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AJUSTAMENTO DO TRABALHO NA ÁREA DO EURO E NOS ESTADOS UNIDOS DESDE A CRISE

O início da crise fi nanceira – e a contracção da actividade económica daí decorrente – teve um grande impacto sobre os mercados de trabalho na área do euro e nos Estados Unidos, resultando em contracções acentuadas do emprego e em subidas notáveis do desemprego (ver Gráfi co A). Embora dados recentes mostrem que as descidas generalizadas da actividade foram bastante

semelhantes em ambas as economias, com quedas do PIB real entre o valor máximo e o mínimo de aproximadamente 5%, o ajustamento no mercado de trabalho parece ter sido ligeiramente mais acentuado e mais substancial nos Estados Unidos do que na área do euro1. Tal deve-se, em

certa medida, à maior concentração de perdas em termos de actividade em sectores intensivos em trabalho (como, por exemplo, a construção e o sector fi nanceiro) nos Estados Unidos e à acumulação de mão-de-obra mais intensiva na área do euro. A presente caixa aborda o ajustamento do factor trabalho na área do euro e nos Estados Unidos desde o início da crise, realçando as principais diferenças no processo de ajustamento.

Dinâmica do mercado de trabalho desde a crise

O Gráfi co B sincroniza os ajustamentos cíclicos observados nas duas economias em relação à primeira contracção trimestral em cadeia do PIB em 2008 com vista a realçar as diferenças entre as duas economias no que respeita às trajectórias e mecanismos de ajustamento implementados. O início da recessão (ponto “0” em cada uma das componentes do Gráfi co B) precipitou uma descida muito forte do total das horas trabalhadas em ambas as economias, dado que as empresas ajustaram o factor trabalho à luz da redução das encomendas e da queda da procura do produto. Nos Estados Unidos, o abrandamento da actividade desencadeou um ajustamento rápido no emprego e, consequentemente, um aumento da taxa de desemprego, um processo que continuou até ao início de 2010. Na área do euro, pelo contrário, o emprego e o desemprego foram, em certa medida, protegidos do impacto total da forte queda do PIB por um recurso bastante signifi cativo ao ajustamento das horas trabalhadas por indivíduo empregado. Embora a legislação mais forte para a protecção do emprego na área do euro deva ter desempenhado um papel na atenuação de parte do ajustamento no mercado de trabalho, uma 1 Para informações sobre as diferenças metodológicas nos dados do emprego para a área do euro e os Estados Unidos, ver o artigo intitulado

“Comparability of statistics for the euro area, the United States and Japan”, na edição de Abril de 2005 do Boletim Mensal do BCE. Gráfico A Evolução do PIB, emprego e desemprego na área do euro e nos Estados Unidos

(taxas de variação homólogas (%); taxa de desemprego em percentagem da população activa civil) PIB (escala da esquerda)

emprego (escala da esquerda) taxa de desemprego (escala da direita)

a) Área do euro b) Estados Unidos

-6 -4 -2 0 2 4 2 4 6 8 10 12 2006 2007 2008 2009 2010 2011 -6 -4 -2 0 2 4 2 4 6 8 10 12 2006 2007 2008 2009 2010 2011

Fontes: Eurostat, Bureau of Economic Analysis e Bureau of Labor Statistics dos Estados Unidos e cálculos do BCE. Nota: As últimas observações referem-se ao T4 2011, à excepção do emprego na área do euro (T3 2011).

porção do menor ajustamento do emprego também se fi cou a dever, indiscutivelmente, aos regimes de horários de trabalho reduzidos (frequentemente com o apoio do governo) amplamente utilizados em muitos países (particularmente, Bélgica, Alemanha e Itália).

No decurso da recessão, o número de empregados na área do euro registou uma redução de aproximadamente 3.8 milhões (ou seja, 2.6%), enquanto mais de 8 milhões de postos de trabalho (aproximadamente 6%) desapareceram nos Estados Unidos. As diferentes reacções do emprego e das horas trabalhadas nas duas economias conduziram a um aumento muito mais lento do desemprego ofi cial na área do euro, embora partindo de um nível inicial consideravelmente mais elevado e não obstante uma dinâmica da oferta de trabalho bastante diferente2. Mais especifi camente, no decurso

da crise, a taxa de desemprego na área do euro aumentou de um valor imediatamente abaixo de 7.4% no primeiro trimestre de 2008 para 10.2% no segundo trimestre de 2010. Por seu lado, nos Estados Unidos, a taxa de desemprego aumentou de 4.4% na véspera da crise para o nível máximo de 10% no último trimestre de 2009.

