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ARBITRARIEDADE E ESTADO DE DIREITO

DIREITO E ESTADO

72. ARBITRARIEDADE E ESTADO DE DIREITO

legalidade do Estado. Arbitrariedade é conduta antijurídica praticada por órgãos da administração

pública e violadora de formas do Direito. Arbitrariedade e Direito são ideias antitéticas, inconciliáveis.

O que caracteriza propriamente a arbitrariedade é o fato de uma ação violar a ordem jurídica vigente, com desatenção às formas jurídicas. Pode ser praticada mediante ação, quando o poder público, por exemplo, exorbita a sua competência, ou por omissão, que pode ocorrer na hipótese de um órgão administrativo negar-se à prática de um ato para o qual é competente. Consoante ressalta Júlio O. Chiappini, a violação do Direito pode alcançar tanto o aspecto de forma quanto o de conteúdo e ambas hipóteses caracterizam a infração jurídica; todavia, arbitrariedade haverá apenas quando houver ataque às formas.21 Isto se passa, por exemplo, quando o executivo não respeita a sua faixa de competência e

dispõe sobre assunto afeto à órbita do legislativo; quando o executivo pratica ato judicante e transgride a ordem constitucional; quando o legislativo aprova uma lei sem respeitar o quorum exigido. O conceito de arbitrariedade independe, pois, do valor justiça. Ela pode ser justa ou injusta. O que não é possível é haver uma arbitrariedade legal.22 Conforme, ainda, o ilustre jurista argentino Júlio Chiappini, “hablar de

un Derecho arbitrario, incluso, es caer en una contradictio in adjectio”.

Entre os meios preconizados para o combate à arbitrariedade, apontam-se os seguintes: a) eliminação do arbítrio judicial, negando-se ao Poder Judiciário a possibilidade de criar o Direito; b) o controle jurídico dos atos administrativos, pela instauração de uma justiça especializada; c) o controle da constitucionalidade das leis.

72.2. Estado de Direito. O fundamental à caracterização do Estado de Direito é a proteção efetiva aos direitos humanos. Para que esse objetivo seja alcançado é necessário que o Estado se estruture de acordo com o clássico modelo dos poderes independentes e harmônicos; que a ordem jurídica seja um todo coerente e bem definido; que o Estado se apresente não apenas como poder sancionador, mas como pessoa jurídica portadora de obrigações. A plenitude do Estado de Direito pressupõe, enfim, a participação do povo na administração pública, pela escolha de seus legítimos representantes. Goffredo Telles Júnior identifica o Estado de Direito por três notas principais: “por ser obediente ao Direito; por ser guardião dos direitos; e por ser aberto para as conquistas da cultura jurídica”.23

A elaboração do conceito de Estado de Direito mediante a indicação de caracteres foi considerada por Ulrich Klug uma tarefa plena de dificuldades. Em seu lugar, o jurista alemão adotou o método de delimitação negativa, recorrendo ao modelo de pensamento que denomina por máxima de controle: não haverá Estado de Direito quando uma pessoa puder exercer sobre outra um poder incontrolado.24

BIBLIOGRAFIA PRINCIPAL

Ordem do Sumário:

67 – Giorgio del Vecchio, Lições de Filosofia do Direito, vol. II;

68 – Eduardo García Máynez, Introducción al Estudio del Derecho; Alessandro Groppali, Doutrina do Estado; Darcy Azambuja, Teoria

Geral do Estado; Icílio Vanni, Lições de Filosofia do Direito; João Mendes de Almeida Júnior, Noções Ontológicas de Estado, Soberania, Fundação, Federação, Autonomia;

69 – Abelardo Torré, Introducción al Derecho; Federico Torres Lacroze, Manual de Introducción al Derecho;

70 – Gustav Radbruch, Filosofia do Direito, vol. II; Miguel Reale, Filosofia do Direito, vol. I; Giorgio del Vecchio, op. cit.; Alessandro Groppali, op. cit.;

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1 Alessandro Groppali faz observações nesse sentido: “Nem o Direito é qualquer coisa que está por si mesmo, fora e acima do Estado, uma vez que ele representa o procedimento e a forma através dos quais o Estado se organiza e dá ordens; nem o Estado, por outro lado, pode agir independentemente do Direito, porque é através do Direito que ele forma, manifesta e faz atuar a própria vontade” (Doutrina do Estado, 2a ed., trad. da 8a ed. original, Edição Saraiva, São Paulo, 1952, p. 168). Idêntico é o pensamento de Heinrich Henkel: “Há uma correspondência funcional entre Direito e Estado: seu ‘necessitar’ e ‘ser necessitado’ recíprocos, no sentido de que só com sua união podem alcançar ambos a plena capacidade funcional” (op.

cit., p. 185).

