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O DIREITO NO QUADRO DO UNIVERSO

28. OBJETOS NATURAIS

28.1. Conceito. Objeto natural é todo elemento que integra o reino da natureza e se subordina ao princípio da causalidade. A sua existência independe da vontade humana. Graças a ele o homem mantém

a sua vida, cria o seu instrumental de trabalho e produz. A planta, os rios, os peixes, os minerais são alguns dos objetos que a natureza coloca à mercê do homem. O seu estudo se faz pelas ciências naturais: Física, Química, Biologia, Astronomia, entre outras. Os objetos naturais dividem-se em duas espécies: físicos e psíquicos. Estes são tratados pela Psicologia e se referem, por exemplo, à emoção, ao desejo, à sensação etc.

Para bem aproveitar os benefícios desse imenso potencial, o ser humano procura conhecer a estrutura dos diferentes objetos naturais, os princípios e as leis que os regem.

28.2. Caracteres. Conforme se pôde verificar no quadro das Ontologias Regionais, de Carlos Cossio, os objetos naturais possuem os seguintes caracteres: a) reais: existem no tempo e no espaço, à exceção dos objetos psíquicos, que possuem apenas a dimensão temporal; b) estão na experiência: são acessíveis pelos sentidos humanos. Enquanto os objetos físicos são apreendidos pela percepção externa, os fenômenos psíquicos se desenvolvem pela percepção interna; c) neutros ao valor: objetivamente, não possuem sentido. O homem, sim, pode atribuir-lhes valor.

28.3. Princípio da Causalidade. No reino da natureza, nada ocorre por acaso. Cada fenômeno tem a sua explicação em uma causa determinante. O princípio da causalidade corresponde ao nexo existente

entre a causa e o efeito de um fenômeno. O eclipse solar, por exemplo, é um efeito que se explica por

uma determinada causa. O fenômeno é um efeito que pode, dialeticamente, constituir-se em causa de um novo fenômeno. Diante de um fato da natureza a indagação que se apresenta é sempre um porquê. A explicação do fenômeno exige um recuo ao passado, a fim de se constatar a circunstância que lhe serviu de causa. Literariamente situado o princípio, pode-se dizer que “na esfera da natureza não há recompensas nem punições: há consequências”.3

28.4. Leis da Natureza. A natureza é um corpo vivo, que se mantém em permanente movimento e transformação, em decorrência da existência de numerosas leis que regem o seu mundo. A lei natural, definida por Montesquieu como “a relação necessária derivada da natureza das coisas”,4 possui

caracteres particulares, entre os quais se destacam: universalidade, imutabilidade, inviolabilidade e

isonomia.

28.4.1. Universais. Porque são iguais em todos os lugares.

28.4.2. Imutáveis. As leis da natureza não sofrem variações. Não evoluem. Não perdem e nem recebem novas dimensões. A noção que o cientista possui sobre determinada lei é que é passível de retificação. É indispensável não se confundir, portanto, a lei da natureza com o enunciado que dela se faz.5 Quando os tratados científicos modificam o enunciado de uma lei natural, é sinal que a concepção anterior era falsa. Nem se pode afirmar que o cientista cria uma lei natural, pois na realidade tem o poder apenas de constatar a sua existência.

28.4.3. Invioláveis. O homem só pode influenciar os objetos naturais até onde as leis permitem. E o que a lei permitirá no futuro é o mesmo que permite hoje e no passado distante, de vez que a ordem

natural das coisas é inalterável. Se o homem obtém, na atualidade, a fecundação do óvulo pelo método

de inseminação artificial, teoricamente tal fenômeno já era possível desde o início da criação. Ao homem, porém, faltavam conhecimento e recursos tecnológicos.

28.4.4. Isonomia. É o princípio da igualdade de todos perante a natureza. A morte, por exemplo, é fenômeno decorrente de leis biológicas e atinge a todos os seres vivos indistintamente.

