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Formado em Engenharia Eletrônica na Mauá, com pós- graduação na Harvard Business School , FEA-USP e FGV. Trabalha no Bradesco há 23 anos, onde começou como diretor presidente da Digilab e hoje é diretor gerente. Envolvido com projetos de automação bancária desde os anos 60. Responsável pelos Canais Eletrônicos, CRM, Inteligência Competitiva, Mobilidade e acumulando a Presidência da Scopus.

37 contínuo com o cliente e transformar em conhecimento explícito, na elaboração

de novas soluções. O sr. Brandão antecipou que o luxo mais importante para o crescimento é o de “fora para dentro”, do “CLIENTE para o TÉCNICO”.

Também me permito fazer uma reverência à engenharia nacional. Acho que a automação bancária se deve à capacidade dos nossos engenheiros. Não é à toa que aqui temos representantes das melhores escolas de engenharia do país. Do ITA, da Poli, da Mauá, que formaram os verdadeiros precursores da automação bancária no país. Por que digo isso? Porque muitas vezes se justiica a nossa capacidade transacional e velocidade de automação, qualidade e produtividade, por causa da inlação. Claro, a inlação tinha o seu peso nessas decisões. Mas, na verdade, tínhamos peculiaridades no sistema bancário brasileiro que obri- garam a nossa engenharia a se esforçar mais do que lá fora.

Nós já éramos desregulamentados desde o início. Quer dizer, os bancos na- cionais são de fato nacionais e não regionais. Temos distâncias continentais no nosso país, cobertura geográica liberada para todos os bancos, fazemos o atendimento ao público como sistema coletor de pagamento, coisa que nos ou- tros países é feita pelos Correios. Ainda hoje no Brasil se paga tudo nos bancos. Havia uma concorrência muito acirrada e o sistema de telecomunicações era um monopólio e não atendia às necessidades dos bancos. Aliás, foram os bancos que quebraram esse monopólio. As primeiras redes de telecomunicações priva- das – talvez o pessoal mais jovem não possa nem entender isso –, mas você era obrigado a ter uma máquina como se fosse um telefone, na época era um telex, cedido pela Embratel. Você não podia comprar um telex, havia uma linha e um equipamento que eram fornecidos pela Embratel. Para sorte minha, fabricados pela Olivetti, onde trabalhava e que tinha contrato com a Embratel. Mas essas redes de telecomunicações não nos atendiam e, portanto, nos obrigaram a solu- ções de processamento distribuído já naquela época.

Costumo dizer que engenheiro de gravata é aquele que recebe manuais, tra- duz o que recebe de fora e sai vendendo soluções, tentando encontrar os pro- blemas. Mas, principalmente na época de Reserva de Mercado, ele se transfor- mou num engenheiro de bancada, não de gravata. Nós izemos muitas coisas

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em termos de automação bancária aqui no Brasil, e temos que nos orgulhar disso. Frequento a USP todos os dias e eu tinha contato com os quarto-anistas, quinto-anistas da Poli à procura por atividade de fato de engenharia – e não para se transformar num vendedor. E isso foi muito importante durante a épo- ca da Reserva de Mercado, pois podíamos oferecer a eles a oportunidade de ser de fato projetistas, engenheiros.

Eu credito a isso o nível de automação bancária do país respeitado mun- dialmente e que hoje desaguou, aqui no Brasil, no internet banking, o primei- ro fora dos Estados Unidos. E por que só tinha um banco fora dos Estados Unidos? Porque o governo americano não permitia que os browsers tivessem segurança. Aquela história do cadeadozinho que se fecha – que se conhece hoje –, o governo americano não permitia que, fora da fronteira americana, houvesse transação segura.

A Scopus, uma empresa tipicamente de engenharia nacional muito ligada à Poli, foi para o MIT, achou lá os três cientistas que escreveram os algoritmos e, de posse deles, desenvolveu uma camada de software seguro implementada aqui no Brasil. É a famosa segurança que fecha o cadeado com chaves de 128 bits. Portanto, a engenharia nacional tem um papel muito importante nas evo- luções do internet banking no Brasil.

