• Nenhum resultado encontrado

O Plano Diretor Participativo de Fortaleza: mudanças para quem?

_O Plano Diretor Participativo de Fortaleza: o que tem de novo?

3. Título III – Do Sistema de Planejamento e Gestão: Capítulo I – Da Estrutura Funcional

5.3 O Plano Diretor Participativo de Fortaleza: mudanças para quem?

Em 2005, houve uma mudança de gestão na PMF quando Luizianne Lins assumiu a prefeitura, significando uma transformação no quadro político municipal de Fortaleza. O cenário nacional, com a vitória de Lula em 2002, contribuiu para que outros membros do Partido dos Trabalhadores fossem eleitos em alguns estados e municípios brasileiros. Em Fortaleza, a vitória de Luizianne Lins significou a vitória também da tendência mais à esquerda dentro do próprio partido, a “Democracia Socialista”. Alguns membros do PT, inclusive aqueles ligados mais diretamente ao presidente Lula, eram contra uma candidatura própria do partido, eles defendiam uma aliança com o Partido Comunista do Brasil (PC do B) e apoiavam a candidatura do então deputado federal Inácio Arruda. Entretanto, Lins venceu as disputas internas e se lançou candidata em 2004, sendo eleita e rompendo com o período dominado pelo PMDB, através de seu representante Juraci Magalhães.

A vitória do PT em Fortaleza significou o rompimento de uma sequência de quatro gestões do PMDB, nada participativas, com pouca ênfase no planejamento urbano e muito centradas em obras, conforme comentado anteriormente. A mudança significava, portanto, a possibilidade de transformar essa realidade e tornar a gestão mais próxima da população e de seus reais problemas, o que também se esperava do governo federal petista.

Em 2005, a prefeita retirou o projeto de lei do PDDUA da Câmara Municipal, mas não recomeçou um novo processo imediatamente. O NUHAB fez diversas tentativas de marcar uma audiência com a prefeita durante esse ano, mas não conseguiu (BRASIL, 2004).

Em janeiro de 2006, foi iniciado um novo processo de elaboração do plano diretor, dessa vez não mais entre um conjunto de outras leis, como o LEGFOR, mas inicialmente somente desse plano, que se chamou Plano Diretor Participativo de Fortaleza (PDPFor). O processo de elaboração não poderia ser muito longo, pois havia uma cobrança do MC para que todos os planos diretores fossem aprovados até agosto de 2006 (depois, esse prazo foi adiado). Entretanto, desde o início da elaboração até a sua publicação como lei passaram-se três anos. O PDPFor foi aprovado pela Câmara Municipal em fevereiro de 2009 e a sua publicação no Diário Oficial se deu em 13 de março do mesmo ano, através da Lei Complementar no 062. Desde a sua aprovação até hoje, o PDPFor sofreu algumas alterações através de emendas.

5.3.1 PDPFor: o processo

No início de 2006, o PDPFor começou a ser elaborado. O processo de cancelamento da aprovação do PDDUA e a retirada do projeto de lei da Câmara pela nova prefeita provocou um desgaste interno na gestão, entre os órgãos e as secretarias. Os técnicos da COURB, pertencente à SEINF, tinham sido responsáveis pelo acompanhamento do desenvolvimento daquele projeto de lei; dessa forma, o novo

processo deveria ser coordenado por outros técnicos. A Secretaria Municipal de Planejamento e Orçamento (SEPLA) foi a escolhida para a função, visto que ela já era responsável pelo desenvolvimento do Orçamento Participativo (OP) e não existia uma secretaria específica para o planejamento urbano. O secretário à época, que coordenou o processo, era o economista José Meneleu Neto.

O plano, entretanto, não foi elaborado pelos técnicos da prefeitura. Uma empresa foi contratada para desenvolvê-lo, o Instituto Pólis. Essa contratação não foi resultado de um processo licitatório, o Instituto foi contratado por notório saber80, pois já havia desenvolvido diversos planos diretores no Brasil e já trabalhava com a temática há muito tempo, sendo reconhecido publicamente ao tratar do tema.

O contrato com o Instituto Pólis foi feito, inicialmente, por 10 meses, segundo o entrevistado 02, que seria o tempo de elaboração e aprovação até o prazo-limite estabelecido pelo MC. O processo, portanto, deveria ser desenvolvido de modo rápido, pois precisaria ser recomeçado, visto que, de acordo com o TAC, nada do PDDUA poderia ser considerado.

Para acompanhamento do processo foi constituído um núcleo gestor, oficializado pelo Decreto Municipal no 12.038, em 30 de maio de 2006. Não tinha formato de conselho, sendo extinto após a aprovação do plano, mas tinha o objetivo de acompanhar e monitorar a elaboração do plano, bem como aprovar a metodologia participativa e garantir o seu cumprimento (PERDIGÃO, 2015). Era colegiado, com membros do poder público e da sociedade civil:

9 membros do poder público executivo, 6 conselheiros do orçamento participativo representando cada uma das secretarias executivas regionais, 10 representantes de movimentos sociais e ONG’s, 6 representantes profissionais, 3 representantes de sindicatos e órgãos de classes e 4 representantes de órgãos de pesquisa (MOREIRA, 2008, p. 20).

Além do acompanhamento do núcleo gestor, e apesar do pouco tempo para elaborar a lei, o processo deveria ser participativo, conforme estabelece o Estatuto da Cidade e a Lei Orgânica do município. De acordo com o Decreto no 5, de 2006, pactuado entre prefeitura e Instituto Pólis, a participação popular deveria dar-se de acordo com as seguintes etapas:

Etapa Atividade Datas do ano de 2006

Etapa I Capacitação comunitária: essa etapa previa a capacitação de 100 servidores técnicos.

