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PERTURBAÇÕES NOS MERCADOS DE DÍVIDA SOBERANA DA ÁREA DO EURO E REPERCUSSÕES NO SECTOR FINANCEIRO EM

Após a introdução do euro em 1999, as taxas de rendibilidade pagas nos mercados de dívida pública de longo prazo evoluíram em consonância entre si nos vários países da área do euro, tendo os seus níveis, em geral, convergido. O aumento relacionado e progressivo das correlações entre pares de taxas de rendibilidade refl ectiu a percepção do mercado de que os riscos eram globalmente semelhantes entre países e de que a evolução dos riscos dos países era quase paralela. No entanto, as perturbações fi nanceiras, que surgiram no Verão de 2007 e se intensifi caram com a falência do Lehman Brothers, cerca de um ano depois, resultaram em alterações signifi cativas neste padrão. De facto, desde o Verão de 2007, as correlações entre as taxas de rendibilidade das obrigações soberanas a 10 anos na área do euro divergiram, tendo essa evolução sido essencialmente impulsionada pela percepção do mercado quanto aos fundamentos orçamentais específi cos a cada país. Para além dos mercados de obrigações soberanas, a percepção de um risco acrescido prevalecente desde o Verão de 2007 também afectou o sector fi nanceiro, em graus consideravelmente diferentes entre os países da área do euro. A presente caixa fornece uma análise breve das variações nas relações entre os mercados de obrigações soberanas na área do euro, bem como das variações na relação entre os mercados de dívida soberana e o sector fi nanceiro.

Até meados de 2007, as divergências entre as taxas de rendibilidade das obrigações de dívida pública e os prémios dos swaps de risco de incumprimento (credit default swaps – CDS) de dívida soberana na área do euro eram negligenciáveis. Desde então, porém, começaram a surgir desvios, os quais atingiram níveis sem precedentes, especialmente no que se refere aos países com problemas orçamentais graves, designadamente, a Irlanda, Portugal e a Grécia, se bem que, desde 2010, o fenómeno se tenha alargado a um maior número de países da área do euro.

As variações nas ligações ao nível dos países entre as taxas de rendibilidade das obrigações soberanas e os prémios dos CDS de dívida soberana podem ser efectivamente ilustradas recorrendo a correlações variáveis no tempo, baseadas na estimação de um modelo econométrico 1.

O Gráfi co A mostra o intervalo (calculado como o valor máximo menos o valor mínimo) e a mediana das correlações bilaterais das taxas de rendibilidade das obrigações soberanas a 10 anos face à taxa de rendibilidade das obrigações a 10 anos alemãs. O Gráfi co B, por seu lado, apresenta o intervalo e a mediana correspondentes das correlações bilaterais dos prémios dos CDS no mesmo conjunto de países, face ao prémio dos CDS a 5 anos gregos2. Em termos globais, os dois

gráfi cos fornecem evidência de que, embora as correlações entre taxas de rendibilidade tenham passado para território negativo no fi nal de 2009, no que se refere aos CDS, permaneceram, em geral, positivas, não obstante oscilações assinaláveis e uma tendência em sentido descendente desde 2010. Esta evolução divergente dos dois conjuntos de correlações advém do facto de os CDS serem sobretudo medidas do risco de incumprimento, ao passo que as taxas de rendibilidade das obrigações são também afectadas por variações na preferência de liquidez dos participantes 1 As correlações variáveis no tempo são calculadas através de um modelo multivariável GARCH. Embora, em princípio, também possam ter por base correlações entre as taxas de variação das taxas de rendibilidade e dos CDS calculados em períodos de tempo com uma duração pré-defi nida, é dada preferência a uma estimação baseada num modelo, uma vez que, optimamente, o período ao longo do qual as correlações são calculadas é determinado pelo modelo em si e as correlações resultantes podem ser interpretadas mais como “correlações locais” (isto é, associadas aos pontos mais recentes da amostra para a qual a estimação é realizada) do que como correlações médias numa determinada amostra.

2 Com 11 séries temporais, cada matriz de correlação é composta por 55 séries temporais e não pode ser apresentada num gráfi co simples. Para superar esta difi culdade, foram calculados quantis das 55 correlações bilaterais para cada dia da amostra, designadamente o 5.º e 95.º quantis, assim como a mediana. Desta forma, o grande conjunto de séries temporais de coefi cientes de correlação é sintetizado em apenas três séries temporais.

