 2010, começando com o Guia

politicamente incorreto da história do Brasil, 6º lugar naquele ano, com 18.792, 3º em

2011 (81.823) e 6º em 2012 (50.779). A segunda parte, o Guia politicamente incorreto

da América Latina, elaborado em parceria com Duda Teixeira, emplacou o sétimo lugar

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história do mundo, vendeu 40.100 em 2013 (6º lugar). Outro jornalista que trabalha com

história, Eduardo Bueno, voltou à ativa em 2010 e o seu Brasil: uma história teve 5.070 compradores (19º lugar). Vale lembrar, ainda, que Brasil: uma biografia (34.253), das pesquisadoras Lilia Schwarcz e Heloísa Starling, aparece em 17° em 2015, vendagem incomum para livros escritos por historiadores.

As biografias elaboradas por jornalistas continuaram atraindo o público leitor, com algumas peculiaridades. Aumentou a tendência de o profissional ser contratado por uma personalidade para organizar os seus depoimentos e a pesquisa documental, sendo que, em geral, esta última assina a obra. É o caso de 50 anos a mil, livro que, embora assinado pelo cantor e compositor Lobão, teve intensa participação do jornalista Claudio Tognolli (1963), sendo a biografia brasileira mais bem colocada em 2010 – 16º lugar, com 6.208 livros vendidos – e 7º em 2011, com 25.593. Em 2013, um ex-jogador e comentarista esportivo lançou Casagrande e os seus demônios, assinado em parceria com o jornalista Gilvan Ribeiro (1989), vendendo 41.231 exemplares e ficando em 4º lugar. Já em 2014, Cláudio Tognolli fechou parceria com Romeu Tuma Jr. para organizar Assassinato de reputações, que aparece na lista em 5º lugar, com 62.199.

Apostando no filão religioso, o jornalista Rodrigo Alvarez (1974) lançou, em 2014, Aparecida (60.909, 6º lugar) e emendou, em 2015, com Maria (7º, com 80.925; 6º em 2016, com 59.357). Em 2016 apresentou a biografia do padre cantor Fábio de Melo, Humano demais, 17º lugar, com 24.341. O jornalista Marcel Souto Maior (1966) e a sua biografia Kardec (24.581), sobre o criador da doutrina espírita, esteve em 13º em 2013.

Ainda no campo das biografias, destaque para o veterano jornalista e escritor Ignácio de Loyola Brandão (1936), que ficou em 20° (3.302) em 2010, com Ruth

Cardoso: fragmentos de uma vida. Em 2013 ele biografou um anônimo que ficou

milionário, em Carlos Wizard: sonhos não têm limites, conseguindo vender 27.701 e ficando em 9º lugar, enquanto no ano seguinte o mesmo livro vendeu 30.717 (12º). Outra biografia que chamou a atenção foi Dirceu, de Otávio Cabral (1971), sobre o político José Dirceu, 14º lugar em 2013 (24.004). Já a última parte da trilogia sobre Vargas, Getúlio:1945-1954, de Lira Neto (1963), em 2014, vendeu 28.561 e ficou em 15°, mesma colocação de outra biografia de um empresário, Abílio (38.436), sobre Abílio Diniz, da jornalista Cristiane Correa (1970), em 2015.

132 Por fim, também tem atraído os leitores os temas ligados a escândalos políticos, principalmente os mais recentes da história do Brasil. A privataria tucana, de Amaury Ribeiro Jr. (1959), emplacou o 8º lugar em 2011, com 27.250, e o 7º em 2012 (47.824).

Lava jato, do jornalista Vladimir Neto (1973), focado na atuação do juiz Sérgio Moro,

foi o mais bem colocado na lista de mais vendidos da Publishnews de 2016, com 80.931 livros vendidos. Nas listas da Veja entre 2010 e 2017 também aparece bem colocado, em 2014, Operação banqueiro, do jornalista Rubens Valente (1970). E Holocausto

brasileiro, de Daniela Arbex (1973) foi destaque na revista em 2013, embora ambos não

apareçam na lista de 20 mais vendidos do site.

No ano de 2017, o segundo lugar da lista de mais vendidos em não ficção indicava outra tendência do mercado: as autobiografias de personalidades do mundo da música. Rita Lee: uma autobiografia, que ela alega ter escrito sozinha, já tinha ficado em 8º lugar em 2016, com 43.729 livros vendidos e, em 2017, estava com 98.083.

Hebe: a biografia, do jornalista Artur Xexéo (1951), chamou a atenção com 22.174,

ocupando o 15º lugar. Embora não seja um jornalista, livros do médico Drauzio Varella (1943), como Prisioneiras (9º lugar, com 29.613, em 2017), costumam ser classificados como livros-reportagem por alguns autores, pelo seu estilo de escrever e apurar. Parceria entre um artista e um jornalista, O livro de Jô: uma biografia desautorizada, assinada por Jô Soares (1938) e Matinas Suzuki Jr., vendeu muito bem já na estreia, 29.550 exemplares, ficando em 10º lugar.

