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ARTICULAÇÕES ENTRE A PSICOLOGIA E A EDUCAÇÃO: A CONSOLIDAÇÃO DA PSICOLOGIA ESCOLAR

2.3 O QUE É A P SICOLOGIA E SCOLAR ?

2.3.1 U MA P SICOLOGIA E SCOLAR PREVENTIVA E RELACIONAL

A compreensão contemporânea de atuação em Psicologia Escolar aponta para a necessidade de o psicólogo se desvincular da ação culpabilizadora e de exclusão em relação aos alunos, que prevaleceu em outros momentos históricos, bem como para a necessidade de ocupar-se da individualidade dos sujeitos sem, contudo, desarticulá-los de suas redes de relações e de sua história. Nesse sentido, a perspectiva preventiva na atuação em Psicologia Escolar mostra-se como possibilidade de uma atuação diferenciada (Araújo, 2003; Araújo & Almeida, 2003).

A noção de prevenção está, normalmente, relacionada à ação de se antecipar a determinado fenômeno com o objetivo de evitar que ele ocorra e, nesse sentido, a idéia decorrente dessa concepção é evitar a ocorrência de problemas e de ajustar soluções a possíveis problemáticas. Todavia, contemporaneamente, a perspectiva preventiva na atuação psicológica busca a superação da visão de promoção de adaptação, esperando que o profissional de Psicologia, em sua atuação, “evidencie as contradições entre as práticas educativas e as demandas dos sujeitos nesse contexto” (Araújo, 2003, p. 65).

Sobre o entendimento da atuação preventiva, Marinho-Araújo e Almeida (2005) esforçam-se em esclarecer que o conceito de prevenção não se refere ao ajustamento e adequação de situações e comportamentos, tidos como inadequados, a padrões aceitos socialmente. Esse posicionamento de controle social, exercido a partir da padronização de comportamentos e atitudes, desconsidera a característica histórica e social de cada indivíduo.

Ao contrário desta visão de controle, Marinho-Araújo e Almeida (2005) sugerem que a atuação preventiva em Psicologia Escolar esteja respaldada em ações que busquem a) facilitar e incentivar a construção de estratégias de ensino diversificadas, b) promover a reflexão e a conscientização de funções, papéis e responsabilidades dos sujeitos e c) superar, junto com a equipe escolar, os obstáculos à apropriação do conhecimento.

Dessa forma, a ação preventiva deve se redirecionar para a compreensão e intervenção nas relações interpessoais que permeiam a construção do conhecimento e da ação pedagógica e, assim, é preciso que o psicólogo escolar instrumentalize-se no sentido de estudar e entender as relações interpessoais como sendo sua unidade de análise, isto é, seu foco de atenção e de intervenção. (Almeida, 1999; Araújo, 2003; Araújo & Almeida, 2003; Marinho-Araújo & Almeida, 2005).

Corroborando a perspectiva relacional e sobre as dificuldades que surgem na história de vida de um sujeito, Machado (2000) lembra que “não existem causas individuais para os fenômenos da vida, pois eles não são individuais, não são de ninguém. São efeitos que se engendram em uma rede de relações” (p. 146). Por assim ser, entende-se que os fenômenos são viabilizados nas relações e, dessa maneira,

os caminhos para a intervenção do psicólogo escolar devem, portanto, estar ancorados na compreensão de que as relações sociais originam o processo interdependente de construções e apropriações de significados e sentidos que

acontece entre os indivíduos, influenciando, recíproca e/ou complementarmente, como cada sujeito constitui-se enquanto tal. Para intervir na complexidade intersubjetiva presente nessas relações, o psicólogo deve fazer uma escolha deliberada e consciente por uma atuação preventiva sustentada por teorias psicológicas cujo enfoque privilegie uma visão de homem e sociedade dialeticamente constituídos em suas relações históricas e culturais. (Araújo, 2003, p. 66).

Nesta perspectiva relacional, entende-se que o psicólogo escolar deve se apropriar e se instrumentalizar para o estudo, análise e intervenção nas relações interpessoais, entendidas enquanto unidade de análise da prática educativa e pedagógica. Este posicionamento de caráter preventivo supõe que se crie um espaço de interlocução com os professores que tenha como foco tanto os aspectos objetivos dos processos de desenvolvimento e de aprendizagem como a conscientização dos aspectos subjetivos que permeiam estes processos (Araújo, 2003; Araújo & Almeida, 2003).

Faz-se extremamente necessário abandonar as concepções e práticas que entendem os fenômenos educativos sobre o prisma individual e dissociado do contexto histórico- social no qual está inserido, devendo se encaminhar para a adoção de concepções integradoras e amplas.

Pesquisas unidirecionais que focalizam apenas o ambiente familiar, por exemplo, devem procurar integrar outros aspectos, para além daqueles relacionados ao contexto familiar, como ocorre com o exemplo a seguir. Com o objetivo de identificar que recursos no ambiente familiar podem favorecer o desempenho escolar, uma investigação desenvolvida por Marturano (1999) constatou, junto a uma amostra clínica de 100 crianças encaminhadas por dificuldade de aprendizagem, que a presença ou ausência de materiais educacionais e do envolvimento parental podem afetar o desempenho escolar dos filhos.

As crianças que participaram da pesquisa estavam em atendimento psicológico clínico especializado.

A partir dos dados coletados em entrevistas com as mães e por textos solicitados às crianças, a autora aponta que o nível de elaboração da escrita das crianças está positivamente associado à disponibilidade de livros e brinquedos, enquanto o atraso escolar está negativamente associado à organização das rotinas e à diversidade de atividades compartilhadas com os pais. Nota-se que esta pesquisa não incluiu, em seu planejamento, por exemplo, a investigação de aspectos do cotidiano escolar ou social que participam do processo de ensino-aprendizagem. E, em conseqüência do desempenho acadêmico das crianças, foi atribuída responsabilidade exclusiva aos materiais educacionais disponíveis no ambiente familiar e ao envolvimento parental.

Assim, pesquisas e estudos que privilegiam apenas um contexto de desenvolvimento, por exemplo, devem ampliar seu olhar para a inter-relação existente entre os sujeitos, os afetos, as aprendizagens, os contextos, entre outros.