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RESULTADOS PISA 2018

5.1 A Teoria das Situações Didáticas

CAPÍTULO 5 135

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A fundamentação teórica, ora abordada, consiste na aplicação da Teoria das Situações Didáticas (TSD) e nos pressupostos da Dialética Ferramenta-Objeto. A escolha da TSD para guiar a pesquisa, justifica-se em função do problema apresentado, qual seja investigar que variáveis didáticas presentes na aplicação de uma sequência didática potencializam o letramento financeiro do estudante de licenciatura em Matemática, observando as interações estabelecidas entre o professor, o aluno e o saber. Já os pressupostos da Dialética Ferramenta- Objeto nortearão a construção de conceitos de juros na Matemática Financeira e a compreensão do objeto de estudo em diferentes quadros (numérico, algébrico, gráfico e estatístico) e, ainda, em contextos diversos (social, financeiro e empreendedor), usando a perspectiva de cenários para investigação.

procedimentos que possibilitem a determinação de variáveis didáticas e seus valores 136 relacionados ao saber matemático. Assim, destacamos algumas variáveis e valores que estamos considerando neste estudo.

Quadro 9 – Variáveis didáticas e valores levados em conta na elaboração e escolha das tarefas

Variáveis didáticas Valores

Contexto social Equidade

Exclusão

Evasão escolar

Contexto socioeconômico Renda

Educação

Saúde

Contexto socioeconômico Alto

Médio

Baixo

Tipo de Gráfico Dados explícitos

Dados implícitos

Comparação gênero e cor ou raça

Tipo de medida central Conjunto homogêneo

Conjunto heterogêneo

Restrição

Aspectos de qualidade de vida Expectativa de vida

Educação

Renda (PIB per capita) Indicadores de qualidade de vida Categorias

Escala de valores

Tipo de média Classificação

Comparação

Restrição

Adequabilidade Cálculo do Índice de Desenvolvimento Humano

(IDH)

Índices

Medida

Escala de valores

Inflação e índice de inflação Razão

Porcentagem

Variação percentual

Reajuste de Inflação Desvalorização do dinheiro

Poder de compra Gráfico de colunas e índice de inflação Altura das barras

Interpretação inadequada Tipo de tabela (Capitalização simples) Taxa incide sobre o capital

Valor dos juros é mesmo em todos os períodos

Tipo de tabela (Capitalização composta) Taxa incide sobre o montante acumulado no período imediatamente anterior

Valor dos juros aumenta em cada período

Tipo de gráfico (Função afim) Uma reta

Crescimento linear Tipo de gráfico (Função exponencial) Curva exponencial

Crescimento exponencial

Comparação percentual Proporção 137

Porcentagem

Análise de resultados Previsão de lucro e dívida

Pagamento financiado ou à vista Trocas intertemporais Números do crescimento econômico Relação com o consumo

Consequência para o pós-consumo Números do consumo de fast food Hábito alimentar

Conscientização do consumo alimentar Panfleto de promoção: valor anunciado x valor

praticado na loja

Conhecendo o CDC

Esclarecimento do CDC para publicidade de um produto

Vai vencer: preço baixo Data de validade

Produto impróprio para o consumo Tipo de cadastro para inadimplência Nome limpo, sem restrição de crédito

Organização financeira Fonte: Elaborada pelo autor.

De acordo com Brousseau (1997), os valores constituem caminhos variáveis da situação matemática e podem ser mudados para gerar uma mudança no jogo (ou situação-problema), provocando uma modificação da estratégia ótima, mesmo que o objeto matemático continue sendo o mesmo.

Para exemplificar como essa mudança no valor da variável implica em uma mudança de estratégia do aluno, destacamos uma situação do regime de capitalização composta que se faz muito presente para o cidadão-consumidor.

Em um anúncio de uma loja, um produto pode ser comprado por R$ 300,00 à vista ou em três parcelas mensais iguais de R$ 100,00 sem juros, sendo o primeiro pagamento no ato da compra. Estas formas de pagamentos são equivalentes?

Podemos pensar nos dois esquemas abaixo para representar o problema.

Gráfico 9 – Fluxo de caixa dos pagamentos (1)

Fonte: elaborado pelo autor.

Essa situação requer do aluno uma mudança de direção em relação ao anúncio da loja, que propõe um pensamento de que R$ 300,00 hoje é o mesmo que R$100,00 (hoje) + R$ 100,00 (daqui a 1 mês) + R$ 100,00 (daqui a 2 meses).