Gráfico A Valores máximos, mínimos e da mediana das correlações bilaterais face à taxa de rendibilidade das obrigações a 10 anos alemãs

(dados diários; 24 de Março de 2008 a 6 de Janeiro de 2012)

-1.00 -0.75 -0.50 -0.25 0.00 0.25 0.50 0.75 1.00 -1.00 -0.75 -0.50 -0.25 0.00 0.25 0.50 0.75 1.00 máximo mínimo mediana 2008 2009 2010 2011

Fontes: Thomson Reuters e BCE.

Nota: Os valores máximos, mínimos e da mediana são calculados, todos os dias, com base nas dez correlações bilaterais da taxa de rendibilidade das obrigações alemãs face às taxas de rendibilidade das obrigações a 10 anos da Bélgica, Irlanda, Grécia, Espanha, França, Itália, Países Baixos, Áustria, Portugal e Finlândia.

Gráfico B Valores máximos, mínimos e da mediana das correlações bilaterais face aos prémios dos swaps de risco de incumprimento a 5 anos gregos

(dados diários; 2 de Junho de 2008 a 6 de Janeiro de 2012)

0.25 0.50 0.75 1.00 0.25 0.50 0.75 1.00 máximo mínimo mediana 2008 2009 2010 2011

Fontes: Thomson Reuters e BCE.

Nota: Os valores máximos, mínimos e da mediana são calculados, todos os dias, com base nas dez correlações bilaterais dos prémios dos swaps de risco de incumprimento a 5 anos gregos face aos prémios dos swaps de risco de incumprimento a 5 anos na Bélgica, Alemanha, Irlanda, Espanha, França, Itália, Países Baixos, Áustria, Portugal e Finlândia.

no mercado, as quais desempenharam um papel fulcral durante o recente período de tensões nos mercados fi nanceiros. Com efeito, à medida que as tensões orçamentais se foram tornando mais intensas e generalizadas na área do euro, a tendência dos investidores foi para afectarem fundos sobretudo aos mercados de obrigações considerados relativamente mais líquidos e seguros, fi gurando o mercado obrigacionista alemão, de forma proeminente, entre estes. O surgimento de correlações negativas entre as taxas de rendibilidade das obrigações de dívida pública na área do euro não deve, portanto, ser apenas interpretado como um sinal de que o risco de crédito diminuiu para alguns países e aumentou para outros. Na realidade, as correlações bilaterais decrescentes mas, geralmente, ainda positivas entre os prémios de CDS da dívida soberana da área do euro e os prémios de CDS da dívida pública grega desde meados de 2010 apontam para uma interdependência dos riscos soberanos na área do euro, ainda que em diferentes graus. No que diz respeito à interacção dos riscos entre o sector soberano e o sector fi nanceiro, estiveram em acção vários canais. Primeiro, a exposição dos sistemas bancários da área do euro ao risco soberano tem sido uma fonte de transmissão directa do risco. Segundo, a rede interligada de instituições fi nanceiras e a complexidade das suas exposições cruzadas poderão ter resultado na exposição indirecta ao risco soberano de algumas instituições fi nanceiras. Terceiro, a percepção do mercado de que, na eventualidade de bancarrota de um sistema bancário, a intervenção pública acarretaria custos orçamentais e um maior risco de incumprimento da dívida soberana.

Gráfico C Índices iTraxx SovX Western Europe e iTraxx Europe Senior Financials a 5 anos

(dados diários; 1 de Janeiro de 2010 a 18 de Janeiro de 2012)

0 50 100 150 200 250 300 350 400 450 500 0 50 100 150 200 250 300 350 400 450 500 iTraxx Europe Senior Financials

iTraxx SovX Western Europe

2010 2011

Fonte: Bloomberg.

Gráfico D Desvios padrão variáveis no tempo e correlação dos índices iTraxx seleccionados

(dados diários; 1 de Janeiro de 2010 a 18 de Janeiro de 2012)

0.0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1.0 0 50 100 150 200 250 300 2010 2011

desvio padrão do índice iTraxx Europe Senior Financials desvio padrão do índice iTraxx SovX Western Europe correlação (escala da esquerda)

tendência da correlação (escala da esquerda)

Fontes: Bloomberg e BCE.

Notas: O eixo do lado direito é expresso em percentagens anualizadas. Os desvios padrão variáveis no tempo e a correlação variável no tempo são calculados através de modelos bivariáveis GARCH para as taxas de variação dos dois índices iTraxx.