2 Na área do euro, o crescimento da população activa estagnou, em larga escala, após o início da recessão. Tal poderá dever-se quase equitativamente a um abrandamento do crescimento da população e da taxa de participação. Em contraste, nos Estados Unidos, a população activa registou uma contracção de aproximadamente 0.5%, em grande parte devido a uma forte descida da taxa de participação, enquanto o crescimento da população abrandou apenas ligeiramente.

Gráfico B Evolução do emprego, horas trabalhadas e desemprego na área do euro e nos Estados Unidos

(taxas de variação trimestrais em cadeia (%); variações em pontos percentuais trimestrais em cadeia da taxa de desemprego da população activa civil)

área do euro Estados Unidos

a) Total de horas trabalhadas b) Emprego

-3 -2 -1 0 1 -3 -2 -1 0 1 -4 0 4 8 12 16 -3 -2 -1 0 1 -3 -2 -1 0 1 -4 0 4 8 12 16

c) Horas trabalhadas por indivíduo empregado d) Taxa de desemprego

-2 -1 0 1 2 -2 -1 0 1 2 -4 0 4 8 12 16 -2 -1 0 1 2 -2 -1 0 1 2 -4 0 4 8 12 16

Fontes: Eurostat, OCDE, Bureau of Labor Statistics dos Estados Unidos e cálculos do BCE.

Notas: 0 no eixo dos x representa o primeiro trimestre de contracção do PIB em cada economia (T1 2008 nos Estados Unidos; T2 2008 na área do euro). As últimas observações referem-se ao T4 2011, à excepção das séries relativas ao emprego e às horas trabalhadas na área do euro, que terminam no T3 2011.

Mercado de trabalho dinamizou-se um pouco mais rapidamente na área do euro do que nos Estados Unidos

Desde a recessão – e apesar do ajustamento mais modesto observado no decurso da crise – os mercados de trabalho da área do euro parecem ter reagido um pouco mais rapidamente à retoma da actividade do que os dos Estados Unidos, sendo que quer as horas trabalhadas (particularmente, as horas trabalhadas por indivíduo empregado) quer o emprego regressaram a um crescimento positivo um pouco mais rapidamente na área do euro do que nos Estados Unidos, não obstante uma retoma mais rápida da actividade nos Estados Unidos. Em parte, tal poderá refl ectir uma contracção ligeiramente mais prolongada nos Estados Unidos do que na área do euro, onde a recessão se arrastou durante mais um trimestre. No entanto, tal refl ecte igualmente a utilização ligeiramente mais intensiva da mão-de-obra existente nos Estados Unidos após a retoma da actividade, o que conduziu a um aumento acentuado da produtividade do trabalho nos Estados Unidos na sequência da recessão3.

Até meados de 2011, as condições do mercado de trabalho evidenciaram sinais de melhoria em ambas as economias, com as horas trabalhadas e o emprego a começarem a expandir-se – embora de forma gradual – e o desemprego a registar uma ligeira descida. Em termos globais, o emprego na área do euro aumentou em aproximadamente 900 000 postos de trabalho (ou seja, 0.6%) desde que o valor mínimo foi registado, enquanto cerca de 2 milhões de postos de trabalho (1.5%) foram criados nos Estados Unidos. Em certa medida, a menor criação de emprego na área do euro durante o período pós-crise é uma consequência natural do maior grau de acumulação de mão-de-obra registado no decurso da recessão. Consequentemente, a taxa de desemprego na área do euro permaneceu elevada na sequência da recessão, aumentando para 10.4% no quarto trimestre de 2011. Entretanto, nos Estados Unidos, a taxa de desemprego diminuiu quase 1 ponto percentual, para 8.7%, no mesmo trimestre.

Aumento do desemprego de longa duração em ambos os lados do Atlântico

O aumento da duração do desemprego desde o início da crise é uma característica comum a ambos os lados do Atlântico. Períodos de desemprego mais longos poderão dar origem a uma forte deterioração do capital humano e da ligação ao mercado do trabalho, às quais, por sua vez, poderão seguir-se consequências nocivas para o potencial de crescimento de uma economia a longo prazo. Tipicamente, a percentagem do desemprego de longa duração é muito mais baixa nos Estados Unidos do que na área do euro, com a percentagem de indivíduos desempregados durante mais de seis meses a atingir, no geral, um valor máximo de aproximadamente 25%, no período imediatamente a seguir à recessão nos Estados Unidos, o que compara com cerca de 65% do total na área do euro. Porém, a percentagem aumentou consideravelmente nos Estados Unidos durante a última recessão, situando-se acima de 40% desde o início de 2010, embora tal esteja ainda 20 pontos percentuais abaixo do nível observado na área do euro. Em parte, esta subida deve- -se indubitavelmente à gravidade da recessão e à falta de novas possibilidades de emprego num mercado de trabalho norte-americano ainda estagnado, mas poderá igualmente estar 3 Ver a caixa intitulada “Evolução recente da produtividade por sector na área do euro e nos Estados Unidos”, na edição de Dezembro de