28.5. Importância. À medida que o homem obtém conhecimento sobre os objetos naturais, procura traduzir a sua nova experiência em fatos concretos. O avanço da ciência vai repercutir no mundo das invenções e no campo tecnológico. O progresso material gera a necessidade de o homem caminhar igualmente no setor espiritual. Sob pena de incidir no materialismo, o agente da evolução científica precisa compatibilizar as conquistas com as suas atitudes, sob o apoio de uma segura filosofia de vida. 29. OBJETOS IDEAIS

Os objetos ideais tornam-se inteligíveis a partir do exame de seus caracteres. Conforme se irá constatar, o termo ideal não possui qualquer conotação de ordem moral ou de aperfeiçoamento. Constituem campo de pesquisa da matemática, geometria e lógica. Os números, as figuras geométricas, os conceitos, são alguns de seus exemplos. Recaséns Siches distingue duas espécies nesta categoria: objetos ideais puros e valores.6 Como essa inclusão é negada por outros autores e ainda pelo fato de os valores

apresentarem caracteres especiais, para efeito didático esta segunda espécie apontada será focalizada isoladamente. Portanto, os caracteres, a seguir apresentados, referem-se tão somente aos objetos ideais que Siches denomina puros.

Caracteres básicos: a) são irreais, isto é, não ocupam um lugar no espaço e não têm duração. São, portanto, inespaciais e intemporais; b) não estão na experiência sensível: não são acessíveis pelos sentidos. A mentalização de um quadrado não depende de qualquer conclusão sobre o mundo exterior. Se o técnico fabricar algum objeto sob a forma de um quadrado, ter-se-á, aí, um objeto cultural e não um objeto ideal; c) neutros em relação aos valores : carecem de sentido. Não podem ser qualificados dentro de uma escala que compreende o bem e o mal. A sua materialização ou configuração prática pode, sim, obter significado, representar valor, mas já não se terá um objeto ideal.

30. OS VALORES

30.1. Axiologia. A parte da Filosofia que estuda os valores em seu caráter abstrato, sem considerar a sua projeção nas diferentes ciências, denomina-se teoria dos valores ou axiologia. Os valores específicos, concretos, ficam ao nível das próprias ciências. Assim, os valores jurídicos são abordados na Filosofia do Direito; os econômicos, nas Ciências Econômicas; os políticos, na Ciência Política.

Antes de se questionar a participação individual dos valores no quadro das Ontologias Regionais, impõe-se uma explanação sobre o seu conceito e importância.

30.2. Conceito. O homem é um ser em ação, que elabora planos e dirige o seu movimento com objetivo de alcançar determinados fins. A escolha desses fins não é feita por acaso, mas em função do que o homem considera importante à sua vida, de acordo com os valores que elege. A atividade humana, em última análise, é motivada pelos valores. Estes assumem a condição de fator decisivo, determinante dos projetos que o homem constrói e de cada providência que toma.

A ideia de valor está vinculada às necessidades humanas. Só se atribui valor a algo, na medida em que este pode atender a alguma necessidade. Assim, a necessidade gera o valor; este coloca o homem

em ação, que por sua vez vai produzir algum resultado prático: a obtenção de algum objeto natural ou cultural, ou a mentalização e vivência espiritual de objeto ideal ou metafísico.

Como todo conceito-limite, o valor não comporta uma definição lógica ou real. Pode-se dizer, contudo, que a ideia de valor se compreende na noção que temos entre o bem e o mal, entre as coisas que promovem o homem e as que o destroem. O valor não existe no ar, desvinculado dos objetos. Vem impregnado na realidade, na existência.

Todo processo cultural é estruturado com vista à realização de um valor próprio. A estética existe em função do belo, a técnica visa a alcançar o útil, a Moral projeta o bem, a Religião valora a divindade e o Direito tem na justiça a sua causa principal.

