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9 ANÁLISE EM VIEHWEG DA TEORIA DOS INTERESSES

Viehweg (1979) aborda em sua obra Ihering e a Teoria dos Interesses, a qual foi tratada por aquele quando da análise da Tópica com a Mos Italicus. Como salientado, Franz Wiacker defendeu que o sistema lógico de Wolff, por ser coerente, contribuiu para os fundamentos de inúmeros códigos jus-racionalistas e, por meio de seus discípulos juristas e pandectistas, o Código Civil Alemão e codificações irmãs a este, estabeleceram o programa de dedução lógica da decisão jurídica, tomando como ponto principal princípios superiores e conceitos gerais de valor construtivo fixado previamente, e que se mantiveram na Ciência Jurídica. Também se enfatizou que muitos juristas criticaram Wolff por sua falta de originalidade, por ser uma sistematização minuciosa e fria da metafísica de Leibniz e nada mais. (FASSO, 1978).

Explanou-se também que, Puchta é considerado o mais célebre representante da escola alemã do século XIX que estruturou a Ciência Jurídica dentro de um sistema lógico modelando-o em uma pirâmide de conceitos, segundo Larenz (1989); destacou-se neste quadro Savigny e Ihering; este último, posteriormente, torna-se crítico do sistema formal, abarcando o pragmatismo jurisprudencial que originou a chamada “Jurisprudência dos Interesses” de Philipp Heck, mais aberta aos axiomas sociais e finalidades do Direito.

No que concerne à Jurisprudência dos Interesses, que Viehweg comenta no início do parágrafo, Foi exposto que Luhman (1983) não foi de encontro à visão de sistema de conceitos apenas por querer implementar uma jurisprudência sociológica, não podendo ser mal interpretada em sendo contra à abstração ou à dogmática.

O legado da Jurisprudência de Interesses na prática jurídica alemã foi revolucionador da aplicação do Direito, uma vez que substituiu gradualmente o método de subsunção lógico- formal pelo de um “juízo de ponderação” de uma situação concreta e avaliação de interesses em jogo, de harmonia criteriológica de valoração típicos da lei. Ademais, foi exposta posição de Harry Westermann, que embora defensor da Jurisprudência dos Interesses, criticou-a quanto à indefinição da palavra “Interesse”, propondo que “Estes não seriam em si

propriamente interesses” e sim “corolários da ideia de Justiça”. A partir deste momento surge a chamada “Jurisprudência das valorações” atual, embora se verifiquem ainda alguns problemas; o ponto cerne resquício do sistema de interesses é justamente a existência ou não de critérios objetivos de valoração e a fundamentação racional do uso dos valores. (LARENZ, 1989).

Pois bem, após essa pequena recapitulação, constata-se que Viehweg, em seu parágrafo 8 de sua Tópica e Jurisprudência, fundamentando-se na doutrina Alemã, entende que no que se refere ao Direito Civil, o raciocínio Tópico deve ser destacado. Destarte, neste sentido, os topoi são buscados tendo em vista os problemas e sofrem renovação sempre que estes assim o exigirem, devendo, neste contexto, extrair – se a utilidade e conveniência do uso dos conceitos e proposições jurídicas.

A Arte do Direito conduz-se por sua eterna reconstrução, primando por sua solidez, mas não se esquecendo de sua característica de flexibilidade. Sendo a Ciência do Direito móvel e, portanto, de acordo com diversas situações que serão levadas em consideração. Caso conceitos e proposições contrariarem à postura aporética, devem ser impedidas de ser utilizadas. É conveniente à Ciência do Direito no dizer de Viehweg (1979), uma “variedade assistemática de pontos de vista”, no caso, os topoi. A tópica tem a capacidade de se ajustar às céleres alterações do contexto histórico-social atual, pelo dinamismo da técnica, constituindo- se em um pensamento em constante “fazer-se”, “ativo”.

Para melhor compreensão do pensamento de Viehweg acerca da Ciência do Direito, o contexto histórico sobressai-se. A ideia de sistema, no âmbito jurídico, que emerge do pensamento jusracionalista, firma-se com o constitucionalismo escrito e com as codificações, nos séculos XVIII e XIX respectivamente, conduzindo à elaboração doutrinária dos positivistas, principalmente na França e Alemanha. Junto com seu contexto motivacional ideológico, veio o grande êxito da lógica formal na matemática e Ciências Naturais, ofuscando outros métodos de raciocínio.

Assim, partindo destas ideias típicas do século XIX, onde a produção sistemática no Direito Positivo e na construção teórica são destacadas, surge a importância da interpretação no Direito. Todavia, esqueceu-se do papel imprescindível da hermenêutica, focalizando na ideia de ordem o conceito de Direito. Na segunda metade do século XX, no que chamaram de “consciência de crise” é que começa a ser questionada a noção de “sistema” com opção pelo problema, posição Viehweguiana.