2 Gustav Radbruch, op. cit., vol. I, p. 144.

3 Hermann Heller, Teoria do Estado, Editora Mestre Jou, São Paulo, 1968, p. 221.

4 Nicolau Maquiavel, O Príncipe, Os Pensadores, Abril Cultural, São Paulo, 1973, vol. IX, p. 11.

5 Eusébio de Queiroz Lima, Teoria do Estado, 7a ed., A Casa do Livro Ltda., Rio de Janeiro, 1953, p. 5.

6 Apud Eusébio de Queiroz Lima, Teoria do Estado, ed. cit., p. 6. 7 Eduardo García Máynez, op. cit., p. 101.

8 Segundo García Máynez: “Em realidade trata-se de um espaço tridimensional ou, como diz Kelsen, de corpos cônicos cujos vértices consideram-se situados no centro do globo”, op. cit., p. 100.

9 Apud Eduardo García Máynez, op. cit., p. 98. 10 Op. cit., p. 100.

11 Apud João Mendes de Almeida Júnior, Noções Ontológicas de Estado, Soberania, Fundação, Federação, Autonomia, Edição Saraiva, São Paulo, 1960, p. 63.

12 João Mendes de Almeida Júnior, op. cit., p. 65.

13 Em Leviatã, Hobbes sintetiza o fenômeno do contrato social: “Cedo e transfiro meu direito de governar-me a mim mesmo a este homem, ou a esta assembleia de homens, com a condição de transferires a ele teu direito, autorizando de maneira semelhante todas as tuas ações. Feito isto, à multidão assim unida numa só pessoa se chama Estado, em latim civitas.” (op. cit., p. 109).

14 A expressão utilizada por Kant foi Estado de Direito, cujo sentido atual é diverso do empregado pelo famoso filósofo alemão. 15 João Mendes de Almeida Júnior, op. cit., p. 38.

16 O pensamento expresso por Schiller dá bem a medida dessa concepção: “tudo deve ser sacrificado ao interesse do Estado, menos aquilo a que o Estado serve já de meio. O Estado em si mesmo não é um fim. É apenas condição para atingir os fins da humanidade, e estes não podem consistir senão no desenvolvimento harmônico de todas as forças do homem.” Apud Gustav Radbruch, op. cit., vol. I, p. 150.

17 Fustel de Coulanges, op. cit., vol. I, p. 348 e segs. 18 Apud Fustel de Coulanges, op. cit., vol. I, p. 351. 19 Miguel Reale, Filosofia do Direito, op. cit., vol. I, p. 253. 20 João Mendes de Almeida Júnior, op., cit., p. 38.

21 Em Anuário no 1 da Facultad de Derecho y Ciencias Sociales de la Pontificia U. Católica Argentina – Rosário, 1979, p. 87.

22 Na opinião de Recaséns Siches, nem todo ato ilegal praticado pelo poder público configura arbitrariedade. É indispensável que o ato antijurídico seja inapelável e emane, conseguintemente, de quem dispõe do supremo poder social efetivo. Se o ato praticado for retificável por instância superior ou emanar de particular, não haverá arbitrariedade no sentido rigoroso do termo, mas um ato ilegal ou errôneo (Introducción al Estudio del Derecho, ed. cit., p. 107). Em igual sentido expõe Juan Manuel Teran: “... um ato antijurídico ou ilegal é susceptível de reparação, mas um ato arbitrário é impossível que possa ser reparado dentro da ordem jurídica estabelecida... só pode incorrer em arbitrariedade a autoridade que tenha a máxima potestade, colocando-se acima do Direito” (Filosofía del Derecho, Editorial Porrua S.A., México, 1952, p. 72).

23 Em Carta aos Brasileiros, Jornal do Brasil, ed. de 08.08.77, 1o caderno, p. 5.

Quarta Parte