A mudança de estratégia esperada por parte do aluno é que ele pense na mudança de 138 valor no contexto do problema, ou seja, que o dinheiro tem um custo no tempo. Portanto é incorreto somar quantias monetárias em períodos diferentes, sendo necessário estabelecer uma data focal para tal comparação. A mudança desejada para compreensão da situação dada seria, por exemplo, escolher o momento zero para comparação e considerar um custo para o dinheiro no mês (por exemplo 3%, percentual geralmente acrescido em compras com o cartão de crédito).

Comparando os valores na época 0, obtemos:

𝐶1 = 300,00

𝐶2 = 100 + 100

(1 + 0,03)1+ 100

(1 + 0,03)2 = 100 + 97,09 + 94,26 = 291,35

A referida mudança permitirá ao aluno compreender que a ideia de “juro zero” é estratégia de marketing. As lojas costumam anunciar o mesmo preço à vista e para parcelamento sem juros, ou seja, aumenta o valor à vista (juro embutido) para dar a falsa ideia de igualdade nas possibilidades de pagamento.

Desta forma, fica explícito que o valor da entrada é isento de juros e as outras duas parcelas, apesar de serem iguais, são formadas de duas partes (amortização + juros) e, que para retornar com o dinheiro no tempo, basta multiplicar pelo fator 1

(1+𝑖)𝑛, decorrente do cálculo exponencial, no qual 𝑖 indica a taxa com representação decimal e 𝑛, o número de períodos.

Deste modo, o trabalho do professor é construir situações para que o aluno elabore seus conhecimentos como resposta pessoal, fazendo-o agir sozinho ou em grupo, para tomar decisões e justificá-las ou modificar sua resposta, de acordo coma as exigências do milieu, e não a um desejo do professor. De acordo com Brousseau (1996), uma situação adidática é uma situação através da qual o que se faz tem caráter de necessidade em relação às obrigações que não são arbitrárias nem didáticas. Ainda segundo esse autor:

[...] não basta comunicar um problema a um aluno, para que esse problema se converta em seu problema e ele sinta o único responsável de resolvê-lo. Também não basta que o aluno aceite essa responsabilidade para que o problema que resolva seja um problema “universal”, livre de pressupostos subjetivos (BROSSEAU, 1996, p.50).

Nesse caso, cabe ao professor o que Brousseau (1996) denomina de “devolução”, a atividade por intermédio da qual o professor tenta alcançar ambos os resultados, fazendo a mediação do processo. Para o professor, é grande a tentação de romper com esse momento de

devolução e ensinar diretamente o saber14 como objeto cultural, evitando as interações do aluno 139 com o milieu. Nesse caso, apresenta-se o saber e o aluno se apropria dele como puder.

Para Almouloud (2007), a TSD permite ao professor, no momento da aplicação de uma situação-problema em sala de aula, experimentar quatro fases denominadas de dialéticas, quais sejam da ação, da formulação, da validação e da institucionalização no processo de aprendizagem.

Segundo esse autor, a dialética da ação possibilita colocar o estudante numa situação de ação, na qual é posto um problema para o aluno, cuja melhor solução, nas condições propostas, é o conhecimento a ensinar. A dialética de formulação propicia ao aluno trocar informações com uma ou várias pessoas, os quais serão os emissores e receptores, trocando mensagens escritas ou orais. Este é o momento em que os aprendizes ou grupo de aprendizes expõem, por escrito ou oralmente, os conhecimentos que mobilizaram e a solução encontrada. Para a dialética da validação, o aluno deve mostrar a validade de seus argumentos, colocando a mensagem matemática a julgamento de um interlocutor. O emissor deve justificar a exatidão e pertinência de seu modelo e fornecer, se possível, uma validação semântica e sintática. Por último, a dialética da institucionalização se dá quando o professor fixa de modo convencional e explícito o estatuto cognitivo do saber, dizendo o que é novo na construção do conhecimento do aluno, mostrando o objeto de estudo e o nomeando. Uma vez construído e validado, o novo conhecimento vai fazer parte do patrimônio da classe. Posteriormente a essa fase, o saber se torna disponível para a utilização na resolução de problemas matemáticos.

A presente proposta de pesquisa visa o estudo dos processos de ensino e de aprendizagem direcionados para atividades do estudante de licenciatura, por meio da criação de situações que provoquem a construção de conhecimentos financeiros e reflexões sobre o comportamento financeiro dos alunos no contexto da educação financeira.

Na próxima seção, apresentaremos a estruturação em cenários para investigação, segundo Skovsmose (2014), em diferentes milieux de aprendizagem.