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Os valores se distinguem, de várias manei­ ras, do conceito de objetivos mais tradicio­ nal da TCC. Embora os objetivos possam ser bastante úteis para dirigir o comporta­ mento, eles também apresentam certas ca­ racterísticas que limitam sua utilidade na promoção de um estilo de vida saudável e gratificante. Por exemplo, os objetivos foca­ lizam o futuro e consideram, inerentemente, o que a pessoa deveria ser, mais do que aquilo que ela é no momento. Embora essas pro­ priedades possam tornar motivadores os objetivos, também podem gerar sentimen­ tos de descontentamento e desesperança, e promover a não aceitação do momento pre­ sente. Em contraste, os valores se centram no momento e incentivam a participação e o empenho em atividades valorizadas.

A valorização é conceitualizada como um processo ou uma direção (p. ex., cuidar da própria saúde e bem-estar), ao passo que o objetivo é um ponto final ou resulta­ do (p. ex., perder cinco quilos). É possível conquistar ou atingir um determinado ob­ jetivo, mas os valores jamais são totalmente satisfeitos ou permanentemente obtidos. Apesar de suas diferentes funções, os obje­ tivos e os valores se inter-relacionam: pode­ mos pensar nos valores como a cola entre os objetivos. Por exemplo, podemos ter o objetivo de sair com alguém em um encon­ tro, o que pode ser impulsionado por um valor importante de desenvolver, nutrir e manter relacionamentos íntimos. Enquanto

o objetivo pode ser atingido, a valorização é um processo constante que dirige o com­ portamento antes que o relacionamento seja iniciado e continua a informar e aperfeiçoar um relacionamento mais íntimo e profundo conforme ele evolui.

Em nosso trabalho clínico, pedimos ao cliente que considere e discuta suas expe­ riências positivas e negativas com objeti­ vos. Ele geralmente consegue perceber mo­ mentos em que seus objetivos mantiveram seu comportamento nos trilhos e outros em que os objetivos foram associados à pro­ crastinação e desapontamento. Frequen­ temente utilizamos o Material 7.1 (p. 178) para resumir muitos dos pontos descritos acima. Também utilizamos a seguinte me­ táfora, adaptada da TAC, para distinguir esses dois construtos (Hayes, Strosahl e Wilson, 1999):

Suponha que você gosta muito de es­ quiar e planeja uma viagem há semanas. Finalmente chega o dia da viagem; você compra o ingresso para o teleférico, es­ pera na fila e chega ao topo do monte. Quando está prestes a dar a largada, um homem se aproxima e lhe pergun­ ta sobre o seu objetivo: "Aonde você está tentando chegar?" Quando você responde "à base do monte", ele insiste que pode lhe ajudar a atingir esse obje­ tivo e prontamente a empurra para um helicóptero, a leva até a base do morro e desaparece. Imagine como você se sen­ tiria. Embora o objetivo de esquiar seja chegar à base do morro, a parte diver­ tida está no processo. Ter o objetivo de chegar à base é importante porque lhe permite se engajar no processo, mas o valor de esquiar está em deslizar veloz­ mente morro abaixo.

E agora vamos imaginar a situação de se apaixonar. Imagine que o seu obje­ tivo é se comprometer com um parceiro de vida. Você vai a uma festa e atrai o olhar de um homem atraente e interes­ sante. Magicamente, a sua vida avança velozmente por meio do processo e re­

toma a velocidade normal no momento em que você atinge seu objetivo. Quan­ do se dá conta, está indo embora da festa com esse homem, que é agora o seu companheiro de vida. Você conse­ guiu pular os momentos embaraçosos, a primeira briga e conhecer a família dele, mas também pulou a antecipação do primeiro beijo, a emoção intensa que acompanha o sentimento de verdadeira conexão, e a experiência de declarar o seu amor diante dos amigos e da famí­ lia durante uma cerimônia de casamen­ to ou comprometimento.

Pense se essa caracterização está de acordo com a sua experiência. Os objetivos são úteis porque nos mantêm voltados para direções valorizadas, mas talvez precisemos encará-los de modo menos sério, para que continue claro o que realmente importa na vida. Um exemplo clínico pode ajudar a ilus­ trar algumas das sutis distinções entre va­ lores e objetivos. Amy, uma jovem cliente diagnosticada com TEPT relacionado a um ataque sexual, chegou à terapia com o obje­ tivo declarado de encontrar um parceiro de vida. Ela tinha muito medo dos pensamen­ tos, lembranças e emoções relacionadas ao ataque, e evitava a maioria das interações interpessoais por medo de que eliciassem essas experiências indesejadas. Embora o seu objetivo de ter um relacionamento ínti­ mo parecesse ser benéfico para o tratamen­ to, no decorrer do tempo ficou mais claro que isso não estava tendo nenhuma função motivacional. Amy estava muito isolada e passava muito tempo imaginando como a sua vida seria maravilhosa se ela tivesse tido a sorte de encontrar o parceiro certo. Ela, regularmente, comparava o seu self atual com seu futuro self idealizado, e man­ tinha uma lista mental do que precisava "consertar" em si mesma antes de buscar seu objetivo (p. ex., ela precisava parar de ruminar sobre o abuso sexual, precisava ser mais feliz e menos deprimida, precisava se sentir inteira).

A Prática daTerapía Cognitivo-comportamental Baseada em Mindfulness e Aceitação 16 1

Utilizando vários dos métodos discuti­ dos neste capítulo, trabalhamos com Amy os seus valores. Exploramos o valor de "ter contatos íntimos com as pessoas" que in­ formava seu objetivo de relacionamento e a incentivamos a realizar algumas ações consistentes com esse valor (p. ex., fazer contato visual, conversar com as pessoas ouvindo-as com mindfulness, revelar seus pensamentos e sentimentos) em seus atuais relacionamentos (com a terapeuta, seus médicos, as outras mulheres de seu grupo de terapia, e as mulheres com as quais mo­ rava em seu programa de residência), mes­ mo que ainda experienciasse ruminações, sentimentos de tristeza e pensamentos de inadequação. Ao longo do tempo, Amy começou a fazer mais amizades e, depois, a namorar. Seu objetivo foi atingido, mas, mais importante, a qualidade global de sua vida melhorou quando ela começou a agir de acordo com seu valor e a se relacionar com as pessoas em seu dia a dia.

Valorização como um