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Administrador de Empresas, formado pela FGV-SP, foi diretor do Banco Itaú, responsável pela área de tecnologia, posteriormente diretor comercial do Banco, onde se aposentou, foi também diretor do Banco Bandeirantes.

31 Minha experiência no Banco Federal de Crédito, hoje Banco Itaú, começou

com o cartão perfurado, com os processos das carteiras de cobrança, caução e desconto. Era uma loucura fazer aquilo. Não havia check-digit. Então, cada perfuração tinha de ser conferida. Uma máquina perfurava, outra conferia. E todo o sistema era processado com cartão perfurado. Esses equipamentos fa- ziam parte de máquinas que precederam os computadores, e eram chamadas de “sistema convencional”. Um agravante do problema era que nem as dupli- catas, nem os boletos, nem as codiicações dos bancos eram padronizados. As operadoras dessas máquinas tinham quase que adivinhar quais os campos deveriam ser perfurados.

Então, veio o Bradesco, com a aquisição de um computador 1401, o famoso computador da IBM, causando na época inveja a todos os demais bancos no Brasil. Enorme para a época, o 1401 tinha 8 KB de memória – na verdade, não se usava ainda o termo “bytes”, e sim “posições de memória”... sim, eram 8 ki- lobytes, pois os megabytes estavam ainda muito no futuro. Com esse compu- tador, o Bradesco fazia milagres.

Logo depois do Bradesco, o Banco Federal de Crédito resolveu comprar um computador e contratou também um IBM 1401. Nesse tempo, o Carlos Eduardo Fonseca, o Karman, já tinha começado a trabalhar conosco. E no 1401 nós im- plantamos o sistema de conta-corrente. Comecei usando o birô da IBM da rua São Luís, no Centro de São Paulo. Tinha contratado um block time, uma moda- lidade em que o computador era disponibilizado exclusivamente para o banco durante certo período diário. Levava para lá, todas as noites, os cartões perfura- dos, em cima do meu Fusca, e a ita magnética com os dados dos clientes. Das 20h às 22h nós processávamos o sistema de contacorrente. Não batia quase nada, era um inferno, pois tínhamos de conferir as listagens de lançamentos e saldos todo dia. Quando conseguimos inalmente receber o novo computador no Banco, já com alguma experiência do sistema, foi uma maravilha. Foi, en- tão, que o Karman, o Sérgio Sawaya, o Henrique Zaidan e o Lino Rolo – todos gênios da informática, que na época era chamada Processamento de Dados – começaram a aprender sozinhos.

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A IBM, em termos de metodologia, a essa altura era praticamente zero. Ela só ensinava a programar, e, em termos de processo, de controle de processo, também era quase inexistente. O que a IBM tinha realmente de bom era o after

sales service, o serviço pós-venda, e isso era indiscutível. Era o sistema mais

caro, mais complicado, com uma ininidade de versões, mas você telefonava e no dia seguinte lá estava um técnico. Veio gente até de Nova York, pegando o avião de noite para atender ao Banco Itaú na manhã seguinte.

Isso tudo fez parte do grande sofrimento que foi o início do sistema de pro- cessamento de dados. O fornecedor não sabia operar as máquinas, os usuários também não, muitas pessoas do banco eram contra, com medo de perder o em- prego. Esse início de processamento de dados do sistema bancário foi uma lou- cura. Mas, então, tivemos sorte e com o tempo fomos melhorando, melhorando. Quem vivenciou essa época heroica lembra-se de que os computadores eram bem diferentes dos que estamos acostumados a ver nos dias de hoje. Por exem- plo, esse computador IBM 1401 não tinha sistema operacional e não possuía discos, só itas magnéticas. Os programas eram escritos numa espécie de as-

sembler bastante simples chamado Autocoder e, em seguida, eram perfurados em

cartões. Toda vez que um programa era modiicado, era perfurado um novo deck de cartões. Ou melhor, isso era o que devia ser feito, porque na prática os progra- madores frequentemente preferiam fazer as modiicações diretamente no deck antigo, substituindo manualmente os cartões velhos pelos novos. É claro que esse procedimento acarretava frequentes erros. A propósito, uma das grandes diiculdades nessa fase era manter os programas fontes atualizados. Foi uma luta para conseguir que os programas fontes estivessem sempre atualizados.

