• Nenhum resultado encontrado

Formado em Engenharia Eletrônica pela Escola Politécnica da USP e em Ciências Contábeis pelo Mackenzie, foi diretor de sistemas do Banco Itaú, diretor superintendente da Itautec e diretor de TI do Banco Real ABN Amro. Participou dos conselhos da Prodam, Prodesp e CIP. Hoje, participa do conselho da Itautec e é sócio das empresas BRToken, FindIT, HDI e Origami.

É

com imensa satisfação que estou dando este depoimento em companhia

de amigos com quem convivi em momentos importantes para a evolução da tecnologia bancária brasileira. Vou contar um pouco de minha história no Itaú, a partir das posições já colocadas anteriormente pelo Antonio Geraldo Toledo de Moraes, até os projetos que deram origem à Itautec e algumas expe- riências na Febraban e no Cnab. No começo da automação bancária, como o Ge- raldo comentou, o grande desaio era a qualidade da entrada de dados e a falta de padronização de documentos. Nas áreas de processamento de dados era famosa, na época, a frase: “entra lixo, sai lixo”, que retratava bem esse problema. O siste- ma mais crítico e com maior volume de dados era o de contas correntes. No Itaú utilizávamos o sistema de controle paralelo, ou seja, o computador trabalhava em paralelo com as agências, registrando e conferindo os saldos. O segundo sistema mais crítico era o sistema de carteiras – cobrança, caução e descontos. Processá- vamos também os sistemas de acionistas e de Depósitos a Prazo Fixo.

No caso particular do Itaú, existia um foco muito grande nos sistemas de controle. Eu queria aperfeiçoar os serviços das agências com o sistema de Lis- tão, como meus colegas de outros bancos estavam fazendo, mas a prioridade do Dr. Olavo era a contabilidade. Ele focava na amarração contábil dos siste- mas para garantir que todos os números estivessem corretos. Os controles das contas “departamentos no país”, contas internas e contas de receitas, naquele tempo manuais, eram muito rigorosos.

Era grande a preocupação com a apropriação de resultados – no caso de carteira de títulos tínhamos um programa que calculava o rebate, utilizado

70

para calcular as receitas das carteiras de empréstimo a serem apropriadas no mês. No caso de depósitos a prazo ixo, os programas calculavam as despesas com juros do mês. Esses dois programas eram fundamentais para o cálculo do resultado mensal. A discussão sobre os resultados era sempre polêmica, pois, como a credibilidade do computador era pequena, as áreas de controle continuavam fazendo cálculos manuais e os resultados raramente batiam. O assunto acaba caindo em uma reunião com o dr. Olavo, com cada área defen- dendo sua posição, e o resultado era sempre previsível: “Eu não continuo a reunião com posições não batidas; quando vocês chegarem a um acordo com relação a esses números vocês voltam”.

Assim, minha grande preocupação foi “amarrar contabilmente” todos os sis- temas do banco, o que acabou gerando a implantação do sistema de contabilida- de. Isso foi feito através do sistema “Movimentação de Contas”, que integrava o fechamento contábil das agências com os movimentos de conta corrente, cartei- ras e contabilidade, utilizando um sistema de lotes, amarrados com o fechamento dos caixas. Com esse sistema pudemos também implantar o Listão em todas as agências. Os controles icaram bastante rígidos, o que muitas vezes gerava con- litos, uma vez que, se todo o movimento não estivesse batido, o processamento era interrompido. A solução encontrada foi abrir uma conta chamada “diferenças a regularizar”, que possibilitava a continuidade do processamento e a correção das diferenças num momento seguinte. Esses controles foram batizados, pelo Renato Cuoco, como “síndrome da amarração contábil”. O sistema Movimenta- ção de Contas tornou-se a base da arquitetura dos sistemas do Itaú e muitos dos seus conceitos perduram até hoje. Os analistas que participaram de seu desen- volvimento eram pessoas excepcionais, que vieram a ocupar cargos de destaque no Itaú e no mercado de informática, e dentre eles destaco o Antônio Carlos Barbosa de Oliveira, o Antônio Carlos Morelli e o Cássio Dreyfuss.

Nesse ponto, vou contar uma história que relata bem a reação dos antigos funcionários dos bancos que resistiam à implantação dos sistemas computa- dorizados. Estávamos com o sistema de contabilidade pronto para implantação e tínhamos que submetê-lo à aprovação da Comissão Técnica Bancária. O sis-

71 tema não foi aprovado devido aos formulários contábeis não serem amarelos,

como era praxe na época. A solução foi encomendarmos formulários amarelos, o que adiou a implantação em dois meses. Em seguida, nova crise, o gerente geral da contabilidade recusou-se a participar da reunião em que apresentaría- mos o sistema às agências do Banco Itaú. Ele reuniu seus gerentes imediatos e disse que não compareceria por discordar do sistema, que estava condenado ao fracasso e que aquele seria o último dia em que as posições do banco estariam batidas. A reunião foi feita, o sistema foi aprovado pessoalmente pelo dr. Olavo e a implantação ocorreu normalmente, sem nenhum problema grave. O gerente geral aposentou-se quatro meses após esse episódio.