Queria ainda falar da importância da Olivetti nos anos 50, 60 e início dos 70. De fato, todas as máquinas de contabilidade dos bancos eram Olivetti. E essa máquina perfurava uma ita de papel, com um furo quadrado. A capacidade da Olivetti era tal, em termos de marketing, que a empresa conseguia justiicar que o leitor, ao ler um furo quadrado através de uma escova “energizada”, formava de fato uma onda zero-ou-um digitalmente mais fácil de identiicar do que se o furo fosse redondo. A capacidade de marketing de venda e a argumentação nos permi- tiram a liderança na época. Essa posição da Olivetti era tão forte que, como a única máquina que lia esses furos quadrados era a Univac, muitos bancos no Brasil, antes mesmo de ter IBM, tiveram Univac. Até que depois começamos a comer- cializar na Olivetti os famosos RC-2000 e RC-3000, que transformavam os furos quadrados numa ita magnética que pudesse ser lida pelos computadores.

39 Outro dado interessante foi a transição do data entry, que era um grande

problema dos bancos. O início foi o cartão perfurado, depois a IBM ofereceu sistemas online com o famoso vídeo 2260, que parava um computador do ban- co só para fazer data entry, e aí começaram as soluções off-line. A DE-520 foi um produto tão interessante que, durante a época de Reserva de Mercado, o governo brasileiro tentou trazer sua fabricação para o país.

E vocês talvez não lembrem, mas se rememorarem, a Cobra, que era uma em- presa do governo, fabricou o sucessor da DE-520. Como a Olivetti não permitia a fabricação da DE-520, eles foram a Sycor, nos Estados Unidos, e trouxeram o Sycor 340. Aqui, de interessante, é a famosa briga entre o cassete (de DE520) com o loppy (no IBM 3740) no data entry. Olivetti versus IBM. Novamente a capa- cidade de marketing da Olivetti. É evidente que, na época, o suporte cassete era inferior ao loppy. Só que a estação de trabalho da IBM tinha o teclado não posi- cionado na frente do vídeo, forçando o operador a digitar torcendo o pescoço.

E nós, da Olivetti, explorávamos isso dizendo que na DE não haveria proble- ma de L.E.R. (Lesão por Esforço Repetitivo), que aconteceria no pescoço de quem usasse as máquinas IBM. Deu certo, a DE teve uma posição importante em ter- mos de processamento de data entry. Na verdade, quando chegou a Reserva de Mercado, o líder em termos do que seria hoje a microinformática era a Olivetti. Outra coisa peculiar da Reserva de Mercado é que eu, como Olivetti, negociei com a Scopus uma máquina de entrada de dados no Brasil. Posteriormente, fui para a Scopus administrar esse mesmo contrato que eu tinha assinado como Olivetti, que foi a fase em que iniciei a trabalhar na indústria nacional.

Gostaria de lembrar que a nossa geração é privilegiada porque o processo de seleção dos engenheiros que se formavam nos anos 60 era sui generis. Hoje, o pessoal tem diiculdade para encontrar trabalho, e nós éramos caçados pelas multinacionais de tecnologia. Elas iam às escolas e nos disputavam realmente. Eu, particularmente, ia começar a trabalhar na IBM, e tive uma oferta de 30% a mais de salário para permanecer na Olivetti onde já estagiava, que, coinci- dentemente, me mandou para a IBM para ser treinado durante mais de seis meses. Fiquei lá com o Luiz Fadel, com o Sala, e posteriormente acabei estu-

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dando na IBM da Itália a versão zero do Cics, que, pasmem, ainda é o sistema usado pelos grandes bancos. Nós estamos falando de um produto da IBM que tem 40 anos e ainda realiza a maioria das transações dos bancos brasileiros.

Ou seja, no processo de seleção e oportunidades fomos uma geração pri- vilegiada. Outra coisa interessante é que nos anos 60, naquelas famosas má- quinas de contabilidade, os bits e os bytes eram sólidos. Não tínhamos como programar digitalmente; portanto, se espetavam pedacinhos de ferro nas má- quinas e, na verdade, podíamos pegar o bit e o byte na mão. As máquinas tinham milhares de peças como os telex, que como eu disse romperam pela primeira vez o monopólio do Estado na área de telecomunicações e foram os bancos que izeram isso. Foram posteriormente integrados aos mainframes. A Scopus, ainda nos anos 70, desenvolveu uma interface que conectava as grandes redes de telex aos computadores; começava, então, algum trabalho de permitir as agências online.

