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O DIREITO NO QUADRO DO UNIVERSO

33. O MUNDO DO DIREITO

33.1. Considerações Prévias. Com oportunidade, renova-se agora a indagação fundamental: onde se localiza o território do Direito? Com base nas notas essenciais do Direito, já discriminadas, e tendo em vista os caracteres das diversas categorias de objetos, torna-se possível responder à indagação, indicando a posição do Direito no quadro das Ontologias Regionais.

33.2. Direito e Objetos Naturais. Tanto o mundo do Direito quanto o reino da natureza possuem leis. Mas enquanto as leis naturais são universais, imutáveis, invioláveis e se manifestam com absoluta isonomia, as leis jurídicas revestem-se de outros predicados:

a) O Direito Positivo não é universal, pois varia no tempo e no espaço, a fim de expressar a

experiência de um povo, manifesta em seus costumes, cultura e desenvolvimento geral.

b) Para ser um efetivo processo de adaptação social, o Direito não pode ser imutável. À medida que

se operam mudanças sociais, o Direito deve apresentar-se sob novas formas e conteúdos.

c) Apesar de o Direito ser obrigatório e possuir coercibilidade, não dispõe de meios para impedir a

violação de seus preceitos. Os mecanismos sociais de segurança, por mais aperfeiçoados que sejam, revelam-se impotentes para impedir as diversas práticas de ilícito.

d) No Direito, o princípio da isonomia, segundo o qual todos são iguais perante a lei, não possui a

eficácia absoluta que existe no mundo da natureza. Se, do ponto de vista teórico, a isonomia da lei é princípio de validade absoluta, no campo das aplicações práticas o absoluto se transforma em relativo, por força de múltiplos fatores de distorções.

e) Enquanto as leis da natureza são regidas pelo princípio da causalidade, pelo qual há uma sucessão

infalível, previsível, entre causa e efeito nos fenômenos naturais, o Direito é dominado pelo princípio da

finalidade, segundo o qual a ideia de fim a ser alcançado é responsável pelo fenômeno jurídico.

Enquanto no Mundo da Natureza indaga-se o porquê do fenômeno ocorrido, no Direito pergunta-se o

para quê de determinada lei.

f) A ordem natural das coisas é obra do Criador, enquanto o Direito Positivo é elaboração humana. g) Os objetos naturais pressupõem sempre um suporte físico, enquanto o ser do Direito não possui

matéria.

h) Os objetos naturais são neutros em relação aos valores, enquanto o Direito é processo que visa a

realização de valores.

O paralelo entre as leis naturais e as jurídicas, com toda evidência, revela-nos que o Direito não se localiza no Mundo da Natureza.

33.3. Direito e Objetos Ideais. A simples menção de que os objetos ideais não têm existência, “não estão na experiência” e são neutros ao valor, põe em manifesto a impossibilidade de o Direito identificar-se com essa categoria de objetos, de vez que tem existência, está na experiência e realiza

valores. Em relação a estes, é inegável a sua importância na vida do Direito, que deve ser visto como

instrumento de realização da justiça. Contudo, não se pode dizer que Direito é apenas valor, e, com maior razão, valor apenas como ideia.

33.4. Direito e Objetos Metafísicos. O fato de o Direito Positivo estar na experiência, de vez que é cognoscível empírica e racionalmente, afasta a possibilidade de vir a ser catalogado entre os objetos metafísicos. Estes possuem, entre outras características, a de não estarem na experiência.

33.5. Direito e Cultura. Como processo de adaptação social, o Direito é gerado pelas forças sociais, com o objetivo de garantir a ordem na sociedade, segundo os princípios de justiça. Assim, o Direito é um objeto criado pelo homem e dotado de valor. Como, por definição, objeto cultural é qualquer ente criado pela experiência humana, infere-se que o Direito é objeto cultural.