Alguns autores então começam a tratar acerca da “decodificação”; é neste período que o pensamento de Viehweg emerge, tendo com cerne o aspecto tópico, sob a perspectiva do

problema, num viés dialético, da Ciência do Direito. Assim, o pensamento tomando como ponto de partida os topoi (pontos de vistas importantes), abarca um mundo discursivo aberto. Diferentemente das provas aferidas pelo meio dedutivo num sistema fechado de premissas desnecessárias. Destarte, as premissas fundamentais do silogismo são legitimadas pela anuência daqueles que intervêm na discussão.

A tópica requer que, sem que se abandone o sistema sem o qual não se pode pensar em Direito, repensar o conceito deste levando em consideração seu componente hermenêutico de efeitos teóricos-práticos importantes, afinal, a interpretação está agregada ao Direito.

A Ciência do Direito apresenta-se em sua concepção de forma ampla por não contemplar de forma solitária a norma, mas observando sua conectividade com seu sentido e fim, seu conteúdo ético-jurídico e eco na sociedade, além do contexto histórico em que surgiu, por isso, mantém-se o liame entre os inúmeros aspectos históricos, sociológicos e sistemáticos, conforme Savigny. É uma ciência auxiliadora do jurista inclusive na interpretação e aplicação da ordem jurídica. Todavia, há posições reducionistas do direito, onde o Direito vincula-se a um discurso ideológico e limitado a repetição de fórmulas (normas) e aplicação mecânica mediante subsunções silogístico-dedutivas.

Outro autor bastante tratado por Viehweg em seu parágrafo 8 foi Wilburg (2000, p. 56). Este jurista introduziu a noção de um “sistema móvel”. Procurou esse jurista uma outra saída distinta dos extremos da escola de direito livre e da exarcebada ligação do juiz à lei no sistema fechado. A Ciência Jurídica deve superar e desenvolver, mediante uma conformação mais móvel e flexível do Direito, sempre quando o “tráfico jurídico” não requerer regras ou preceitos formais, normas com mais elasticidade do que as postas.

Viehweg (1979, p. 95) destaca a posição de Wilburg e sua noção de mobilidade do sistema trazendo-a para o Direito Civil, quando da crítica de que o direito civil estaria paralisado num sistema rígido e que teria de se tornar móvel.

Para Wilburg, existem dois âmbitos essenciais para aplicação do conceito de sistema móvel: um direcionado ao legislador inerente à técnica legislativa, e que leva a uma formulação de normas onde o próprio legislador oferece os elementos de valoração; o outo âmbito trata-se da aplicação do direito, quando firma possibilidade diferente da subsunção lógico – dedutiva. (GUICHARD, 2000, p. 52). O interessante na visão de Wilburg, é que quando se pensa num sistema móvel, tal noção ajuda a desenvolver o pensamento sistemático; Canaris situa o sistema móvel numa posição entre as cláusulas gerais, que precisam de conteúdo valorativo e opera pela tópica, e as previsões normativas rígidas, submetidas à subsunção. (CANARIS, 2002, p.143-148).

Esta nova forma de pensar o sistemático ainda está em construção diante da dinâmica da realidade moderna e, como dito anteriormente, exsurge a característica de uma nova maneira de pensar a Ciência Jurídica tomando como ponto de partida a concepção de sistema aberto. Assim, o sistema móvel age no sentido de reafirmar a abertura do sistema oferecendo elementos não hierarquizados e sem prevalências por meio do qual se extrairá o direito, por meio da escolha valorativa. Canaris (2002, p. 148) destaca também a contribuição da tópica onde se perquire o mínimo de segurança e estabilidade ante as escolhas arbitrárias do legislador na concreção de cláusulas gerais e conceitos legais indeterminados.

A tópica é responsável pela rejeição do prisma das ideias e o retorno à concretude. Este é o mesmo direcionamento dado por Larenz no que se refere ao surgimento do sistema, cuja noção vem da contribuição do sistema conceitual-abstrato que se completa por elementos característicos da abertura do sistema. Em seu surgimento, o pensamento tópico está presente, mas para Larenz (1997, p. 621-69), não se considera a compreensão do sistema como mera justaposição do pensamento lógico-dedutivo e do tópico.

Entretanto, sem querer bater de frente com Larenz, é complicado negar que o desenvolvimento do pensamento jurídico observa na contemporaneidade o legado da noção de sistema móvel e da tópica. O sistema erige-se não com pretensão de ser exclusivo mas composto, que significa dizer que a abertura do sistema abarca sua perspectiva conceitual e o dota-o de valores que na mobilidade e na tópica ganham certa ordenação.

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