30.3. Caracteres. Assinalamos quatro caracteres fundamentais para os valores: a) correspondem a

necessidades humanas: para que algo possua valor, é indispensável que seja dotado de algumas

propriedades, capazes de satisfazer às necessidades humanas. Se o homem não possuísse necessidades, não haveria sequer a ideia de valor; b) são relativos: como as necessidades humanas não são padronizadas, não obstante se possa acusar uma faixa comum, os valores não se apresentam com idêntico significado para todas as pessoas. Assim, um código é sempre valioso para o estudante de Direito e não possui tal importância para o aluno de Engenharia. Diante das coisas o homem pode assumir três posições básicas: atribuir valor positivo, negativo ou manter-se neutro. A intensidade da valoração também é relativa, de acordo com o grau de necessidade da pessoa; c) bipolaridade: a cada valor positivo corresponde um valor negativo ou desvalor. Exemplos: justiça e injustiça; amor e ódio. Essa estrutura polar dos valores é designada polaridade essencial pelo filósofo Johannes Hessen;7 d) possuem

hierarquia: o homem estabelece uma linha de prioridade entre os valores. Esta é também variável de um

ser humano para outro. De um ponto de vista objetivo, considerando-se as necessidades e interesses do gênero humano, pode-se estabelecer uma graduação entre os valores de forma estável. Assim, os valores espirituais ocupariam um plano superior aos de ordem material. Entre estes, os de sobrevivência teriam primazia em relação aos de ostentação.

30.4. Localização. Quanto à localização dos valores, há, basicamente, três posições: a) no sujeito;

b) no objeto; c) na relação entre o sujeito e o objeto . A primeira teoria, que se pode chamar de subjetiva, tem como ponto básico a circunstância de que o sujeito é portador de necessidade. A segunda, objetiva, apoia-se no fato de que o objeto, que irá suprir a necessidade, possui certas propriedades que o

fazem valioso perante o homem. A última é uma teoria eclética, para a qual o valor não existe isolado, mas na coparticipação do sujeito e objeto.

30.5. Os Valores e a Teoria dos Objetos. Podem os valores ser considerados objetos e, como tais, incluídos no Quadro das Ontologias Regionais?

Entre os filósofos não há uniformidade de orientação. O exame simplificado da questão indica as seguintes posições e argumentos:

1a) Opinião Contrária à Inclusão – Aftalion, Olano e Vilanova, sob a alegação fundamental de que os valores não possuem autonomia, pois não têm existência isolada e se manifestam apenas nos objetos culturais, para dar-lhes sentido, negam-lhes a condição de objetos. Para os argentinos, não seria possível admitir a inclusão de objetos não independentes no Quadro das Ontologias Regionais.8

2a) Opinião Favorável à Inclusão – Ao dividir os objetos em sensíveis (empíricos), suprassensíveis (metafísicos) e não sensíveis (ideais), Johannes Hessen incluiu os valores na última categoria. Pensava o filósofo alemão que “os valores pertencem à classe dos objetos não sensíveis. A sua particular maneira ou modo de ser é a do Ser ideal ou do Valer. Num ponto de vista mais ontológico-estático, podemos

também falar, certamente, num ser ideal dos valores, como o fazemos a propósito dos objetos matemáticos, e dizer que, num certo sentido, eles, assim como estes, também são.”9

Em nossa opinião, além de se manifestar nos objetos culturais, os valores podem existir autonomamente, enquanto ideia. Assim considerados, é inegável a sua inclusão na categoria dos objetos. Essa autonomia é possível, de vez que os valores, como ideia, podem ser sujeitos de um juízo lógico. Quando afirmamos que a justiça é indefinível, o valor se apresenta como sujeito do juízo. Nesse momento, não há como se pretender reduzir o valor a elemento de alguma outra categoria de objeto. Daí se infere, em conclusão lógica, que os valores constituem objeto específico, devendo ocupar, destarte, uma faixa própria no quadro das ontologias regionais.10