Outra coisa que vale citar é que nesse tempo, como não havia terminais para desenvolver o software – isso só viria anos mais tarde com computadores muito mais modernos –, os analistas e programadores tinham de aprender a operar o computador para compilar e testar eles próprios os seus programas, competindo com a produção, já que o computador só podia fazer uma coisa por vez. Era uma briga constante para tentar conciliar as necessidades de compila- ções e testes com as necessidades da produção.

33 E, por falar em produção, as rotinas de processamento mensal eram acon-

tecimentos sempre “emocionantes”. A rotina de classiicação (sort) principal, por exemplo, demorava algo como oito horas, estendendo-se pela madrugada. E não foi uma nem duas vezes que o computador resolveu “travar”, obrigando a reiniciar essa rotina... Era um drama para conseguir recuperar o tempo perdido, sem esquecer que o processamento diário nunca podia ser afetado.

Alguns anos se passaram e em 1967 o Banco adquiriu um novo computador, o IBM /360, que tinha a “enorme” memória de 64 Kilobytes (agora já eram bytes). Aparecia a multiprogramação, isto é, a capacidade de executar mais que um pro- grama em paralelo – um grande avanço tecnológico naquela época. Foi nesse ano que o banco tomou uma iniciativa ousada e pioneira no Brasil, que foi a de adotar o Cobol como linguagem única para desenvolvimento de aplicações. Provavel- mente o Banco Itaú foi a primeira empresa brasileira a adotar uma linguagem de alto nível para desenvolver todas as suas aplicações. Hoje isso pode soar óbvio e banal; porém, naquela época foi sem dúvida uma decisão bastante arrojada.

Mas o grande problema nosso sempre foi a entrada de dados. Esse era sempre o drama do processamento de dados, seja em bancos, seja em qualquer outro lu- gar. No início, o cartão era um inferno. Depois apareceu a Olivetti com a ita per- furada, e depois o disquete. Então, a própria Olivetti criou um equipamento mais adequado, o DE-520, e ele já deu uma melhoradinha na nossa vida. Mas a grande solução mesmo foi a partir dos sistemas para leitura de cheques com código de barras magnético, o CMC-7, e depois veio o sistema “on-line”.

Houve uma tentativa intermediária, com a tal da leitura óptica, mas essa não pegou. A solução toda demorou. Só na década de 80 o volume de cheques com código de barras magnético passou a ser signiicativo e começaram as implan- tações dos sistemas “on-line” e, então, se resolveu o problema de entrada de dados. Até esse momento, o grande gargalo era o sistema de entrada de dados. A partir de 1965, o Banco Federal Itaú, que vinha de uma recente união do Ban- co Federal de Crédito com o Banco Itaú, passou a incorporar outros bancos, e os crescentes volumes de transações do Banco levaram à necessidade de adquirir computadores cada vez mais potentes.

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Em paralelo, foram sendo desenvolvidos novos sistemas aplicativos que se mostraram cada vez mais estratégicos. A estrutura básica de alguns desses sis- temas resistiu até os dias de hoje. Tudo isso foi o resultado de vários anos de experimentação e evolução conceitual de sistemas por parte dos analistas e programadores, que criaram as bases para o futuro desenvolvimento do banco.

Mas todo esse desenvolvimento posterior é, hoje, bem conhecido e já faz parte da História. O que eu tentei fazer neste depoimento foi, como disse no início, transmitir um pouco da Pré-História do desenvolvimento do que então era chamado o Processamento de Dados nos bancos brasileiros, e que mais tarde passou a ser chamado área de TI.