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A Nova Cidade

| Fotografia 40 | Bairro Azul | Vila Nova de Santo André | 10.Ago.2010 | Fotografia de Cátia Assunção.

A criação de um novo centro urbano colocou-se, desde cedo, como uma hipótese no desenvolvimento deste complexo, essencialmente portuário e industrial. De entre as razões anteriormente mencionadas, há que destacar que esta hipótese se evidencia das restantes (que previam o desenvolvimento dos aglomerados de Sines e de Santiago do Cacém), pela sua menor probabilidade de gerar conflitos e tensões sociais (PORTUGAL, PRESIDÊNCIA DO CONSELHO Gabinete da Área de Sines, 1973, p. 214). Por outro lado, a criação de uma cidade nova, traduz o ideal utópico da realização profissional de muitos urbanistas e arquitectos, pelo grau de liberdade que permite e pela ausência de referências a seguir, factor que não esteve, de certo, totalmente alheio a este projecto.

O planeamento urbano deste complexo teve intrínseco a utilização de um modelo de programação linear, que traduz um certo entusiasmo tecnológico e científico, impulsionado pelos avanços tecnológicos, registados na década 60, nos campos da informática e informação. De forma sintética, este modelo de programação linear, é apontado, no contexto da época, como um método sistemático de planeamento urbano, que através de uma definição prévia de objectivos e restrições, permite a obtenção um conjunto de linhas de acção, orientadoras do desenvolvimento a seguir. Os modelos de programação matemática, apontados como instrumentos de planeamento contínuos54, são referidos como métodos capazes de resolver problemas complexos, como os do planeamento urbano, no qual estão envolvidos inúmeros factores, reduzindo, através da

54 Devido à possibilidade de se actualizarem os dados, restrições e objectivos.

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relação das variáveis, as infinitas soluções admissíveis a um pequeno número de possibilidades (PORTUGAL, PRESIDÊNCIA DO CONSELHO Gabinete da Área de Sines, 1973, pp. 224-225).

Esta metodologia de planeamento urbano, foi utilizada pelo Gabinete da Área de Sines para produzir o esquema geral de organização territorial e de uso de solo, na qual se definiram as áreas industriais, residenciais, comerciais, públicas e a estrutura da rede de transportes55.

Embora não se pretenda avançar sob uma análise exaustiva do contexto do planeamento urbano, no país e no mundo, é inevitável referir que este processo de planeamento, reflecte uma forte influência de teorias como as de Von Thunen (1826), Christaller (1933), Hoyt (1939), Losch (1940) ou de Ulman e Haris (1941), entre outras, teorias essas que no seu contexto, correspondem a realidades muito diferentes das vividas em Portugal.

O planeamento da cidade nova de Santo André, tem também associados os princípios da urbanística moderna56, nomeadamente no que respeita à estrutura fundiária definida, às lógicas funcionalistas e de zonamento e à implantação de blocos isolados, não descurando referências à Garden City (de Ebenezer Howard), à Ville Radieuse ou até mesmo à Unité d’Habitation de Marseille (de Le Corbusier). Tal como referido pelos

55 Este modelo constituiu ainda o suporte para o planeamento das restantes infra-estruturas, para a determinação da

política e sistema de transportes e definição de estratégias relacionadas com o uso de solo, a população, o emprego (PORTUGAL, PRESIDÊNCIA DO CONSELHO Gabinete da Área de Sines, 1973, p. 226).

56 Termo utilizado por José Ressano Garcia Lamas, correspondente ao período pós Segunda Grande Guerra, até às

décadas de 1960/70 (LAMAS, 2004, pp. 297-382).

| Fotografia 41 | Vista sobre a Avenida de Santiago e o Bairro das Panteras Cor-de-Rosa | Vila Nova de Santo André | 10.Ago.2010 | Fotografia de Cátia Assunção.

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arquitectos Vassalo Rosa e Silva Dias57, não faltaram também as referências ao Novo Urbanismo Europeu e à malha hipodérmica e rigorosa da cidade inglesa de Milton Keynes58, sendo apontado, Kevin Lynch59 como autor de cabeceira dos então jovens arquitectos.

Esta nova cidade, prevista como um aglomerado satélite, capaz de fundar uma nova centralidade dotada de serviços, equipamentos e habitação concentrados, foi programada para 100 mil habitantes, a instalarem-se de modo faseado no tempo. Neste sentido, e sem querer imbricar, nesta fase do estudo, o conhecimento da realidade actual, há que mencionar um certo entusiasmo e utopia face às previsões populacionais e de mão-de-obra envolvidas quer na construção, quer no funcionamento das estruturas industriais e portuárias (e também nos serviços e equipamentos que foram sendo criados). Mais uma vez se demonstra um certo desfasamento face às realidades e contextos de teorias desenvolvidas em outros países, sobretudo europeus e a realidade portuguesa60

para além de uma notória renúncia à cidade tradicional.