Dado que a evolução do mercado de trabalho tende a apresentar um desfasamento em relação à evolução cíclica global, o crescimento do emprego em 2011 foi mais forte do que em 2010. Esta situação, em conjugação com um abrandamento do crescimento do PIB, implica que o crescimento da produtividade por indivíduo empregado se reduziu em 2011. O crescimento homólogo da produtividade diminuiu de 2.2% no primeiro trimestre de 2011 para 1.0% no terceiro trimestre. A redução do crescimento da produtividade foi generalizada a todos os sectores. O crescimento da produtividade global medida por horas trabalhadas também se reduziu, embora em menor grau.

Depois de atingir o nível mínimo em Abril de 2011, a taxa de desemprego aumentou novamente, ultrapassando o valor máximo anterior, de Maio de 2010 (ver Gráfi co 25).

Em Dezembro de 2011, a taxa de desemprego situava-se em 10.6%, ou seja, 0.7 pontos percentuais acima do seu nível mínimo em Abril.

2.5 EVOLUÇÃO ORÇAMENTAL

Na área do euro, a crise fi nanceira e económica transformou-se numa crise da dívida soberana, com graves implicações para a confi ança. À luz das preocupações do mercado quanto ao sector bancário e da maior incerteza quanto às perspectivas macroeconómicas, a confi ança na sustentabilidade da dívida pública enfraqueceu, tendo as taxas de rendibilidade das obrigações de dívida pública aumentado signifi cativamente em muitos países. A crise afectou igualmente os activos e passivos fi nanceiros das administrações públicas (para mais pormenores, ver Caixa 8).

parcialmente relacionada com o facto de o período em que se tem direito a subsídio de desemprego ter sido alargado de 26 para 99 semanas desde Junho de 2008 4. Entretanto, o

desvio persistente das taxas de desemprego de longa duração deverá refl ectir maiores diferenças institucionais que afectam os mercados de trabalho na Europa e nos Estados Unidos.

A recente recessão afectou signifi cativamente os mercados de trabalho em ambos os lados do Atlântico, sendo que as taxas de utilização de mão-de-obra permanecem ainda bastante abaixo dos seus níveis pré-crise. A deterioração do mercado de trabalho foi particularmente signifi cativa nos Estados Unidos. É provável que o crescimento do emprego permaneça moderado durante ainda algum tempo quer na área do euro quer nos Estados Unidos. As melhorias a mais longo prazo dos mercados de trabalho da área do euro deverão depender fortemente da capacidade de prosseguir a reestruturação no sentido de promover a inovação e a implementação de práticas de trabalho efi cientes, aumentando assim o emprego no mais longo prazo. Poderão ser necessárias mais reformas na área do euro de modo a ajudar a facilitar as transições no mercado de trabalho, em particular para os indivíduos jovens que entram no mercado de trabalho, os quais até ao momento têm sido desproporcionalmente atingidos pela crise, bem como para o grupo crescente de desempregados de longa duração.

4 É amplamente aceite que alargar o período em que se tem direito a subsídio de desemprego aumenta a duração do período de procura de emprego, embora as estimativas variem consideravelmente. Centrando-se no episódio mais recente, Daly, Hobijn e Valletta concluem que o facto de o período máximo de pagamento do seguro de desemprego nos Estados Unidos ter sido alargado consideravelmente deverá ter contribuído apenas modestamente para o alargamento dos períodos de desemprego observados nos Estados Unidos desde 2008 (ver Daly, M., Hobijn, B. e Valletta, R., “The recent evolution of the natural rate of employment”, Federal Reserve Bank of San

Francisco Working Paper, n.º 2011-05, Setembro de 2011). Relativamente a este episódio, os contributos mais importantes deverão ter

sido dados pelas grandes descidas do emprego em alguns sectores e pelo desfasamento daí resultante dos atributos dos trabalhadores em relação às vagas, bem como pela redução da mobilidade geográfi ca devido ao rebentamento da bolha do mercado imobiliário norte- -americano.

Caixa 8

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