Ainda no inal da década de 60, trabalhei numa fase com o que era de- nominado computadores de mesa. Evidentemente, eram equipamentos com capacidade um pouquinho superior a uma régua de cálculo, 120 instruções. Na verdade, os italianos tinham também uma forma muito elegante de falar sobre uso dos registradores para dados e instruções, que era o “uso promíscuo” de memória. Tínhamos de fato que fazer a programação e dividir a memória junto com os dados. Para fazer uma tabela Price, por exemplo, se ocupava 100% da capacidade de processamento da máquina.

Já nos anos 70, iniciaram-se os primeiros projetos de agências online com terminais não-inteligentes, equipamentos eletromecânicos. Como fornecedor, nós tínhamos de modiicar o Cics para que ele pudesse falar com esses termi- nais eletromecânicos, dado que eles não tinham nenhuma inteligência. Surgiu, então, um terminal com certa capacidade de memória, ainda eletromecânico, e me lembro de ter feito uma proposta para o Eduardo Magalhães, do Unibanco, e ter colocado na descrição que aquilo era “inteligência capilar”, porque tinha alguma memória na ponta, no terminal. Acabei sendo conhecido como o cara da “inteligência capilar”.

41 Na verdade, alguns desses projetos foram implantados no BEG, Banco Es-

tadual da Guanabara, onde tivemos algumas experiências online, computador Burroughs. E o Banco Auxiliar, ainda nos anos 70, que implantou uma primeira agência online com terminais eletromecânicos. Era uma época de heroísmo. A Olivetti tinha os seus terminais em um prédio na Avenida Paulista, e o pessoal do CPD do Auxiliar, que eram engenheiros do ITA, escreveu um software e ba- tizou de Seven, que eles achavam que vinha depois do Cics, da IBM.

Eu me lembro de termos uma vez queimado a controladora de comunica- ções do Banco Auxiliar. Enim, problemas que só numa época heroica podem acontecer. Posteriormente, as primeiras transmissões de dados ponto a ponto. Falou-se muito aqui da DE. Ainda nos anos 70, e com a qualidade das comu- nicações que nós tínhamos, isso também era heroico, começamos a fazer as primeiras transmissões de dados e sistemas online, mas em sistemas de trans- missão batch, por exemplo, de sistemas data entry. Em 1974, também houve um fato muito interessante. Lembro de ter participado, junto com um colega, do projeto do primeiro rack de modems. Hoje, isso é uma coisa tão trivial, mas o primeiro rack tinha três ou quatro modems de 2400 bits por segundo, o que foi um grande salto. O cliente era o Bradesco porque os terminais eletromecâ- nicos de que eu estava falando aqui transmitiam 50 bauds, 134,5 bauds. E por que 134,5 bauds? Porque dava em média certo número de palavras por minuto. Portanto, saltar para 2400 bps era uma façanha.

Acho que, diferentemente do curso de engenharia de hoje, nosso curso era mais genérico. Éramos treinados para sermos grandes administradores, geren- tes. A especialização veio posteriormente. Durante os últimos anos de curso de qualquer das atividades da engenharia, você tinha muita formação para se preparar para ser gerente. Como falei, já a partir do quarto ano da escola, as grandes empresas e organizações, os grandes fornecedores de computadores, ofereciam estágios com uma remuneração interessante. Na época, nós éramos realmente muito procurados por essas empresas e com uma oferta, ainda mais sedutora, de tão logo ser efetivado, fazer um treinamento no exterior. Essa era a cenoura colocada para os jovens engenheiros.

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A possibilidade, principalmente durante a Reserva de Mercado, de fazer de fato engenharia fez diferença em relação à época em que o engenheiro ganhava uma gravata, alguns manuais, já tinha algumas soluções e tinha que encontrar os problemas nos clientes. Foi uma fase muito interessante. A época da Reserva de Mercado criou uma escola muito importante. Esse efeito de que um país em desenvolvimento lidera processos de automação, como aconteceu com a automação bancária brasileira, onde nós somos referência. A Itautec chegou a vender na Europa soluções de automação bancária. Temos também a própria Digirede, que chegou a implantar sistemas fora do país.

