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_O Plano Diretor Participativo de Fortaleza: o que tem de novo?

3. Título III – Do Sistema de Planejamento e Gestão: Capítulo I – Da Estrutura Funcional

5.2 A primeira revisão do PDDU: uma visão tecnocrática

5.2.1 A relevância da participação da rede NUHAB

A rede NUHAB começou a se articular em 2002, quando diversos movimentos sociais e algumas ONGs perceberam a necessidade de discutir a cidade de modo mais aprofundado, após o início do processo do LEGFOR. A sua participação foi essencial para a interrupção da votação do plano diretor na Câmara.

A ONG CEARAH Periferia (CP) teve um importante papel nessa articulação. Nela já havia um projeto em andamento chamado Escola de Planejamento Urbano, existente até hoje e que fazia parte de um programa maior, o Programa Cidades Sustentáveis. O objetivo da escola era capacitar pessoas pertencentes aos movimentos sociais acerca das problemáticas urbanas, da legislação, das políticas e dos programas relacionados às cidades, segundo a entrevistada 15. Buscava-se o empoderamento dos movimentos sociais.

Além do CP, os próprios movimentos sociais, àquela época, já faziam capacitações e trabalhos de conscientização acerca do plano diretor com as comunidades que lidavam com a temática urbana, como o CMP e a FBFF.

A agenda da Reforma Urbana voltou a ganhar força no Brasil depois da aprovação do Estatuto da Cidade. Após a eleição do presidente Lula, diversos movimentos sociais começaram a participar do debate acerca desse tema em escala nacional através do Conselho das Cidades e das Conferências da Cidade, conforme comentado no capítulo anterior. As articulações de Fortaleza passaram a ocupar uma cadeira de suplente no Conselho Nacional das Cidades, com uma diretora do CP. Esse fato, juntamente com a campanha nacional Plano Diretor Participativo, sensibilizou os movimentos sociais e articulações locais acerca da importância desse instrumento, que estava sob revisão, e estimulou neles a percepção da necessidade de participar do processo.

O CP percebeu, portanto, a importância de relacionar o curso da Escola de Planejamento Urbano à discussão que estava acontecendo sobre o plano diretor, pois o processo estava em andamento sem apresentação de metodologia de participação, e aquele era um espaço aberto para o debate sobre a cidade. A rede NUHAB foi gerada nesse contexto e teve como espaço para acontecer a sede do próprio CP, segundo a entrevistada 15.

Os debates se intensificaram no NUHAB, mas este percebeu que havia um déficit de conteúdo por parte dos movimentos, que não conheciam profundamente as leis, os instrumentos urbanísticos, o Estatuto da Cidade, nem sequer as ZEIS. Dessa forma, era complicada a exigência dos direitos

77 A importância da participação da rede NUHAB no processo do LEGFOR e do PDPFor foi destacada em diversas

entrevistas. A construção do texto sobre como se deu essa articulação e participação foi baseada na entrevista feita com a entrevistada 15, participante da rede na época, mas também com os entrevistados 02 e 14 e a partir do documento de pesquisa feito pelo Ministério das Cidades (BRASIL, 2004).

durante o processo de elaboração do plano. O NUHAB destacou, portanto, a necessidade de capacitação dos movimentos acerca da temática, mesmo que de modo paralelo ao processo de desenvolvimento do plano.

A avaliação que se tem é que a realização de mobilizações, pressões, ocupações, articulações e ações de qualificação da participação popular é que têm garantido minimamente o avanço tanto no que diz respeito às legislações, como no atendimento das demandas sociais e na construção de mecanismos de exigibilidade de direitos (BRASIL, 2004).

Assim, em 2003, a rede NUHAB concorreu e ganhou um projeto da CESE (Coordenadoria Ecumênica de Serviços) e o articulou com o da Escola de Planejamento Urbano, já existente e financiado pela OXFAM78, ambos projetos de advocacy. Dessa forma, a Escola direcionou a sua capacitação para a temática urbana, voltada para contribuir no empoderamento dos movimentos sociais acerca dos temas relacionados ao plano diretor. Essa capacitação era complementada por aquelas desenvolvidas pelos próprios movimentos sociais nos bairros.

No início de 2004, o NUHAB lançou a campanha “Por um Plano Diretor Participativo”, com um evento que reuniu as entidades integrantes da rede, os movimentos sociais envolvidos e a universidade; a partir daí iniciou a realização de capacitação sobre o Plano Diretor de Fortaleza para os movimentos sociais e demais interessados. Os objetivos da campanha eram:

Sensibilizar as comunidades para a importância do Plano Diretor e informar sobre a proposta encaminhada pela Prefeitura de Fortaleza e estimular e desencadear um processo de participação da população na gestão democrática da cidade (BRASIL, 2004).

A campanha desenvolveu, além da capacitação da população, diversas ações informativas sobre o plano e suas consequências para a cidade e para as pessoas e uma pesquisa sobre o conhecimento da população acerca do que é plano diretor (BRASIL, 2004). Também fazia parte das atividades de

advocacy do NUHAB, de acordo com a entrevistada 15, o acompanhamento da aprovação do LEGFOR

durante as audiências públicas na Câmara.

Como última atividade do projeto maior, devido às irregularidades identificadas pelo NUHAB durante todo o processo do LEGFOR, foi desenvolvida a referida ação de contestação. Entretanto, o NUHAB precisaria de apoio do Ministério Público para que a ação fosse implementada. Inicialmente, procuraram o Ministério Público Estadual (MPE), que não quis dar seguimento à ação. O Ministério Público Federal (MPF) passou a ser uma segunda opção, e era possível o seu apoio, visto que o

78 A Oxfam é “uma das organizações não governamentais internacionais que lideram o trabalho de ajuda humanitária em

situações de emergência no mundo. Além disso, a Oxfam, a partir de sua identidade de trabalhar em parceria com outras organizações, passa a fazer parte de um movimento global a favor de mudanças que criem as condições estruturais para um desenvolvimento em favor dos direitos humanos e das transformações sociais necessárias para se ter uma sociedade mais justa. [...] é uma confederação de 20 organizações que atuam em 94 países pelo fim da pobreza e desigualdade”. (http://www.oxfam.org.br).

questionamento relacionava-se a uma lei municipal, mas as irregularidades – o não cumprimento do que determina uma lei federal, o Estatuto da Cidade; e a contratação irregular de uma instituição vinculada à Universidade Federal do Ceará – estavam relacionadas a instâncias federais. O MPF aceitou dar entrada na ação, mas foram necessários diversos documentos para comprovar as alegações, segundo a entrevistada 15.

Foram, portanto, feitos pareceres de técnicos para comprovar que o conteúdo estava deficiente desde o diagnóstico e que era insuficiente de acordo com o exigido pelo Estatuto da Cidade. Além disso, foi necessário comprovar que não houve participação popular, o que foi feito com cópias das atas das reuniões da prefeitura, juntamente com um abaixo assinado que referendava a afirmação e reivindicava que houvesse participação. Foi também feita uma pesquisa para comprovar que a população não havia sido capacitada para participar, o que demonstrou também não cumprimento do que estabelece o Estatuto da Cidade. Por fim, a peça jurídica agregava além de todas essas comprovações, a análise do processo de contratação da ASTEF para coordenar o processo.

O MPF, com o apoio do NUHAB e da FBFF, deu entrada na ação, que suspendeu o processo de aprovação do LEGFOR quando este já estava na Câmara Municipal. Foi estabelecido um Termo de Ajustamento de Conduta, e o processo só foi retomado na gestão seguinte.