O Plano Geral, realizado em 1972, estruturava a cidade nova de Santo André segundo três núcleos divisos entre si, pelas bacias hidrográficas da Lagoa de Santo André. Este modelo de desenvolvimento baseado no conceito de cidade poli-nucleada,

57 Aquando do Seminário organizado pela Secção Regional Sul da Ordem dos Arquitectos, sob o tema “Santo André -

Uma Cidade para a Indústria”, que decorreu em Vila Nova de Santo André, a 18 de Abril de 2009 (com a participação dos arquitectos G. Câncio Martins, Vassalo Rosa e Silva Dias).

58 José Ressano Garcia Lamas, refere de forma mais directa que o modelo de planeamento utilizado na cidade nova

de Santo André, decorre da aplicação das “grelhas neutras”, características de Milton Keynes (LAMAS, 2004, p. 454)

59 Em “A Imagem da Cidade”.

60 Nas previsões populacionais há um notório relacionamento com as previsões das cidades inglesas para 50 mil e

até 100 mil habitantes.

| Fotografia 42 | Vista sobre a Avenida de Santiago e o Bairro das Torres | Vila Nova de Santo André | 10.Ago.2010 | Fotografia de Cátia Assunção.

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previa três centros: (1) o núcleo Sul constituído por dois centros secundários (com 25 mil habitantes cada), (2) o núcleo central61, eleito para a localização do centro principal, responsável por toda a gestão urbanística (25 mil habitantes) e, (3) o núcleo Norte constituído também por um centro secundário (25 mil habitantes) (RODRIGUES, 1997, p. 140).

Em 1972 inicia-se a construção da cidade, pelo centro secundário Ocidental (o designado Primeiro Estabelecimento, localizado a Sul do centro principal), o mais próximo da costa.

No âmbito do plano (e do anteplano) foi dada especial atenção: (1) aos espaços públicos, reservando-os para a localização de equipamentos públicos, redes de espaços e de zonas verdes, de lazer e recreio; (2) aos espaços privados aliados aos espaços públicos; (3) à valorização da circulação pedonal; (4) à interconexão dos sistemas de transporte público; (4) à associação de praças e ruas interiores com galerias cobertas e

átrios e pátios públicos. (RODRIGUES, 1997)

O grupo de arquitectos e urbanistas, envolvidos neste projecto62 optou por uma estrutura reticular, desenvolvida a partir do crescimento morfológico de tipo linear, assente em vias de comunicação vertebradoras, alinhadas segundo o cardus e decumanus63, característicos da cidade romana. Esta estrutura foi apontada como a mais adequada ao tipo de desenvolvimento previsto (faseado). Ao longo destas vias,

61 O núcleo central cumpre a função de núcleo aglutinador dos restantes.

62 De entre os quais Guilherme Câncio Martins, Silva Dias e Vassalo Rosa, mencionados anteriormente.

63Cardus com orientação Norte-Sul e Decumanus com orientação Este-Oeste. De acordo com a cidade romana estas

vias principais cruzam-se perpendicularmente, dado origem, no seu ponto de intersecção à localização do fórum, das actividades políticas e administrativas e, nas suas imediações, às actividades mercantis.

| Fotografia 43 | Vista sobre o Bairro do Pica-Pau Amarelo | Vila Nova de Santo André | 10.Ago.2010 | Fotografia de Cátia Assunção.

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desenvolver-se-iam os elementos principais da estrutura urbana, nomeadamente o centro, e os principais equipamentos e serviços. Os espaços públicos assumem no plano da nova cidade uma grande preponderância, respondendo aos princípios da Carta de Atenas64.

Apesar do esforço dos arquitectos e urbanistas em fazer prevalecer alguns elementos e características dos assentamentos urbanos alentejanos, como a horizontalidade, por exemplo, verifica-se um descuramento face à estrutura da propriedade, predominantemente rural, promovida em grande parte, pela política de expropriações aplicada.

Do ponto de vista técnico, pode dizer-se que esta cidade, evoluiu positivamente, optando pela correcção de alguns pontos menos favoráveis dos conjuntos habitacionais característicos dos anos 50 e 60 (anteriormente referidos). Embora não se afaste muito da estética promovida pelas cidades industriais, optou-se por integrar no projecto desta cidade nova, uma diversidade de formas, entre os vários bairros, capaz de quebrar a tradicional monotonia. Assim, cada bairro, apesar de inserido num contexto e projecto de quarteirão e malha, deteria a sua identidade própria (RODRIGUES, 1997, pp. 166-167). Aplicou-se aqui o conceito de “grande bairro”65, formado por conjuntos de diversas formas e autores, na qual a malha desempenha a função de elemento aglutinador das várias parcelas.

| Fotografia 44 | Bairro dos Serrotes - Moradias Unifamiliares | Vila Nova de Santo André | 10.Ago.2010 | Fotografia de Cátia Assunção.

64 Considerado como um manifesto do urbanismo, resultante do IV CIAM, realizado em 1933, em Atenas.

65 Consultar (PORTAS, A Arquitectura da Habitação no Século XX Português, 1997). Ver também (COSTA R. J.,

2006).

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