Isso vai se repetir agora, com a mobilidade. Se começarmos a pensar em referências sobre mobilidade, vocês não vão me dar um único exemplo dos Es- tados Unidos. Vão dizer que existe uma solução interessante no Quênia, outra muito interessante na Indonésia. O desaio que foi colocado para a engenharia nacional, na época, foi respondido e, de fato, nós viramos referência mundial. Particularmente, no meu trabalho, eu era responsável pela Engenharia de Sis- temas da Olivetti, e esse conceito de manter o saldo online nas agências foi inventado no Brasil porque nós tínhamos problemas de comunicação. Não foi a opção do Itaú, que fez um sistema muito interessante na Itautec, o GRI, ge- renciador para soluções centralizadas. No nosso caso, projetamos uma solução de processamento distribuído, com o saldo mantido online na agência. Esse conceito nasceu no Brasil e foi posteriormente adotado, até porque as multi- nacionais tinham soluções que não se adequavam e não eram absolutamente adotáveis pelos bancos brasileiros ou em países com estrutura similar.

Essa interação com as escolas e com a academia também foi importante. Fa- zíamos palestras sobre protocolo de comunicação, o que é BSC, o que é protocolo assíncrono. A distância entre o conhecimento técnico do fornecedor e do usuário era tamanha que falávamos de detalhes totalmente insigniicantes para os dias de hoje. Seria mais ou menos a mesma coisa que fazer hoje uma palestra sobre o protocolo IP. Quem é que tem interesse nisso? Ninguém, e todo mundo usa.

Nesse período, também começou a se perceber a necessidade de uma for- mação um pouco mais ampla do que o aprendizado técnico, e as escolas de

43 administração têm um papel muito importante nisso. Eu me lembro de ter

participado, como aluno e como palestrante, na FEA-USP e na FGV, de cursos sobre automação bancária já sob o ponto de vista de administrador. Porque, de fato, a tecnologia estava dominada, mas como transformar isso em negócio era o nosso desaio, e nisso as escolas de administração foram mais importante do que as de engenharia, que tiveram um papel eminentemente mais técnico.

Queria acrescentar, com relação a essa geração dos anos 60, 70, o quanto ela foi privilegiada. Na verdade, como a área de tecnologia e processamento de dados, o CPD da época, selecionava esses engenheiros, uma série de ativi- dades novas no âmbito dos bancos, nascia de pessoas da área de tecnologia. Planejamento estratégico, por exemplo. Quem eram as pessoas dentro do banco mais preparadas para começar a discutir planejamento estratégico? O pessoal do CPD. Porque tinha lá formação acadêmica interessante, então os spin offs de áreas como Organização & Métodos, mercado de capitais, planejamento estra- tégico nasceram do pessoal de tecnologia da informação hoje. Acho que o me- lhor exemplo disso é o [Alcir] Calliari, que virou presidente do Banco do Brasil. O próprio John Reed tem uma frase muito famosa: “we are in the information business”. Ou seja, para ele, o negócio do banco é informação. E as cabeças pen- santes dos bancos estavam concentradas na área de tecnologia. Talvez esteja sendo um pouco cabotino, mas é o que vivemos.

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ou formado pelo ITA, em 1963. Iniciei minha carreira como engenheiro

eletrônico na primeira década escolhida para se retratar aqui, a dé- cada de 60. Muita coisa interessante aconteceu antes dessa época, e também faz parte da história, mas na década de 60 a automação bancária, em particular, começou a se acelerar acentuadamente. Acredito que a trajetória da automação bancária brasileira tem muito a ensinar para os jovens e também para os não tão jovens de hoje.

Minha experiência em automação bancária pode ser considerada uma das mais diversiicadas, na medida em que trabalhei em muitas empresas, dos dois lados da mesa: como fornecedor e como cliente. Não iz carreira em nenhum dos bancos, nem trabalhei por mais de seis anos em nenhuma empresa. A única onde estou há mais tempo, 20 anos, é a minha própria empresa.

Como era a tecnologia na década de 60? Falávamos de “mecanização”. Nem se falava ainda de “processamento de dados”, muito menos de “informática”. Falá- vamos dos equipamentos convencionais, das chamadas tabuladoras. Falávamos ainda da programação feita em painéis. Não usei e não programei, mas vi essa “tecnologia” sendo usada em um dos bancos em que trabalhei. Falávamos, mui- to, em cartões perfurados. A entrada de dados, para todas as inalidades, inclu- sive para programação, era feita por cartões perfurados. Perfuradora de cartões era o grande recurso do back-ofice, o grande assunto. Já havia também a ita magnética nesse tempo, usada no processamento de massas maiores de dados.

Falávamos das CPUs e o que elas continham, sendo a parte principal dos com- putadores. Falávamos de máquinas que rodavam um único programa por vez. Não