34. CONCLUSÕES

O território do Direito localiza-se no Mundo da Cultura. É um processo de cultura espiritual que possui substrato não físico e valor a ser alcançado. Qual seria o suporte do Direito? Inegavelmente, a

conduta social do homem. Estabelecendo diretrizes para a convivência, modelando o agir em sociedade,

o Direito modifica o comportamento social, canalizando as ações para a vivência de valores. Como os processos culturais realizam valores, o Direito visa à concreção da justiça, que é a sua causa final, a grande razão de ser, a motivadora da formação dos institutos jurídicos. A justiça encerra toda a grandeza do Direito. Em termos absolutos, é um ideal não alcançável. A história, contudo, é a testemunha do notável esforço do homem para o aperfeiçoamento do Direito. A justiça privada, a lei de talião, o sistema das ordálias, o regime da escravidão, vigentes em épocas recuadas da história, revelam um Direito profundamente injusto, distanciado dos grandes princípios do Direito Natural. Hoje, o Direito valoriza a vida humana, protege os mais fracos, estabelece o princípio da isonomia legal. Contemplar o passado e observar o presente é esperar futuro promissor para as instituições jurídicas.

BIBLIOGRAFIA PRINCIPAL

Ordem do Sumário:

25 – Recaséns Siches, Introducción al Estudio del Derecho; Flóscolo da Nóbrega, Introdução ao Direito; 26 – Miguel Reale, Lições Preliminares de Direito;

27 – Aftalion, Olano e Vilanova, Introducción al Derecho; Abelardo Torré, Introducción al Derecho;

28 – Recaséns Siches, op. cit.; Fausto E. Vallado Berrón, Teoria General del Derecho; Flóscolo da Nóbrega, op. cit.; Miguel Reale, op.

cit.;

29 – Aftalion, Olano e Vilanova, op. cit.; Abelardo Torré, op. cit.;

30 – Johannes Hessen, Filosofia dos Valores; Flóscolo da Nóbrega, op. cit.; 31 – Aftalion, Olano e Vilanova, op. cit.; Alberto Torré, op. cit.;

32 – Ernst Mayer, Filosofía del Derecho; Wilhelm Sauer, Filosofía Jurídica y Social; Recaséns Siches, op. cit.; 33 – Recaséns Siches, op. cit.; Aftalion, Olano e Vilanova, op. cit.; Flóscolo da Nóbrega, op. cit.;

____________

1 Miguel Reale, Filosofia do Direito, ed. cit., vol. II, p. 270.

2 Carlos Cossio, apud Aftalion, Olano e Vilanova, Introducción al Derecho, 9a ed., Cooperadora de Derecho y Ciências Sociales, Buenos Aires, 1972, p. 15.

3 “In nature there are neither rewards nor punishments: there are consequences”, cf. Robert G. Ingersoll, apud Mariza Ferrari e Sarah G. Rubin, Inglês, Ed. Scipione, 1a ed., São Paulo, 2001, p. 99.

4 Montesquieu, op. cit., p. 9.

5 Neste equívoco incorre Fausto E. Vallado Berrón, quando afirma: “De acordo com as modernas concepções da física, a lei natural só expressa com um alto grau de probabilidade o acontecer causal dos fenômenos.” Nesta passagem, como em outras, de seu estudo sobre “La Ley de la Naturaleza”, identifica lei natural com enunciado. (Teoria General del Derecho, Universidad Nacional Autónoma del México, 1972, p. 81). Nesta falha não incidiu J. M. Bochenski, ao expressar igual pensamento: “... as teorias científicas nunca são verdades absolutamente certas. Tudo o que a ciência pode alcançar neste domínio é a probabilidade” (Diretrizes do Pensamento Filosófico, 4a ed., Editora Herder, São Paulo, 1971, p. 62). O

conhecimento científico não se confunde, pois, com o objeto de estudo das ciências da natureza, que são as leis naturais. 6 L. Recaséns Siches, Introducción al Estudio del Derecho, ed. cit., p. 11.

7 Johannes Hessen, Filosofia dos Valores, 3a ed., Arménio Amado, Editor, Sucessor, Coimbra, 1967, p. 60. 8 Aftalion, Olano e Vilanova, op. cit., p. 26.

9 Johannes Hessen, op. cit., p. 51.

10 Esta conclusão difere da apresentada nas cinco primeiras edições deste livro. Uma vez demonstrada a autonomia dos valores como premissa de raciocínio, inevitavelmente há de se reconhecer que os valores configuram categoria ontológica própria.

11 Wilhelm Sauer, Filosofía Jurídica y Social, Editorial Labor S.A., Barcelona, 1933, p. 117. 12 Max Ernst Mayer, Filosofía del Derecho, 2a ed., Editorial Labor S.A., Barcelona, 1937, p. 80.

Capítulo 8