24 e 25 de janeiro

80 O Instituto foi contratado a partir do “Contrato 01/206 – Prestação de serviço para o Município de Fortaleza com a

interveniência da Secretaria de Planejamento e Orçamento do Município e o Pólis – instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais” (PERDIGÃO, 2015).

Lançamento do PDP junto com a capacitação comunitária nas 14 áreas de participação (AP)81 (Figura 49), simultaneamente.

04 de fevereiro

Etapa II Leitura comunitária simultânea em 7 APs. Entre 11 e 18 de fevereiro Interpretação e análise das 3 leituras: comunitária, técnica e jurídica. Mês de março

Etapa III I Fórum do Plano Diretor Participativo – “A cidade que temos” 25 de março Audiências públicas nas Regionais – audiências públicas territoriais nas 14 APs

e eleição dos delegados.

3 a 11 de abril Audiências públicas temáticas – 4 rodadas de debates. 17 a 28 de abril Etapa IV II Fórum do Plano Diretor Participativo – “A cidade que queremos”.

Apresentação e discussão das propostas sistematizadas e da proposta do governo; eleição dos delegados dos segmentos.

27 de maio

Etapa V Congresso da Cidade – aprovação do Plano Diretor Participativo e encaminhamento para a Câmara Municipal.

14 de julho Etapa VI Entrega do plano à Câmara Municipal de Fortaleza. agosto

QUADRO 01. Etapas participativas do PDPFor

Fonte: Decreto no 005/2006; elaborado pela autora

Como se percebe, segundo o Quadro 01, todo o processo participativo, publicado pelo Decreto no 005/2006, foi bastante enxugado para que pudesse ser cumprido o prazo de finalização determinado, agosto daquele ano. Entretanto, com o prolongamento do limite para aprovação do plano, estabelecido pelo MC, alguns eventos sofreram modificações, tanto em relação às datas quanto em relação ao tempo dedicado à atividade.

As análises feitas acerca das etapas, apresentadas a seguir, estão pautadas no relatório sobre o processo de participação social na elaboração do Plano Diretor Participativo de Fortaleza, desenvolvido pela gestão atual, a partir dos registros da gestão anterior, bem como nas entrevistas com os participantes daqueles momentos. As informações, portanto, são, por vezes, contraditórias.

81 As áreas de participação consideradas pelo PDPFor foram as mesmas áreas utilizadas pelo orçamento participativo, visto

FIGURA 49. Áreas de participação do orçamento participativo de Fortaleza

Fonte: Arão (2012)  

Etapa I: Capacitações

O primeiro momento das capacitações foi o do corpo técnico da prefeitura, para que ele pudesse tornar-se multiplicador.

A etapa de capacitação da sociedade civil, pelo que previa o planejamento, praticamente não existiria, seria somente um momento informativo. Entretanto, segundo Perdigão (2015), essa se deu em diversas fases, em locais e com públicos diversos, o que está de acordo com a fala do entrevistado 06, que afirmou ter havido momentos de apresentação dos temas e do plano em diversos espaços: em cada uma das Regionais e nos locais onde a prefeitura foi solicitada.

Para os entrevistados 02 e 15, esses primeiros momentos configuraram-se como apresentações do plano, e não como verdadeira capacitação. Grande parte das pessoas não sabia o que era um plano diretor, nem como seriam os momentos participativos. Segundo Moreira (2008), somente a primeira audiência pública tratou da tentativa de capacitar a população, e nela foram apresentados diversos temas que estariam presentes no plano.

participar de forma adequada do processo, pois, conforme comentado anteriormente, a rede havia percebido a deficiência dos movimentos sociais em relação ao tema. Mesmo com as capacitações iniciadas na época do LEGFOR, pela Escola de Planejamento Urbano do CP, e com as capacitações locais dentro das áreas de atuação dos movimentos sociais urbanos, o empoderamento da população ainda não era suficiente.

O NUHAB organizou uma capacitação paralela ao processo de elaboração do plano, o que culminou na produção de materiais e propostas que terminaram por ser incorporados pelo documento da lei, segundo os entrevistados 06 e 15. Os alunos e ex-alunos da Escola de Planejamento, ou seja, as lideranças comunitárias e dos movimentos sociais, foram convidados a trabalhar em conjunto com ONGs, universidade etc., na sede do NUHAB, no CP. Eles construíram mapas de precariedade habitacional e vazios urbanos, de acordo com o conhecimento que possuíam da cidade, principalmente onde atuavam ou moravam, para que fosse desenvolvida uma proposta para as ZEIS. Ainda segundo aqueles entrevistados, foram feitas visitas com o intuito de compartilhar, entre os participantes, as informações sobre as localidades, de modo que mais pessoas pudessem ser incorporadas ao processo.

Após o trabalho de capacitação ter avançado e os mapas terem sido desenvolvidos, foi organizado o 1o Encontro de Comunidades, no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC), para que os resultados pudessem ser compartilhados, discutidos e complementados e algumas propostas dos movimentos para as ZEIS de Fortaleza pudessem ser finalizadas. O encontro aconteceu durante uma semana. Alguns alunos universitários participaram do evento, para colaborar com a elaboração do material produzido, segundo o entrevistado 02. Foram finalizados os mapas sobre as condições de moradia e precariedade da cidade e os mapas localizando os vazios urbanos próximos aos locais de moradias precárias. Ao final do encontro, foram montadas propostas de ZEIS, tanto de ocupação quanto de vazio.

Além desse processo organizado pelo NUHAB, os movimentos sociais, individualmente, também estavam se organizando e tinham suas próprias propostas para as áreas de ZEIS, de acordo com as áreas onde atuavam.