Os diferenciais das taxas de rendibilidade das obrigações de dívida pública a 10 anos face à taxa de rendibilidade das obrigações alemãs correspondentes começaram a aumentar na Grécia, Irlanda e Portugal em Março, em virtude da redução da notação da dívida soberana desses países, e continuaram a aumentar em Abril e Maio, dado a necessidade de reestruturação da dívida pública grega ter atraído uma maior atenção (ver o gráfi co na Caixa 1). No início de Junho de 2011, os diferenciais na Grécia, Irlanda e Portugal eram, em média, pelo menos 500 pontos base mais elevados do que em Maio de 2010, altura em que as tensões nos mercados de dívida soberana se intensifi caram pela primeira vez. A partir de Junho de 2011, as tensões relacionadas com a dívida começaram a afectar países de maior dimensão, em particular Itália e Espanha, num contexto de discussões e incerteza sobre a resolução da crise da dívida soberana na área do euro. Perto do fi nal do ano, após terem atingindo um máximo na última semana de Novembro, os diferenciais das taxas de rendibilidade das obrigações a 10 anos face às taxas de rendibilidade das obrigações alemãs correspondentes diminuíram signifi cativamente. Tal deveu-se à melhoria do sentimento do

mercado, antes da reunião dos Chefes de Estado ou de Governo da área do euro em 9 de Dezembro, bem como à redução das taxas de juro directoras do BCE e às novas medidas de política monetária não convencionais. Além disso, as medidas tomadas por vários bancos centrais em áreas económicas importantes para reforçar a sua capacidade de apoiarem a liquidez do sistema fi nanceiro mundial contribuíram para a atenuação das tensões nos mercados de dívida soberana.

Após uma subida moderada nos primeiros três meses de 2011, as taxas de rendibilidade reais começaram a descer, refl ectindo riscos geopolíticos mais elevados e uma deterioração das perspectivas mundiais. No início de Junho, a taxa de rendibilidade das obrigações de dívida pública da área do euro a 5 anos indexadas à infl ação tinha descido para 0.5%, enquanto a das obrigações a 10 anos se situava em 1.2%. Posteriormente, verifi cou-se uma nova aceleração da descida das taxas de rendibilidade reais, como evidenciado pelo facto de as taxas de rendibilidade reais à vista a 5 e 10 anos terem registado valores de, respectivamente, 0.2% e 0.8%, em Dezembro. Em termos globais, a Para ilustrar estas interacções, o Gráfi co C apresenta a evolução de dois índices iTraxx a 5 anos, nomeadamente o iTraxx SovX Western Europe e o iTraxx Europe Senior Financials 3.

Enquanto o primeiro é um agregado dos CDS de dívida soberana ao nível da área do euro, o segundo considera os CDS de 25 das principais instituições fi nanceiras da área do euro (tranches sénior). Embora se suponha que estas instituições fi nanceiras não sejam grandemente afectadas pela evolução do risco soberano, dada a grande diversidade das suas carteiras, o seu risco de incumprimento, tal como indicado pelos prémios dos CDS, aumentou a par do risco de incumprimento da dívida soberana, especialmente entre Março e Outubro de 2011. As correlações variáveis no tempo entre estes dois índices de CDS, bem como as respectivas volatilidades, tenderam a subir desde Abril de 2011 (ver Gráfi co D). A partir de Agosto de 2011, após a reactivação do programa dos mercados de títulos de dívida e as conclusões da Cimeira da UE de 21 de Julho, a correlação tendeu a diminuir, embora nos primeiros dias de 2012 tenha aumentado, regressando aos níveis observados no fi nal de Agosto. A tendência global de sentido ascendente na correlação destacou o risco acrescido de ocorrência simultânea de crises de incidentes de crédito nos sectores soberano e fi nanceiro, por meio de uma exposição crescente do sistema fi nanceiro aos riscos soberanos.

3 O iTraxx SovX Western Europe é um índice com base nos prémios dos CDS para um determinado prazo de vencimento, ao nível da Europa Ocidental. O iTraxx Europe Senior Financials é um índice com base nos prémios dos CDS de tranches sénior, para um dado prazo de vencimento, de 25 das principais instituições fi nanceiras da área do euro. A composição detalhada destes índices pode ser consultada no sítio da Markit.

descida das taxas de rendibilidade reais ao longo do ano esteve em consonância com a evidência de uma deterioração das perspectivas económicas e ocorreu, em geral, num contexto de expectativas de infl ação globalmente estáveis. No fi nal de 2011, a taxa de infl ação implícita nos contratos a prazo de 5 anos com uma antecedência de 5 anos situava-se em 2.4%, 10 pontos base acima da registada um ano antes, sendo semelhantes as indicações fornecidas pelos contratos de swap de infl ação semelhantes.

DESCIDA ACENTUADA DOS PREÇOS DAS ACÇÕES

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