Quanto aos jornalistas, a possibilidade de sobreviver de livro no Brasil contemporâneo parece remota. Alguns, mais experientes, como Fernando Morais e Lira Neto, conseguiram tal status, mas muitos repórteres ainda dividem o ofício de escritor com a labuta diária nas redações. Ou, em alguns casos, mesmo não estando presencialmente nelas, precisam ainda colaborar com colunas semanais. As estratégias de marketing parecem ser, às vezes, mirabolantes e caras, como as que antecedem o lançamento de autores best-sellers como Laurentino Gomes. No entanto, uma grande massa de jornalistas que escreve livros luta para conseguir viabilizar contratos e tentar continuar publicando novas obras. Essas e outras questões ficarão mais claras a partir dos depoimentos dos dez jornalistas escritores e dois editores entrevistados nesta tese.

A estrutura narrativa dos livros-reportagem, com força na descrição dos ambientes e reconstituição dos personagens em plena ação, também tem chamado a atenção dos produtores de cinema brasileiros. Fernando Morais é um dos que mais tiveram a chance

133 de ver suas obras serem transpostas para a tela grande. A mais cara, com chancela da

Globo Filmes, em 2004, foi Olga, dirigida por Jayme Monjardim e com Camila

Morgado no papel principal. O filme atingiu a marca de 3,5 milhões de espectadores. Outra versão cinematográfica envolvendo a obra desse autor, Corações sujos, dirigida por Vicente Amorim e lançada em 2011, não obteve tanta projeção. Entretanto, a transposição mais polêmica foi a de Chatô, o rei do Brasil. O ator Guilherme Fontes se propôs a adaptar a obra em 1995, mas o filme só foi lançado, com certo sucesso de crítica, em 2015. Fontes teria consumido R$ 8,6 milhões na produção e foi questionado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) sobre o uso do dinheiro de captações.

Algumas associações também oferecem prêmios específicos para a categoria livro-reportagem ou biografia. Embora os entrevistados não acreditem que esses louros impactem a vendagem dos seus livros, trata-se de uma chancela a mais para as editoras pelo menos carimbarem um selo de agraciado em novas edições, agregando valor ao produto. O prêmio Jabuti é o mais prestigiado, sendo que alguns livros-reportagem superaram as categorias específicas e obtiveram a marca de melhor livro de não ficção do ano. Foi o caso de Estrela solitária, de Ruy Castro, em 1996; Corações sujos, de Fernando Morais, em 2001; Abusado, de Caco Barcellos, em 2004; Carmen, uma

biografia, de Ruy Castro, em 2006; e do bicampeão nessa categoria máxima, Laurentino

Gomes, com 1808 e 1822, respectivamente em 2008 e 2011.

O Prêmio Vladimir Herzog, que abrangia livros com temas mais sociais, políticos e engajados, abandonou a categoria de livro-reportagem em 2010. Já a Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) ainda premia anualmente livros nas amplas categorias de Ensaio/teoria e Crítica literária/reportagem, além de Biografia/autobiografia/memória. Em termos internacionais, o campo da não ficção em livro comemorou o prêmio Nobel de Literatura de 2015, concedido, pela primeira vez, a uma autora de livros-reportagem, a escritora e jornalista bielorussa Svetlana Alexiévitch, que concebeu, entre outras obras, Vozes de Tchernóbil: a história oral de um desastre

nuclear e A guerra não tem rosto de mulher, lançados em 2016 no Brasil. Um sinal de

reconhecimento do gênero no campo literário e no mercado editorial.

Embora não seja objeto dessa tese, a produção de livros-reportagem por estudantes de jornalismo em todo o Brasil, como modalidade de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), também é significativa e merece mais estudos acadêmicos. Porém, poucos conseguem publicar posteriormente as suas experiências ou mesmo se aventurar

134 mais profundamente nesse campo quando se tornam profissionais. Uma boa amostra da força desse tipo de produto nas universidades de jornalismo são as inscrições para o prêmio Exposição de Pesquisa Experimental em Comunicação (Expocom), da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares de Comunicação (Intercom), que escolhe todos os anos, em seus congressos regionais e nacionais, os melhores livros- reportagem produzidos por acadêmicos de jornalismo.

A partir das entrevistas com os jornalistas e editores analisadas nos próximos capítulos, serão apresentadas as características dos livros-reportagem brasileiros na contemporaneidade. Como no passado, os seus autores continuam assumindo uma postura de revelar um Brasil oculto, aspectos da história pouco iluminados, personagens importantes que não tiveram a devida avaliação pública e uma carga forte de humanização. Desde meados dos anos 1980, os livros escritos por jornalistas foram deixando de ser apenas espaço de publicação de crônicas ou reportagens que já haviam obtido reconhecimento público na mídia impressa diária para se tornarem projetos profissionais em contrato direto com as editoras.

Assim, a herança do jornalismo como instituição, ou seja, dos saberes de procedimento, reconhecimento e narração do que é noticiável ou, no caso do livro, com pretensão de “eternizável”, continua movendo e servindo de baliza para vários jornalistas no processo de elaboração dos livros-reportagem. Euclides da Cunha, um dos pioneiros no laboratório de transformar informações jornalísticas em material de livro e todos os seus sucessores, principalmente os repórteres-cronistas, continuam sendo modelos, apesar das diferenças com as formas atuais de produção.

Encerrado esse esboço de reflexão histórica sobre os livros publicados por repórteres no Brasil, que não teve pretensão alguma de ser definitivo, pode-se partir, no próximo capítulo, para a discussão da metodologia que norteou essa pesquisa e fundamentou as entrevistas com 10 jornalistas escritores de livros-reportagem e dois editores. Também nas próximas páginas será justificada a escolha do universo de entrevistados em específico, bem como apresentada a trajetória de cada um deles no jornalismo e no mercado editorial.

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