Com a implantação do sistema de movimentação de contas, a prioridade passou para os sistemas de Controle e Gestão. O dr. Olavo queria calcular o resultado do banco, quebrando por região, agências, produtos e clientes. Ele participou pessoalmente das reuniões para deinição do sistema. Foram 60 dias seguidos com reuniões nos inais de tarde. A consequência foi a implantação dos primeiros “data bases”, com destaque para a primeira base de dados que consolidava as posições dos clientes, que chamávamos de “Customer Informa- tion File”. Foi o período em que mais aprendi sobre o Banco Itaú. Nesse ponto vou contar mais uma história: um dos relatórios emitidos pelo sistema era o de clientes com contribuição positiva e negativa, relatório esse que era enviado às agências para subsidiar o trabalho dos gerentes. Um dia o dr. Moraes Abreu [José Carlos], que assumira a presidência do Banco quando o dr. Olavo foi para a Prefeitura de São Paulo, recebe uma visita de inspetores do BC, que, após elo- giarem os relatórios, dizendo que ainda não tinham visto nada igual, disseram que iam incluí-los no roteiro das inspeções e questionaram por que o banco mantinha aqueles clientes com contribuição negativa tão bem identiicados nos relatórios. Foram umas boas discussões para convencê-los de que os relatórios eram uma ferramenta de trabalho para evitar essas ocorrências.

Toda essa infraestrutura de sistemas de controle e gestão, amarrados conta- bilmente, foi de fundamental importância para suportar o crescimento do Itaú e o processo de fusões e aquisições que se seguiu. No que se refere ao aperfei-

72

çoamento das relações interbancárias, os cheques foram padronizados no Con- gresso de Bancos do Recife, com decisiva atuação do Banco Central, que na altura era presidido pelo prof. Ruy Leme. Começamos a trabalhar na padronização dos boletos de cobrança, através de uma comissão criada pelo Olavo Setubal e pelo Amador Aguiar, para propor melhorias nos processos interbancários, denomina- da Comissão Técnica Itaú Bradesco, da qual participávamos, pelo Itaú: o Renato Cuoco, o Samuel Meda e eu, e pelo Bradesco: o Manoel Cabete, o Jorge Adati e o Celso Mellon Raggio. Aqui, abro um parêntese para contar um caso: numa reu- nião no Bradesco, quando analisávamos o “layout” dos boletos, o Amador Aguiar entra na sala e pergunta: “Meninos, o que vocês estão fazendo?” “Estamos ten- tando resolver um impasse na padronização dos boletos, uma vez que o passo da impressora do computador é em polegadas e o passo das máquinas de escrever é em milímetros. Como muitos bancos ainda usam máquinas de escrever, preci- samos encontrar uma forma de atender aos dois passos.” A resposta do Amador foi imediata: “Não se preocupem com isso, padronizem só para o computador, os bancos que não usarem computador, ou vão quebrar ou nós vamos comprar...” É claro que aceitamos a sugestão e a proposta de padronização foi em polegadas.

Fui convidado para presidir o Cnab em 1977 e levamos essa proposta de pa- dronização dos boletos para aquele fórum. Permaneci quatro anos à frente do Cnab, acompanhado de um grupo excepcional de proissionais, três dos quais es- tão conosco hoje, nesta mesa redonda: o Calliari, o Regis e o Eduardo Magalhães. Completavam o grupo o Isao Aoki (Noroeste), o Celso Mellon Raggio (Bradesco) e o Zemar Carneiro Rezende. Além dos bloquetos, padronizamos os DOCs - Do- cumentos de Crédito e a primeira versão dos arquivos magnéticos para troca de informações eletrônicas. Trabalhamos sobre a revisão da codiicação das contas contábeis proposta pelo BC e discutíamos muito a Política Nacional de Informá- tica, a necessidade de liberação de licenças de importação de equipamentos, os caminhos a serem seguidos e os equipamentos necessários para implantação dos sistemas OnLine/Real Time. Vou comentar sobre este último tema e deixarei os demais para meu depoimento na mesa redonda sobre o Cnab e os Ciabs.

73 – apoiada em mainframes, e muito dependente da rede de comunicações – e a

descentralizada – com servidores nas agências. A descentralizada, que vinha sendo incentivada pelo governo, uma vez que estava baseada nos míni e microcomputa- dores que começavam a ser fabricados no Brasil. No Cnab, eu e o Calliari defen- díamos o sistema centralizado, enquanto um grupo liderado pelo Celso apoiava a descentralização apoiada nos minicomputadores, e o Zemar e o Eduardo Magalhães perseguiam a solução descentralizada baseada em microcomputadores. As discus- sões eram complicadas, pois tudo era precário, a rede de telecomunicações era lenta e pouco coniável, os minicomputadores fabricados no Brasil não eram totalmente adequados às particularidades do sistema das agências, e os microcomputadores, cuja fabricação estava no início, tinham pouquíssima capacidade de armazenamen- to. Ou seja, a escolha de qualquer uma das alternativas exigia apostar no futuro.

Para conhecer melhor essas soluções resolvemos promover, através do Cnab, em 1979, um Seminário Internacional de Automação Bancária, sobre sistemas em tempo real. Convidamos para palestrar o Citibank (USA), o Kyowa Bank (Ja- pão) e o Credit Lyonnais (França), bancos internacionais que em seus países já utilizavam sistemas online. O grupo de palestrantes de bancos era completado pelo Eduardo Magalhães, que tinha liderado a implantação desse sistema no Brasil, usando terminais IBM, projeto este que foi interrompido pela política de reserva de mercado. Contamos também com o apoio da IBM, da Burroughs, da Univac e da Olivetti para apresentarem suas soluções.

Com base nessas informações e depois de uma série de visitas a bancos nos Estados Unidos, no Japão e na Europa, decidimos partir para o sistema centrali- zado, apostando numa melhora continuada das telecomunicações. Estabelecemos também que o sistema deveria ser o mais simples possível, de fácil manutenção, que os programas nos terminais e servidores deveriam ser carregados a partir do computador central, que possibilitasse uma implantação rápida, sem exigir muito treinamento do pessoal das agências, enim, que fosse simples e fácil de operar.

Foi a partir dessas deinições que o dr. Olavo decidiu criar a Itautec. Mas essa é outra história, que contarei na mesa redonda sobre as indústrias de nacionais de informática.

74